Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise sobre a relação entre a desigualdade de renda e o aumento da violência no Brasil.

Autor
Carlos Patrocínio (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/TO)
Nome completo: Carlos do Patrocinio Silveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Análise sobre a relação entre a desigualdade de renda e o aumento da violência no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 21/12/2002 - Página 27298
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, INJUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, BRASIL, APREENSÃO, INSUFICIENCIA, RENDA, AQUISIÇÃO, ALIMENTOS, AUMENTO, DESEMPREGO.
  • ANALISE, RELATORIO, DESENVOLVIMENTO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), REGISTRO, DESIGUALDADE SOCIAL, BRASIL, CONCLUSÃO, ORADOR, INJUSTIÇA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, PAIS, FAVORECIMENTO, AUMENTO, VIOLENCIA.

O SR. CARLOS PATROCÍNIO (PTB - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Brasil é, de fato, um País de contrastes inaceitáveis - vamos logo dizendo! - e dificilmente compreendidos. Como é que se entende que o Brasil é um País rico se um terço da sua população vive na pobreza? O Brasil está no terço mais rico do planeta. No entanto, 22 milhões de brasileiros vivem com menos de R$80,00 por mês - são os indigentes, segundo nomenclatura técnica. Com esses R$80,00, conseguem comprar uma cesta de alimentos com o mínimo de calorias necessárias ao ser humano, ou melhor, Sr. Presidente, conseguiam fazê-lo até há pouco tempo, porque, com a inflação de novembro e dezembro, já não conseguem comprar sequer o mínimo de alimentos necessários à sua sobrevivência. E nada mais podem adquirir, nem roupas, nem calçados; só conseguem obter jornais velhos, que lhes servem de cama ou cobertor. É claro que nem pensam em comprar carne, leite, frutas ou preservativos, o que mantém o ciclo perverso da miséria à sombra dos viadutos e arranha-céus.

Além de 22 milhões de indigentes, há mais de 31 milhões de brasileiros enquadrados na categoria “pobres”, que vivem com R$160,00 por mês. Estes conseguem comprar a alimentação básica, mas não sobra nada para outros itens essenciais, como moradia, roupa, transporte e material escolar.

Mas a renda por habitante não permite colocar o Brasil entre os países mais pobres do mundo. E isso se dá não por que há muitos ricos. Na verdade, os ricos são pouquíssimos. A diferença se deve à grande, à absurda desigualdade social, à grave diferença de ganhos que coloca o Brasil como um dos países líderes no quesito “desigualdade de renda”. Para relembrar, vou repetir as porcentagens que revelam nossa fraqueza: os 10% mais ricos têm-se apropriado de cerca de 50% da renda nacional, enquanto que os 40% mais pobres ficam com 10%. A desproporção é vergonhosa, Srªs e Srs. Senadores!

De acordo com o Relatório sobre Desenvolvimento Humano das Nações Unidas, de 2001, os 10% mais ricos no Brasil ficam com 46,7% da renda nacional. Em nosso País, os ricos chegam a ganhar 30 vezes mais que os pobres. Seguindo critérios da ONU, foram comparados 92 países no quesito “desigualdade social”. O Brasil só perdeu para duas nações africanas: Malavi e África do Sul.

Ora, ser o detentor de uma das mais gritantes diferenças de renda do Planeta não é troféu para nação alguma exibir. É, no mínimo, um dado que deveria tirar o sono de muita gente. Em favor de sua reversão, deveria mobilizar-se a Nação inteira, seus dirigentes, políticos, as lideranças financeiras, o mundo empresarial, as organizações civis, as campanhas religiosas, enfim, todos os brasileiros, estejam onde estiverem, colaborem como puderem!

Além do mais, a desigualdade social não é um dado que se deixa analisar isoladamente. Ele não carrega apenas o peso de uma imensa injustiça social. Suas relações com outros fatores vão se movendo como tentáculos que esgarçam e rompem a tessitura social.

É difícil, por exemplo, não relacionar os indicadores econômicos com a questão da criminalidade. Essa percepção está presente na cabeça de muitos brasileiros.

Em março deste ano, o Instituto DataFolha fez uma pesquisa de opinião e apurou que 21% dos brasileiros consideram a segurança como o principal problema do País. Há seis anos, apenas 2% da população tinha a mesma resposta. Ou seja, a insegurança e o medo foram multiplicados por dez. Em segundo lugar, desponta o desemprego como a outra grande aflição nacional.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para grande parte da população, esses dois temas estão intrinsecamente relacionados. Tanto isso é verdade, que, quando perguntados sobre como resolver o problema, 57% dos entrevistados responderam que o Governo deveria dar prioridade a investimentos na área social, como ações de combate ao desemprego e melhorias na educação. Para outra parcela, de 38%, a solução seria aumentar o número de policiais treinados nas ruas e gastar mais dinheiro em equipamentos.

Alguns estudos têm mostrado a relação entre a falta de dinheiro no bolso e o aumento da criminalidade. Nos Estados Unidos, tais estudos já se avolumam em instituições de pesquisa. No Brasil, os economistas Marcos Lisboa, da Fundação Getúlio Vargas, e Mônica Andrade, da Universidade Federal de Minas Gerais, dedicaram-se por dois anos a uma meticulosa análise de diversos dados. Tomando a taxa de homicídios na população jovem, especialmente entre 15 e 19 anos, perceberam que o número de crimes diminuía diante de fatores como o aumento do salário real e a queda de desigualdade, por exemplo.

Falando à revista Época, edição de 15 de abril de 2002, o economista Marcos Lisboa revelou que os dados estudados permitem prever que um aumento de 1% na taxa de desigualdade provoca um aumento de 0,2% no índice de homicídios, entre os homens, na idade de 25 anos.

Sabemos, nobres Colegas, que a relação entre desigualdade de renda e violência nas ruas não é a única a estar presente quando se toca em temas de natureza econômica. Mas não se pode ignorar uma cadeia de fatores que seguem encarrilhados. A desigualdade está estreitamente vinculada à má distribuição de renda, que se agrava com a queda da participação dos salários na renda nacional; que compromete o nível de desemprego; que leva a força de trabalho ao mercado informal; que faz baixar a remuneração média do trabalhador e assim por diante, numa cantilena de seqüências desfavoráveis e negativas.

Precisamos de ações capazes de interromper essa cadeia maligna. Não será de uma hora para outra que o quadro se reverterá. Mas temos de implantar as medidas necessárias agora, para colhermos as melhorias em futuro não muito longínquo.

Tenho certeza de que o crescimento econômico seria capaz de alterar o clima social nas regiões mais pobres e mais violentas, por trazer esperança de emprego e de uma vida melhor aos que foram excluídos do mercado. Não vejo no crescimento econômico a varinha de condão que vai operando milagres onde toca. Se for para crescer e não dividir o bolo, ficaremos na mesma.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temos de contar com instituições fortes, que tenham a capacidade de distribuir os ganhos de forma igualitária, e com instituições democráticas, que favoreçam o acesso a bens primordiais, como saúde, educação, moradia. Mais ainda, Sr. Presidente, precisamos de instituições justas, que ponham fim à impunidade e aos privilégios.

Sr. Presidente, ontem, por ocasião da aprovação da Lei Orçamentária Anual, em sessão do Congresso Nacional, tive a oportunidade de fazer referência ao salário mínimo. Elogiei a Comissão Mista do Orçamento que provisionou recursos necessários para que se possa conferir, no próximo ano, um salário mínimo de pelo menos R$240,00. Mas temos sentido essa dificuldade em aumentar o salário mínimo no Brasil. E todos os jornais de hoje dão conta de que, em dois minutos, o Congresso Nacional, a Câmara dos Deputados e o Senado, aprovou uma despesa adicional para o próximo ano de cerca de R$2 bilhões, com o aumento dos Parlamentares. Trata-se de um aumento em cascata: aumenta-se a remuneração dos Deputados e Senadores e, conseqüentemente, a dos Vereadores. Portanto, fizemos um esforço hercúleo para arranjar R$4 bilhões de provisão para o Orçamento do ano que vem e, em poucos minutos, vamos gastar com os políticos do Brasil mais de R$2,2 bilhões.

Sabemos, Sr. Presidente, que os Parlamentares precisam ganhar mais. Há muitos anos, não temos qualquer aumento, e os Parlamentares de todos os níveis, os políticos de maneira geral talvez sejam os agentes sociais mais importantes do Brasil, portanto, evidentemente merecem o aumento. Mas antes temos que olhar para os miseráveis deste País. Foi o que disse ontem, por ocasião da aprovação do Orçamento Geral da União para o ano de 2003.

Espero, firmemente, que o Presidente Lula, que só ganhou essa eleição porque tem dito que vai cuidar dos pobres deste Brasil, consiga montar um Ministério à altura - e parece que está conseguindo -, um Ministério eclético, que vai lhe dar uma ampla base de sustentação, o que é necessário. Temos que perceber isso. O próprio Partido dos Trabalhadores precisa entender que Lula tem de fazer algumas concessões, porque precisa de uma boa base de sustentação no Congresso Nacional. Mas que o Governo Lula volte efetivamente suas ações, seu governo para as pessoas mais pobres do nosso País, que, conforme já disse, apresenta um desonroso lugar, no concerto das nações, em relação à distribuição de renda.

Faço votos de que V. Exªs que aqui permanecerão entendam que o povo brasileiro precisa diminuir a sua pobreza.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/12/2002 - Página 27298