Discurso durante a 22ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao pronunciamento do Sr. Romero Jucá. Análise do processo de ocupação da Amazônia.

Autor
Sibá Machado (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Machado Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL. DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Comentários ao pronunciamento do Sr. Romero Jucá. Análise do processo de ocupação da Amazônia.
Aparteantes
João Capiberibe, Pedro Simon, Valdir Raupp.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2003 - Página 4356
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL. DESENVOLVIMENTO REGIONAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, ROMERO JUCA, SENADOR, CRITICA, INICIATIVA, GOVERNO FEDERAL, REFORMULAÇÃO, PROPOSTA, SISTEMA INTEGRADO DE PAGAMENTO DE IMPOSTOS E CONTRIBUIÇÕES DAS MICROEMPRESAS E DAS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE (SIMPLES), PROGRAMA, RECUPERAÇÃO, NATUREZA FISCAL, PEQUENA EMPRESA, AUSENCIA, PARTICIPAÇÃO, SENADO, EXPECTATIVA, ORADOR, PROXIMIDADE, CONVOCAÇÃO, AUXILIO, NEGOCIAÇÃO.
  • COMENTARIO, CONCENTRAÇÃO, RIQUEZAS, RECURSOS NATURAIS, REGIÃO AMAZONICA, CRITICA, AUSENCIA, INICIATIVA, GOVERNO, APROVEITAMENTO, BIODIVERSIDADE, REGIÃO.
  • REGISTRO, NECESSIDADE, REFORMULAÇÃO, PLANO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, REGIÃO AMAZONICA, IMPEDIMENTO, EXPLORAÇÃO, CLANDESTINIDADE, RECURSOS NATURAIS, CONTRABANDO, ANIMAL, DESTRUIÇÃO, FLORESTA, RESULTADO, FALTA, RESPONSABILIDADE, TECNICAS AGRICOLAS, PEQUENO AGRICULTOR, REGIÃO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, FRONTEIRA, REGIÃO AMAZONICA, COMBATE, TRAFICO, DROGA, URGENCIA, INCENTIVO, PESQUISA CIENTIFICA, REGIÃO, DESENVOLVIMENTO, TECNICAS PROFISSIONAIS, EXPLORAÇÃO, FLORESTA AMAZONICA.
  • APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, IMPEDIMENTO, CLANDESTINIDADE, EXPLORAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESPECIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, ZONA FRANCA, RECURSOS NATURAIS, CERTIFICADO, PRODUTO FLORESTAL.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, meu bom dia a todos!

            Em primeiro lugar, faço um breve comentário a respeito das preocupações apresentadas aqui pelo Senador Romero Jucá sobre as reivindicações das associações de sindicatos e representantes das pequenas e microempresas de todo o Brasil.

Tenho a convicção de que o Presidente Lula abrirá, sim, a negociação com esta Casa, que, inclusive, terá de pronunciar-se sobre a matéria. Também sou favorável a essas reivindicações e acredito que poderá ser encontrada a melhor solução para o problema.

Dados do Sebrae de cerca de cinco anos atrás revelam que 52% da massa salarial paga neste País decorrem das pequenas e microempresas. Mais de 50% de todas as oportunidades de trabalho também são apresentadas por esse setor. Portanto, sendo as pequenas e microempresas tão importantes para a economia nacional, certamente terão muita importância também nas negociações que deverão ser feitas pelo Governo e, certamente, por esta Casa.

Sr. Presidente, apresento aqui algumas considerações a respeito de muitos debates a que já assistimos sobre a Amazônia, a Amazônia brasileira especificamente, e especialmente sobre os modelos apresentados até agora por sucessivos governos. Desde a ocupação deste País pelos portugueses, em 1500, até o presente momento, o modelo de desenvolvimento da Amazônia está carecendo, do meu ponto de vista, de um novo pacto.

Há uma dicotomia entre a segurança nacional a partir da Amazônia, e o desenvolvimento sustentado. As potencialidades da Amazônia sempre foram vistas, naquela região, como algo homogêneo: como um grande tapete verde onde não havia gente, apenas índios. Essa era a convicção de todos os tipos de investidores e de exploradores que ali aportavam. A Amazônia não era percebida em toda as suas facetas.

Alguns números precisam ser lembrados. Trata-se de uma região que tem mais de cinco milhões de quilômetros quadrados, dos quais 80% são ocupados por floresta tropical primária; 19%, por cerrados e campos; e 1%, por espelhos d’água, lagos, rios e outros tipos.

A Amazônia representa 1/3 de todas as florestas tropicais do planeta, e nela estão contidas 1/3 de todas as espécies vivas que a Terra já produziu. Tem, ainda, riquíssimas jazidas minerais - cálculos preliminares estimam que na região exista algo em torno de um trilhão de dólares em minérios, vegetação e outras espécies.

Com todo esse potencial, é claro que a Amazônia está na esfera de interesses de qualquer governo, não apenas do nosso. A especulação internacional na Amazônia é crítica em relação ao uso predatório daquela área.

Nesses últimos trinta anos, os modelos de desenvolvimento apresentados para a Amazônia se responsabilizaram por 15% do desmatamento dessa área, ou seja, dos 80%, estamos agora com apenas 65%.

As tecnologias de produção, relativamente à pecuária ou à agricultura, são arcaicas, são do tempo da pedra lascada: ainda usam o machado e o fogo como instrumentos para a ocupação do terreno. Segundo dados da Embrapa, a pecuária, explorada com baixíssima tecnologia, apresenta um rendimento de menos de 0,7 animal por hectare de pasto. A agricultura é rotativa e de subsistência, com baixíssima rentabilidade também.

A alta concentração de terras merece aqui algum destaque. O Censo de 1996 apresenta os seguintes números sobre concentração de terras: cerca de 530 mil propriedades ocupam 110 milhões de hectares, ou seja, 1,1 milhão de quilômetros quadrados; as propriedades acima de dois mil hectares correspondem a 1,6% dos estabelecimentos e ocupam uma área equivalente a 56% dos 110 milhões de hectares; as propriedades com menos de 50 hectares correspondem a 60% dos estabelecimentos e, em termos percentuais, a apenas 4% dessa área.

A exploração da madeira equivale a um garimpo: a madeira é tratada como se fosse um produto não-renovável. Famílias, tanto indígenas quanto ribeirinhas e pequenos agricultores, trocam uma tora de cedro, mogno ou mesmo de cerejeira e outras espécies mais raras por um quilo de açúcar, por uma lata de leite em pó ou coisa parecida. O problema é ainda mais grave se levarmos em consideração que, nessa cadeia de exploração da madeira, mesmo muitos dos tidos como empresários madeireiros da região também não ficam ricos. O modelo de exploração tem colocado maior volume de dinheiro nas mãos do último elo da cadeia produtiva, que é a indústria de beneficiamento.

Acrescente-se aos problemas já mencionados o das fronteiras da Amazônia. Todos os dias muitas pessoas estão sujeitas aos perigos representados pela presença dos narcotraficantes. Também assistimos ao perigo da biopirataria e ao contrabando de madeiras, de minérios e, principalmente, de espécies vivas, como animais silvestres. Sobre os cerca de sete mil quilômetros de fronteiras da Amazônia, há a vigilância aérea feita pelo Sivam, mas não temos praticamente nenhuma vigilância por terra.

O tráfico de animais e de espécies vegetais movimenta, hoje, só na Amazônia, cerca de US$1 bilhão por ano - conclui-se, portanto, ser esse um negócio muito lucrativo. A pesquisa também aponta que esse é o terceiro contrabando mais lucrativo da região - o primeiro é o tráfico de drogas; o segundo, o de armas; e o terceiro, o de animais.

A pesquisa clandestina também nos assusta muito. Vemos constantemente o patenteamento de espécies da nossa região por empresas estrangeiras, a exemplo do que ocorreu no final do ano passado: o patenteamento do cupuaçu pelo Japão - com isso, os brasileiros vão ter que comprar cupuaçu do Japão. Há, ainda, a indústria de fitoterápicos - quanto a isso, cito o uso da unha-de-gato pelos americanos.

O discurso internacional sobre o futuro da Amazônia, Srª Presidente, prega que o Brasil cuida mal da sua Amazônia, que é um patrimônio da humanidade e que, assim sendo, precisa ser internacionalizada.

A propósito: o Ministro da Educação, Cristovam Buarque, em debate nos Estados Unidos, na Universidade de Harvard, ao ser interrogado por um estudante sobre a internacionalização da Amazônia, após ouvir que ela era um patrimônio da humanidade, respondeu o seguinte: caso pudessem ser considerados como de interesse internacional a fome e a pobreza na África, bem como o livre acesso das pessoas a museus e afins, como o Museu do Louvre, cujos acervos deveriam também ser considerados patrimônio da humanidade, se isso acontecesse, a Amazônia poderia também ser internacionalizada. Mas, se isso não acontecer, a Amazônia continuará brasileira.

Ocorre, porém, que, enquanto debatemos, a Amazônia está sendo internacionalizada debaixo de nossos narizes. Assistimos aos desdobramentos, em 1960, da implantação do Projeto Jari: cerca de seis milhões de hectares de terra foram tratados como um pedaço dos Estados Unidos dentro do Brasil; o proprietário, o Sr. Daniel Ludwig, tinha acesso direto àquela área sem precisar contatar as autoridades brasileiras. Vimos o empreendimento japonês chamado Jica ocupando grandes áreas de terras. Assistimos à sangria dos minérios de Carajás: riquezas sendo levadas a preço vil para servir interesses internacionais. Portanto, na minha opinião, a Amazônia já está sendo internacionalizada.

Entendo que algumas pessoas têm apresentado propostas equivocadas para tratar dessa matéria. Uma delas, com o objetivo de defender e nacionalizar totalmente a Amazônia, propõe a criação de novos Estados e novos Municípios. Srª Presidente, apesar de respeitar os propositores dessa iniciativa, tenho a convicção de que seria a pior medida que poderíamos adotar. A criação de novos Estados e Municípios, em tempos ruins como os que estamos vivendo na economia brasileira, significaria mais dinheiro do Tesouro Nacional aplicado em salários do serviço de administração pública: mais governadores, vice-governadores, senadores, deputados estaduais, prefeitos, e assim sucessivamente. Dessa forma, estaríamos tirando do “quase nada” para aplicar no “coisa nenhuma”.

Outro problema que se apresenta para a ocupação da Amazônia, uma iniciativa já tomada pelo governo militar nas décadas de setenta e oitenta, é o incentivo à migração. Famílias de sem-terra de qualquer região do País foram levadas para a Amazônia para aplicar, naquela região, o modelo de desenvolvimento e de produção do qual têm conhecimento nas suas áreas de origem. Há também um outro problema: essas pessoas e todos os tipos de empreendimentos vêem aquela região como floresta em pé, um sinônimo de atraso, um símbolo da preguiça daqueles que não querem trabalhar. Finalmente, temos o pesado incentivo na pecuária. E se os números do Incra estiverem corretos, uma área de duzentos hectares de pastagem gera emprego para, no máximo, duas pessoas.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senador Sibá Machado, V. Exª me concede um aparte?

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Com todo prazer, Senador João Capiberibe.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, precisamos compreender a história do nosso País e da Amazônia, em particular. É sabido que, quando da migração européia do final do século XIX, os italianos, alemães e pessoas de todos os países europeus atravessaram o Atlântico, trazendo consigo um mito sobre o Brasil e um mito muito particular sobre a Amazônia: Amazônia das amazonas, a Amazônia das árvores gigantes que penetravam nas nuvens, dos fenômenos, dos rios que engoliam os navios, e outros. E esse mito permanece até hoje. Quando se pensa em projetos para a Amazônia, são sempre megaprojetos porque prevalece o mito do vazio demográfico. É preciso que tomemos consciência de que na planície amazônica, antes da chegada dos europeus, viviam entre quatro a seis milhões de pessoas. Hoje, no entanto, os descendentes ameríndios espalhados por todo o País não ultrapassam trezentos mil. Houve um genocídio, e o planejamento feito até hoje para a ocupação, exploração e integração da Amazônia continua promovendo genocídios e destruição ambiental, ampliando a pobreza social. O caso do Jari, como V. Exª citou, é uma loucura no meio da floresta. O Sr. Daniel Ludwig, quando chegou à Amazônia para implantar um projeto em seis milhões de hectares, tinha setenta anos e alguns bilhões de dólares para gastar. No entanto, não teve tempo útil para realizar seu projeto. Todos os projetos planejados para a Amazônia excluem as populações locais. Muito recentemente é que se começou a repensar o desenvolvimento da Amazônia a partir das necessidades locais, e o seu Estado é um bom exemplo. Todos os Estados amazônicos oficialmente não adotaram políticas de desenvolvimento local sustentável, o adestramento de cadeias produtivas de produtos da biodiversidade, mas hoje existe uma consciência muito mais profunda na região, e V. Exª, junto com a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e tantos outros Deputados e Senadores representam a consciência de que é inaceitável a reprodução do modelo que destrói a natureza e que aprofunda as desigualdades sociais, promove a pobreza e a miséria, como é o caso do Jarí, já que no entorno do Projeto Jari vivem, hoje, cerca de cem mil pessoas, que foram atraídas pelo projeto, mas que não estão nele incluídas. O rio Jari é um rio fantástico, encachoeirado, uma dádiva da natureza: há a cachoeira de Santo Antônio, com 20 metros de queda; e também está lá a maior concentração de castanhais do País. Finalizando, V. Exª tem toda razão quando diz que a floresta é destruída por uma simples falta de reflexão. Uma floresta com milhares espécies vegetais e animais pode ser utilizada se a olharmos de outra maneira. Temos experiências que mostram com clareza que, quando se aproveita meia dúzia de espécies, de forma manejada, em um hectare de floresta em pé, como a madeira, os frutos, resinas, cipós, tudo isso produz cinco ou seis vezes mais do que qualquer outra atividade agrícola, seja pastagem ou soja, produto que virou a panacéia da Amazônia. Todos sabemos que não é possível continuar transformando proteína vegetal e energia em proteína animal, em vacas e porcos da Europa. A biosfera não suporta essa relação, porque tem um balanço negativo. Enfim, temos que saber e aprender e aproveitar essa riqueza que é a Floresta Amazônica, sem destruí-la. Temos que ter racionalidade econômica na utilização de nossas riquezas. Muito obrigado pelo aparte.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco PT - AC) - Agradeço ao Senador João Capiberibe pelo aparte e ouço o nobre Senador Pedro Simon e, em seguida, o Senador Valdir Raupp.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - O pronunciamento de V. Exª é da maior importância. O Sr. Bush disse que as forças do mal estão do lado de lá e que ele representa as forças do bem. Mas a verdade é que a internacionalização da Amazônia também está no esquema americano. Aliás, o que é mais dramático, é que a Inglaterra, a França e diversas nações do mundo pensam assim. Acreditam que a Amazônia é o reservatório de água do mundo. Assim, se faltar água, podem buscá-la aqui. O problema do meio ambiente é sério, e, como a Amazônia é a maior reserva tropical do mundo, querem internacionalizá-la. Mostrei outro dia, aqui no Senado, o mapa que circula nas universidades americanas, onde aparece a América com a Amazônia internacionalizada e o Brasil restrito às demais regiões. Estão querendo transformar a Amazônia em uma espécie de Antártida. É claro que não será hoje, porque o americano tem uma escala de interesses e porque ainda não estamos enfrentando o problema da falta de água. Atualmente, enfrentamos o problema do petróleo. E como é esse o problema, o americano está indo onde estão as maiores reservas petrolíferas e colocando seus pés em cima do que julga ser patrimônio do mundo, porque é muito importante para os Estados Unidos terem o controle mundial do petróleo. E como todos falam que enfrentaremos o problema da escassez de água - e as maiores reservas do mundo estão na Amazônia -, os Estados Unidos olham para cá com olhos de certeza de uma reserva garantida, da qual mais dia ou menos dia vai tomar posse. É cruel o que está acontecendo, mas ainda é pior que as nossas respostas sejam tão tímidas. Faço justiça ao Presidente José Sarney que criou o Projeto Calha Norte. Nesse projeto, foram criados quartéis na Amazônia, espaços reservados para o Ministério da Saúde, Agricultura, enfim, todos os setores, para dar cobertura àquela região. E isso deveria ter sido feito em toda a fronteira de sete mil quilômetros, como V. Exª disse. Aquele projeto foi importante. Talvez o Sivam tenha sido importante; negativo não foi. Mas estamos fazendo muito pouco, quase nada, para garantirmos que a Amazônia continue sendo nosso patrimônio. O discurso de V. Exª é da maior importância e do maior significado. E alerto V. Exª para o fato de que, aqui no Congresso Nacional, já foram feitos projetos, comissões, congressos da Amazônia etc. Mas estamos muito aquém do que deveríamos fazer no sentido de preservar aquilo que é nosso. O que me assusta é que, com relação ao Iraque, por exemplo, o mundo está protestando, indo às ruas gritar contra a invasão. Se, de repente, o Conselho de Segurança da ONU decidir que a Amazônia é patrimônio da humanidade, teremos pouquíssimas pessoas do nosso lado. Por isso, é muito importante - e faz muito bem V. Exª - que tomemos as posições necessárias para realizarmos a nossa parte. Sempre digo - e Deus me perdoe que isso ocorra - que, enquanto eu estiver vivo, não deixarei para meus filhos um território menor do que aquele que recebi. No mínimo, podemos delegar aos nossos filhos um território do tamanho daquele que recebemos. Pode ser um território onde haja fome, miséria, injustiças sociais - porque essas coisas vamos ter que resolver -, mas o território é nosso, do tamanho que recebemos. Meus cumprimentos, pois V. Exª está fazendo um pronunciamento da maior importância e do maior significado.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Obrigado, Senador Simon, pelo seu aparte.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Senador Sibá Machado, V. Exª me permite um aparte?

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Concedo um aparte ao Senador Valdir Raupp.

O Sr. Valdir Raupp (PMDB - RO) - Senador Sibá Machado, V. Exª está abordando um tema de grande relevância para a Amazônia e para o Brasil. Gostaria de falar sobre o Sistema de Vigilância da Amazônia - Sivam, onde o Governo brasileiro investiu, se não me falha a memória, em torno de US$1,8 bilhão, financiado pelo Governo americano. Os equipamentos foram comprados à empresa Raytheon, também dos Estados Unidos. E tenho as minhas dúvidas se, hoje, os Estados Unidos não estão vigiando mais a Amazônia do que o Brasil, porque técnicos americanos ajudaram a instalar todo esse sistema, que tem uma base em Porto Velho, no meu Estado, outra em Belém, no Pará, e outra no Estado do Amazonas. Creio que toda a Amazônia brasileira e até parte da Amazônia do Peru, da Bolívia e da Colômbia está sendo vigiada hoje pelos americanos. Então, essa questão da internacionalização da Amazônia é muito séria, e o Parlamento brasileiro tem que se preocupar muito com ela. Outra questão são as vocações de cada região, de cada Estado. Entendo que a Amazônia deve preservar, é claro, grande parte de suas florestas, como o Estado do Acre encontrou a sua vocação. Tenho falado que, hoje, a economia acreana está baseada no extrativismo. Da mesma forma que o Estado do Amazonas, tirando a Zona Franca de Manaus, que é um grande pólo industrial, tem mais de 90% do seu território em florestas, que devemos preservar. Mas já não concordo com outros Estados, como o de Rondônia que teve, no passado, um modelo de desenvolvimento agrícola. O Incra assentou lá, há vinte, trinta, quarenta anos, noventa mil pequenos produtores rurais, que, hoje, são produtores de leite - criam gado de leite e de corte - e de café. Meu Estado produz, hoje, muito leite e café. Tem cinqüenta e seis indústrias de laticínios e, como falei, oitenta a noventa pequenos produtores que também produzem café, feijão, arroz para o sustento das suas famílias. Hoje, já existem, em cada sítio, em cada pequena propriedade de 21 a 100 hectares, de três a quatro famílias; os filhos vão casando e formando suas famílias. Portanto, é difícil voltar o modelo atual de parte de Rondônia para o modelo extrativista; mas temos também 70% das florestas do Estado intactas. Quando fui Governador, implantei o Panaflora - Programa Agroecológico Florestal, que preserva em torno de 70% das florestas. No Governo Fernando Henrique foi baixada uma medida provisória que voltou no tempo, estabelecendo que cada pequeno produtor teria que preservar não 50%, que era o modelo do Incra, mas 80%, criando um impasse muito grande. Essa medida provisória está nesta Casa, e peço apoio aos Srs. Senadores para que, no caso do meu Estado, prevaleça o zoneamento agroecológico implantado com dinheiro brasileiro, do meu Estado, preservando 50% das pequenas propriedades e não 80% como está na medida provisória. Começo a imaginar: será que o Estado de São Paulo, se não tivesse desenvolvido a agricultura, a indústria, teria hoje a população que tem? Teria as riquezas que tem hoje? Então, espero que no meu Estado, essa terra que foi distribuída no passado seja destinada à agricultura e também aos pequenos produtores de gado de leite. Muito obrigado, Senador Sibá Machado.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Obrigado, Senador Valdir Raupp, pelo seu aparte.

Srª Presidente, dado o avançado da hora, V. Exª poderia me conceder mais alguns minutos somente para encerrar o meu discurso?

A SRª PRESIDENTE (Serys Slhessarenko) - Mais dois minutos, Senador Sibá Machado.

O SR. SIBÁ MACHADO (Bloco/PT - AC) - Queremos lembrar, Srª Presidente, que as estratégias de desenvolvimento para a região apontaram para a criação da Zona Franca de Manaus, que é uma indústria de eletroeletrônico, mas nenhum investimento foi feito para a área florestal. Além do que foram realizados investimentos na pecuária e foram criados os incentivos fiscais.

Só para citar alguns números: o setor florestal, pouco explorado, representa apenas 15% do PIB da Amazônia e gera 130 mil empregos diretos. O setor exportou, em 2002, US$513 milhões e representa apenas 4% do mercado global.

O que talvez algumas pessoas não saibam é que 84% da madeira da Amazônia são consumidos no Brasil, aqui no Centro-Sul, e apenas 16% são exportados.

Diga-se de passagem que inexistem centros de pesquisas para essa área de desenvolvimento florestal e as nossas universidades estão com muita dificuldade.

Queremos apresentar algumas sugestões e propostas:

- Criar uma zona franca de produtos florestais manejados, em qualquer outra capital amazônida, mas com o viés do investimento para a indústria florestal;

- Determinar que 100% da extração, industrialização, circulação e comercialização de produtos de origem florestal sejam manejados e, num passo futuro, certificados. Inclusive, já ouvi dos Senadores de Roraima essa preocupação;

- Estabelecer o planejamento de instalação da cadeia produtiva do setor e incentivar que os Estados possam ter seu zoneamento florestal;

- Criar linhas de crédito especiais para o setor;

- Determinar que a próxima ação da reforma agrária na Amazônia aponte para outros tipos de assentamentos, respeitando também espaços florestais. Hoje, há 53 projetos de colonização, todos falidos, gerando resserviços, resultando no fato de que as famílias precisam receber os incentivos do Programa Fome Zero, em vez de contribuir para o Programa;

- Incentivar o manejo comunitário e em áreas particulares.

Sou partidário da idéia de que é preciso alocar recursos para as pesquisas, por intermédio da Embrapa, das universidades ou de qualquer outro instituto de pesquisa nacional.

Vou citar alguns números para encerrar, Srª Presidente. Hoje, infelizmente, os cálculos são empíricos, ou seja, não são cientificamente levantados, mas enquanto o rendimento médio madeireiro de uma tora bruta está hoje em R$250,00; a média por hectare na Amazônia, na pior das hipóteses, pode chegar a R$2.000,00. Então, gostaríamos que se calculassem todas as reservas extrativistas, como maior alternativa dessa riqueza, pois no futuro, com o manejo certificado, esses preços poderão subir de 20% a 30%.

Srª Presidente, era o que eu tinha a dizer. Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2003 - Página 4356