Discurso durante a 58ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Discriminação do governo de Fernando Henrique Cardoso ao Nordeste, conforme análise de dados estatísticos do IBGE. Indignação com a extinção da Sudene, cujo papel era preponderante no desenvolvimento da região.

Autor
Carlos Wilson (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Discriminação do governo de Fernando Henrique Cardoso ao Nordeste, conforme análise de dados estatísticos do IBGE. Indignação com a extinção da Sudene, cujo papel era preponderante no desenvolvimento da região.
Aparteantes
Francisco Escórcio, Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 11/05/2002 - Página 7860
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • ANALISE, AUMENTO, DESENVOLVIMENTO, SAUDE PUBLICA, EDUCAÇÃO, BRASIL, REGISTRO, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), DESIGUALDADE REGIONAL, REFERENCIA, SALARIO, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, OMISSÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, REGIÃO NORDESTE, PROTESTO, EXTINÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), MOTIVO, IRREGULARIDADE, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, PREJUIZO, POLITICA, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, AUSENCIA, SUBSTITUIÇÃO, ORGÃO REGIONAL.
  • REGISTRO, DADOS, HISTORIA, ATUAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE).
  • CRITICA, JOSE SERRA, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, CONTINUAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.

O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de iniciar o meu discurso, gostaria de parabenizar a Senadora Heloísa Helena pelo seu belo pronunciamento. S. Exª está sempre mostrando o talento e a sensibilidade de uma parlamentar atuante, de uma parlamentar que orgulha muito a nossa Casa e, com certeza, o povo de Alagoas e o povo brasileiro. Eu estava na Mesa, ao lado do Senador Mozarildo Cavalcanti, e fiquei realmente sensibilizado com o discurso da Senadora Heloísa Helena. Meus Parabéns!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sem ter o talento, a doçura e também a dureza da Senadora Heloísa Helena, vou falar hoje sobre a realidade da nossa Região, o Nordeste. Faço-o diante do novo perfil da realidade brasileira divulgado pelo IBGE. Alguns dados - não posso negar - merecem até comemorações. O levantamento aponta avanços nas áreas de Educação e Saúde, por exemplo. Entretanto, preciso chamar a atenção para uma realidade que, infelizmente, não se altera, permanece imutável e revela o grande fosso que separa o Nordeste do resto do País.

De acordo com os números revelados pelo IBGE, infelizmente, 46,2% da população nordestina ainda ganha até um salário mínimo. No Brasil, esse índice é de 24,4%, também segundo estatística do IBGE - sempre o Nordeste está perdendo. Esse percentual, entretanto, sobe para 73% quando o limite chega a dois salários mínimos, ou seja, R$400, se levarmos em conta o recente aumento miserável do salário mínimo.

Tão grave quanto isso, o IBGE revela ainda que apenas 1,4% dos nordestinos ganham mais de vinte salários mínimos, o que não é uma grande fortuna. Ou seja, mais de setenta nordestinos em cem sobrevivem com R$400, e apenas 1,4 em cada 100 ganham mais de R$4 mil.

Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti, Srªs e Srs. Senadores, preciso admitir que, alimentado pelo otimismo, cometi o pecado de acreditar, oito anos atrás, que o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso não só iria reverter a concentração de renda, como também alterar esses dados geoeconômicos tão dramáticos. Faço esta confidência de forma constrangida: acreditei no Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso e penso que o mesmo se passou com os Senadores Pedro Simon e José Alencar.

Promessas não faltaram, principalmente nas duas últimas campanhas eleitorais. Não me surpreende, agora, que o IBGE tenha retratado o Nordeste como a região mais pobre do Brasil, pois, em proporção inversa às promessas, faltaram as atitudes, as ações que a Região reclama há muitos e muitos anos, desde a Proclamação da República pelo menos.

Mas, se não atendeu aos apelos nem mesmo de sua base parlamentar nordestina, o Governo ainda remou no sentido contrário: discriminou o Nordeste em ações efetivas e, não satisfeito, desferiu o mais violento golpe, fatal, mortal, contra a economia nordestina ao extinguir, pela via violenta da medida provisória, a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, a Sudene.

Quantas e quantas vezes não ocupei esta tribuna, sendo aparteado por vários Senadores da base de sustentação do Governo e da Oposição, para protestar! Fiz diversos apelos - apelos sem radicalismo, apelos que revelavam a sensibilidade de um nordestino - não só ao Presidente Fernando Henrique e ao Governo federal, como também aos Governadores da nossa Região, para que não cedessem aos argumentos preconceituosos e discriminatórios de que a Sudene estava mergulhada em um poço de corrupção. Fui acompanhado por importantes Parlamentares...

O Sr. Francisco Escórcio (PMDB - MA) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE) - Senador Francisco Escórcio, permita-me apenas concluir o meu raciocínio. Gostaria de citar alguns Parlamentares que se solidarizaram comigo, quando, aqui, eu me posicionava contrariamente à extinção da Sudene. Fui acompanhado por importantes Parlamentares, alguns ex-Governadores, como o Vice-Presidente desta Casa, o Senador Edison Lobão; o Senador Romero Jucá, que é pernambucano, mas aqui nesta Casa representa Roraima; o ex-Governador Geraldo Mello; o Senador Gilberto Mestrinho, entre outros, que não só me apoiaram, como me emprestaram argumentos convincentes de que não poderia ser por conta de denúncias de corrupção que se produziria, como se produziu, mais esse atentado contra a gente do Nordeste.

Ora, se ocorreram irregularidades, temos que punir os responsáveis, e a punição deve ser exemplar. O remédio suficiente seria a apuração e até a prisão dos responsáveis se existisse corrupção na Sudene.

Concedo o aparte, com muito prazer, ao Senador Francisco Escórcio.

O Sr. Francisco Escório (PMDB - MA) - Senador Carlos Wilson, meu colega, meu irmão, meu amigo, lembro-me de V. Exª quando éramos colegas do Ministério da Integração Regional, quando esse tema que dá nome ao Ministério era debatido. Debatíamos sempre esse assunto naquele Ministério. Nós, que conhecemos a matéria profundamente, Senador Carlos Wilson, sabíamos e sabemos da importância de órgãos como a Sudene para o desenvolvimento daquela Região, para a integração regional. Precisamos acabar com as desigualdades regionais e até intra-regionais. Precisamos de um órgão igual à Sudene, à Sudam, à Suframa, para podermos desenvolver aqueles locais. É como se houvesse um doente e, para tirarmos o mal desse doente, tivéssemos que matá-lo. Está tudo errado. Vimos o Ministro José Serra querendo acabar com os incentivos para o Norte e Nordeste brasileiros. Vimos o Presidente Fernando Henrique também sempre inclinado a acabar com o Ministério da Integração Regional, com esses órgãos. E nós, toda a bancada, e os nordestinos estávamos lutando contra isso. Quero dizer em alto e bom som: sou nordestino, sim senhor! Sou maranhense com muito orgulho. Por isso, temos que lutar pelo nosso povo, pela nossa gente, pela nossa Região. Não quero, de maneira alguma, que a nossa Região seja discriminada. Não aceito ser rejeitado dentro deste meu querido Brasil. O Brasil é uno, e é preciso fazer uma política de norte a sul neste País. Não poderíamos deixar passar esta oportunidade para gritar aos cantos do Brasil que precisamos ser olhados com mais carinho, com amor. Felicito V. Exª pelo espírito nordestino e brasileiro. Muito obrigado pelo aparte que V. Exª me concedeu.

O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE) - Agradeço o aparte do Senador Francisco Escórcio, que fez referência a um momento muito importante na nossa vida pública, quando trabalhamos juntos no Ministério da Integração Regional, sob o comando do saudoso ex-Senador Alexandre Costa, um dos principais defensores da Sudene.

Alexandre Costa, com sua simplicidade e com a valentia de nordestino, colocava-se, em todos os momentos, como um grande defensor da Sudene. Fico a imaginar como ele estaria indignado, se ainda estivesse no Senado, com o que se cometeu em relação ao Nordeste com a extinção da Sudene, que sempre foi um referencial de orgulho, geradora de empregos e de indústrias, tendo criado mais de cinco milhões de empregos em toda sua existência.

Nós, que nos inspiramos muito no desenvolvimentista Juscelino Kubitschek, o fundador da Sudene, ficamos a olhar para o coveiro da Sudene: o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Ao assumir a Presidência da República, Fernando Henrique inspirava-se na figura de Juscelino, o grande Presidente do desenvolvimentismo deste País, mas, com certeza, Sua Excelência ficará marcado como o grande coveiro da Sudene, da Região Nordeste.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Carlos Wilson, V. Exª me concede um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE) - Sr. Presidente, antes de concluir, gostaria de ouvir o importante e significativo aparte da Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Carlos Wilson, com alegria, saúdo o pronunciamento de V. Exª. Não é a primeira vez em que V. Exª exige do Governo Federal e do Congresso alternativas para o desenvolvimento econômico-social do Brasil e, de forma especial, do Nordeste, assim como não é a primeira vez em que V. Exª ocupa a tribuna, de forma vigorosa, para solicitar empenho do Governo Federal na superação da falsa dicotomia entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento social. Sabemos da situação em que se encontram as regiões mais pobres do País e, especialmente, a Região Nordeste. Não poderia deixar de compartilhar a indignação de V. Exª em relação à extinção das estruturas de desenvolvimento regional. Já tivemos a oportunidade de discutir esse assunto em concordância. É evidente que muitas dessas instituições, ao longo da nossa história, foram sendo parasitadas pelas oligarquias regionais, devidamente estimuladas pela elite paulista, que, em muitos momentos, recebeu recursos e subsídios dessas instâncias que eram meramente regionais. Considero grave que muitos dos que foram peças fundamentais nesse processo tenham sido os primeiros a alardear para todo o Brasil a necessidade de extinção dessas estruturas de desenvolvimento regional. Assim, eu não poderia deixar de fazer este aparte, saudando o pronunciamento de V. Exª, já que, repito, não é a primeira vez em que V. Exª ocupa a tribuna defendendo o Estado de Pernambuco, o Nordeste e o Brasil. O assunto que V. Exª traz é de fundamental importância, porque precisamos saber o que está sendo articulado. Já que, no Brasil, virou moda a criação de agências, qual é a outra instância de poder e de decisão política que, efetivamente, terá a condição necessária para ser o instrumento fundamental de superação das desigualdades regionais, a fim de viabilizar o desenvolvimento econômico principalmente da nossa Região? Portanto, parabéns a V. Exª!

O SR. CARLOS WILSON (PTB - PE) - Agradeço à Senadora Heloísa Helena, que, como eu disse antes, sempre com brilho e com muita contundência, aborda questões importantes nesta Casa. E S. Exª tem toda a razão. O Governo sempre prefere punir a parte mais fraca, e o Nordeste, sendo a parte mais fraca, é sempre o mais penalizado.

O Governo preferiu punir apenas o Nordeste. Sob essa alegação, Senador José Alencar, extinguiu-se um órgão que gerou - e já disse isto antes quando do aparte do Senador Francisco Escórcio - mais de cinco milhões de empregos em uma hora em que o País enfrenta o momento mais difícil no que se refere à geração de emprego. A Sudene também aumentou em mais de 200% a arrecadação de impostos industriais e aprovou mais de três mil projetos. Nem todos foram bem-sucedidos - é verdade -, mas apenas 12% dos projetos fracassaram, por razões diversas, em um número rigorosamente compatível com os índices nacionais de financiamento similar.

Analisados apenas 32 anos de atuação da Sudene, até 1992, foram consumidos US$8 bilhões, que, repartidos pelos dez Estados nordestinos, deram a cada um menos de US$30 milhões por Estado e por ano. Gostaria de lembrar que apenas a Usiminas, um único empreendimento, consumiu em quatro anos US$6 bilhões. E a binacional de Itaipu, também em quatro anos, recebeu recursos da ordem de US$18 bilhões.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se essas comparações não são suficientes, quero lembrar que apenas o saneamento do Banespa e o giro da dívida da Prefeitura de São Paulo consumiram o dobro dos recursos que a União destinou ao Nordeste, em 50 anos de Sudene.

É claro que o Governo Federal apresentou uma série de ações, a maioria delas absolutamente virtuais, para substituir a Sudene. No próximo dia 24 de agosto, por exemplo, comemoram-se dois anos da edição da Medida Provisória nº 2.058. Por esse instrumento, permitiu-se a conversão das debêntures do Finor e se estabeleceram novas regras para a concessão de incentivos complementares, ou seja: redução de 75% do Imposto de Renda para novos empreendimentos, redução de 37,5% do Imposto de Renda para empreendimentos existentes e reinvestimento de 30% do Imposto de Renda para empresas nordestinas. Mas - vejam a sutileza - esses incentivos ficaram condicionados à definição, por decreto presidencial, de setores prioritários da economia que poderiam recebê-los. Até hoje esse decreto não foi editado. Nenhum incentivo, portanto, foi concedido.

A fatídica Medida Provisória nº 2.145, que extinguiu a Sudene, criou outra entidade para substituí-la, a Adene. Criou também um novo fundo - o Fundo de Desenvolvimento do Nordeste - a ser gerado pela nova agência. Mas faz um ano da edição da medida, e, até agora, nada foi materializado. Nada foi regulamentado. Nem mesmo o Conselho Deliberativo que deveria funcionar no Ministério da Integração Nacional foi instalado.

No próximo dia 14 de maio, expira o prazo de 90 dias concedido pelo Decreto nº 4.126 para a publicação do Regimento Interno da Adene, que deverá ser aprovado pela diretoria da entidade, que, por sua vez, deverá ter o nome de seus integrantes aprovados pelo Senado Federal. É claro que a diretoria sequer foi indicada, e o Regimento ainda sequer foi esboçado.

Srªs e Srs. Senadores, como podemos definir essa postura do Governo Federal em relação a assunto tão vital para a expressiva parcela de brasileiros que vive no Nordeste? Desleixo? Má vontade?

Para mim, é óbvio que o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso voltou suas costas para o Nordeste. E de nada adianta - estamos em campanha eleitoral - o meu colega Senador José Serra, ávido por popularidade, percorrer o Nordeste com promessas de fazer renascer a Sudene.

Não ouvi uma só palavra dele de protesto e de indignação com o fechamento da Sudene. E não há por que acreditar nisso, porque José Serra é o mais legítimo representante do continuísmo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, quer dizer, do continuísmo do preconceito e da discriminação em relação ao Nordeste. Parece claro que sua pretensão se resume unicamente em atrair ingênuos e desinformados.

Podem procurar um nome do Nordeste para compor a sua chapa oficial. Há vários nomes que reconhecemos honestos e dignos. Mas tenho muitas dúvidas de que conseguirão convencer os eleitores nordestinos de que as coisas vão mudar agora. Até porque não há um único indicativo nesse sentido.

Aliás, gostaria de fazer um alerta ao meu amigo e colega Senador José Serra: não minta! Esta Casa é muito dura com quem mente. Esta Casa já mostrou que não suporta mentiras. Não prometa o que não poderá cumprir. Não assuma compromissos que não poderá honrar. Não abuse da confiança do Nordeste. V. Exª tem uma história por que zelar, Senador José Serra! Não troque a sua integridade por promessas eleitorais.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/05/2002 - Página 7860