Discurso durante a 128ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apoio ao projeto de desenvolvimento nacional proposto pelo Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.

Autor
Amir Lando (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RO)
Nome completo: Amir Francisco Lando
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PROGRAMA DE GOVERNO.:
  • Apoio ao projeto de desenvolvimento nacional proposto pelo Presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 15/11/2002 - Página 21737
Assunto
Outros > PROGRAMA DE GOVERNO.
Indexação
  • DEFESA, ENGAJAMENTO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), PROGRAMA DE GOVERNO, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, PRIORIDADE, COMBATE, FOME, MISERIA, GARANTIA, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO, PAIS.

O SR. AMIR LANDO (PMDB - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho, neste final de sessão, em uma quinta-feira, quando o Congresso Nacional já vai desativando as suas funções desta semana, sobretudo para, aqui, fazer um apelo especial ao meu Partido, o PMDB.

Sr. Presidente, a sociedade brasileira acompanhou o desempenho do PMDB nas últimas eleições. Não tivemos, como era anseio de partes de suas bases de uma candidatura própria à Presidência da República. E o Partido ficou frustrado em parte e, em parte, engajado em uma candidatura à Presidência da República. Todavia, não há dúvida de que as diferenças de credo e de propostas, as diferenças naturais de caráter ideológico proporcionaram ao Partido opções diferentes à candidatura à Presidência da República. O PMDB sempre foi isto: um Partido unido na sua base, nos momentos cruciais, em defesa dos interesses do País e do povo brasileiro. Mas é um Partido que abriga uma variedade ampla de convicções, de propostas e, sobretudo, de militâncias.

É esse PMDB que hoje se apresenta diante da Nação. Às vezes, mostra-se como um Partido em crise, mas da crise renasce qual Fênix. É um Partido que tem um arco de preferências muito grande dentro da sua agremiação.

É esse Partido também que, neste momento, tem de fazer uma reflexão séria diante do discurso vindo das urnas. Aos discursos que foram feitos ao povo brasileiro, o povo brasileiro respondeu, de maneira clara e manifesta, acenando para uma preferência sobre o destino da nossa Pátria, com a vitória de Luiz Inacio Lula da Silva. Isso é inequívoco e transparente.

Poderíamos dizer que, já no primeiro turno, vislumbrava-se que 74% da população optaram pela mudança, pelo novo e, sobremodo, para que se devolvesse ao País a esperança de crescer, de desenvolver, da cidadania digna e plena, do exercício de direitos fundamentais que não fossem abstratos e, sim, concretos, porque não podemos ficar no formalismo liberal. O direito à saúde, nobre Presidente, é o direito ao acesso à assistência médica, ao hospital, ao remédio, em caso de necessidade; o direito à moradia é o direito de ter a chave da porta da casa própria ou da casa que se concede para morar daqueles que hoje estão na amargura dos sem-teto. Por isso, temos de olhar com muita sensibilidade as demandas sociais deste País. O direito à escola é esse acesso à educação de maneira efetiva; o direito de ir e vir é a possibilidade de ter o vale-transporte ou, mais concretamente, os recursos para deslocamentos quando necessário.

Não se pode ficar simplesmente pensando que as liberdades democráticas devam permanecer apenas no texto constitucional, senão, que devam se tornar liberdades concretas no exercício da vida no dia a dia.

Em sobremodo, Sr. Presidente, esse direito à vida, uma vida que começa pela alimentação, pelo combate à fome. A proposta do novo Presidente, que assumirá no dia 1º de janeiro, para que aqueles marginalizados, excluídos, possam ao menos comer três vezes por dia é um ponto de partida, de referência mínima à dignidade humana.

Não se pode imaginar que um País continental como o Brasil, com potencialidades fantásticas na produção agrícola, na produção de bens, na produção industrial e, sobretudo, na produção de alimentos, não propicie ao povo brasileiro o direito de comer. É claro que o direito de comer começa por aquilo que é mais essencial: o direito ao trabalho. Porque o direito ao trabalho coloco em primeiro lugar, porque é o direito que faz a provisão da vida, porque é o direito a ganhar o pão de cada dia. Ninguém quer a esmola, ninguém quer apenas a benesse de uma fatia de pão. É evidente que, para quem está “morrendo de fome”, é preciso que se acuda a fome, de qualquer sorte, de qualquer maneira. Mas, sobremodo, o que temos que pensar é na geração de emprego, na geração de rendas.

E é esse o projeto fundamental que se coloca diante do povo brasileiro, é esse o discurso do novo, dos 52 milhões de eleitores. É uma sedução para todo homem público o engajamento a uma proposta nova, consubstanciada nesse projeto de País proposto pelo Presidente recém-eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Por isso, Sr. Presidente, venho a esta tribuna sobretudo dizer que uma corrente expressiva do PMDB está disposta a engajar-se naquilo que sempre foi o sonho da nossa juventude, o ideal de homem público, realizar um projeto de interesse do povo brasileiro, realizar sobretudo a cidadania neste País.

O que se quer é que o novo Presidente da República seja um Presidente brasileiro, que governe para os brasileiros, para os que nasceram aqui sentirem o orgulho da sua própria terra. “Ame com fé e orgulho a terra em que nasceste”, lembro de um verso ainda de minha infância e é isso que queremos. Sentir orgulho de ser brasileiro, sentir acima de tudo a ufania de dizer que este País é viável, que podemos construir uma nação justa, mais humana, mais desenvolvida, progressista, cuja riqueza propicie um retorno de bem-estar à população.

O povo brasileiro tem esse direito histórico e tem esse direito porque o País é imensamente grande e rico. É por isso que entendemos que é hora de o PMDB engajar-se nesse projeto, e engajar-se sem pretensão, sem condições de participação de cargos, mas com participação de responsabilidades, participação no sentido de dar o melhor, de realizar um esforço à altura de nossas capacidades a fim de oferecer ao País a dignidade nacional.

Desejo dizer, Sr. Presidente, que o PMDB desempenhou um papel histórico e importante na luta pela democratização do País. E agora, com essa tarefa realizada, devemos participar de um processo de democratização da riqueza nacional, do bem-estar e da felicidade geral.

É por isso que, nessa hora, ninguém pode ficar distante do apelo, da demanda, da súplica vinda das urnas. O PMDB tem que dar um passo adiante. Um passo em direção ao interesse do povo brasileiro, um passo de engajamento em direção às políticas sociais e públicas que possam incorporar os 54 milhões que vivem abaixo da linha de pobreza, no processo produtivo, para gerar riqueza. E o que é excedente pode ser transformado em superávit para pagar os nossos credores. Mas, sobremodo, é hora também de apelar para todos os que têm interesses neste País, para todos os que são titulares dos créditos, os que colocaram recursos de uma forma ou de outra. São contratos que devem ser observados - pacta sunt servanda, diziam os latinos. Os pactos devem ser obedecidos, digo. E é por isso que, sem quebra de contratos, sem ruptura unilateral, é preciso suplicar a todos aqueles que são titulares desses créditos, aos credores, à banca internacional, ao FMI, que coordena sobretudo a realização desse processo de pagamentos, porque, na verdade, o FMI é um clube dos credores, Sr. Presidente, é um clube em que os interesses dos credores são ali acertados, fixados e impostos, sobretudo àquelas nações que recorrem ao FMI; e estamos nessa linha. Mas é preciso também dizer que chegou a hora da verdade de um diálogo do desesperado. Queremos pagar, vamos pagar, sim, mas o FMI deve ter uma visão clara da situação social, uma visão realista do que se passa no Brasil, porque, se continuarmos atrelados a esses índices de superávit, a esses índices fixados de forma imperativa, o País cada vez mais se afundando e se distanciando da capacidade de pagamento da dívida. Se não incorporarmos aqueles que hoje estão fora do mercado de trabalho ao sistema produtivo, cada vez mais ficaremos em dificuldades e até impossibilitados de pagar ou quitar a dívida, seja o serviço, seja o principal.

Precisamos da compreensão de todas as nações, sobretudo das grandes economias mundiais. Precisamos de um fôlego para suspirar e voltar a produzir mais, dar evasão à nossa capacidade produtiva e assim gerar a riqueza necessária para pagar a dívida até de maneira mais rápida, mais célere do que esses prazos já estabelecidos. Se tivermos uma flexibilização neste momento difícil, neste momento de união nacional, neste momento em que a Nação inteira se engaja em um projeto de reconstrução, com certeza estaremos mais próximos da quitação da dívida, do pagamento mais rápido, porque geraremos mais riqueza, mais bens e serviços, exportaremos mais. Para isso é preciso que rompam, que definitivamente afastem as barreiras alfandegárias, o protecionismo, o incentivo brutal à produção agrícola que ocorre nos países mais desenvolvidos. Para que possamos competir e os nossos produtos tenham acesso aos mercados, não pode haver impedimento para gerar aquilo que é essencial, de que precisamos tanto, que é o superávit da nossa balança.

Sr. Presidente, temos que dar ao povo brasileiro uma oportunidade de reversão. Este País é uma grande potência, mas ainda na fase virtual. O Brasil tem possibilidades incomensuráveis de realizar o bem-estar para o seu povo.

É preciso aumentar o nível de investimentos. O Orçamento enviado ao Congresso Nacional não consigna mais do que R$7 bilhões para investimentos. O programa de combate à fome recentemente anunciado pelo Presidente recém-eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, demanda algo em torno de R$4 a R$5 bilhões. E como conseguir esses recursos? Não há como aumentar a carga tributária. Sabemos que estamos no limite da corda esticada, que, cada vez mais, vai amesquinhando e reduzindo a nossa capacidade produtiva.

Chegou o momento de buscarmos - em primeiro lugar no mercado interno -, dentro da imensidão de nosso território, alternativas para a geração de melhorias e de riquezas para o povo brasileiro. Temos um território imenso, solos férteis e disponíveis à ampliação da fronteira agrícola. É hora de avançarmos mais.

Só na região da Amazônia, sobretudo em Rondônia, Mato Grosso, Pará e parte do Amazonas, temos mais de 100 milhões de hectares que podem ser integrados ao processo produtivo. Precisamos fazer uma opção: dar ou não oportunidade ao povo brasileiro de plantar, colher, melhorar sua condição de vida, sobretudo aos sem-terra. É uma vergonha nacional a existência de acampamentos de sem-terras, com tanta terra disponível. Muitos latifúndios improdutivos poderiam ser desapropriados com celeridade, distribuindo-se a terra para quem quer nela trabalhar.

O processo em marcha é de transformação do País, de mudanças. Não falo de uma mudança radical, mas necessária, progressiva. Falo da compreensão do mundo com relação às necessidades essenciais do Brasil, para incorporar o povo brasileiro ao processo produtivo e fazer com que se gerem excedentes, mais-valia. Assim, o País poderá pagar os credores na hora certa, com o devido valor, podendo até aumentar a quota dos pagamentos e, em algum tempo, de uma vez por todas, acabar com os vínculos brutais da dívida que nos sufoca, nos escraviza, nos engessa e impede o crescimento econômico e social do Brasil.

A hora é agora. É hora também de o PMDB entrar no processo de redenção nacional. Chegou o momento em que não podemos ficar distantes, como meros espectadores. Vamos construir um país novo, diferente, mais justo, sem grandes flagelos sociais. Caso contrário, as novas gerações, a minha sobretudo, não terá outra oportunidade. Tudo processar-se-á na ordem democrática, de acordo com a lei, em harmonia, com paz e tranqüilidade social.

Há muitos pontos que devemos combater. A violência é um grande desafio. Entretanto, tudo começa, Sr. Presidente, pela construção de um projeto nacional para oferecer uma perspectiva aos jovens e aos desempregados de se integrarem à sociedade de maneira adequada, respeitando a dignidade humana. O cidadão quer viver em paz, com os ganhos de uma atividade lícita em que possa realizar, de maneira integral, a sua personalidade como ser humano.

É o que queremos oferecer ao povo brasileiro: oportunidade de realizar as suas potencialidades íntimas, intrínsecas, oportunidade de ajudar a construir uma nação de todos, uma nação que se volte para o seu povo em primeiro lugar. Com os compromissos internacionais que temos hoje, poderemos compatibilizar os anseios de melhoria e daqueles que têm direitos sobre nós.

O direito das obrigações deve ser sempre respeitado, mas entre os homens de bem sempre haverá um terreno comum para conciliar interesses mediante recíprocas renúncias. É hora de pensar que todos temos de renunciar um pouco. A comunidade internacional tem de se sentar à mesa para buscar um caminho que não seja o da Argentina, mas que seja de grandeza, de solidariedade humana, para construirmos nações livres, independentes e que se respeitem entre si em sua autonomia, em sua soberania nacional, para a realização da felicidade de seus povos.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/11/2002 - Página 21737