Discurso durante a 57ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Importância do financiamento de campanha e da questão da fidelidade partidária.

Autor
Antero Paes de Barros (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MT)
Nome completo: Antero Paes de Barros Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Importância do financiamento de campanha e da questão da fidelidade partidária.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Eurípedes Camargo, João Capiberibe.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2003 - Página 11758
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, BANCADA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB), INCLUSÃO, PAUTA, URGENCIA, VOTAÇÃO, REFORMA POLITICA, APOIO, PROPOSTA, APROVAÇÃO, SENADO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, ESPECIFICAÇÃO, FINANCIAMENTO, SETOR PUBLICO, CAMPANHA ELEITORAL, NECESSIDADE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTARIAS (LDO).
  • DEFESA, EXCLUSIVIDADE, FUNDOS PUBLICOS, FINANCIAMENTO, CAMPANHA ELEITORAL, DEFINIÇÃO, PENALIDADE, CANDIDATO, PESSOA FISICA, PESSOA JURIDICA, INFRAÇÃO, OBJETIVO, ETICA, FISCALIZAÇÃO.
  • DEBATE, FIDELIDADE PARTIDARIA, VINCULAÇÃO, RESPEITO, PROGRAMA PARTIDARIO, CRITICA, TROCA, FILIAÇÃO PARTIDARIA, COMENTARIO, DIVERGENCIA, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT).
  • DEFESA, REFORMA POLITICA, REFORÇO, PARTIDO POLITICO, RECUPERAÇÃO, DIGNIDADE, CONGRESSO NACIONAL.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, creio que a reunião que aconteceu ontem entre o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a Bancada Federal do PSDB foi um momento importante na política brasileira. Importante porque o PSDB conseguiu, naquela reunião, recolocar na pauta exatamente o tema tratado aqui desta tribuna pelo Senador Efraim Morais, que é a urgência da reforma política.

Trata-se de urgência urgentíssima, mas não só votar a reforma - e é bom lembrar que o Senado da República já votou e aprovou parte importante da mesma, o coração da reforma. E o Governo anunciou, hoje, que a apoiará na Câmara dos Deputados. Com a sinalização de apoio às reformas vindas do Presidente Lula, do Ministro José Dirceu e do Governo, haverá uma obrigação e um dever do Senado e da Câmara.

A SRª PRESIDENTE (Iris de Araújo. Fazendo soar a campainha.) - Senador Antero Paes de Barros, lamento interrompê-lo, mas preciso prorrogar a sessão por dez minutos, a fim de que V. Exª possa concluir o seu pronunciamento.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Agradeço a V. Exª.

Eu dizia que não haverá reforma sem financiamento público de campanha. Fico feliz em saber que o Governo apoiará o financiamento público da campanha. E, se aprovado, é importante que o Congresso Nacional, por meio da Comissão Mista de Orçamento - embora já tenha esgotado o prazo para apresentação de emendas à LDO -, excepcionalmente, abra uma janela para permitir a inclusão urgente na LDO dos recursos para financiamento público de campanha já para o processo eleitoral do ano que vem.

É um caso de urgência urgentíssima. A matéria já passou por aqui, onde foi aprovada, falta ser aprovada apenas na Câmara dos Deputados. Defendo até que haja uma mudança essencial na questão do financiamento público. Quando foi aprovado o financiamento público aqui no Senado, tentei apresentar uma emenda, mas argumentaram que ela seria atropelada e retardaria a reforma. Por isso, não a apresentei. Alegaram que, se o projeto fosse aprovado no Senado naquele dia, a Câmara poderia apresentar a emenda, a aprovação da reforma seria acelerada e, depois, votaríamos o texto modificado.

Defendo que, no texto aprovado pelo Senado da República, seja incluído que o financiamento será exclusivamente público, mas também seja definida a penalidade para o político que for flagrado recebendo recursos privados. A pena seria ficar definitivamente inelegível. Isso é fundamental para que seja adotada a prática do financiamento exclusivamente público.

Da mesma forma é fundamental que estabeleçamos que a empresa que financiou ficará definitivamente inabilitada para receber obras públicas, assim como ficariam inabilitados os RGs e CPFs dos proprietários e os CGCs dessas empresas. Assim, haveria a garantia absoluta de que o financiamento seria exclusivamente público.

Esse é um tema que pode trazer dificuldades ao Congresso, mas temos que enfrentá-lo, porque há uma falta de credibilidade da classe política. Pode haver uma distorção na compreensão desse instrumento do financiamento público de campanha, que é moralizador, mas que pode gerar incompreensão porque terá que passar a constar do orçamento da União, pois o povo é quem pagará. Temos que ter a coragem de admitir que é isso mesmo e que representa um grande avanço. É ilusório pensar que, atualmente, o financiamento não é público. O financiamento já é público. Só que às custas de entendimentos que nem sempre podem ser públicos.

Concedo um aparte ao Senador João Capiberibe.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senador, concordo que os financiamentos de campanha têm que ser públicos, porque já são públicos, só que por meio do Caixa 2. Temos que admitir isso. Precisamos fazer algumas alterações para garantir o financiamento público. Como está, com lista aberta de candidatos, não é possível fazer financiamento público. Só será possível se for feito ao partido, com lista fechada, porque fortalecerá os partidos políticos. É evidente que os partidos pequenos terão algumas dificuldades nesse processo, mas há tolerância. Eu diria que a sociedade brasileira é extremamente tolerante. Um outro aspecto: essa reforma política tem que ser imediata, sob pena de ampliar a bancada do narcotráfico dentro do Congresso Nacional. Sabemos que o narcotráfico financiou campanhas eleitorais. Tenho essa informação. Se nós não estabelecermos uma legislação que responsabilize os partidos políticos, se a responsabilidade continuar individual, condenar-se-á individualmente a pessoa -- aliás, os partidos livram-se logo do sujeito acusado, que é expulso ou pede desligamento do partido -- e com a instituição partidária não acontece nada. Nesses moldes, com lista aberta, não é possível cobrar responsabilidade dos partidos, nem fazer o financiamento público. Temos que equacionar essa questão. Era isso que queria aduzir ao seu pronunciamento.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Concordo integralmente com V. Exª. Se não me engano, já foi aprovada aqui essa questão da lista, que é uma evolução. Se não foi aprovada, devemos aprovar, até para que não ocorra o que está ocorrendo hoje na política brasileira. Temos que ser transparentes com a sociedade. Política é coisa pública.

E falam na forma como os partidos estão organizados, o voto proporcional, as coligações nas proporcionais. Mas, no último levantamento realizado na Câmara dos Deputados - não me refiro a esta Legislatura -, mais de 50% Deputados trocaram de partidos. A tese da fidelidade partidária é importante na disputa das eleições proporcionais, mas é importante também para os chefes do Poder Executivo. Por quê? Para que sejam eleitos com programas. A lista fechada só vale se for para fortalecer os programas partidários e fazer com que as idéias defendidas em praças públicas representem um verdadeiro contrato social com a população brasileira.

Sem querer entrar em assuntos da economia interna de qualquer partido, entendo que a tese da fidelidade partidária não pode ser a tese da maioria que está no poder, não pode ser a tese de quem controla o holerite, não pode ser a tese de quem está no Poder Executivo.

Estamos a assistir a seguinte situação: o povo brasileiro se lembra de que o PT tenha defendido, na campanha eleitoral, a taxação dos aposentados? Onde se deu esse discurso? Qual foi o encontro nacional do PT que deliberou dessa forma e que permitiria ao Partido punir os parlamentares dissidentes dessas teses? Pelo contrário, as teses históricas do Partido dos Trabalhadores, defendidas em praça pública, foram exatamente na linha oposta ao programa de governo adotado pelo PT após a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva.

Entendo que a fidelidade partidária não pode ser assim: o Parlamentar tem que cumprir a fidelidade partidária porque assim querem os detentores do poder. Não. Entendo que o parlamentar deve respeitar as decisões do Partido deliberadas em convenção nacional. Não sou dos que estimulam a desobediência partidária; ao contrário, na minha formação política, tenho a convicção de que é infinitamente melhor usar a tese do erro coletivo, errar com o partido, do que tentar acertar sozinho. É muito mais confortável. Disputa-se a tese no partido e, se ela for derrotada, vota-se com o partido.

Mas o que se está assistindo aqui não é isso. O que se está assistindo aqui é que não houve disputa de tese nenhuma e que há uma deturpação daquilo que seria a fidelidade partidária. Portanto, creio que a fidelidade partidária deve ser debatida à exaustão.

Nessas questões de acompanhamentos das decisões do Partido, eu já disse ao Líder Arthur Virgílio: o PSDB é favorável às reformas. Em relação a alguns temas das reformas, eu sou contra, e não sou contra porque o Governo é do Presidente Lula; poderia ser do Presidente Fernando Henrique.

Por exemplo, a taxação dos aposentados, creio que é inconstitucional. Ora, se há na Constituição o princípio da irredutibilidade do salário, ao taxar aposentados, estabelece-se a redução de salário. Há também outras análises, como a do direito adquirido, na qual não vou entrar. Mas já pedi ao Líder Arthur Virgílio, que solicitou ao Partido que reúna e delibere no sentido de que possamos votar as reformas. Porém, não seremos contra as reformas.

Além da questão interna de se votar com o Partido, há a questão da troca do Partido. Mostrei dados aqui, da legislação anterior, em que, de um total de 513 Deputados, nos últimos quatro anos antes desta legislatura, 268 - portanto, mais de 50% -- mudaram de partido. Os partidos passaram a ter a mesma finalidade da camisinha: são usados até o momento do prazer e descartados depois. Os partidos viraram cartórios; são usados para registro de candidaturas e imediatamente descartados.

Como conseqüência de uma reforma política, poderia haver uma reacomodação na política brasileira, como poderia ter havido na época da Constituinte. Até a Constituinte, havia o partido-frente, havia frentes partidárias. A Constituinte veio desconstituir tudo aquilo para que tivéssemos partidos políticos, e hoje não fazemos nem sequer o esforço para ser partido. 

A urgência na reforma política é o que pode recuperar a dignidade do Congresso Nacional, porque estamos diante da possibilidade de esta instituição ser transformada em mercado persa, em virtude do troca-troca de partido. Não em função de convicções, mas em função de situações difíceis de serem explicadas.

Ouço, primeiro, o aparte do querido Senador de Brasília e, depois, o do Senador Líder do meu Partido, Arthur Virgílio.

O Sr. Eurípedes Camargo (Bloco/PT - DF) - Senador Antero Paes de Barros, V. Exª traz à discussão a fidelidade partidária. Um tema importante. Como V. Exª citou o Partido dos Trabalhadores. Temos uma forma própria de organização partidária, que passa pelas teses, pelos congressos e que delibera o mandato e o programa partidário. O programa de Governo é debatido numa esfera mais ampla, que abrange inclusive as coligações. O Partido tem os seus fóruns, onde as decisões são tomadas e seguidas pela maioria. É uma questão estatutária. O Partido tem os seus fóruns de decisão. Fazemos reuniões constantemente para avaliação, acompanhamento, e há espaço para que todos possam manifestar as suas dúvidas. Por isso a democracia interna do Partido é uma constante nas nossas vidas. É um trabalho maior a questão do coletivo, requer esforço muito grande, mas há essa vocação e disposição do Partido em realizar discussões internas, respeitando todas os pensamentos que o compõem nas suas tendências. Eu, pessoalmente, pertenço a uma tendência, há várias dentro do Partido. Mas há um espaço onde se define a composição e a linha programática a serem seguidas, e cumpre-se a decisão da maioria. A partir daí, ou se convence ou se é convencido; se não conseguir convencer, será convencido. A decisão é da maioria. Temos isso como praxe, como regra no dia-a-dia.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Agradeço-lhe o aparte.

Talvez a dificuldade seja minha, por não ter conhecimento dessa deliberação do Partido dos Trabalhadores. Mas creio que essa dificuldade não seja só minha, mas de memória do povo brasileiro. Os funcionários públicos, os aposentados, os pensionistas, também, com certeza, não se lembram de nenhuma decisão nesse sentido. Porém, são problemas internos, eu já disse, do Partido dos Trabalhadores. Não vou entrar nessa seara, apenas creio que isso enfraquece o debate sobre a fidelidade partidária.

Entendo que deve haver fidelidade a uma decisão do coletivo, e não uma fidelidade ao interesse do Executivo. Aliás, entendo de forma diferente: entendo que o Chefe do Poder Executivo também deve se subordinar às decisões legitimamente adotadas pelo partido. Mas são convicções pessoais que cada um registra.

Concedo um aparte ao Senador Arthur Virgílio.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Antero Paes de Barros, registro, em primeiro lugar, que, junto com o Líder Efraim Morais, V. Exª fez hoje um discurso extremamente oportuno, trazendo à baila a necessidade de uma reforma que efetivamente moralize a relação política no nosso País. Em segundo, quero dizer que, com a abertura que caracteriza o nosso Partido, temos travado discussões muito profundas sobre as reformas e sobre as conjunturas econômica e política do País. V. Exª é um dos Senadores mais respeitados desta Casa e um dos mais prezados e mais conceituados da nossa Bancada. Portanto, na decisão que V. Exª tomará sobre tópicos de uma reforma, cuja idéia central todos apoiamos - até porque é uma tese nossa -, V. Exª estará completamente livre por uma razão bem simples: o nosso Partido é democrático, o nosso Partido permite a contradição e o nosso Partido ainda nem sequer se definiu. Eu, por exemplo, tenho uma definição tomada: a contribuição de inativos com o patamar de R$2.400,00, nem pensar. Isso invalida a Previdência privada futura, portanto, é antiestratégica. Em segundo lugar, eu, que votei três vezes a contribuição de inativos, votaria a quarta, se o Governo tivesse ou quando o Governo tiver a coragem de não compactuar com o teto de R$17 mil, R$18 mil, R$19 mil ou R$20 mil, como querem alguns setores da sociedade; contribuição de inativos junto com esse teto é uma injustiça que não cometerei. Uma viúva, por exemplo, que ganha R$1.100,00 teria um redutor de 30% e, depois, teria 11% sobre os 70% restantes; ao mesmo tempo, permite que juiz, senador, ministro ou quem quer que seja se aposente com R$17 mil, R$18 mil, R$19 mil ou R$20 mil. Esse atentado ao sentimento de justiça, não cometerei. Isso está bem claro e o defenderei na minha Bancada; defenderei no nosso Partido essa posição para que ajamos nessa mesma direção. Se o Governo tiver coragem para fazer isso, que tenha, mas não o faça com a viúva; faça-o num âmbito global, cobrando o sacrifício de todos neste País. Portanto, que deixe de fazer média e jogar o jogo das comodidades. É muito bom sabermos que podemos pensar diferentemente. Em um ponto, posso pensar de um jeito; V. Exª, de outro, e um terceiro Senador, de uma outra forma, mas continuamos juntos pelo sentimento estratégico de Brasil e sabendo que, entre nós, há um sentimento de liberdade e jamais nada parecido com o tribunal do santo ofício, com o tribunal da inquisição. Parabéns a V. Exª pelo discurso brilhante, que revela a sua maturidade política e a sua, reconhecida pelo Brasil, combatividade. Muito obrigado.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT) - Para concluir, Srª Presidente, quero dizer que a reforma política fortalece os Partidos, que necessitarão de maior esforço para existir. Ela também trará tranqüilidade ao Poder Executivo, porque as pessoas eleger-se-ão com base em programas que deverão ser executados. A fidelidade terá que ser a programas e não a humores momentâneos de quem assume o poder. Sem dúvida nenhuma, esse será um grande avanço da política brasileira.

Quero, portanto, fazer uma saudação ao Líder Jutahy Magalhães por ter conseguido recolocar na pauta da política brasileira a necessidade urgente urgentíssima de aprovarmos a reforma. Essa é a primeira a ser aprovada e creio que, com ela, facilitar-se-á a aprovação das outras reformas. Não tenho a menor dúvida disso.

Era o que tinha a dizer, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2003 - Página 11758