Discurso durante a 108ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reivindicação de ações afirmativas destinadas ao desenvolvimento da região amazônica, em virtude do transcurso, hoje, do Dia da Amazônia.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Reivindicação de ações afirmativas destinadas ao desenvolvimento da região amazônica, em virtude do transcurso, hoje, do Dia da Amazônia.
Aparteantes
Fernando Ribeiro, Marluce Pinto, Moreira Mendes, Pedro Simon, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 06/09/2002 - Página 17126
Assunto
Outros > HOMENAGEM. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, REGIÃO AMAZONICA, OPORTUNIDADE, REIVINDICAÇÃO, MEDIDAS LEGAIS, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
  • COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, SENADO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, DESTINAÇÃO, RECURSOS, APLICAÇÃO, INSTITUIÇÃO EDUCACIONAL, ENSINO SUPERIOR, Amazônia Legal, PROPOSIÇÃO, VIABILIDADE, ESTADO, LIMITAÇÃO, AREA, RESERVA ECOLOGICA, RESERVA INDIGENA, DEPENDENCIA, ANALISE, CRIAÇÃO, RESERVA.
  • REGISTRO, REALIZAÇÃO, FEIRA, AMBITO INTERNACIONAL, REGIÃO AMAZONICA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio que pouca gente, mas muito pouca gente mesmo, sabe que hoje é um dia dedicado à Amazônia, é o dia da Amazônia. E eu, como amazônida, e amazônida não por estar lá, mas por ter nascido e por continuar lá e por ser um representante daquela região, realmente me preocupo com o descaso de que a nossa região vem sendo vítima durante séculos. Na verdade, a Amazônia só foi lembrada na época áurea da borracha, que era o ouro negro que movia as finanças do País e que dava, portanto, suporte aos países aliados na guerra daquela época; depois, quando das outras explorações, explorações minerais, explorações da madeira; e, mais recentemente, quando da exploração sofisticada da nossa biodiversidade, com a biopirataria imperando, o narcotráfico dominando a região, as guerrilhas dos países vizinhos adentrando o nosso território. E o que vemos de concreto em relação à Amazônia é muito pouco, considerando o gigantismo da região, considerando a sua importância geoestratégica, geopolítica.

Neste dia, registro alguns dados para conhecimento dos brasileiros, para reacender a memória dos brasileiros, especialmente daqueles que moram nos 40% do Brasil que não são a Amazônia, para que realmente se destaque a importância dessa região. A Região Amazônica, a Amazônia Legal, representa 59,78% da área do País, portanto, quase 60%, mais da metade da sua área. Só por isso, Sr. Presidente, só por esse tamanho ela já deveria merecer uma atenção muito especial das autoridades federais, dos organismos, dos diversos níveis de administração, e até mesmo da sociedade brasileira como um todo, porque afinal de contas é lá na Amazônia que estão imensas riquezas naturais, onde está localizada a quinta maior reserva de água do mundo, além de um ainda imensurável tesouro de biodiversidade.

Essa região tem 21 milhões de habitantes e, talvez por isso, Sr. Presidente, porque tem apenas 12% da população do País, ela é maltratada, é olhada simplesmente como uma espécie de quintal do País. Um quintal onde deve ter coisas bonitas, que deve estar ajeitadinho, mas que se deixa ao acaso, até mesmo sem que as suas fronteiras estejam protegidas. Temos uma vasta área de fronteira, de mais de 11 mil quilômetros, com sete países da América Latina, todos eles com problemas sérios de narcotráfico, de guerrilha, de contrabando de armas, de tráfico de mulheres, enfim, de todo tipo de ilicitude. E por quê? Porque o Governo Federal, a quem incumbe proteger nossas fronteiras, a quem incumbe defender a nossa soberania naquelas regiões, não o faz. As nossas Forças Armadas, por exemplo, estão relegadas a uma situação deprimente. Estão lá movidas apenas pelo patriotismo, pela vontade de servir ao Brasil. Os brasileiros que lá estão, com as suas famílias, não têm sequer os mínimos elementos capazes de lhes dar dignidade humana naquelas fronteiras tão distantes, no meio do mato. Suas esposas às vezes servem como professoras, complementando um trabalho que é do Estado, do Governo. Há médicos e dentistas das Forças Armadas atendendo não só o contingente militar, mas também toda a comunidade.

Mesmo assim, a Amazônia continua sendo ignorada. Quando se fala em Amazônia, como fez recentemente o Presidente Fernando Henrique, só se pensa em mata, em preservar mato, em fazer santuários ecológicos, como Sua Excelência fez agora com o Parque de Tumucumaque, um ato imperial seu, sem consulta ao povo do Amapá ou ao representante do Amapá. O Senador Sebastião Rocha proferiu discurso indignado sobre o assunto.

Por isso, Sr. Presidente, eu me revolto, conclamando não só o Senado para refletir sobre esses problemas, mas toda a Nação brasileira. O que se está fazendo agora com a Amazônia não é uma internacionalização movida de fora para dentro. É um processo de dentro para fora, pois é o Governo brasileiro que está internacionalizando a Amazônia, debaixo - o termo é pesado - de uma hipócrita bandeira de preservação. Esse tipo de preservação está apenas deixando cada vez mais abandonadas as fronteiras.

Gostaria, Sr. Presidente, de mostrar coisas positivas da Amazônia, já que a grande mídia só mostra mato, índio, incêndio, atrocidades, apontando os amazônidas como os piores dos cidadãos, responsáveis pela tão decantada devastação. E devastação não existe. Quem conhece a Amazônia sabe que não existe. Há, sim, uma pregação internacional de dominação da região, o que leva até os brasileiros a ficarem repetindo essa falácia.

Apresento, então, alguns dados que considero positivos, começando pelo ponto que eu acho mais importante, a educação.

Está na pauta do Senado proposta de emenda à Constituição, de minha autoria, destinando recursos para aplicação nas instituições federais de ensino superior localizadas na Amazônia Legal. E como será feito isso? Não há mistério algum. O art. 159 da Constituição, que está em prática, estabelece:

Art. 159. A União entregará:

I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, quarenta e sete por cento na seguinte forma:

a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal;

b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios;

c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste...

Esses são os chamados fundos constitucionais.

Portanto, Sr. Presidente, o que estou fazendo? Estou acrescentando 0,5%. Aí está a minha emenda:

d) cinco décimos por cento para aplicação, pelas instituições federais de ensino superior, localizadas na Amazônia Legal, em programas de ensino, pesquisa e extensão, voltados à promoção do desenvolvimento sustentável, na forma que a lei estabelecer.

Portanto, estou propondo um aumento do percentual, passando a União de 47% para 47,5%. Esses 0,5% irão para as nossas instituições de ensino superior na Amazônia.

E quantas são as nossas instituições de ensino superior na Amazônia? São 85 instituições, públicas e privadas. Dessas, 13 são públicas: uma municipal, três estaduais e nove federais.

Logo, a minha proposta de emenda vai beneficiar as universidades federais da Amazônia Legal.

Registro, Sr. Presidente, que essa proposta de emenda à Constituição foi aprovada por unanimidade na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, com o voto favorável de Senadores de todas as Regiões do Brasil, inclusive o de V. Exª, que hoje preside esta sessão, Senador Francelino Pereira.

Trata-se de uma ação afirmativa em favor da Amazônia, ao contrário do que vem ocorrendo hoje, quando a Amazônia vem sendo transformada num lugar onde não se pode mais produzir. De um lado, temos reservas ecológicas e parques nacionais gigantescos; de outro, temos reservas indígenas também gigantescas.

Sr. Presidente, tenho estudado muito a questão das reservas ecológicas, indígenas, parques nacionais, procurando, de maneira desapaixonada e não-ideológica, analisar o porquê. O que está por trás disso tudo? Surpreende-me, por exemplo, Sr. Presidente, que tendo nós, segundo o IBGE, apenas 0,41% da nossa população de origem indígena - portanto, nem 0,5% da população do Brasil é indígena -, já tenhamos 12% do território nacional demarcado para reservas indígenas. É um recorde mundial, algo tão inusitado que precisa ser analisado com carinho.

Por que nenhum outro país do mundo fez isso? Por que os Estados Unidos não fizeram isso? Não estou dizendo que devamos copiar o exemplo dos Estados Unidos, que exterminaram os seus índios. Pelo contrário, acho que devemos, sim, dar incentivo aos nossos índios e falar de maneira séria a respeito.

Sobre esse aspecto e procurando fazer com que a Amazônia supere esse entrave que a elite do País colocou, propus uma emenda constitucional que estabelece um limite, ou seja, para que em cada Unidade da Federação haja um tamanho permitido para reservas ecológicas, indígenas e ambientais. Propus 30%, e o Senador Amir Lando, que é o Relator, aumentou para 50%.

Ora, Sr. Presidente, se cada Unidade da Federação destinar metade da sua área para reservas ecológicas, indígenas e ambientais, novamente o Brasil será o campeão mundial de reservas ecológicas. Considerando-se o nosso tamanho, e mesmo percentualmente, teremos muito mais reservas do que, talvez, a soma de todos os países do mundo.

Como disse há pouco, não compreendo a atitude de um Presidente que, por meio de decreto, tira metade da área de um Estado, como foi o caso do Amapá, para criar um parque, o chamado Parque Tumucumaque. E, o que é pior, com levantamentos feitos por uma ONG internacional, a WWF.

Aliás, para minha surpresa, estudando por que as nossas notas de real só têm animais, verifiquei que a escolha do mico-leão-dourado para figurar na última nota lançada, de vinte reais, foi resultado de pesquisa feita pela WWF na Internet. Com isso, completamos o museu, pois todas as nossas notas de real têm um bicho. Não há uma figura histórica. Quer dizer, o Brasil não tem personalidades, vultos da sua história. O Brasil não foi feito por gente. Agora, perguntem se existe alguma nota de dólar com a figura de um animal? Perguntem se existe alguma nota de euro com a figura de um animal? Nós, no entanto, queremos ser bonzinhos e graciosos com o ecoterrorismo que ronda o mundo.

Por isso, Sr. Presidente, incluí nessa minha proposta um item que estabelece que deve ser submetida à análise do Senado Federal a criação de reservas ecológicas, ambientais e indígenas. Por que isso? O Senado é a Casa que representa os Estados, é a Casa da Federação, por isso não é possível que o Governo Federal confisque de um Estado uma área, seja ela pequena ou grande, sem que os seus representantes sejam ouvidos. Aqui nos posicionamos quanto a matérias muito menos importantes, como, por exemplo, a nomeação de dirigentes de agências reguladoras ou de diretores de bancos. Por que, então, não vamos nos pronunciar sobre o que interessa diretamente aos nossos Estados?

Eu realmente acho que essa proposta de emenda à Constituição, que já foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça e que está em plenário em seu terceiro dia de discussão - voltará a ser discutida, portanto, após as eleições -, merece uma análise desapaixonada por parte dos membros desta Casa para que possamos escrever uma nova história para a Amazônia e inseri-la no século XXI. Estamos diante de propostas afirmativas, Sr. Presidente. Aqui não se está querendo tolher o direito do índio de ter a sua terra demarcada, aqui não se está querendo segregar o índio, não se está querendo ir contra ele. O que estamos querendo é que haja critérios. Se as coisas estão sendo feitas corretamente, não há por que temer que o Senado as examine.

Quero também, ainda falando em coisas positivas - já falei das universidades, já falei do estabelecimento de critérios legais para as reservas -, chamar a atenção dos nobres Senadores e Senadoras e da Nação brasileira para a primeira feira internacional da Amazônia, que vai ocorrer entre os dias 10 e 13 de setembro em Manaus. Quero chamar a atenção para o que está dito aqui, pois pretendo ressaltar que existe uma nova Amazônia, uma Amazônia que não é aquilo que pregam no exterior e que grandes órgãos brasileiros ficam repetindo:

1ª Feira Internacional da Amazônia

Tecnologia de ponta por natureza.

Você vai conhecer uma face da Amazônia que o resto do mundo conhece pouco. A face moderna da tecnologia de ponta, de pesquisa científica, das empresas que possuem visão de futuro. Assim é a Amazônia competitiva, onde não faltam oportunidades de novos negócios e vantagens.

Portanto, é a Amazônia do século XXI, é a Amazônia que nós, amazônidas, queremos. E pedimos aos demais brasileiros que nos acompanhem nessa luta de fazer uma Amazônia justa para todos e não, como estão pretendendo fazer, uma região onde não se pode mais trabalhar. Isso porque, além do percentual relativo às reservas ecológicas, indígenas e ambientais que já mencionei, ainda existe a área de preservação dentro das propriedades particulares, que pretendem que seja de 80%. Quer dizer, um colono assentado pelo Incra na Amazônia só pode usar 20% do lote que receber. Estamos diante de um trabalho muito bem preparado, trata-se de um trabalho de colonialismo moderno muito aperfeiçoado, a ponto de encontrarmos muitos inocentes úteis defendendo essa causa.

O Sr. Moreira Mendes (PFL - RO) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Ouço V. Exª, com muito prazer.

O Sr. Moreira Mendes (PFL - RO) - Ilustre Senador Mozarildo Cavalcanti, pena que eu não tenha ouvido o inteiro teor de seu pronunciamento, porque sempre que V. Exª fala da Amazônia o faz com absoluta propriedade. Envaidece-nos muito, como amazônidas, ouvi-lo sempre defendendo essas questões. Gostaria de fazer algumas considerações quanto a essa parte final de seu pronunciamento, quando V. Exª se referiu à questão da reserva de 80% das propriedades privadas na Amazônia. Com relação a essa questão do meio ambiente e da Amazônia, penso que o Governo Federal tem produzido leis, decretos e regulamentos para dar uma satisfação ao mundo, mas se esquece da população que lá vive, que é de 22 milhões de brasileiros. Não se faz nada aqui levando em conta essa população. Preocupam-se muito com a fauna, a flora, o meio ambiente e esquecem-se dessas populações. Isso, a meu ver, é um erro, porque o que estamos fazendo é um faz-de-conta: faz de conta que temos uma legislação de Primeiro Mundo na questão ambiental. A população que lá vive tem que cuidar de sua vida, tem que produzir, tem que se alimentar, tem que dar dignidade a seus filhos, e o Governo está muito distante disso. Penso que o caminho certo seria investir em educação e na modernização da agricultura e da pecuária para que se pudesse produzir mais, com mais qualidade, com menos exploração da terra. Mas isso é conversa que fica de lado. Nada disso se leva em conta. Veja só a questão da Medida Provisória nº 2.166, essa a que V. Exª se referiu e que estipula que 80% da propriedade privada é reserva legal. Quem inventou esses 80%? Depois de muita luta e determinação, conseguimos algum avanço nessa questão. Quando o Presidente da República assinou decreto regulamentando o zoneamento no País - ficou reconhecido o zoneamento no Estado de Rondônia, que é o único Estado da Federação que tem zoneamento em bases técnicas, científicas -, voltamos à condição de 50% para a agricultura e pecuária. Não obstante isso, encontramos lá técnicos do Governo, gente que detém cargo comissionado, dizendo que esse decreto é um mero ajuste político, uma acomodação, que não tem que ser respeitado. Este é o País em que estamos vivendo, Senador, com relação a essa história da Amazônia. Encontram-se caminhos legislativos para resolver o problema, mas eles não são reconhecidos. É como se os decretos do Presidente da República e as leis aqui produzidas fossem apenas um faz-de-conta. Quero parabenizar V. Exª e dizer mais uma coisa que julgo extremamente importante: é preciso - por isso concordo com as duas propostas de emenda constitucional de V. Exª - criar mecanismos que, de alguma forma, possam compensar os Estados da Amazônia. Todas as vezes que são propostos projetos de lei dando algum tipo de compensação para Estados ou Municípios que têm grandes áreas de preservação, não se consegue avançar. Sou testemunha disso nesta Casa: as propostas da Senadora Marina Silva não conseguem avançar, porque quando chega o momento de aprovar a destinação de verbas do FPE ou do FPM, por exemplo, para compensar esses Estados, a fim de que possam dar dignidade aos seus povos, as Bancadas do Sul, Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste votam contra. Estamos condenados, verdadeiramente, ao subdesenvolvimento, a continuarmos como estamos. Tenho a impressão até de que estão querendo que nos transformemos em índios novamente. Tenho todo respeito pelas comunidades indígenas, mas não tenho o menor interesse em me tornar índio. Parabéns pelo seu pronunciamento, Senador Mozarildo!

O Sr. Fernando Ribeiro (PMDB - PA) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Senador Moreira Mendes, agradeço muito o aparte de V. Exª, que é um amazônida fervoroso, que realmente se sente indignado - tanto quanto eu - diante desse tratamento que recebemos. Se podemos chamar a União de mãe, ela tem sido a pior das madrastas para a Amazônia.

Sr Presidente, em homenagem a este Dia da Amazônia, que ia passar tão esquecido - o Brasil não toma conhecimento de que existe a Amazônia, muito menos da existência de um dia dedicado a ela -, gostaria também de ouvir mais um amazônida, o Senador Fernando Ribeiro, do Estado do Pará.

            O Sr. Fernando Ribeiro (PMDB - PA) - Como o ilustre Senador Moreira Mendes, não tive o privilégio de acompanhar, na íntegra, o pronunciamento de V. Exª. No entanto, como paraense e amazônida, não poderia deixar de me associar às palavras dos dois, do orador e do aparteante, no sentido de que carecemos de uma política responsável quanto a essas questões que dizem respeito à preservação e à interação do homem da Amazônia com esses aspectos. É profundamente deprimente para nós chegarmos ao interior e vermos o clima de terror que se estabelece a partir da atuação do Ibama, que persegue os pequenos, os desinformados, os que fazem do extrativismo a sua forma de subsistência, muitas vezes acobertando a atuação dos poderosos. Trago à reflexão desta Casa a possibilidade de, talvez até com a participação desses organismos internacionais que tanto gritam e nos condenam, que recriminam o procedimento não culposo, não doloso, mas cultural do nosso homem, se criar algo para que se possa compensar os que são obrigados a fazer, nas suas propriedades, a reserva. Poder-se-ia remunerar o pequeno proprietário, o pequeno agricultor que preservasse o percentual estipulado da floresta, fazendo com que ele fosse um curador da reserva ambiental. Essa é uma idéia, matéria para uma discussão aprofundada. Como amazônida e como brasileiro, parabenizo V. Exª pelo pronunciamento oportuno, pela lembrança sempre diligente em defesa dos interesses da nossa região.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Senador Fernando Ribeiro, agradeço sensibilizado a V. Exª pelo aparte, que enriquece, neste dia da Amazônia, o pronunciamento que faço sobre a nossa região.

Sei que estou ultrapassando o tempo regulamentar, Sr. Presidente, mas gostaria de concluir citando algo que ouvi de uma pessoa já indignada pelos anos que vem lutando e denunciando o descaso que a Amazônia sofre por parte não só do Governo, mas da grande mídia nacional. Leiam os grandes jornais do eixo Rio-São Paulo, ouçam as grandes emissoras de televisão, de rádio e notem que, quando falam da Amazônia, só falam mal. Não há um espírito de brasilidade para com a Amazônia. No entanto, as grandes cidades estão sofrendo, hoje, pelo descaso com as nossas fronteiras, visto que é lá que começa o tráfico, que entram as armas contrabandeadas. Tanto é que o maior desses traficantes, o Fernandinho Beira-Mar, foi preso na Colômbia. E sabemos perfeitamente que, mesmo dentro da prisão, ele continua controlando o tráfico que entra pelas nossas fronteiras. E por quê? Porque a Amazônia está abandonada. Retomando, portanto, cito o que ouvi dessa pessoa: o mal da Amazônia brasileira é fato de que o maior país que faz fronteira com ela é o Brasil.

Espero que os brasileiros não deixem que o sentimento de abandono, o sentimento de que não somos prestigiados, que não somos olhados como seres humanos que queremos nos integrar ao Brasil, agigante-se no coração dos amazônidas. Queremos ter um tratamento que vá ao encontro do que diz a Constituição, que é a eliminação dessas desigualdades regionais profundas.

Creio que esse novo milênio nos leva a pensar muito mais seriamente na Amazônia. Mas isso não permitirá, portanto, que se aumente a revolta dos verdadeiros amazônidas contra a situação em que vivem.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Ouço, com muito prazer, o aparte do Senador Pedro Simon, se a Mesa assim o permitir, em homenagem à Amazônia.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Senador Mozarildo Cavalcanti, admiro muito o trabalho de V. Exª e de outros colegas Senadores que batem, e batem com dureza, cobrando uma ação do Senado Federal e do Governo com relação à Amazônia. V. Exª tem razão quando destaca que projetos, como os de autoria da Senadora Marina Silva, que visam a trazer alguma vantagem para a Amazônia, não são aprovados por esta Casa porque Senadores das Regiões Sul, Sudeste e de outras não votam favoravelmente aos mesmos. Senador Mozarildo Cavalcanti, desconsiderando o problema dos brasileiros que passam fome - e são milhões -, a Amazônia é o problema mais importante que o Brasil tem. Inclusive, estranho que nos debates entre os candidatos à Presidência da República - e também nas propostas que os mesmos têm apresentado - não tenha sido feita nenhuma pergunta invocando a questão da Amazônia, que avalio realmente como dramática. Trago comigo um mapa que é distribuído pelo governo norte-americano aos seus estudantes em que o Brasil figura no continente americano, mas sem que a este pertença a Amazônia. A Amazônia aparece como uma região similar à Antártida, considerada propriedade da humanidade. E o pior é que esse mapa é o que vem sendo divulgado em todo o mundo. No meu entendimento, só esse mapa justificaria um protesto e uma revolta do Brasil junto à Organização das Nações Unidas. O Presidente George W. Bush e os Primeiros-Ministros francês e inglês dizem, com todas as letras, que a Amazônia tem que ser transformada em território internacional, que o Brasil não tem condições, competência e capacidade para administrar a Amazônia. Na verdade, há uma cobiça fantástica pela Amazônia, pois é a região mais importante no que se refere a reservas de água doce e à flora medicinal. A Amazônia é um patrimônio imenso que nos pertence e também a outros países, irmãos nossos da América. Mas a cobiça é realmente fantástica. E isso pode ser comprovado quando vemos os Estados Unidos intervindo na Colômbia e querendo fazer um confronto naquele país. Isso também pode ser comprovado em relação às terras indígenas. Sou totalmente favorável à fixação de terras dos indígenas, mas não ao fato de fixar os indígenas na fronteira com o país vizinho, colocando os indígenas daqui e do lado de lá na mesma tribo, já começando a se falar na nação Yanomami. Assim como o americano interveio e roubou metade do México, não será surpresa se amanhã ocorrer uma intervenção e nos roubarem a nossa Amazônia. No Governo do Presidente José Sarney houve preocupação com a Amazônia, refletida nos projetos Calha Norte e Sivam, que, com todas as polêmicas causadas, têm um lado positivo. Não sinto, no entanto, que este Governo, a sociedade e o Congresso dêem 10% da importância que se deveria dar à Amazônia. Eu, que estou ao final da minha vida pública, só peço a Deus que nossos filhos não recebam um território menor do que nós recebemos dos nossos pais, depois de toda uma caminhada com muito sangue, muita luta, muita garra e muita competência. O Brasil é um continente, e isso causa a inveja a milhões de pessoas nos Estados Unidos e na Europa. Roubar a Amazônia é o que eles querem. Ficarmos inertes, acovardados, sem tomar uma atitude, é algo que me parece totalmente impatriótico. V. Exª faz um pronunciamento da maior importância. Penso que deveríamos tomar providências no sentido da preservação daquilo que talvez seja a maior riqueza do continente brasileiro. Meus cumprimentos a V. Exª.

O SR. MOZARLDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Senador Pedro Simon, como representante do Rio Grande do Sul, o seu pensamento não me surpreende, pois já tive oportunidade de conversar com V. Exª sobre a Amazônia e sei do conhecimento que tem sobre a região. Na verdade, V. Exª tem ajudado muito os parlamentares da Amazônia, inclusive recentemente, na votação da proposta de emenda à Constituição, de minha autoria, que prevê um percentual para investimento nas universidades federais da Amazônia. Portanto, com muita satisfação, acolho o aparte de V. Exª, que é um depoimento importantíssimo, visto que nos mostra que não apenas nós, da Amazônia, estamos preocupados com a situação, vendo fantasmas que não existem.

A CPI das ONGs já constatou que, na Amazônia, uma ONG atua no contrabando de minério e outra, na grilagem de terra. E não é pouca terra, Senador Pedro Simon: são 174 mil hectares de terras manipuladas por uma ONG sediada na Itália, que faz pacotes turísticos, introduzindo no Brasil e retirando dele dólares sem controle algum do País. Essa situação é realmente preocupante. Precisamos tomar providências urgentes. Não sei se o nível de decisão do Poder Executivo está anestesiado ou se está impossibilitado de se colocar contra os poderosos do Banco Mundial, do FMI, que impõem esse tipo de colonialismo e de entrega paulatina da Amazônia aos países mais ricos.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - V. Exª me permite um aparte?

A Srª Marluce Pinto (PMDB - RR) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Se a Presidência me conceder um pouco mais de tolerância, gostaria de ouvir os apartes dos Senadores Roberto Saturnino e Marluce Pinto.

Concedo o aparte ao Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senador Mozarildo Cavalcanti, cumprimento V. Exª. Todos que o apartearam foram unânimes em reconhecer o valor do seu discurso, que confirma a sua preocupação constante com a Amazônia, região que V. Exª representa nesta Casa. Efetivamente, isso deve preocupar - e é importante que esta preocupação seja levantada constante e permanentemente - todos os brasileiros. O Brasil, neste momento, está com a sua soberania fragilizada, enfraquecida - essa é que é a verdade - pelas decisões de política econômica que adotou, pela dependência em que se colocou em relação ao mercado financeiro internacional, aos capitais estrangeiros e à própria boa vontade no ingresso de capitais estrangeiros. Quer dizer, essa situação fragilizou enormemente o exercício da soberania por parte do Brasil, e temos observado episódios numerosos que demonstram isso. De outro lado, no mundo se construíram esses grandes interesses que ambicionam a Amazônia, porque lá está o principal reservatório de biodiversidade do planeta. Esses interesses tentam fazer com que a opinião pública mundial aceite a idéia de que não há mais nações mas mercados e que o Brasil é um grande e excelente mercado, muito promissor. E isso enfraquece ainda mais a disposição de exercício de soberania sobre a Amazônia. Então, a vulnerabilidade do Brasil, somada à idéia de que não há mais nações e sim mercados, induziria - e há um propósito de induzir - a Nação brasileira a negociar a Amazônia, devido ao endividamento do Brasil, sua vulnerabilidade e dependência. Por outro lado, o País tem uma riqueza inesgotável a qual não é capaz de explorar, porque não tem recursos...

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - Lembro ao Senador Roberto Saturnino que o orador já excedeu o seu tempo por mais de 20 minutos e ainda há um aparte da Senadora Marluce Pinto, que será concedido por alguns instantes.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Peço desculpas a V. Exª e ao orador, estou terminando. A verdade é que o assunto nos comove, mobiliza-nos. Havendo toda essa riqueza num Brasil tão dependente e estando presente no mundo a idéia das transações de mercado, amanhã o Brasil poderá ser forçado a alugar a Amazônia ou a fazer qualquer negócio com ela. Isso não só nos indigna, como também nos preocupa. E é preciso suscitar junto à Nação e à opinião pública brasileira essa ameaça e essa possibilidade que pode vir a ocorrer. Por essa razão, cumprimento V. Exª pela oportunidade e importância de seu discurso, como sempre ocorre, aliás, uma vez que V. Exª é um representante digno dessa região do nosso País.

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - Senadora Emilia Fernandes, peço-lhe, por favor, um pouco de paciência para ouvirmos o aparte de sua companheira e amiga, Senadora Marluce Pinto, que já se comprometeu a falar rapidamente. Com a palavra a Senadora Marluce Pinto.

A Srª Marluce Pinto (PMDB - RR) - Primeiramente, quero agradecer ao Presidente desta sessão, Senador Francelino Pereira, pela tolerância. Quando cheguei, o Senador Mozarildo Cavalcanti já estava na tribuna, mas, pelo que o Presidente falou, S. Exª já está ultrapassando o seu tempo em quase 20 minutos. Chega-se, portanto, à conclusão da importância da Amazônia. Quero felicitar o meu nobre colega e conterrâneo, Senador Mozarildo Cavalcanti, sobre o seu belo discurso. Eu me empolgo quando participo de qualquer discussão sobre a Amazônia. E fico orgulhosa quando Senadores como Pedro Simon, do Rio Grande do Sul, e Roberto Saturnino, do Rio de Janeiro, debatem esse assunto, porque S. Exªs representam Estados de grande população e importância. Muito embora, para nós, Roraima seja o Estado mais importante, não só porque é o que representamos mas também por ser um Estado novo, em desenvolvimento, que está encravado numa região que poderá fortalecer o nosso País. Roraima tem duas fronteiras muito importantes: a Venezuela e a Guiana Inglesa. De lá, poderemos exportar, através do Caribe, diminuindo bastante os custos. O que temos visto, como disse o Senador Pedro Simon, é que não há uma política, um programa de desenvolvimento a respeito e que ainda não vimos nenhum dos presidenciáveis se pronunciar com determinação sobre o desenvolvimento da região Amazônica. Senador Mozarildo Cavalcanti, às vezes, fico bastante constrangida, porque V. Exª e eu sabemos da importância do programa Calha Norte. O Senador Pedro Simon viajou conosco...

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - Senadora Marluce Pinto, o tempo do orador já está esgotado.

A Srª Marluce Pinto (PMDB - RR) - Sr, Presidente, conceda-me mais um minuto, por favor, porque estão presentes no plenário poucos Senadores. É bom que S. Exªs tomem conhecimento deste assunto. Assim, na nova Legislatura, não somente os Senadores da Amazônia mas todos os 81 Senadores estarão aqui defendendo uma região que é Brasil e que pertence a todos nós, brasileiros. No que diz respeito à conclusão do programa Calha Norte, recentemente, viajei para aquela região na prazerosa companhia dos Senadores Pedro Simon e Emilia Fernandes, ambos do Rio Grande do Sul, onde encontramos o Ministro da Defesa e o Alto Comando do Exército, e não tivemos a felicidade de mostrar aos nobres Senadores as terras que foram demarcadas no Surucucus.

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - O tempo do orador já está ultrapassado.

A Srª Marluce Pinto (PMDB - RR) - Apenas mais um minuto, Sr. Presidente. O Programa Calha Norte e a implantação do Sivam estão permitindo que aquela região seja mais bem fiscalizada, evitando justamente o que o Senador Mozarildo Cavalcanti acabou de dizer: a infiltração de estrangeiros na região. Sou Relatora da CPI das ONGs, e o Senador Mozarildo Cavalcanti referiu-se aos 174 mil hectares que ficam exatamente na região de Roraima, o último Município que faz fronteira com o Amazonas, Rorainópolis. O que considero pior é o fato de o Poder Central esquecer-se do Calha Norte.

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - Senadora, o tempo de V. Exª está esgotado. A Senadora Emilia está impaciente.

A Srª Marluce Pinto (PMDB - RR) - Falarei agora e os minutos que eu passar daqui para frente, V. Exª diminua do meu tempo.

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - O seu minuto já acabou.

A Srª Marluce Pinto (PMDB - RR) - Então, Sr. Presidente, Senador Mozarildo Cavalcanti, sobre o Calha Norte, em 1999 esqueceram de colocá-lo no Orçamento da União. Salvei com uma emenda, porque, senão, não se teria nem uma rubrica para se complementar os recursos e o programa teria sido extinto. E, pasmem V. Exªs, este ano, quando fomos votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias, também esqueceram do Calha Norte. Felizmente, aprovei três emendas, que nos darão condições de apresentarmos recursos para a continuidade da instalação dos pelotões de fronteira, para custeio desses pelotões, e também para as obras nas comunidades mais carentes dos Municípios que fazem parte do Calha Norte. Salvei com três emendas! Espero que os nobres Senadores desta Casa, os que fazem parte da Comissão de Orçamento, e também quando o Orçamento for para o Plenário, que nos ajudem a aprovar os recursos solicitados para o Calha Norte, porque é uma maneira de se continuar a proteger a Amazônia e procurar, de alguma maneira, desenvolver aquela região, que, como já foi dito aqui, é tão importante. Muito obrigada, Senador Mozarildo, e mais ainda, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Francelino Pereira) - Senador Mozarildo, o tempo de V. Exª está esgotado.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Quero apenas, Sr. Presidente, agradecer os apartes do Senador Saturnino Braga e da Senadora Marluce Pinto, e pedir a V. Exª, já que só faltava uma página, que a considere como lida. São sugestões de ações para o desenvolvimento da Amazônia que peço façam parte do inteiro teor do meu pronunciamento.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.

Salve a Amazônia!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/09/2002 - Página 17126