Discurso durante a 59ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Indignação com o ocorrido ontem, no Grande Prêmio da Áustria de Formula 1, quando o piloto brasileiro, Rubens Barrichello, foi obrigado a ceder a vitória ao seu companheiro de equipe, por determinação da escuderia Ferrari.

Autor
Eduardo Siqueira Campos (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/TO)
Nome completo: José Eduardo Siqueira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESPORTE. POLITICA EXTERNA.:
  • Indignação com o ocorrido ontem, no Grande Prêmio da Áustria de Formula 1, quando o piloto brasileiro, Rubens Barrichello, foi obrigado a ceder a vitória ao seu companheiro de equipe, por determinação da escuderia Ferrari.
Aparteantes
Lindberg Cury.
Publicação
Publicação no DSF de 14/05/2002 - Página 7939
Assunto
Outros > ESPORTE. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • CRITICA, OCORRENCIA, CAMPEONATO MUNDIAL, AUTOMOVEL, INTERFERENCIA, INTERESSE ECONOMICO, ESPORTE, FALTA, ETICA, DETERMINAÇÃO, INDUSTRIA AUTOMOBILISTICA, PREJUIZO, VITORIA, BRASIL, ALEGAÇÕES, CONTRATO, EXPECTATIVA, REVISÃO, REGULAMENTO, COMPETIÇÃO ESPORTIVA.
  • ANALISE, POSIÇÃO, BRASIL, AMBITO INTERNACIONAL, REFERENCIA, RECURSOS NATURAIS, RECURSOS HIDRICOS, AGRICULTURA, DEFESA, REFORÇO, POLITICA EXTERNA, GARANTIA, VANTAGENS, NEGOCIAÇÃO, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (Bloco/PSDB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesta segunda-feira, ocupo brevemente a tribuna para tentar traduzir um pouco a preocupação com algumas das coisas que são caras ao povo brasileiro.

Estamos às vésperas da Copa do Mundo. O brasileiro é apaixonado pelo futebol e também pelo tênis. Devemos essa paixão pelo tênis fundamentalmente à Maria Esther Bueno e, nos dias de hoje, ao Guga. Mas jamais nos esqueceremos de Emerson Fittipaldi, Ayrton Senna, Nelson Piquet, entre outros tantos grandes atletas. O povo brasileiro aprendeu a se apaixonar também pela Fórmula 1. Por isso, esse tema não é menor. O discurso que ora inicio vai me remeter ao final do pronunciamento feito agora pelo brilhante Senador Osmar Dias, que falou do nosso sentimento de brasilidade ao assistirmos ao nosso País sentado à mesa internacional de negociação, com autoridade de quem tem 27% da água doce e 30% da biodiversidade do planeta, além de pontos estratégicos, como a base de Alcântara, que economiza combustíveis sólidos no lançamento de foguetes.

Sr. Presidente, somos uma Nação estratégica, uma terra e um povo estratégicos. Temos a Amazônia, o Pantanal, todos os minérios. Orgulhamo-nos disso, e esse orgulho aparece, da mesma forma, quando o brasileiro quer ver o Brasil representado na grande competição internacional. Contudo, hoje o mercado tomou conta de tudo, inclusive do esporte. Refiro-me especificamente à triste cena a que assistimos ontem. Temo que os brasileiros desistam de assistir à Fórmula 1 e esqueçam o passado de Ayrton Senna - que já nos deixou, mas que é uma marca no coração de todo o povo brasileiro -, por verem que o interesse estratégico e comercial da Ferrari acabou envergonhando um espetáculo inteiro. Talvez essa seja a única escuderia que tenha torcida organizada e apaixonada, como a torcida do meu Flamengo, como sou apaixonado pelo meu Tocantins. Assisti ontem à torcida vaiar, reprovar e não aceitar aquela decisão. E, Sr. Presidente, isso foi acontecer logo contra o nosso brasileiro, a quem atribuímos uma falta de sorte imensa. Alguns criticam, mas todos nós admiramos o caráter do piloto Rubens Barrichello, que, no entendimento da maioria dos brasileiros, deu ontem uma demonstração de profissional respeitador das decisões daqueles que o contratam.

Sr. Presidente, tenho certeza absoluta de que, pelos títulos que já conquistou, pelo momento em que se encontra o campeonato mundial de Fórmula 1, talvez o próprio Michael Schumacher devesse ter tido o gesto maior de grandeza. Aquilo incomodou, Sr. Presidente.

Esta Casa representa os Estados e quero reproduzir aqui, no plenário do Senado Federal, o sentimento de revolta do nosso povo, porque, como disse, temo que os brasileiros não queiram mais assistir à Fórmula 1. Se nosso piloto está em primeiro lugar e a equipe manda-o deixar passar o outro corredor, qual brasileiro vai querer assistir novamente a um espetáculo daqueles?

Às vezes, no futebol, ocorre uma situação em que é melhor o time perder, já estando classificado, para não pegar um adversário difícil à frente. Mas o torcedor não gosta disso. O torcedor gosta da vitória, da cabeça erguida. Vamos enfrentar o mais difícil e vamos vencê-lo!”

Estou, Sr. Presidente, otimista com a seleção brasileira que vai à Copa. Estou otimista em relação ao meu País, que tem à frente o Presidente Fernando Henrique Cardoso, que nos colocou em alguns embates na Organização Mundial do Comércio; contra a quebra do monopólio; contra a quebra das patentes, quanto aos medicamentos, no programa contra Aids em que o Brasil é considerado o País número 01 - conseguimos diminuir em 50% a morte dos já infectados.

O Brasil tem crescido como Nação, tem se afirmado perante os outros povos. São progressos de um País que é um expoente, como disse o Senador Osmar Dias, profundo conhecedor da nossa agricultura. Somos uma nova fronteira. Temos um Brasil inteiro das Tordesilhas que ainda não foi ocupado ou descoberto. É a nossa região, Sr. Presidente. É o Norte, o Centro-Oeste, o portal da Amazônia, o meu Tocantins. E me sinto incomodado como brasileiro com a cena que vi ontem.

Mas me incomoda também, Sr. Presidente, sabermos que o mercado de hoje, lastreado nas dívidas externa, interna e nos juros, acaba retirando do Brasil a condição de estar melhor posicionado nessa mesa internacional, porque se o petróleo já foi importante no século passado, se já tivemos guerra no século passado por conta do petróleo, teremos guerra por conta da água. Isso quem diz é a ONU em um de seus estudos. Há o risco de o homem vir a brigar pela água doce, esgotável, com a qual agora começamos a nos preocupar, porque só pensávamos nela para a geração de energia.

Hoje há a preocupação do uso múltiplo das águas, da proteção de nossos mananciais, dos nossos rios, da integração das nossas bacias. Nós estamos fazendo isso no Tocantins.

Então, Sr. Presidente, será que esse assunto nada tem a ver com o que aconteceu com o nosso Rubens Barrichello?

O Sr. Lindberg Cury (PFL - DF) - Senador Siqueira Campos, V. Exª me concede um aparte?

O SR. SIQUEIRA CAMPOS (Bloco/PSDB - TO) - Ouço V. Exª com grande alegria, Senador Lindberg Cury, representante do Distrito Federal.

O Sr. Lindberg Cury (PFL - DF) - Senador Siqueira Campos, realmente fiquei sensibilizado com o seu pronunciamento. Houve, na verdade, uma revolta muito grande neste País. O automobilismo fica muito em evidência quando temos um expert dessa área. Havia audiência na época do Nelson Piquet, do Emerson Fittipaldi e, principalmente, do Ayrton Senna. Desde o momento em que houve aquele desastre trágico com o Ayrton Senna, o brasileiro perdeu o interesse pela Fórmula-1, porque ninguém era capaz de substituí-lo naquela ocasião. Até as próprias emissoras encontraram sérias dificuldades em formalizar contratos de transmissão para o Brasil. Não valia a pena. O brasileiro não queria torcer para outro, a não ser quando, na competição, houvesse um piloto brasileiro. Ficamos por muito tempo sem representante. Os preços dos contratos foram reduzidos, não se encontravam patrocinadores. Ontem, verificamos que houve, na verdade, um grande golpe contra o Brasil, como diz V. Exª. O brasileiro está altamente revoltado com tudo aquilo que aconteceu. Foi um ato antidesportivo. Não se pode admitir que isso seja feito daquela maneira. Na última volta, autorizar a ultrapassagem do Michael Schumacher. Na verdade, isso foi terrível! Eu me congratulo com V. Exª por trazer ao Senado esse assunto. Rubinho Barrichello merece uma oportunidade. Ontem, seria a segunda vez em que ocuparia a galeria de honra como primeiro colocado. Temos que repensar realmente situações como essa. Imaginem o constrangimento por que passaria o povo brasileiro se, na decisão do campeonato mundial, o nosso time tivesse que abrir mão de uma vitória. E o povo brasileiro acompanha essas competições automobilísticas. Creio que, a partir de agora, vamos deixar de acompanhá-las, porque se o Rubinho estiver na frente terá que abrir mão para o Michael Schumacher. Meu cumprimentos, Senador.

O SR. SIQUEIRA CAMPOS (Bloco/PSDB - TO) - Nobre Senador Lindberg Cury, é difícil! Ontem foi o Dia das Mães, e a nossa pátria mãe gentil desmereceu um belo presente, que, na verdade, seria apenas o retrato do que foi a corrida inteira.

Penso, Sr. Presidente, que cabe a nós também dizer, em nome do povo brasileiro, que vamos esperar uma revisão do regulamento que impeça esse tipo de manobra.

Ficamos também revoltado - e aí me refiro ao lado do Brasil que poucas vezes tem um time de expressão em uma final de campeonato - com o que aconteceu com o Brasiliense em São Paulo. Temos tecnologia, câmeras instaladas em vários pontos. Já vejo acontecer isso em importantes modalidades de jogos nos Estados Unidos da América, onde o juiz paralisa, vai até à câmera, verifica o que aconteceu para não deixar haver injustiça. Fico entristecido de ouvir a torcida dizer que o Brasiliense foi roubado. É triste! Temos a tecnologia que pode ser usada perfeitamente para que isso não ocorra. E, na Fórmula-1, existe tecnologia de ponta em todos os sentidos, mas é preciso que haja também em todo lugar o debate da ética, porque o constrangimento do piloto alemão ontem foi tão grande que não lhe cabia outra atitude senão entregar o título, pedir que Rubinho fosse ao primeiro lugar do pódio. Aquilo foi uma tristeza para a nossa pátria mãe gentil no Dia das Mães.

Sr. Presidente, não sei. Não vou, de forma alguma, condenar o comportamento profissional e ético ainda mais de quem fez talvez a mais brilhante de todas as suas corridas da pole até a última volta. Agora, recém-contratado novamente como segundo pilo da equipe, bom profissional que é, atendeu àquela ordem. Ora, Sr. Presidente, não sei se eu a aceitaria. Não sei se Piquet, Senna, Fitipaldi, José Carlos Pace a aceitariam. Não sei se algum piloto também a aceitaria. Não quero, em absoluto, transformar o meu pronunciamento numa crítica ao nosso querido piloto, até porque venceu a corrida ontem. Mas algo precisa ser repensado. E o meu medo maior é que o esporte saia perdendo com isso.

Vamos aproveitar um episódio como este, Sr. Presidente, para relembrar a todos nós as nossas responsabilidades com este País, com esta grande Pátria, com esta Nação e fazer com que o Brasil seja cada vez mais respeitado no exterior. Vemos aqui, na nossa América do Sul, com tristeza, problemas na Argentina, Colômbia, Venezuela, problemas insanáveis no Paraguai, na Bolívia. É importante que o brasileiro, que normalmente se preocupa com o dia-a-dia, com a violência, o desemprego, a saúde, e não se preocupa muito com política externa, comece a observar bastante o cenário internacional, porque o mercado hoje é que dita tudo, os juros, as mesas integradas, as grandes fugas de capitais. O mundo já está globalizado. Não há como fugir disso. Mas temos que lembrar a nossa Amazônia, o nosso Pantanal, as nossas riquezas, para dizer que precisamos ser mais fortes nas negociações internacionais do que simplesmente esta moeda inexistente que o tal mercado propala e pela qual pagamos tantos juros.

Aqui também deixo minha homenagem, Sr. Presidente, à condução firme, no meu entendimento, do Presidente Fernando Henrique Cardoso, do Ministro Pedro Malan e do Presidente do Banco Central, Armínio Fraga. Quem quer morar num prédio não quer saber muito bem quem é o síndico, de quem, aliás, pouca gente gosta. Geralmente, procura-se o síndico por causa de problema. Mas todo o mundo quer o elevador funcionando, o prédio limpo, as coisas organizadas. O nosso síndico do Tocantins recolhe uma admiração de 80% da sua população, porque é zeloso na condução do seu Estado. Temos um síndico, Sr. Presidente, que, além de tudo, é um estadista. Vai deixar em breve a Presidência da República. Vamos sentir muita saudade dele. Sei que, neste momento, esta parte do meu pronunciamento pode ser impopular. Sr. Presidente, não tenho uma vida pública muito longa, mas tenho absoluta certeza de que, pelo que vem fazendo, pelo que deixou em termos de realização integração do meu País - com a Ferrovia Norte-Sul, com a Hidrovia Araguaia-Tocantins, com tudo que vem fazendo - aos eixos de desenvolvimento, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, não só por ter contido aquilo que não mais parecia sob nosso controle, que é a inflação, legou a este País muita coisa importante.

Tenho certeza de que a população brasileira terá responsabilidade até para não aceitar que nenhum dos postulantes a Presidente da República importe risco. Não podemos aceitar também o que se diz sobre fulano ou beltrano - ora, um brasileiro nascido aqui, trabalhador, seja ele quem for -, pois isso é diminuir a Pátria brasileira, é desconhecer o nosso potencial, é diminuir as nossas riquezas e a capacidade do nosso povo.

Todos estão postulando democraticamente, Sr. Presidente. Um deles chegará lá. E eu terei mais quatro anos na tribuna deste Senado para dizer que estarei ao lado do próximo Presidente da República. Confio no projeto do Presidente Fernando Henrique Cardoso e acredito que Sua Excelência fará seu sucessor, mas não deixarei de, como Senador da República, dar o meu respaldo a qualquer cidadão brasileiro que, legitimamente, chegue à Presidência da República e que precise desta Casa para governar bem o Brasil.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/05/2002 - Página 7939