Discurso durante a 14ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Lançamento pelo Governo Federal, hoje, do Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. Defesa de mudança na legislação para coibir o trabalho escravo no Brasil. Apoio ao movimento "O Pará é que vale", em prol da instalação da nova siderúrgica da Companhia Vale do Rio Doce naquele Estado. Necessidade de revisão da legislação que criou a Compensação Financeira sobre a Exploração de Recursos Minerais. (como Lider)

Autor
Ana Júlia Carepa (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Ana Júlia de Vasconcelos Carepa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA MINERAL.:
  • Lançamento pelo Governo Federal, hoje, do Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. Defesa de mudança na legislação para coibir o trabalho escravo no Brasil. Apoio ao movimento "O Pará é que vale", em prol da instalação da nova siderúrgica da Companhia Vale do Rio Doce naquele Estado. Necessidade de revisão da legislação que criou a Compensação Financeira sobre a Exploração de Recursos Minerais. (como Lider)
Aparteantes
João Alberto Souza.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2003 - Página 3209
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA MINERAL.
Indexação
  • REGISTRO, LANÇAMENTO, PLANO NACIONAL, ERRADICAÇÃO, TRABALHO, ESCRAVATURA, ELABORAÇÃO, COMISSÃO INTERMINISTERIAL, PARTICIPAÇÃO, ENTIDADE, SOCIEDADE CIVIL, APOIO, ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO (OIT).
  • GRAVIDADE, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, ESPECIFICAÇÃO, ESTADO DO PARA (PA), DEFESA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, DESAPROPRIAÇÃO, TERRAS, OCORRENCIA, ESCRAVATURA, NECESSIDADE, COMBATE, IMPUNIDADE.
  • APOIO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, MUNICIPIO, MARABA (PA), ESTADO DO PARA (PA), PROTESTO, COMPANHIA VALE DO RIO DOCE (CVRD), CONSTRUÇÃO, INDUSTRIA SIDERURGICA, ESTADO DO MARANHÃO (MA), FALTA, BENEFICIAMENTO, RECURSOS MINERAIS, REGIÃO, EXTRATIVISMO.
  • IMPORTANCIA, REVISÃO, LEGISLAÇÃO, ROYALTIES, AMBITO, REFORMA TRIBUTARIA, MELHORIA, COMPENSAÇÃO FINANCEIRA, REGIÃO, MINAS, PROMOÇÃO, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA. Como Líder. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Senadora Lúcia Vânia, que agora preside a sessão, ainda mais nesta nossa semana. Quem dera a nós, mulheres, que nos fosse dedicado não só um dia, mas que, durante todos os dias, pudéssemos pensar sobre a situação das mulheres, fazendo uma reflexão positiva sobre os avanços já conquistados, mas também uma reflexão sobre o que ainda precisamos conquistar e sobre o quanto ainda há milhares de mulheres que precisam conquistar o seu direito de viver as nossas diferenças com direitos iguais. Com certeza, seria melhor. Mas acho que estamos dando passos nessa direção.

Venho aqui registrar duas situações. A primeira é que hoje, às 15 horas, foi lançado, no Palácio do Planalto, o Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. Eu estava presente nesse ato, junto com o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Ministros de Estado, entre eles quem coordena esse trabalho, o Secretário Nacional de Direitos Humanos, Nilmário Miranda, e o Ministro do Trabalho e Emprego, Jacques Wagner.

Esse Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo no Brasil foi elaborado, na verdade, por uma comissão criada no início do ano passado no âmbito do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, do Ministério da Justiça. Ela foi composta por representantes de vários Ministérios, entre eles o Ministério do Trabalho, o Ministério do Desenvolvimento Agrário e também entidades da sociedade civil, como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação dos Juízes Federais, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) - estava presente Dom Tomás Balduíno, que entregou, simbolicamente, o Plano ao Presidente Lula -, o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, além de uma representação da OIT- Organização Internacional do Trabalho.

Faço questão de registrar que o Plano de Erradicação do Trabalho Escravo contará com o apoio da OIT. Esse trabalho foi iniciado no ano passado, portanto ainda no outro Governo. O plano era de combate ao trabalho escravo, mas, a partir deste Governo, transformou-se no Plano para Erradicação do Trabalho Escravo, pois não é possível que, em pleno séc. XXI, ainda existam, segundo estimativa do próprio Ministério do Trabalho, 25 mil trabalhadores submetidos a condições análogas à do trabalho escravo no Brasil. Segundo dados da CPT de 2002, foram constatados, por meio de denúncias, 148 casos de exploração de trabalho escravo, envolvendo 5.665 trabalhadores. Desse total, 117 casos, que totalizam 4.333 trabalhadores, ocorreram no meu Estado, o Pará, que tem o triste título de campeão do trabalho escravo no Brasil.

Outros Estados em que a incidência de trabalho escravo é grande são Maranhão e Mato Grosso. Contudo, de 5.665 trabalhadores libertados pelos grupos móveis, mais de 4.300 estavam no Estado do Pará, o que mostra o quanto o nosso Estado contribui infelizmente para essa prática desumana que ainda ocorre em nosso País.

O pior é que exatamente nessas regiões em que ocorre o trabalho escravo encontram-se os mais baixos valores de Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH. Exploram trabalho escravo não apenas os grandes fazendeiros, mas também e infelizmente empresas que tiveram o apoio de agências de desenvolvimento, como da extinta Sudam, e que receberam financiamento público de instituições como o Banco da Amazônia.

Recentemente, no Pará, foram presos o ex-Deputado Federal Augusto Farias e sua irmã - não é a primeira vez que sua fazenda é denunciada e nela são encontrados trabalhadores escravos - pela prática do trabalho escravo.

Sr. Presidente, é importante a nossa participação, porque existe uma série de ações que dependem do Poder Legislativo. Já existem 18 iniciativas em tramitação no Poder Legislativo, algumas delas são de autoria do ex-Senador do meu Estado, Ademir Andrade, e do Deputado Federal Paulo Rocha, que continua no mandato. A proposta do Deputado Federal Paulo Rocha realmente foi iniciada antes, mas até hoje não consegue tramitar na Câmara Federal. O projeto do Senador Ademir Andrade, na verdade, é uma emenda à Constituição que permite a expropriação da terra onde for constatado o trabalho escravo, porque realmente não há condições de um cidadão continuar dono de uma terra se ele escraviza seres humanos. Essa emenda já foi aprovada nesta Casa Legislativa, no Senado Federal, mas infelizmente ainda está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara Federal.

O Ministro do TST Francisco Fausto já fez, tanto ao antigo Presidente da Câmara como ao atual, solicitação para que possa ser agilizada a votação dessa emenda constitucional. É uma vergonha internacional para o País a existência dessa prática. Portanto, faço este registro.

Além de saudar o Governo por lançar o Plano Nacional Para a Erradicação do Trabalho Escravo, alerto esta Casa Legislativa para que as ações legislativas possam ser votadas o mais urgente possível, porque, com certeza, há impunidade. Uma única pessoa até hoje foi condenada por trabalho escravo! Uma única pessoa! E sabem qual foi a condenação? Teve de doar algumas cestas básicas.

Então, é necessário que tenhamos também uma legislação mais rígida, porque a impunidade é a maior incentivadora do trabalho escravo e da violência no nosso País. Queremos o fim da impunidade e a erradicação, não só o combate, do trabalho escravo.

Como Senadora do Estado em que há a maior incidência do trabalho escravo, acompanharei diuturnamente essa situação, porque não quero mais ver o nosso Estado com esse triste título de campeão.

Sr. Presidente, no domingo à noite, no município de Marabá, no sudeste do Pará, ocorreu um dos maiores atos que a população já fez em defesa dos seus interesses. Trata-se da campanha “O Pará é que vale” com o qual o povo está tentando sensibilizar a Companhia Vale do Rio Doce, que tem a maior parte da exploração no Estado, inclusive com a perspectiva de ampliar essa exploração para outros minérios, porque, além do ferro, do ouro, também há a exploração do níquel, do cobre e de manganês. Ou seja, além desses outros minérios que a Vale do Rio Doce também explorará, com certeza, o Estado do Pará, com o seu imenso potencial mineral, é hoje o maior investimento da Companhia Vale do Rio Doce.

Mas a Companhia Vale do Rio Doce, em associação com outras empresas, construirá, apesar do ferro e do buraco ficar no Estado do Pará, uma siderúrgica no Maranhão. O povo paraense está protestando contra essa situação. Inclusive pretendemos promover uma discussão desapaixonada, séria, que realmente possa avaliar, principalmente nos Estados onde existem tais riquezas naturais, se o valor da Compensação Financeira sobre a Exploração de Recursos Minerais, CFEM - petróleo, gás natural, minerais e água para a geração de energia -, realmente está valendo a pena para os referidos Estados.

Tenho certeza de que não haverá nenhum empecilho para aprovação da matéria na Comissão de Assuntos Econômicos. A subcomissão discutirá o que antigamente se chamava de royalties para que não só a alíquota dessa compensação financeira possa ser ampliada, como melhor distribuída, porque não só o município em que a mina se localiza sofre as conseqüências pela extração, mas principalmente todos os municípios que estão no entorno da mina. É uma discussão que exige revisão.

A legislação que criou a CFEM - Compensação Financeira Sobre a Exploração de Recursos Minerais - existe há catorze anos. É necessário que a submetamos a revisão, principalmente no momento em que será discutida a Reforma Tributária nosso País.

O povo do Pará não está mais disposto a perder ou a ficar apenas com os buracos. Queremos também a oportunidade de ter uma política de desenvolvimento. Por isso, tomamos essa iniciativa, porque, para nós, não se trata apenas de discutir a siderúrgica, mas também a possibilidade de termos mais recursos para que possamos fazer investimentos diversos na política de geração de empregos da nossa região, que é tão carente, porque os 100 piores índices de desenvolvimento humano que existem no Brasil estão localizados nas regiões Nordeste e Norte.

O Sr. João Alberto Souza (PMDB - MA) - Permite V. Exª um aparte?

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Concedo o aparte ao Senador João Alberto Souza.

O Sr. João Alberto Souza (PMDB - MA) - Senadora, ao chegar no plenário, ouvi o discurso de V. Exª, que evidentemente retrata o trabalho que V. Exª está fazendo no Senado e a sua vontade de minorar a dificuldade do povo do Pará. Esclareço que a localização do porto no Maranhão, para que os minérios de Carajás fossem exportados, foi resultado de uma decisão eminentemente técnica. Lembro-me de que, na época em que eu era Deputado Federal, o ex-Senador Jarbas Passarinho e o Deputado Jarder Barbalho procuravam fazer com que fosse o minério exportado - se não me falha a memória - pelo porto que seria instalado na Ponta da Tijoca, no Pará.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - MA) - O nome era Espadarte.

O SR. João Alberto Souza (PMDB - MA) - Quanto à siderúrgica, os motivos para instalarem-na no Maranhão também são técnicos. Se se instalar uma siderúrgica no Pará - tenho somente um argumento válido -, o minério terá de escoar pelo Porto de Itaqui. É muito mais fácil a instalação no Estado do Maranhão, porque - sem detrimento algum ao Estado do Pará, onde, inclusive, tenho familiares e políticos - essa parte pesada seria transportada para o Porto de Itaqui e, de lá, seria mandada aos portos da Europa, aos portos para onde exportaríamos toda essa produção. Fica muito mais fácil a instalação no Estado do Maranhão. É bom para o Pará, é bom para o País, é bom para o nosso povo, principalmente neste momento em que estamos lutando tanto para que se minorem as dificuldades da nossa população. V. Exª disse muito bem que não será, de jeito nenhum, uma discussão apaixonada. Concordo piamente. Não vamos fazer uma discussão apaixonada a esse respeito. Vamos encontrar o meio técnico, para que se resolva esse assunto, que é tão importante para o Estado do Pará, como também para o Estado do Maranhão. Muito obrigado pelo aparte.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Obrigada, Senador. É natural que cada um aqui, como representante de uma Unidade da Federação, defenda o seu Estado. Fui eleita para defender o povo do Pará. Como já disse, aliás, fui eleita com o slogan de Senadora do povo do Pará. Portanto, defendo a geração de emprego no meu Estado, mas tenho a compreensão de que não é uma briga com o Estado do Maranhão. Infelizmente, eu não era política na época em que se decidiu o porto. Portanto, não posso falar, embora pense que haja mais razões do que técnicas nessa situação.

Mas não vou entrar nesse debate, porque, de qualquer jeito, o porto já existe. Entretanto, eu poderia dizer, por exemplo, que assim como o ferro vai de Carajás para Itaqui pela ferrovia, também o material necessário para a siderúrgica poderia voltar no retorno do trem.

Teríamos várias formas de discussão técnica. Também temos técnicos que dizem que poderia ser no Estado do Pará. Então, penso que precisamos fazer uma discussão que não se prenda apenas à discussão da siderúrgica, porque ela é importante, mas, certamente, não é a única alternativa para o nosso Estado.

A iniciativa que tivemos foi de discutir a questão concreta, ou seja, de que forma vamos compensar o Estado que tem a riqueza. Esse é um princípio absolutamente liberal: valorizar a terra, os recursos naturais, o diferencial da terra que está recebendo os impactos ambientais dessa exploração e de uma concentração de milhares de pessoas que se deslocarão com essa perspectiva de emprego, tendo em vista esses grandes projetos. Qual a compensação que esses Estados estão recebendo? Qual a compensação que os Municípios em torno estão recebendo? É essa discussão que queremos fazer de forma tranqüila aqui no Senado Federal, para que não somente o Estado do Pará, mas todos os que detêm recursos naturais possam ter uma compensação mais justa, até para que possamos implementar um modelo de desenvolvimento, de geração de emprego, de distribuição de renda baseado em economias mais duradouras.

Portanto, Senador, obviamente, defenderei o nosso Estado, é claro, até porque sabemos a importância disso. Tenho certeza de que, se refizermos a compensação financeira, teremos o que é mais importante, ou seja, mais recursos para a geração de emprego, para políticas voltadas para a educação, para a formação da nossa juventude e, inclusive, para que possamos ter a saúde dos habitantes daquela região melhorada. É o que estamos querendo - e para tal fui eleita -: defender mais recursos para o nosso Estado e que seja pago um preço justo pelo diferencial da enorme riqueza - mineral e outras- de nosso Estado do Pará. Também queremos rever a questão relacionada à Hidrelétrica de Tucuruí, porque essa Cefen também se refere a essa questão.

Senadora Lúcia Vânia, concluindo, quero dizer que vamos insistir, até porque devemos fazer uma reforma tributária este ano. Portanto, devemos rever os tributos brasileiros, analisar o que está dando certo e o que precisa ser revisto. Nossa opinião é de que essa legislação precisa ser revista, não apenas pela questão específica do Pará, mas também outros Estados que, embora ricos, recebem tão pouco de compensação.

Temos de pensar que esses recursos naturais não são eternos, nem renováveis, mas finitos, por isso a compensação precisa ser maior.

Quero agradecer e dizer a todos que o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, uma iniciativa do nosso Governo, deve contar, também, com o apoio de toda esta Casa quando da votação urgente das matérias legislativas necessárias, para que possamos pôr fim à impunidade.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2003 - Página 3209