Discurso durante a 145ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

BALANÇO DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. (COMO LIDER)

Autor
Artur da Tavola (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/RJ)
Nome completo: Paulo Alberto Artur da Tavola Moretzsonh Monteiro de Barros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • BALANÇO DO GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO. (COMO LIDER)
Aparteantes
Eduardo Suplicy, José Alencar.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/2002 - Página 25324
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REALIZAÇÃO, PROGRESSO, AMBITO NACIONAL, REFORÇO, ATIVIDADE, ESTADO, SOBERANIA NACIONAL, ABERTURA, ECONOMIA NACIONAL, REFORMA ADMINISTRATIVA, EXPANSÃO, ATIVIDADE AGROPECUARIA, EXPORTAÇÃO, MELHORIA, EDUCAÇÃO, AUMENTO, ACESSO, ENSINO FUNDAMENTAL, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, CUMPRIMENTO, CONTRATO, AMBITO INTERNACIONAL, DESENVOLVIMENTO, POLITICA EXTERNA.
  • SOLICITAÇÃO, ATENÇÃO, PROPOSTA, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, CANDIDATO ELEITO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, IMPORTANCIA, MANUTENÇÃO, PROGRESSO, GOVERNO FEDERAL, NECESSIDADE, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, CONTENÇÃO, INFLAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio que cabe, neste exato momento da vida brasileira, alguma reflexão que, na qualidade da Líder do Governo, me sinto também no dever fazer, seguindo, aliás, a linha do discurso do ilustre e nobre Senador Romero Jucá.

Gostaria de enumerar no início das minhas palavras os dez pontos que me parecem foram a essência da ação do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

O primeiro deles refere-se ao dimensionamento, que chamo de correto, do tamanho e do papel do Estado. O Estado brasileiro sempre foi o centro das discussões: o Estado máximo dos socialistas, o Estado mínimo dos liberais. O Manifesto do PSDB propõe o Estado socialmente necessário, expressão de Norberto Bobbio. Desde a Constituição de 1988, que deu uma configuração ao Estado brasileiro, o esforço feito pelo Governo nos últimos anos foi de criar justamente este Estado intermediário das relações sociais, este Estado não empresário, este Estado não onipotente. Por sua vez, não abriu mão da existência de um Estado capaz de dimensionar os rumos e os passos do desenvolvimento, incluindo as tensões sociais, as tensões intraclasses, como um amálgama importante para o funcionamento deste mesmo Estado.

O primeiro ponto, que me parece uma conquista realizada nos últimos anos, é o dimensionamento correto do tamanho do papel do Estado. O segundo ponto é a abertura da economia brasileira.

Quem olhar oito anos atrás, quem vir as propostas do novo Governo, que busca ser o mais ponderado possível nesse caminho, verificará que já hoje a abertura da economia brasileira é um fato insofismável, tanto é uma abertura para os acordos multilaterais como uma abertura no sentido de flexibilização de uma porção de segmentos.

No passado, pregavam: vão privatizar a Petrobras. Dizíamos: vamos, isto sim, flexibilizar e acabar com o monopólio; porém jamais privatizar a Petrobras, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica.

Passados os oito anos, temos uma abertura da economia em níveis ainda iniciantes, mas muito importantes e fortes para a realidade brasileira, e também o processo das privatizações praticamente realizado no País.

Em relação a esse processo, sempre me pareceu haver um grande equívoco na discussão do problema. As privatizações foram tidas como a idéia da venda de estatais - e alguns chamaram-nas de desmonte da máquina do Estado -, quando as privatizações existiram por uma razão muito mais profunda do que pura e simplesmente diminuir o tamanho do Estado.

O Estado brasileiro, falido, endividado - até hoje - perdera a capacidade de investimento nos setores básicos da economia. A causa das privatizações é a retomada dos investimentos, impossibilitados de serem feitos por um Estado afogado em dívidas, com uma escala muito pequena de sobra de material para investimento, com obrigações as mais fortes.

O terceiro item, que, a meu ver, não se completou integralmente - pode ser que o novo Governo o complete -, mas teve um início auspicioso, é o da reforma do próprio Estado, por meio da reforma administrativa e do máximo de racionalização das funções deste mesmo Estado. Uma série de projetos, uma série de trabalhos foram feitos nessa direção, um Ministério, inclusive, trabalhou, sobretudo no primeiro Governo Fernando Henrique Cardoso. Acredito que no segundo Governo Fernando Henrique Cardoso, a reforma do Estado perdeu um pouco do seu élan inicial, embora o Estado brasileiro tenha obtido alguns graus bastante razoáveis nessa reforma.

O quarto ponto - este é fundamental - foi a criação de parâmetros de responsabilidade fiscal. Seguindo a Lei Camata, a Lei de Responsabilidade Fiscal é uma lei que, em cinco anos mais - ela já tem três de vigência - colocará o Brasil como um País efetivamente civilizado. Ela tem sanções muito graves, coloca na cadeia o administrador que não cumprir determinadas regras essenciais para a saúde deste mesmo Estado e para a recuperação dele na sua capacidade de investimento.

O quinto ponto me parece haver sido a expansão da agricultura e dos serviços de exportação. Esse ponto tem a ver diretamente com a balança comercial. Estamos com resultados auspiciosos. Temos uma agroindústria exemplar no mundo, e essa expansão da agricultura é hoje nossa principal pauta de exportação. O esforço do Governo brasileiro no que se refere à exportação abriu um caminho na direção de aumento do nosso Produto Interno Bruto e de regularizar a nossa balança comercial.

            O sexto ponto é, a meu juízo, uma revolução: o que foi feito no ensino fundamental.

O ensino fundamental brasileiro é o ensino que hoje atinge 97% das crianças em idade escolar. Por que digo revolução no ensino fundamental? Porque o esforço para o ensino fundamental não foi apenas quantitativo - em 1994 tínhamos cerca de 92% das crianças nas escolas - foi o esforço de mantê-las na escola, de qualificar o ensino para que as crianças, pela evasão e pela repetência, não saíssem da escola. Coadjuvado esse processo por atividades como o Fundef e o Programa Bolsa-Escola, que, ademais, mantinham a criança na escola também, até por motivos de que ela não seria retirada da escola para ajudar a renda familiar, na medida em que o Estado entrou diretamente com recursos para que a criança cumprisse integralmente esse espaço da sua vida educacional, que é, dentre todos, no campo educacional, positivamente o mais democrático, pois a discriminação contra a criança pobre, de origem humilde começava no ensino fundamental.

É lógico que a esse sucesso, a essa revolução no ensino fundamental ter-se-á que se seguir agora, a meu ver, um belo trabalho na direção da pré-escola e na direção do que hoje é o grande gargalo da educação brasileira: o ensino médio, chamado ensino secundário, porque, como já estão a sair do ensino fundamental muito mais crianças, a pressão sobre o ensino médio é maior, o gargalo ainda é grande. Foi feito um esforço nessa direção, porém não suficiente para o tamanho da demanda.

O sétimo ponto, que, a meu ver, significa a grande transformação trazida pelo Governo Fernando Henrique, está nos fundamentos de uma ação social associada ao desenvolvimento humano, e não puramente assistencialista.

Por coincidência, falo no dia seguinte ao que o Presidente da República recebeu, nas Nações Unidas, um prêmio exatamente por haver sido um dos Governantes de todo o mundo que mais fez investimentos no sentido da ação social associada ao desenvolvimento humano.

Há várias maneiras de se fazer ação social. A ação social isoladamente é assistencialista. Ela, em geral, serve à demagogia, ao populismo, porém, não é efetivamente renovadora. E há vários projetos de ação social que têm um fundamento e vão além da assistência pura e simples, eles estão na origem da formação de quadros e da inserção, na sociedade brasileira, de pessoas que efetivamente serão aptas não apenas para rudimentos de uma profissão, mas para um desenvolvimento humano integral. Acredito, também, que este há de ser um ponto que o novo Governo seguirá, porque tenho visto muitos projetos nessa área previstos por ele.

O nono ponto, a meu juízo, é igualmente fundamental: a prioridade dos fundamentos macroeconômicos como política de Estado.

O Brasil não terá solução se não mantiver esses fundamentos macroeconômicos responsáveis pela estabilidade, por um equilíbrio entre pagamento da dívida, reorganização do Estado e aumento do capital para investimento. Investem-se hoje no Brasil, na questão social - pouca gente sabe disso -, mais de R$132 bilhões/anos, se considerarmos todo investimento feito nessa direção.

Portanto, a prioridade dos fundamentos macroeconômicos é essencial, até porque não há outra saída. E esses fundamentos, por mais criticados que tenham sido, criaram a possibilidade de desenvolvimento sustentado e equilibrado.

O nono ponto é o cumprimento dos contratos nacionais e internacionais e também a expansão da política externa.

Foi com rigor, com dificuldade e com impopularidade que o Governo cumpriu integralmente os contratos internacionais - sobretudo os ligados à dívida -, os compromissos com o Fundo Monetário Internacional, o que, se por um lado - é verdade - restringiu a sua possibilidade de investimentos internos, por outro , em termos internacionais, categorizou o País para que ele entrasse no concerto das nações e das agências financiadoras de desenvolvimento com um grau de respeitabilidade que induz ao prosseguimento dessa mesma política. E isso foi tão criticado...

Finalmente, um aspecto aparentemente difícil de ser caracterizado materialmente, mas de alta relevância e que tem sido cantado em prosa e verso e reconhecido até por aqueles que são adversários mais ferrenhos do Presidente da República, o aprofundamento institucional: democracia, liberdades públicas, anistia. Foi completado no Governo Fernando Henrique Cardoso o processo da anistia. Um de seus ministros da Justiça recebeu prêmio das Nações Unidas por direitos humanos, o Ministro José Gregori, hoje embaixador em Portugal, e o aprofundamento institucional do qual o mundo hoje está tendo provas ao verificar que a transição brasileira, a transição deste País periférico se estabelece em um nível de entendimento elevado, de alta categoria do ponto de vista político como cabe a uma nação civilizada e madura.

Do ponto de vista econômico, o cerne da questão, três dessas mudanças, a meu juízo, são fundamentais: a responsabilidade fiscal, a responsabilidade monetária - a manutenção do valor da moeda, o câmbio flexível - e o cumprimento dos contratos.

Diante disso, estamos na ante-sala de um novo governo, bafejado pela opinião pública, recebido com esperança e que vem dando provas de que busca, da melhor maneira, encontrar um caminho sério para a sua administração. Como irá se comportar esse novo governo, tendo em vista a contradição flagrante entre o que ele sempre pregou e o que ele começa a modificar, pouco ou muito, nessa fase de transição, que é contrário a sua pregação anterior e também contrário a pressão dos seus setores radicais? Diante dessa dúvida - tenho uma idéia de que ele irá se comportar muito bem - e buscando analisar muito mais que opinar ou fazer qualquer propaganda de governo, poderíamos criar dois cenários: um positivo e um negativo. No cenário positivo, a meu juízo, o novo governo manteria a austeridade fiscal e monetária, honraria os contratos - acredito que honrará - e aceitaria a dificuldade - algo que lhe é muito difícil - da impopularidade necessária para não cumprir as promessas, pelo menos no seu primeiro ano de governo. Tenho ouvido já de líderes importantes do novo governo, pela televisão, a informação de que, adiante, com os passos dados, essas promessas serão cumpridas. Neste caso: manter a austeridade fiscal e monetária, honrar os contratos, aceitar as dificuldades de cumprir as promessas pelo menos no primeiro ano, o novo governo não poderá, a meu ver, aumentar o salário mínimo além do que é sustentável do ponto de vista fiscal, reajustar o funcionalismo público, renegociar as dívidas dos Estados e Municípios - ainda que sejam dívidas com essa desculpa que o Governo de Minas Gerais está encontrando para furar exatamente o rigor necessário, a manutenção estrita dos princípios da responsabilidade fiscal. Não poderá também descumprir, a meu ver, as metas do superávit primário com o FMI de pelo menos 3,75% do PIB e não poderá errar na indicação dos nomes para os Ministérios da Fazenda e do Planejamento e para a Presidência e as Diretorias do Banco Central. Além de obedecer à implacabilidade desse cenário que é difícil, duro - o novo governo até tem dado bastantes indicações de que parece seguir por aí -, o novo governo terá que cumprir as suas promessas acerca de crescimento da economia, redução da pobreza e da desigualdade de renda, que tem sido uma de suas bandeiras mais importantes, promessas de campanha que incendiaram as esperanças da grande massa que idealizou uma possível onipotência da bondade do novo Presidente, justiça e competência na figura dele, do Presidente Lula, que é - não deixa de ser -, apesar de figura de grande valor, um transporte mágico, mitológico, típico do sistema presidencialista de governo. No sistema parlamentarista de governo, esse tipo de idolatria não existiria, até porque ele tem outro estilo de escolha do governo que dirigirá a nação. A meu juízo, no cenário positivo e otimista que traço, o básico, além do respeito a esses três pontos: manter a austeridade fiscal e monetária, honrar os contratos e a dificuldade de cumprir as promessas, pelo menos no primeiro ano, dentro desse cenário, o básico é a reforma da Previdência.

No Brasil, menos de 7% da população tem mais de 70 anos; gastam-se cerca de R$150 bilhões - aproximadamente 11% do PIB -, somando Estados e Municípios, com o pagamento das aposentadorias e pensões. Os números são assustadores. O déficit do INSS, que paga as aposentadorias dos operários e dos trabalhadores, é de R$18 bilhões, em 2002, para 20 milhões de beneficiários, e a maioria ganha em torno de um salário mínimo. Já o déficit do sistema de aposentadoria dos funcionários públicos federais é de R$27 bilhões, ou seja, R$9 bilhões a mais do que o do INSS, para apenas um milhão de funcionários públicos. Então o Brasil gasta mais com um milhão de funcionários públicos do que com 20 milhões de trabalhadores aposentados. Ora, nenhum cálculo atuarial resiste a esse quadro.

Essa reforma não foi feita antes exatamente porque o partido que estará no governo a partir de janeiro de 2003 se posicionou contrariamente e ajudou muito na impopularidade do atual Governo. Até porque há de fato uma questão perversa no problema: a da mudança das regras do jogo e a do corte da aposentadoria - no caso da aposentadoria integral do funcionalismo público numa fase em que mais se precisa dos recursos para sobreviver. O problema da Previdência, portanto, é um passo fundamental, anterior, a meu ver, ao que está sendo pregado, ou seja, ao da reforma tributária, que não é importante para o Brasil neste momento como a reforma da Previdência até porque o que se conseguir doravante na reforma da Previdência serão recursos que realmente carrearão investimentos.

Assim, quanto à reforma tributária e fiscal, numa perspectiva otimista, mantidos os fundamentos macroeconômicos e realizadas as reformas fiscal e da Previdência, poderíamos prever para 2003 um crescimento pequeno do PIB - 2,5% e 3%; podemos calcular uma inflação em torno de 7%, melhor que a deste ano, e o saldo da balança comercial entre R$11 bilhões e R$13 bilhões, ou seja, um cenário positivo levaria, no cumprimento dessas obrigações, o novo Governo a obter esse resultado, que, a meu ver, é positivo, otimista, e não altera os fundamentos da economia brasileira. Aí, sim, acredito que o Governo pode fazer o que deseja, que é resolver a desigualdade em renda e enfrentar, efetivamente, a pobreza, de modo gradativo. Esse é o cenário positivo que me parece possível, e a tradução dele qual é? É seguir o que se vem fazendo. E seguir o que se vem fazendo é perceber que os fundamentos da socialdemocracia já estão de tal maneira arraigados no País, que, a meu ver, não têm como ser removidos.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exa permite-me um aparte, Senador Artur da Távola?

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Apenas gostaria que V. Exa me permitisse mostrar o cenário negativo - estou fazendo uma análise do que considero o cenário positivo; agora, farei um breve desenho do cenário pessimista. O Presidente me alerta que meu tempo acabou, mas acredito que poderemos, sem nenhuma dúvida, com o maior prazer, conceder, em seguida, o aparte ao Senador Eduardo Suplicy.

No cenário pessimista, vamos dizer que o novo Governo desobedeça a algumas das questões básicas antes enumeradas. Não vou não vou repeti-las para não atrasar. Por exemplo, ele concede um salário mínimo acima das disponibilidades orçamentárias - isso parece que já está afastado - ou, como prometeu, recentemente, o Presidente Lula, dá um aumento ao funcionalismo ou então renegocia a dívida dos Estados e Municípios. Não sei, vai depender de pressões, de opções, de decisões, de aspectos que não estão claros, todavia. Ele pode também priorizar a reforma tributária no lugar da reforma da Previdência. Por quê? Porque a reforma da Previdência implica trato com a impopularidade e não sei se o Governo está preparado para isso. Reforma da Previdência é igual a impopularidade; não reforma da Previdência é igual a crise grave.

Nessa hipótese negativa, o que acontece? O mercado se acautela, especula, o risco Brasil aumenta, os juros internos não baixam, a economia não cresce e ocorre a tensão política entre as demandas da sociedade, incorporadas como promessas de campanha, e aquela racionalidade implacável, fria e até socialmente injusta, mas necessária, da equipe econômica. Conforme o resultado desse atrito, há possibilidade de o Governo desestabilizar-se interna ou externamente. É a crise. Nesse quadro de crise, será difícil falar daquilo que é o cerne da pregação, ou seja, do crescimento da renda e do combate à pobreza, os quais não terão chances de ocorrer tão cedo, pois a crise não os permitirá.

Estamos, portanto, diante desses dois cenários na economia brasileira, que terão a ver diretamente com o seguimento de uma política de desenvolvimento sustentado, com graus de crescimento não ideais, mas possíveis, e com a fria racionalidade dos números. Será difícil o cumprimento das promessas feitas de boa-fé, feitas com o desejo sincero de que se realizassem, mas que possivelmente não encontram amparo na realidade de um mundo que, por sua natureza, é globalizado, de uma economia que, por sua natureza, escapa aos plenos controles da máquina pública.

O mundo mudou muito. Mudou o próprio conceito de soberania, que era dominante ao tempo da minha formação e que ainda o é e ainda está na consciência de todos nós. O conceito contemporâneo de soberania já não pressupõe o que está dentro das fronteiras. É o que se chama de soberania difusa. Em outras palavras, a soberania do meu país está onde estão a tecnologia e a cultura dele exportadas. Seja onde for! Onde estão a tecnologia e a cultura de um país está a soberania dele. E já não é mais, há muitos anos, um problema estrito de uma soberania que se circunscreva ao território geograficamente delimitado.

Então, estamos diante desses dois cenários. Torço, ponho fé, para que o cenário da continuidade do procedimento anterior, que terá como contrapartida o peso de aceitar que o que vinha sendo feito era extremamente razoável, seja o vencedor. E temo, por outro lado, que, na hipótese de não ser seguido esse caminho, possamos estar no caminho da crise.

Senador Eduardo Suplicy, ouço V. Exª com muito prazer!

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Artur da Távola, considero importante a análise que V. Exª fez dos principais pontos do Governo Fernando Henrique Cardoso. Gostaria de salientar um ponto destacado por V. Exª e que inclusive foi considerado importante para que o Presidente recebesse na ONU o prêmio por haver melhorado o índice de desenvolvimento humano no Brasil. Ressaltou Sua Excelência que a expectativa de vida durante os oito anos de seu Governo teria aumentado cerca de 4% e que houve programas de transferência de renda que hoje remontam a um volume considerável. Gostaria, justamente neste ponto, Senador Artur da Távola, de observar que houve um avanço decorrente de inúmeras experiências. Hoje, o próprio Governo Fernando Henrique Cardoso faz um diagnóstico de que tais experiências precisam ser muito mais racionalizadas, coordenadas, unificadas. Em 1994, 1995, por exemplo, o Governo iniciou a distribuição de cestas básicas - cerca de três milhões. Em 1998/2000, distribuía mais de 30 milhões de cestas básicas. Depois, chegou à conclusão de que a transferência direta de renda seria melhor do que a distribuição de cestas básicas. Havíamos aqui propugnado por programas de transferência de renda. O Senador Fernando Henrique Cardoso, em dezembro de 1991, votou favoravelmente à proposta de garantir uma renda a todos os adultos. A partir daquele debate, ficaram instituídos os Programas de Renda Mínima associados à educação, denominados Bolsa Escola, que foram expandidos. Enquanto o Ministério da Educação expandia sobremaneira, sobretudo no último ano e meio, esse programa, o Ministério do Bem-Estar Social e o da Previdência expandiam, de alguma maneira, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil; o Programa Bolsa Alimentação passou a ser expandido pelo Ministério da Saúde; o Ministério da Integração lançou o Programa Bolsa Renda; o Ministério de Minas e Energia lançou o Programa Vale Gás; o Ministério da Previdência também tinha os projetos da Lei Orgânica da Assistência Social, bem como os projetos de pagamento da previdência rural, pagamentos continuados.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - O FAT estava no Ministério do Trabalho, também é outro.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - E o seguro-desemprego, que era administrado pelo Ministério do Trabalho.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - E ainda o Saúde Família.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - E o Fundo de Amparo ao Trabalhador administrava inúmeros outros programas. Em junho deste ano, o Presidente Fernando Henrique Cardoso anunciou que, em vez desses programas, unificaria tudo em um cadastro único social, substituindo-os pelo cartão do cidadão. Isso representou uma racionalização ainda não instituída. O diagnóstico que está sendo passado pelo Governo Fernando Henrique Cardoso para o governo de transição indica que inúmeros desses programas estão se cruzando, em que pese toda a tentativa de aperfeiçoamento, de racionalização. Primeiro, há famílias vizinhas, no mesmo lugar, no mesmo município ou em outros Estados, com programas diferentes. Inúmeras vezes há uma superposição dos programas. Esse diagnóstico indica que é importante racionalizarmos, unificando os programas, pois há Estados e Municípios que têm programas com diferentes desenhos, alguns mais generosos e melhores. Por isso, é necessário um esforço de racionalização, em cooperação com todos os governos estaduais e municipais. Essa é uma tarefa que o novo Governo está disposto a realizar. Assim, acredito que possa ser dado um salto, com a aprovação dessa matéria hoje, pelo Senado, com a perspectiva de, a partir de 2005, se instituir uma renda básica como direito à cidadania, que pode ser aquele desenho que irá racionalizar esses programas de transferência de renda, numa forma hoje estudada e amadurecida pelos maiores economistas que têm indicado esse tema como o mais adequado. Agradeço a oportunidade.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Senador Suplicy, V. Exª faz um aparte de grande percuciência, de grande equilíbrio, que agrega ao meu discurso uma conclusão perfeita. Apenas quis mostrar que esse esforço vem sendo feito no Brasil, e, a meu ver, até foi muito mal comunicado à população. A questão social passou como se estivesse em branco no Governo Fernando Henrique, e acredito - não sou otimista nem pessimista, mas um militante da esperança - que seja pela unificação, proposta por V. Exª, que seja pela manutenção de uma certa descentralização, que não me parece ruim, mas concordo com V. Exª que é um assunto a ser estudado e aprofundado melhor pelo novo governo. Tenho um certo medo de centralizações efetivas. Tudo isso prosseguindo, ganha o País em equilíbrio, em desenvolvimento sustentado e no enfrentamento devido da maior das suas questões, que é a questão da pobreza e da miséria. O importante é que isso seja feito, mas sem a desestruturação dos fundamentos macroeconômicos. Se o nosso País tem 40 ou 50 milhões de excluídos, o esforço brasileiro - e isso é pouco observado - tem 120 milhões de brasileiros incluídos já participando do processo de produção, do processo de consumo. E tão grave quanto esquecer os excluídos é desorganizar a economia que atende os incluídos, como é o caso da Argentina: quando desestabiliza os incluídos, a Argentina entra na grave crise. Espero que o cenário otimista ou positivo aqui apresentado seja aquele seguido para que esses fundamentos não desapareçam.

Agradeço muito o aparte de V. Exª, o qual foi de extrema percuciência e lucidez, como, aliás, cabe a V. Exª normalmente nesta Casa.

Muito obrigado, Sr. Presidente...

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Senador Artur da Távola, concede-me V. Exª um aparte?

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Ao Vice-Presidente da República, quem negar um aparte fica com a carreira política definitivamente manchada. Só espero que a Mesa o permita.

O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti) - Lembro apenas que o orador já ultrapassou, em dobro, o tempo permitido. Mas, com muito prazer, ouviremos o aparte do Senador José Alencar.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Então, ouço o aparte de V. Exª com muito prazer, Senador José Alencar.

O Sr. José Alencar (PL - MG) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Pedi o aparte para me congratular com a forma, eu poderia dizer com a maestria com que V. Exª defende, nesses dez pontos que arrolou, o trabalho do eminente Presidente Fernando Henrique Cardoso ou do seu Governo. Anotei com a maior atenção e não discordo da maioria dos pontos arrolados. Apenas gostaria de fazer uma observação, se me permite o eminente Senador Artur da Távola. Quero falar justamente sobre a questão ligada aos fundamentos macroeconômicos, objeto de ênfase no pronunciamento de V. Exª. Falarei, por exemplo, das questões ligadas à política monetária, que no Brasil tem sido responsável pela elevação despropositada e, a meu ver, desnecessária dos custos de capital em nosso País. Por que desnecessária e despropositada? Porque não há, no mundo inteiro, um país com as potencialidades, dimensões e características do nosso que precise adotar tal política. Assistimos, ontem, à negociação de um pacote de títulos cambiais representativos de parcela substancial da nossa dívida pública interna - títulos cambiais que jamais deveriam existir, porque essa dívida pública interna deveria sempre ser representada por nossa moeda. Vimos ontem, ou anteontem, a negociação foi feita a um custo de 36% mais o risco cambial, obviamente. Essa é uma taxa que quando a gente conversa sobre ela com alguém que tenha o mínimo de noção de aritmética financeira - não precisa ser engenheiro, pode ser alguém que tenha tomado apenas algumas aulas de aritmética financeira, e as bancas credoras nacionais e internacionais conhecem muito bem matemática financeira - sabe perfeitamente que a taxa é um despropósito, para não dizer uma inconseqüência, ou mesmo uma irresponsabilidade. Acredito que o custo Brasil, que tem elevados os custos de capital para o nosso País, com a elevação dos spreads, nos financiamentos para o nosso País, está muito ligado a essa política monetária inconseqüente. Toda essa banca credora sabe perfeitamente que nenhuma economia pode remunerar esses custos. Para se ter uma idéia, a nossa taxa básica, a taxa denominada Selic, é vinte vezes superior à mesma taxa básica correspondente à aplicada no mercado americano; ela é dez vezes superior à taxa dos países que pertencem à Comunidade Econômica Européia. Não há nenhum país do mundo que possa remunerar a sua dívida a esses custos. Isso é um suicídio! É realmente uma inconseqüência, um suicídio. Não temos como evitar o caos se não tivermos uma mudança desse quadro. E ela tem condições de chegar. Por quê? Porque nos descuramos das atividades produtivas. Estamos apenas administrando a questão monetária como fim. As atividades produtivas, não só do setor primário, como dos setores secundário, terciário e da infra-estrutura, que representam a economia, precisam voltar a crescer e poderão voltar a crescer de forma sustentada a uma taxa compatível com a que se verificou, no Brasil, no século passado, até os anos 80. Por exemplo, dos anos 50 a 80, tivemos uma taxa igual a mais de 7% ao ano de crescimento da economia. Eminente Senador Artur da Távola, realmente houve um enorme empobrecimento porque chegamos a possuir um PIB de cerca de US$800 bilhões. Hoje ele está em torno de 500. Isso significa que nosso PIB per capita chegou a ser US$6 mil. Hoje, é a metade disso: US$3 mil per capita/ano. Essa política monetária nos levou a essa situação e nos empobreceu. A própria Lei de Responsabilidade Fiscal não está sendo observada a rigor pelo Governo Federal porque temos construído um superávit adjetivado. Adjetivado por quê? Porque não é superávit. Na verdade, esse superávit adjetivado de primário cobre 40% do déficit. Os outros 60% do déficit têm se acoplado à dívida. Daí a razão pela qual ela cresce como bola de neve. Então, essa política tem de ser modificada, tem condições de ser modificada e os próprios credores internacionais terão compreensão para isso. Por exemplo: quando vence um pacote dessa dívida pública, representada em títulos cambiais - e esses pacotes vencem periodicamente, uma semana, quinze dias, dez dias, volta e meia vence mais um pacote, US$2 bilhões, US$2,5 bilhões, US$5 bilhões, isso tem acontecido -, os credores desses pacotes fazem um movimento especulativo no mercado para, obviamente, obter uma desvalorização maior da nossa moeda porque eles querem receber mais reais pelos dólares representados por aqueles títulos cambiais. Portanto, está ocorrendo esse aumento do dólar. Mas tudo isso tem de ser visto não para se atirar qualquer tipo de pedra no Governo que está encerrando. Eu, por exemplo, penso que há questões que foram postas por V. Exª que merecem o nosso aplauso. Entre elas, essa demonstração maravilhosa de consolidação das instituições democráticas do Brasil, com essa transição civilizada, que está sendo objeto de aplauso do mundo inteiro. Isso é absolutamente reconhecido por todos nós. Temos também de reconhecer o esforço admirável na área da produção agrícola, que obteve neste ano um superávit de cerca de US$20 bilhões nas exportações, demonstrando simplesmente a competitividade de um dos segmentos da economia brasileira, denominado setor primário, Apesar do abandono em que se encontram as estradas para o transporte dessa produção até os portos, apesar dos custos elevados também na operação desses portos. É claro que há muito a ser feito. Não diremos aqui, de forma alguma, que tudo isso está errado. Por exemplo, o fim da inflação. V. Exª trouxe como primeiro ponto importante que a inflação no Brasil acabou com o Plano Real. A rigor, do ponto de vista acadêmico, o Plano Real tem a participação de um mineiro, filho do nosso querido e saudoso Otto Lara Resende, que foi André Lara Resende, o outro foi Pérsio Arida. Esse é o Plano Arida, de 1985, que foi preterido em favor do congelamento de preços e salários, em 1986, e foi trazido pelo Presidente Fernando Henrique, quando assumiu o Ministério da Fazenda, em boa hora. Só que, em 1985 o Plano Arida iria indexar a economia para conviver com o cruzeiro em ORTN, mas o congelamento acabou com o “R” da ORTN, porque acabou com a inflação, as obrigações do Tesouro não tinham mais que ser reajustáveis, desmoralizou-se a OTN e todos os outros índices que foram criados, daí por que os economistas que fizeram o plano tiveram de adotar a Unidade Real de Valor. Então, devemos, é claro, aplaudir porque estava no Ministério da Fazenda e foi por iniciativa de Sua Excelência essa decisão. É muito importante que reconheçamos tudo isso, mas a grande verdade, Eminente Senador Artur da Távola, é que o Brasil não pode continuar administrando a sua dívida com a taxa de juros vigente no mercado brasileiro. Quando dizemos a alguém que conhece algo de Matemática que, no Brasil, o consumidor paga 8% ao mês pelo crédito para comprar um bem de consumo, as pessoas simplesmente pensam que dizemos besteira, porque isso não é possível, porque ninguém pode pagar essa taxa. Isso é um despropósito, para não dizer um assalto. Isso não pode continuar porque mata a economia. O Brasil tem demonstrado uma capacidade de crescimento e uma potencialidade realmente fantástica diante do que tem acontecido, pois ainda que modesto houve um pequeno crescimento. Isso tudo graças a essa potencialidade maravilhosa da economia brasileira. Daí a razão pela qual criticamos essa política, que não pode continuar. A responsabilidade pela coisa pública, a responsabilidade pelos contratos, a responsabilidade em relação aos credores nacionais e internacionais reside em uma verificação e revisão dessa política de juros, porque ela mata a economia que não tem como sustentar essas taxas. É absolutamente impossível que o Brasil chegue a bom termo com essas taxas. Nós podemos crescer de tal forma a nossa dívida e o nosso empobrecimento que faremos do Brasil uma Argentina. Então, é preciso haver mudanças. É de fato importante que haja a reforma da Previdência. Essa é fundamental. Admira-me que um Governo que possuía condições excepcionais para realizá-la, não o fez. Provavelmente, porque tenha levado em consideração o fato de que reforma da Previdência é sinônimo de impopularidade. Não sei. V. Exª quem disse que reforma da Previdência é sinônimo de impopularidade. Mas fazer a reforma da Previdência nunca houve, nesses novos tempos, nenhum governo, que tivesse esse poder. V. Exª disse que o partido que ganhou as eleições votou contra a reforma da Previdência, mas foi uma minoria. Se houvesse vontade do Executivo, ela teria sido aprovada, obviamente. Não houve nenhuma reforma que não pudesse ser feita desde que fosse da vontade do Executivo; a reforma tributária, por exemplo. Nós sabemos que há vários caminhos. O próprio saudoso professor Roberto Campos falava em um caminho chamado eletrônico, que é o imposto único do Deputado Marcos Cintra. Pois bem, a reforma tributária tem dois caminhos então, já que o próprio grande professor Roberto Campos adotou um desses caminhos, chamado caminho eletrônico e teceu elogios a ele. Então, há dois caminhos. O segundo caminho é o clássico e é esse que vinga. Não há outro. E para esse há três impostos básicos: um imposto indireto e dois diretos. São os impostos arrecadatórios. A alíquota de um imposto sobre valor agregado, que poderia ser cobrado da última operação ou em todas as operações, gerando crédito na operação subseqüente, seria alta, porque ela iria absorver alíquotas como a do ICMS, a do IPI, a do PIS, a do Cofins e a da própria CPMF. Então, seria uma alíquota elevada, mas essa é a situação da economia do Brasil. Os outros dois impostos são o imposto de renda que se subdivide em imposto de renda sobre pessoa física e sobre pessoa jurídica e o imposto sobre propriedade, que se subdivide em imposto sobre propriedade rural e sobre propriedade urbana. Mas o Governo não poderia abrir mão de um imposto sobre operações financeiras, porque ele é instrumento de política monetária. Também não poderia abrir mão do imposto de comércio exterior, porque é instrumento de administração de importações e de exportações. Mas não são impostos de fim arrecadatório - e isso simplificaria a vida brasileira. A reforma da previdência social é inadiável. É preciso fazer a reforma da Previdência e é preciso acabar com adjetivação do superávit. Ao contrário, é preciso realizar um superávit que dê equilíbrio ao Orçamento. Para isso basta colocar as taxas de juros apenas umas quatro ou cinco vezes maior do que a média mundial. Quatro ou cinco vezes maior do que a média mundial como taxa básica! É muita incompetência nossa não saber negociar, porque o Brasil é um País que possui condições excepcionais de recursos naturais e de recursos humanos. O Brasil é um país de povo bom, pacato, ordeiro, trabalhador, inteligente, versátil. A miscigenação do nosso povo nos confere essa versatilidade que faz inveja aos estudiosos do mundo inteiro. Temos instituições democráticas consolidadas. Aqui não há radicalismo. Este é um País maravilhoso, de dimensões continentais. Um País assim não pode representar risco. Isso é negociação mal feita. Parece alienação das autoridades maiores em relação às decisões das autoridades monetárias. Foi essa alienação que nos levou a esta situação. Não se iluda, eminente Senador Artur da Távola, foi essa a razão pela qual saiu vitoriosa a chapa presidida pelo eminente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, que vai, não tenha a menor dúvida, ter discernimento e responsabilidade para realizar um trabalho à altura da confiança e da esperança que o povo brasileiro deposita na sua administração. Não tenho dúvida disso. Mais de dois terços da sociedade brasileira estão obviamente lhe dando todo o apoio. Se V. Exª me permitir, devo dizer que quis fazer um aparte ao nosso nobre colega Senador Romero Jucá, que não foi generoso como V. Exª foi. S. Exª como que chamou o Presidente eleito à responsabilidade, como se dissesse: “Presidente do Banco Central já”. Pode ficar tranqüilo o nosso eminente e bom amigo Romero Jucá, pois o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva é o responsável por essa indicação. Tem obviamente a responsabilidade de fazê-lo em tempo hábil, mas o fará a seu juízo e não por pressão de quem quer que seja, muito menos da mídia. Queremos um Governo que represente a vontade nacional e a vontade nacional é representada pelo nosso grande Presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Muito obrigado, Senador José Alencar.

O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti) - Senador Artur da Távola, desculpe-me por interromper V. Exª, mas prorrogarei a sessão por cinco minutos, a fim de que V. Exª conclua o seu pronunciamento.

O SR. ARTUR DA TÁVOLA (Bloco/PSDB - RJ) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Senador José Alencar, V. Exª fez um longo aparte e não tenho mais tempo nem condições de respondê-lo da maneira necessária. Ficará como um agregado ao meu discurso. Espero apenas que o Presidente Lula ouça o Partido de V. Exª, que não tem, ao que parece, sido chamado para certas discussões na área econômica, e possa também ouvir as idéias que V. Exª defende com tanta acuidade e precisão. Quanto à questão momentânea, V. Exª há de convir que é um momento especialíssimo: é preciso segurar a inflação de algum modo para benefício do próprio Governo. Durante o Governo Fernando Henrique não existiu o que, agora, no final, no caso das taxas de juros, passou a existir.

Todos concordamos com V. Exª. Entretanto, acredito que a taxa de juro não é propriamente questão da vontade do governante, mas da imposição dos fatos econômicos, do tipo de especulação que se estabelece sobre a economia e dos bombardeios no mercado financeiro. No entanto, ela não opera nos fundamentos macroeconômicos de um país, mas, sem dúvida, em um viés importante.

Desse modo, espero que o novo Governo ouça V. Exª - infelizmente, não tenho notado o PL ser ouvido na área econômica, como me parece que deveria -, o que levará, efetivamente, a essa lucidez. Oxalá possa ele executar, depois da reforma da Previdência, a reforma fiscal e tributária, tão necessária ao País, a fim de que haja uma modernização.

Senador José Alencar, V. Exª não estava no Congresso nesse tempo, mas não tenha dúvida de que quem não aprovou a reforma da Previdência foi o Congresso. Nós participamos do processo, vimos a quase destruição da Câmara e sentimos a violenta pressão. No caso da Previdência, a Base optou por aquele caminho mais popular. Sabemos que a reforma deixou de ser feita não por vontade manifesta do Presidente da República ou pelo desejo do nosso Partido, que a defendeu até o fim, mas por deliberação do Congresso, que não procedeu à reforma tributária. Oxalá o novo Congresso possa realizar a reforma previdenciária e, posteriormente, encaminhar uma reforma tributária bastante razoável ao País. Não há dúvida.

Espero que o novo Governo possa, portanto, levar adiante essa tarefa hercúlea que busquei traduzir em meu discurso.

Agradeço enormemente ao Presidente a sua gentileza e a V. Exª, Senador José Alencar, a qualidade do seu aparte, que honrou meu pronunciamento.

Muito obrigado.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/2002 - Página 25324