Discurso durante a 10ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à determinação do presidente George W. Bush e de seus auxiliares em insistirem com o plano de guerra contra o Iraque, apesar de todas as manifestações pela paz no Oriente Médio. Cumprimentos ao presidente Lula pela indicação do Sr. José Bustani para a embaixada brasileira no Reino Unido e pela manifestação contrária à guerra.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • Críticas à determinação do presidente George W. Bush e de seus auxiliares em insistirem com o plano de guerra contra o Iraque, apesar de todas as manifestações pela paz no Oriente Médio. Cumprimentos ao presidente Lula pela indicação do Sr. José Bustani para a embaixada brasileira no Reino Unido e pela manifestação contrária à guerra.
Aparteantes
Serys Slhessarenko.
Publicação
Publicação no DSF de 06/03/2003 - Página 2894
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • IMPORTANCIA, MANIFESTAÇÃO, DEFESA, PAZ, MUNDO.
  • CRITICA, CONDUTA, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), MANUTENÇÃO, PLANO, GUERRA, DESTRUIÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, IRAQUE.
  • CONGRATULAÇÕES, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INDICAÇÃO, JOSE MAURICIO BUSTANI, DIPLOMATA, EMBAIXADA DO BRASIL, REINO UNIDO, REPUDIO, GUERRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), IRAQUE.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por um apelo do Papa, em todo o mundo realiza-se hoje, uma Quarta-feira de Cinzas, um culto pela paz.

Interessante esse Papa, que vai ter o seu nome na História por ter sido o primeiro pontífice não italiano, que saiu dos territórios da Itália para percorrer o mundo - de uma maneira quase, eu diria, exagerada, pelo número de países atingidos -, e que sofreu um atentado, após o qual nunca mais voltou a ser o mesmo, já que era atlético e de físico em condições avantajadas. Alquebrado pela doença, muitos têm defendido a tese de que Sua Santidade deveria renunciar pela debilidade de sua saúde. Não só o Sumo Pontífice não fez uma opção pela renúncia, como se mantém numa posição de respeito por toda a Humanidade.

É claro que o Presidente americano não deve estar dando muita importância ao fato, mas um enviado do Papa irá lhe entregar, hoje, uma carta especial de S. S., apelando-lhe, em prol da Humanidade, pela paz no mundo.

S. S. já enviou, anteriormente, um emissário ao Iraque, apelando ao Presidente daquele país para que se esforçasse em atender as solicitações da ONU, dando uma demonstração de que deseja a paz.

Independentemente do apelo papal, há muito não se via, no mundo, quantidade tão grande de gente nas ruas, em manifestações impressionantemente extensas pela paz, a começar nos Estados Unidos. Apesar de a imprensa americana, como grande parte da imprensa mundial, de certa forma estar apoiando as iniciativas pró-guerra, multidões e multidões de americanos estão percorrendo as ruas das mais variadas cidades, como Nova Iorque e Washington, num apelo pela paz. As maiores manifestações da história de Londres - maiores, inclusive, do que aquelas ocorridas após a vitória dos aliados na grande guerra - estão sendo feitas hoje, pela paz, contra a presença de tropas inglesas nessa guerra que se antecipa e que espero não aconteça.

O que falar da França, cujo governo, desde o início, lidera uma movimentação nesse sentido? Numa atitude corajosa, a França, a Rússia e a China - três países com direito a veto no Conselho de Segurança - estão manifestando abertamente a sua perspectiva de vetar a iniciativa da Inglaterra, dos Estados Unidos e da Espanha. Assim, praticamente o mundo inteiro está na mesma movimentação pela paz.

A queima de alguns mísseis iraquianos que os emissários da ONU consideraram de alcance exagerado - se não me engano, mais de 150 km - demonstra que aquele governo quer cumprir as decisões da ONU.

Amanhã e sexta-feira, o Conselho de Segurança irá se reunir e apresentará o parecer dos técnicos da ONU, opinando sobre se o Iraque está ou não cumprindo as determinações que lhes foram feitas - e as informações da imprensa são de que os técnicos dirão que sim, que o Iraque está cumprindo as determinações.

É impressionante que todos esses fatos estejam ocorrendo.

A Humanidade, os países, o Secretário-Geral da ONU, em várias manifestações e em diversos lugares do mundo, estão dizendo que a ONU espera que não haja guerra, pois o Iraque está cumprindo as determinações, mas o Presidente americano e os seus auxiliares, de uma maneira fria, sem nenhuma preocupação de conquistar um quisto da simpatia mundial, continuam a remeter tropas - já são mais de 300 mil americanos e uma pitada de ingleses que se encontram ao redor do Iraque - e a fazer chantagens dolorosas de se assistirem, como as feitas à Turquia, um país limítrofe com o Iraque, que vive uma grande crise de fome, de miséria e de divergências étnicas, inclusive no seu território. Sabendo disso, os americanos ofereceram-lhe, a fundo perdido, um empréstimo de US$30 bilhões para que permita que tropas americanas passem pelo seu território para invadir o Iraque.

Na semana passada, num gesto importante e impressionante, o Parlamento turco, apesar das pressões totais pelo dinheiro, muito importante para a recuperação do país, surpreendendo a tudo e a todos, não aprovou a moção que permitia às tropas americanas saírem da Turquia para bombardear o Iraque.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Com o maior prazer.

A Srª Serys Slhessarenko (Bloco/PT - MT) - Senador Pedro Simon, nos últimos dias, realmente, temos estado com essa preocupação muito grande. Naquela discussão com o nosso “Embaixador”, o Ministro Celso Amorim, a sua participação foi vibrante. Além disso, em outros momentos, já ouvi V. Exª falar contra a guerra. Senador Pedro Simon, acredito que os povos, nas ruas, e os parlamentares, nas tribunas, inviabilizarão essa guerra. Tenho a mesma fé que V. Exª e tantos outros Senadores têm, porque já ouvi, desta e de outras tantas tribunas brasileiras posicionamentos contra ela. Acreditamos, sim, que essa conflito não acontecerá. Dizia V. Exª outra dia que alguma coisa lhe dizia que a guerra não aconteceria. Eu também digo, intuitivamente, a mesma coisa: ela não pode acontecer! Acredito que se todos os parlamentos se posicionassem com a mesma postura do parlamento turco, se os povos, em todo o planeta, forem para as ruas - isso tem que ser uma movimentação mundial, já que não atingirá apenas o Iraque e os Estados Unidos, mas sim o mundo inteiro - com certeza, de uma forma ou de outra a guerra estaria inviabilizada, sim! Penso sempre, Senador Pedro Simon, que aquele fatídico 11 de setembro, que ninguém queria e tampouco aceitou, que todos nós repudiamos, em que o mundo inteiro lamentou e chorou tantas vidas perdidas - e não vamos aqui fazer relatos de quantas vidas os Estados Unidos já exterminaram pelo mundo com suas políticas, não vamos nos contrapor a isso - infelizmente, não serviu de exemplo para o Sr. Bush. O 11 de setembro, sob o meu ponto de vista, teria que ter servido de alerta para a política maior americana, ou seja, de que não adianta se posicionar como tendo a força do maior poderio bélico, econômico e político. De que adiantou? O Pentágono foi intempestivamente torpedeado. O World Trade Center foi colocado no chão em poucos segundos. Ou seja, está passando da hora de o Sr. Bush tomar consciência de que não adianta se posicionar como o imperialista que pode tudo, porque seu povo também paga caro por isso, como pagaram com a perda de mais de seis mil vidas com a derrubada do World Trade Center. Senador Pedro Simon, eu diria que se ocupássemos esta tribuna - dirijo-me a V. Exª, tendo em vista a assiduidade com que V. Exª tem buscado esta tribuna -, a exemplo de outros parlamentos do mundo, seguindo os seus exemplos, posicionando-nos no sentido de incentivar, de alguma forma, como Parlamento brasileiro, outros e outros parlamentos do mundo, o planeta Terra, como um todo, inviabilizaria essa guerra, sim, Senador Pedro Simon! E, a partir daí, acredito que muita coisa terá de mudar! Temos que estimular outros valores. Não podemos continuar estimulando os valores da competição, da disputa, às vezes, as mais infames disputas, aquelas que não se preocupam com a morte de crianças; que, na África, a população esteja sendo exterminada pela doença, pela fome, pela miséria; que, em tantos outros países do mundo, a droga esteja tomando conta, além de inúmeras doenças e tudo o mais. Portanto, precisamos começar a tratar a educação com muita seriedade no sentido de mudança de valores. Chega de competição! Chega de busca desenfreada de conquistar poder político, econômico, bélico! Vamos buscar a solidariedade e a fraternidade. Isso tem que ser buscado com educação - e educação de muita qualidade - para transformar realmente as mentalidades pela construção de um mundo melhor para todos nós. Obrigada.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Não somente agradeço a honra do aparte como o incorporo ao meu pronunciamento, porque me identifico com o que disse V. Exª, e faço questão de, se fosse o caso, repetir palavra por palavra do que disse V. Exª, porque V. Exª está absolutamente correta, além de ter sido muito feliz em seu aparte.

Fez bem V. Exª em recordar a queda das torres. Aquele foi o momento em que, talvez, mais tenha o povo americano recebido a solidariedade mundial. Não há país, não há canto da humanidade que não tenha se solidarizado com a nação americana, que não tenha pensado no episódio como uma barbárie, um absurdo, algo que tenha ido além do imaginável: fazer com que milhares de pessoas morressem no seu local de trabalho. Uma petulância, um exagero, um absurdo! Também uma organização, mas, na verdade, em termos de atentado, foi o maior que se viu; e foi o que teve maior repulsa da humanidade. Ali, fora outro Presidente, fora o antecessor do Sr. Bush, tenho a certeza de que ele teria aproveitado aquele fato para criar um movimento antiterror, para criar uma mobilização contra a violência, com a qual se identificariam os países do mundo inteiro. E, hoje, o americano estaria vivendo um momento de grande solidariedade mundial. Deus, me perdoe! Deus me perdoe, não devemos julgar para não sermos julgados, mas, a impressão que se tem é que aquele brutal atentado serviu para que o Sr. Bush externasse o que ele já pretendia fazer, e que não sabia como iniciar, e aquele atentado lhe deu a chance de começar. Em cima do atentado, ele começou o movimento mais violento, inclusive contra os direitos humanos do povo americano, criando um órgão de defesa interna que tem o direito de penetrar nos lares, na vida íntima de todos os americanos; fazendo com que, para entrar nos Estados Unidos, embaixadores e ministros de outros países tenham que passar por uma ampla revista, tirar aos sapatos e tudo o mais. Foi a partir dali que o Sr. Bush iniciou essa caminhada.

Em primeiro lugar, coitado do Afeganistão, um país que vive de guerra em guerra, no chão; uma ação coitada, sem apoio, sem nada, um bombardeio que não terminava mais! Não sei se queriam pegar o cidadão Bin Laden, mas, na verdade, não quiseram, não o pegaram. 

E agora, o homem que está lá, o senhor ditador do Iraque: um homem cruel, um homem brutal, um homem violento, um homem que merecia estar na cadeia, um homem que não devia estar presidindo um país, um homem que tem a repulsa da Humanidade! Mas é só ele. Via ontem, numa televisão americana, um comentarista americano perguntando quem mais poderia atingir os Estados Unidos: o Iraque ou a Coréia do Norte. Estamos correndo atrás para ver se o Iraque tem arma. No entanto, a Coréia diz ter arma - e o mundo todo sabe que ela tem. O presidente da Coréia diz ter armas e que pode atingir os Estados Unidos. E, o presidente americano se refere com a maior elegância à Coréia: “Vamos discutir diplomaticamente. Esta é uma luta diplomática que, quando chegar a hora, vamos conversar com a Coréia”.

No Iraque, está se reunindo, amanhã, a Corte de Segurança, e o Sr. Bush está mandando mais 60 mil homens; e o Secretário de Estado americano está declarando, com todas as letras, “que vai pensar”. Se existir hipótese de a moção americana, britânica, espanhola não ser aprovada ou ser vetada eles já estão pensando em retirar a moção. E, aí, acreditam que a moção anterior já serve para o ataque. Se a moção anterior já serve para o ataque, para que apresentar a segunda moção? Debocham da humanidade, debocham do conjunto da sociedade ao fazer a afirmativa de que vão invadir o Iraque independentemente de moção, com moção ou sem ela. É claro que eles estão fazendo o máximo imaginável para que a moção seja aprovada; é claro que estão fazendo o possível e o impossível para que a moção seja aprovada.

            Homens e mulheres, nus, protestaram no Chile, país que faz parte do Conselho de Segurança. Não sei o que eles estão conversando com o Chile, com o México e com outros países para que votem a favor deles no Conselho de Segurança.

            Aquele membro do Itamaraty que tentaram desmoralizar porque era presidente do órgão especializado em investigar e combater armas atômicas estava fazendo um trabalho excepcional e havia sido reeleito por quatro anos, por unanimidade. Ele estava travando um diálogo com o Iraque para que aquele país permitisse que os interventores fossem lá investigar as armas. E o americano o expulsou, derrubou esse brasileiro. O PT fez muito bem, e o Presidente Lula, em indicá-lo para embaixador, hoje, em Londres. Já agora imaginamos que aquele embaixador brasileiro estava, com a sua ação, perturbando a caminhada que os americanos faziam rumo à guerra.

Felicito o Presidente Lula, Sr. Presidente, pela coragem com que ele se tem manifestado. Acho importante a sua atuação. Sabemos que o americano está batendo boca, está ofendendo o Presidente francês. Manchetes dos jornais italianos perguntam à França se ela não se lembra que os americanos é que a salvaram na guerra. Como se a França, para agradecer o trabalho que o americano fez, digno de admiração e amor no mundo inteiro, na Segunda Grande Guerra, tivesse que dar apoio, agora, para a violência que ele quer praticar. Se o americano age assim com as grandes nações, merece respeito o Governo brasileiro quando, com serenidade, mas com firmeza, manifesta sua disposição contrária à guerra.

            Um senador, desta tribuna, não me recordo quem, disse que tinha uma preocupação muito grande e a manifestou ao Chanceler quando S. Exª esteve aqui: o Brasil precisa muito dos Estados Unidos, do Fundo Monetário e do Banco Mundial, órgãos nos quais o americano tem grande força. E como é que o Brasil, que precisa muito do americano, da Alca e dos órgãos mundiais vai, de um lado, combater a invasão e, de outro lado, dialogar com os Estados Unidos? A preocupação dele era com o cuidado que o Brasil deveria ter para que seus interesses não saíssem prejudicados. Respeito esse senador, mas fico com a posição do Governo brasileiro. O Governo brasileiro, antes mesmo de o Presidente Lula assumir, já manifestava o seu interesse em dialogar como o Governo americano. Todos nós sabemos da força e do poderio da economia americana. Todos nós sabemos que para importar e exportar, em suma, para respirarmos lá fora, é muito importante a ação do Governo americano. Contudo, nem por isso o Brasil poderia abdicar de seus valores, de sua responsabilidade, da determinação de dizer que o Governo brasileiro, que os políticos brasileiros, que o povo brasileiro, que a sociedade brasileira, em uma unanimidade nem sempre conseguida como a de agora, está contra a guerra e a favor da paz.

            O que não quer dizer que não queiramos dialogar com os americanos mais adiante sobre questões importantes para a nossa economia e para a deles também. Mas isso deve ser feito com uma posição altiva de um povo e de um governo que coloca o bem da humanidade acima de qualquer coisa.

            Analistas mundiais têm dito algo que me parece realmente importante. Olhando para o mundo e vendo a prepotência com que o americano se conduz, reconhecemos que hoje há uma nação que domina a humanidade. Chegamos a sentir saudade dos tempos da guerra fria, quando havia dois blocos: a Rússia de um lado e os Estados Unidos de outro. E o americano não falava dessa forma e com essa petulância e grosseria que fala agora. Havia discussão, havia debate, havia uma tentativa de entendimento entre Rússia e Estados Unidos. Agora, a Rússia, coitada, está humilhada, numa posição subalterna. A França e a Alemanha, por sua vez, fazem algumas manifestações. Mas, na verdade, temos uma superpotência, maior - repito o que já disse desta tribuna -, muito maior do que o Império Romano.

            Na época do Império Romano não havia televisão, não havia rádio, não existia o avanço da cultura, o domínio sobre todas as formas da cultura - música, cinema, língua, de tudo o que se possa imaginar -, como o exerce hoje o americano. Os comentaristas europeus dizem que hoje há duas forças no mundo: o americano e a opinião pública mundial, que é a força que se contrapõe a ele; a opinião pública mundial, que, quando sente que tem uma idéia relevante, a apresenta, como agora. Bandeiras as mais variadas, ideologias as mais variadas, raças as mais variadas, religiões as mais variadas, regimes políticos os mais variados, mas uma unidade, que é a paz no mundo.

A força da posição popular, a vontade popular, a manifestação da humanidade inteira é a única força que existe, que tem valor e que tem peso para se contrapor à do americano.

Continuo, minha querida Senadora, com a minha convicção. Vou, daqui a pouco, à Catedral, rezar, como o mundo inteiro, pela paz no mundo e para que Deus olhe um pouco para o Presidente Bush, que está tão extasiado e com a determinação de que, para se eleger, tem que haver a guerra no Iraque. Está se perpetuando no mundo essa filosofia de que a guerra é inevitável para a vitória do Presidente Bush. Porque se S. Exª recuar, pelo que já fez, ele estará cometendo um ato tão ridículo! 

Triste realidade essa em que o Presidente de uma nação tão rica, tão potente, com tantas obras, com tanta capacidade de crescer, de progredir, de se desenvolver, imagina que precisa colocar como grande obra do seu governo, para se reeleger, destruir uma nação. Essa é a grande causa mobilizadora do Sr. Bush, homem de fisionomia estranha. Olho S. Exª na televisão, observo seu olhar, sua frieza, inclusive quando cumprimenta autoridades estrangeiras ou quando fala, como, por exemplo, agora, ao lançar o Conselho de Defesa Interna, um órgão de não sei quantos bilhões de dólares. Seu olhar é frio, sua maneira de ser é de uma pessoa predeterminada a certos fatos, o que me assusta muito, Sr. Presidente, pois me parece ser daquelas pessoas compenetradas de que estão certas, de que estão no caminho certo. E quem está no seu caminho, querendo atrapalhar, deve ser colocado de lado, porque são pessoas inimigas.

Que Deus ilumine o Sr. Bush! Que bom seria se ele, ao final, na reunião de depois de amanhã, deixasse o Conselho votar em liberdade, sem coação, sem pressão!

Estamos discutindo, agora, Presidente José Sarney, a escuta telefônica na Bahia, problema que V. Exª tem sob sua responsabilidade, e o Brasil a publica em manchetes, quer cobrança sobre quem a fez, deseja saber como foi realizada. E se está noticiando a escuta telefônica na ONU, nas embaixadas dos países-membros do Conselho de Segurança. Está-se afirmando que isso é real e que, por determinação do órgão de segurança americano, teria havido escuta, fiscalização e espionagem, junto às embaixadas e aos embaixadores representantes dos países participantes do Conselho de Segurança. Meu Deus do céu!

Quando lecionava na universidade, fui daqueles que sempre defendi que teria sido um equívoco do mundo construir a sede da ONU nos Estados Unidos. Eu sempre disse que o ideal seria construí-la em um país como a Suíça - não precisaria estar sediada um grande país, mas ter a serenidade necessária para as suas decisões. No entanto, naquela altura, o mundo inteiro aplaudiu o americano como o herói da Segunda Grande Guerra, como salvador da democracia. A própria Rússia, todos concordaram que a ONU deveria estar sediada nos Estados Unidos. Mas, agora, estamos vendo que é difícil atuar nos Estados Unidos, mesmo na ONU, contrariando interesses que podem ser do Presidente Bush e até do Governo americano, mas que não são da humanidade. Não sei o resultado dessa caminhada.

Quando vemos nos jornais, como ontem, na televisão, o envio de mais de 60 mil homens e outros muitos aviões de bombardeio; quando vemos aviões de bombardeio americanos em Londres, local de onde devem sair, como fizeram há dez anos, na guerra contra o Iraque; quando vemos as operações que estão sendo feitas, perguntamos, em primeiro lugar, se a França, a Alemanha, a China, a Rússia, nossos irmãos do Chile e do México e os demais membros do Conselho de Segurança terão condições, coragem e possibilidade de manterem o seu “não”. Em segundo lugar, perguntamos se o Sr. Bush recuará ou investirá contra a humanidade, contra a ONU e contra todos, indo até o fim. Deus permita que isso não aconteça, Sr. Presidente, porque não me lembro de uma guerra mais estúpida, que contasse com a maior antipatia da humanidade, do que essa que está na iminência de acontecer.

Hitler invadiu a Europa, adonando-se, de uma hora para outra, de países como a Áustria. Quando se acordou, suas tropas estavam apoderando-se da Áustria. Mas, naquele momento, o mundo não enxergava. Era um mundo em guerra. Era um ditador louco, assumindo, pelo bem e pelo mal, o que queria. Agora não! Essa é uma guerra de conquistas. O que move essa guerra? Será o petróleo? Penso que sim. Será a importância de se colocar um pé maior no Oriente Médio? Parece que sim. Será o temor relativo de que a França se aproveite disso para entrar um pouco mais? Parece que sim.

No entanto, espero que contra tudo e todos, desta vez, no duelo Estados Unidos e população mundial, pensamento do mundo e vontade global, os Estados Unidos recuem. Se ainda não aconteceu, penso que não vai ser tão fácil, Sr. Presidente. É claro que a vitória é fácil. É claro que bombardear, destruir o Iraque e derrubar seu governo não é nada difícil, mas o que virá depois serão meses muito amargos. Não sei se não se enfrentará uma guerra santa por parte dessa gente já tão complicada, desse islamismo que tem dado margem a posições tão radicais e difíceis, que muito têm prejudicado a humanidade.

Meus Deus, não sei e não saberei responder em que pé estaremos daqui a seis meses, se a guerra tiver acontecido. É claro que alguns estarão bem. É interessante como as figuras do Presidente e do Vice-Presidente americanos estiveram, praticamente, sempre ligadas às indústrias do petróleo e do armamento, as duas diretamente ligadas ao que está acontecendo. Nunca estiveram tão felizes as indústrias armamentistas do mundo; elas, que choraram o fim da guerra fria, que lamentaram, profundamente, aquilo que parecia o início da paz permanente, estão vivendo seu momento mais glorioso, desde que terminou a Segunda Guerra.

Creio nas forças positivas da humanidade. Creio na força do mundo inteiro pensando, refletindo, rezando e se convencendo de que o bem deve ganhar, no momento em que, talvez, como nunca na história da humanidade, muitas forças estão volvidas no mesmo sentido, católicos, cristãos, maometanos, judeus, pessoas de diferentes raças, de diversas religiões, ateus, seja quem for, seja qual força lhes orienta os passos. Acredito que essa fantástica força telúrica que está mobilizando a humanidade inteira vença. E, confiando que ela vença, fico aqui, na humildade do meu grão de areia, fazendo minha parte para que consigamos a paz para a humanidade.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente, agradecendo a gentileza de V. Exª, e ao nosso Senado, que, na hora oportuna, tomou sua posição. Por unanimidade, esta Casa manifestou-se em solidariedade à paz na humanidade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/03/2003 - Página 2894