Discurso durante a 68ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apresentará projeto que regulamentará a adoção da taxa Tobin pelo Brasil, sobre movimentação internacional de capital especulativo.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Apresentará projeto que regulamentará a adoção da taxa Tobin pelo Brasil, sobre movimentação internacional de capital especulativo.
Publicação
Publicação no DSF de 03/06/2003 - Página 14088
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA DE TRANSPORTES. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, DIA, IMPRENSA, LEITURA, TRECHO, DECLARAÇÃO, HIPOLITO JOSE DA COSTA, JORNALISTA, ELOGIO, ATUAÇÃO, TRABALHADOR, MEIOS DE COMUNICAÇÃO, BENEFICIO, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA, VICENTE VUOLO, EX-CONGRESSISTA, ANTERIORIDADE, DEFESA, AUMENTO, UTILIZAÇÃO, TRANSPORTE FERROVIARIO, HIDROVIA, AMBITO NACIONAL, EXPECTATIVA, VISITA OFICIAL, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), AUTORIZAÇÃO, CONCLUSÃO, CONSTRUÇÃO, FERROVIA, MELHORIA, SITUAÇÃO, TRANSPORTE, ESCOAMENTO, PRODUÇÃO.
  • EXPECTATIVA, APRESENTAÇÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, OBJETIVO, REGULAMENTAÇÃO, COBRANÇA, BRASIL, TRIBUTAÇÃO, MOVIMENTO FINANCEIRO, MERCADO INTERNACIONAL, COMBATE, CAPITAL ESPECULATIVO, ARRECADAÇÃO, RECURSOS, DESTINAÇÃO, REDUÇÃO, POBREZA.
  • ESCLARECIMENTOS, PERIODO, CRIAÇÃO, TRIBUTAÇÃO, AUTORIA, JAMES TOBIN, ECONOMISTA, OBJETIVO, CONTENÇÃO, DESEQUILIBRIO, ECONOMIA, MOTIVO, APLICAÇÃO, CAPITAL ESPECULATIVO, REGISTRO, ANTERIORIDADE, NEGLIGENCIA, PROPOSTA, AMBITO INTERNACIONAL, COMENTARIO, SITUAÇÃO, ATUALIDADE, DEFESA, COBRANÇA, TAXAS, MOVIMENTO FINANCEIRO, MERCADO FINANCEIRO.

A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srs. Senadores, temos aqui vários temas a serem tratados mas, infelizmente, o tempo sempre é escasso.

Em primeiro lugar, quero registrar desta tribuna, lembrar a todos nesta Casa que ontem, 1º de junho, foi o Dia da Imprensa. Não poderíamos deixar de homenagear esses profissionais que, diariamente, se expressam transmitindo o que se passa pelo Brasil e pelo mundo a todos nós.

Lembrarei rapidamente aqui de Hipólito José da Costa, brasileiro que no lançamento do Correio Braziliense em Londres em 1808 escreveu algumas honrosas linhas em seu primeiro jornal. Disse ele:

O primeiro dever do homem em sociedade é ser útil aos membros dela; e cada um deve, segundo suas forças físicas ou morais, administrar, em benefício da mesma, os conhecimentos ou talentos que a natureza, a arte e a educação lhe prestou. O indivíduo que abrange o bem geral de uma sociedade vem a ser o membro mais distinto dela. As luzes, que ele espalha, tiram das trevas, ou da ilusão, aqueles que a ignorância precipitou no labirinto da apatia, da inépcia e do engano. Ninguém mais útil, pois, do que aquele que se destina a mostrar, com evidência, os acontecimentos do presente e desenvolver as sombras do futuro. Tal tem sido o trabalho dos redatores das folhas públicas, quando estes, munidos de uma crítica sã e de uma censura adequada, representam os fatos do momento, as reflexões sobre o passado e as sólidas conjecturas sobre o futuro.

Nossos agradecimentos ao trabalho desenvolvido por estes profissionais comprometidos com a verdade, os operadores da comunicação televisada, radiofônica e escrita que trabalham diariamente em prol de toda uma comunidade e que não podem deixar de ser homenageados. Hoje, através das minhas palavras, agradeço o trabalho da Imprensa brasileira.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, dia 06 próximo estará em Mato Grosso o nosso Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e nós, com certeza, estaremos lá também. Lula irá a Cuiabá e a vários Municípios, como Rondonópolis, e estará também junto a Alto Taquari, a Alto Araguaia, onde temos a nossa Ferronorte, a nossa estrada de ferro.

            Lerei um texto muito breve para lembrar um ex-Senador que foi um aficionado das ferrovias, em especial da ferrovia de Mato Grosso, o Senador Vicente Vuolo. Após 30 anos, Sr. Presidente, Srs. Senadores, de uma luta histórica do Senador Vicente Vuolo, que começou como Deputado Estadual, quando fez seus primeiros discursos, a ferrovia chegou em Mato Grosso, passando pelas cidades de Rubinéa, Aparecida do Taboado, Inocência e Chapadão do Sul, em Mato Grosso do Sul, até Alto Taquari, no Estado de Mato Grosso. Está a caminho de Rondonópolis e de Cuiabá, onde esperamos que chegue logo. Falo do Projeto de Lei nº 312-A/75, apresentado pelo então Deputado Federal Vicente Vuolo e transformado na Lei nº 6.346/76, que está sendo executado hoje pela Ferronorte. É o exemplo da persistência de um Parlamentar. Foram 30 anos.

A luta de Vicente Vuolo não parou por aí. Como Senador da República, S. Exª conseguiu viabilizar um convênio entre a União e o Estado de São Paulo em que cada qual participaria com 50% no pagamento para a elaboração e construção da ponte rodoferroviária. Pois bem, o projeto construtivo da ponte foi feito pela firma Sondotécnica Engenharia de Solos S.A., a vencedora da concorrência. Esses estudos facilitaram os trabalhos desenvolvidos pela Constran para o início das obras. O convênio foi rigorosamente assinado no Ministério dos Transportes, em Brasília, no início da década de 80, o que possibilitou ao Governo paulista começar a construção da ponte rodoferroviária. Sem ponte não haveria ferrovia, Sr. Presidente. Por isso, Vicente Vuolo dizia: “A ponte viabilizou a ferrovia”.

Conhecemos a incansável luta desse homem, Sr. Presidente, que chegou a ser ridicularizado muitas vezes por causa do projeto maluco da ferrovia. Em Mato Grosso, muita vezes, quando queríamos falar de algo que não se realizaria falávamos que era a ferrovia do Vuolo.

Estou fazendo questão de rememorar esse fato para dizer que a persistência, a determinação, a tenacidade de uma pessoa pode levar a uma grande conquista, como fez o Senador Vuolo com a ferrovia até Mato Grosso.

            Inconformado com o modelo de desenvolvimento do País, que priorizava a rodovia em detrimento da ferrovia e hidrovia, Vuolo transformou essa bandeira da ferrovia numa obstinação, enfrentando todos os obstáculos, aparentemente intransponíveis. O inconformismo de Vuolo se justifica. O Brasil depende, em mais de 75%, das suas rodovias para transportar aquilo que produz, ao passo que em outras partes do mundo, como nos Estados Unidos, essa dependência não chega nem mesmo aos 40%, enquanto que na Rússia é a ferrovia, no seu conjunto, a responsável pelo transporte de mais de 70% de sua produção. E o que é mais grave: pelo menos 80% das ferrovias no Brasil foram construídas entre 1850 e 1945, e hoje talvez não atinjam nem mesmos 35 mil quilômetros de extensão. Para um país com uma área superior a 8 milhões de quilômetros quadrados - correspondente a cerca de metade do continente sul-americano - é um absurdo. Diante desse quadro caótico de transporte no Brasil, o projeto de lei de Vicente Vuolo é mais do que uma simples ligação ferroviária entre São Paulo/Cuiabá, é o renascimento da ferrovia no Brasil.

Vicente Vuolo faleceu há pouco tempo, mas a sua luta continua junto à população de Mato Grosso, de Cuiabá, liderada especialmente pelo seu filho Vicente Vuolo Filho.

Temos certeza de que o Presidente Lula trabalhará no sentido de que seja dada a autorização para que a continuidade das obras da ferrovia, hoje em Alto Taquari, Município de Mato Grosso, se dê até Rondonópolis e Cuiabá.

A nossa preocupação é que essa ferrovia cumpra o seu objetivo alternativo de transporte mais barato, econômico e seguro para atender uma imensa região produtora de grãos e não ser um mero instrumento econômico.

Como já disse, tenho certeza de que o Presidente Lula irá cumprir o que chamamos a Lei Vuolo, aprovada no Congresso Nacional na sua integralidade, consubstanciada na execução do trecho Alto Araguaia-Rondonópolis-Cuiabá.

Sr. Presidente, Sras. e Srs. Senadores, o Senador Roberto Saturnino, há pouco, falando pela Liderança do Partido dos Trabalhadores, tocou em um assunto que acredito da maior relevância a chamada taxa Tobin. Sr. Presidente, nossa fala era para ser restrita a essa taxa porque se trata de um projeto que estaremos apresentando nos próximos dias no Senado da República.

Pretendo apresentar a esta Casa, em breve, projeto de lei que regulamentará a adoção da Taxa Tobin pelo Brasil. A taxa Tobin é aplicada sobre a movimentação internacional de capitais. A idéia é cobrar um reduzido percentual sobre cada unidade monetária que atravessa nossas fronteiras, visando a conseguir dois objetivos: primeiro, desestimular a excessiva e nociva volatilidade do capital não produtivo - não do capital produtivo, isso tem que ficar muito claro -; segundo, com a taxa arrecadada, formar um fundo social de combate à pobreza.

Esse é um mecanismo que vem sendo discutido há décadas, mas que se tornou mais atual em virtude das crises financeiras em vários países provocadas pelos capitais que se movimentam com excessiva facilidade e nervosismo ao apertar de uma tecla de computador.

A taxa Tobin, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, é defendida geralmente como medida que deve ser tomada simultaneamente por todos os países do mundo, para que tenha plena eficácia e para que o fundo arrecadado tenha caráter e aplicação internacional de ajuda aos países vitimados pela especulação e no combate às terríveis desigualdades sociais e econômicas do Planeta. Alguns defensores da taxa acreditam que seria possível a adoção dela por uma região ou um conjunto de países, como a Europa ou a América do Sul. Tenho a convicção, no entanto, Sr. Presidente, de que sua adoção é também viável e útil se feita por um país como o Brasil, cuja economia tem dimensão considerável, que goza, em virtude da eleição do Presidente Lula, de generalizado bom conceito internacional.

O Brasil daria o primeiro passo, defendendo-se dos efeitos nocivos do capital que mal pernoita e não se reproduz, nem gera a edificação de algo estável, útil e humano. Logo se seguiriam adesões à iniciativa brasileira, e o conceito taxa Tobin, há tanto debatido, sairia finalmente do papel e se tornaria realidade.

A idéia dessa tributação foi lançada, inicialmente, pelo economista americano James Tobin, que não era um contestador do capitalismo, mas se opunha à idéia de total liberdade das forças de mercado. Corria o ano de 1972, e Tobin estava preocupado com o efeito desestabilizador sobre as economias nacionais, causado pelas aplicações internacionais de curto prazo dos recursos disponíveis das empresas. Sua intenção era, principalmente, colocar um obstáculo ao excessivo vaivém dos capitais não produtivos, taxando-os, por exemplo, com algo como 0,5% do valor movimentado. Assim, seriam contidos os ataques especulativos que destróem moedas e países. O capital produtivo, aquele que se propõe a criar empregos e a produzir, não precisa dessa nervosa movimentação de ir e vir e não sofreria com a pequena taxa. O capital especulativo pagaria a taxa a cada movimento, os pagamentos se acumulariam e a especulação se tornaria menos atraente.

Em 1978, Tobin ganhou o Prêmio Nobel de Economia, não pela proposta da taxa Tobin, que era muito controversa, mas pelos seus estudos sobre carteiras de investimento de empresas. Tobin, recentemente falecido, chegou a ver como sua idéia de tributar o capital volátil internacional veio a receber mais e mais apoio, à medida que corriam os anos.

Também pudera, Sr. Presidente! Nas últimas décadas foram crescendo constantemente a velocidade e o volume do capital especulativo internacional. Só para dar uma noção desse crescimento: estimava-se, em 1985, que a movimentação diária era de US$150 milhões. Hoje, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, pasmem, é de um trilhão e 500 milhões de dólares por dia! É claro que o computador e as comunicações por satélite estão associados a esse explosivo crescimento. Explosivo em dois sentidos: o de súbita e veloz ampliação e o da faculdade que têm esses capitais de explodirem economias nacionais.

Com a vaga neoliberal do início dos anos 90, a taxa Tobin passou a ser malvista pelos que defendiam a total e incondicional liberdade das forças do mercado. Havia uma abundância de dinheiro no mundo, e isso parecia ser positivo para todos os países, pobres e ricos. A euforia do poderio do capital internacional era incontrastável, mas começaram a surgir os fracassos: falência do México, em 1995, e seu “efeito tequila”; crise da Ásia, em 1997, devastadora, causando queda do PIB, durante alguns anos, em vários países da região; falência da Rússia, em 1998, com fugas de capital; desmoronamento do real, em janeiro de 1999, com forte fuga de capitais e grandes lucros para alguns especuladores.

A taxa Tobin começou a ser novamente aventada e discutida, mas os bastiões neoliberais ainda se recusavam a encará-la. O tema somente chegou ao mundo rico quando, recentemente, estourou a bolha da nova economia, a do “ponto com”, a da Nasdaq, tão badalada. Agora, a Europa pelo menos a discute, e muito. Refiro-me à Europa capitalista.

Quanto aos movimentos de resistência à globalização e ao neoliberalismo, desde logo, adotaram a tese de Tobin. Com uma diferença de ênfase: Tobin, quando propôs o mecanismo, pensava mais na estabilidade da moeda dos países vítimas de especulação. Como feição secundária da taxa, sugeriu que os fundos arrecadados fossem canalizados para o Banco Mundial, que, então, financiava projetos produtivos em países em desenvolvimento. Ora, Sr. Presidente, o movimento antiglobalização logo percebeu que a arrecadação poderia ser destinada às causas da justiça social, da solidariedade planetária, da redistribuição das riquezas do mundo.

Os opositores da taxa Tobin sempre se organizaram em torno de dois argumentos: o de que qualquer restrição ao livre fluxo de capitais subtrai de seu efeito benéfico para a economia mundial e o de que a cobrança é tecnicamente inviável.

Ora, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sobre a viabilidade técnica, o Brasil pode dar lições ao mundo. Quanto aos benefícios da livre movimentação de capitais, as sucessivas e trágicas crises dos anos 90 encarregaram-se de sepultar esse argumento.

Sr. Presidente, o Brasil é uma das vítimas da anarquia do mercado financeiro especulativo internacional. O capital não produtivo - repito, não produtivo - evapora-se nos momentos mais inconvenientes, causando destruição e mais miséria. Agora mesmo, a maré do fluxo de capitais voláteis está a nosso favor e eles ingressam no País. Podemos estar certos, no entanto, de que eles nos deixarão e nos abandonarão se houver piores momentos, causando o maior desastre possível.

Daí a conveniência de domá-los, de refreá-los e de auferir apreciável arrecadação, instituindo a nossa taxa Tobin, que estou propondo. A arrecadação seria empregada em favor da justiça social e do bom equilíbrio econômico.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, como eu disse no início, tem de ficar muito claro: é uma proposta de taxação sobre o capital especulativo internacional, sim; não é uma taxação sobre o capital produtivo. Não estamos discutindo essa questão. Trata-se do capital especulativo.

Hoje, ao fazermos essas ponderações, estamos fazendo o intróito ao projeto que apresentaremos ao Senado da República, no sentido da criação - que tenhamos a coragem e a determinação de fazê-lo! - da taxa Tobin, para valer em nosso País. De capital especulativo, ninguém gosta e ninguém quer que leve tudo o que é nosso de um dia para o outro. Passa uma noite aqui e leva milhões; aliás, trilhões, como está muito bem registrado em nossa fala, em termos mundiais.

Na década de 80, eram US$150 milhões por ano; agora a importância de um trilhão e quinhentos milhões de dólares é levada pelo capital especulativo, principalmente dos países mais pobres e realmente explorados. Eles são um paraíso fiscal para o capital especulativo internacional. Deixo muito claro que o capital produtivo é bem vindo. Não queremos taxar o capital produtivo, senão, amanhã, dará a maior confusão por aí. Trata-se do capital especulativo internacional. Com este, não queremos nenhum acordo. Não queremos especulação aqui e, com isso, nos deixar a cada dia que passa mais pobres, não queremos com certeza.

Estamos discutindo o projeto de lei e vamos trazê-lo para o Senado da República, com a certeza de que vamos ter aquiescência e aprovação do Congresso Nacional do nosso País a favor da cobrança da taxa Tobin.

Sr. Presidente, era o que eu tinha a dizer. Obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/06/2003 - Página 14088