Discurso durante a 77ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários a respeito da divulgação dos novos dados de pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, que demonstram diferença de rendimentos entre brancos, negros e pardos, e destaca a região metropolitana de Porto Alegre/RS como sendo a localidade de menor diferença salarial. Indignação com o documento da Federação das Indústrias de São Paulo - Fiesp, que propõe um retrocesso nos direitos dos trabalhadores.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Comentários a respeito da divulgação dos novos dados de pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, que demonstram diferença de rendimentos entre brancos, negros e pardos, e destaca a região metropolitana de Porto Alegre/RS como sendo a localidade de menor diferença salarial. Indignação com o documento da Federação das Indústrias de São Paulo - Fiesp, que propõe um retrocesso nos direitos dos trabalhadores.
Aparteantes
Antero Paes de Barros, Luiz Otavio.
Publicação
Publicação no DSF de 14/06/2003 - Página 15535
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • ANALISE, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), DIFERENÇA, SALARIO, NEGRO, SUPERIORIDADE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, MUNICIPIO, SALVADOR (BA), ESTADO DA BAHIA (BA), INFERIORIDADE, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), REGISTRO, EXPERIENCIA, ORADOR, VITORIA, ELEIÇÕES, IMPORTANCIA, ENCAMINHAMENTO, POLITICA, SETOR PUBLICO.
  • JUSTIFICAÇÃO, APROVAÇÃO, ESTATUTO, IGUALDADE, RAÇA, DEFINIÇÃO, POLITICA NACIONAL, SETOR.
  • DENUNCIA, DESRESPEITO, DIREITOS E GARANTIAS TRABALHISTAS, PROPOSTA, FEDERAÇÃO DAS INDUSTRIAS DO ESTADO DE SÃO PAULO (FIESP), NEGOCIAÇÃO, ENTIDADES SINDICAIS, EXIGENCIA, EXTINÇÃO, PAGAMENTO, REPOUSO SEMANAL, REDUÇÃO, GRATIFICAÇÃO ADICIONAL, HORARIO NOTURNO, PARCELAMENTO, FERIAS, NECESSIDADE, MOBILIZAÇÃO, TRABALHADOR.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, os jornais de hoje estão divulgando os novos dados do IBGE, que demonstram que a maior diferença de rendimentos entre brancos, negros e pardos está, para surpresa de grande parte do País, em Salvador. Lá, os negros ganham bem menos do que ganha a população branca. E sabe-se que, em Salvador, 90% da população é negra.

E um dado positivo, Sr. Presidente: a menor diferença, ainda conforme pesquisa do IBGE, encontra-se na região metropolitana de Porto Alegre - sem querer plagiar aqui o Senador Mão Santa -, lá, no meu Rio Grande do Sul. Esse é um dado importante, porque, no Rio Grande do Sul, ao contrário da Bahia, 90% da população é branca.

Não é que não exista preconceito no Rio Grande, mas é uma alegria para este Senador negro, neste momento, saber que o IGBE levantou dados que demonstram que o Rio Grande do Sul é o Estado onde os negros têm o salário mais próximo do dos brancos.

Ao fazer esta homenagem ao Rio Grande, quero dizer que o nosso Estado é um exemplo a ser seguido na luta contra o preconceito. Não é que não exista preconceito, repito. Ele existe, mas o nosso Estado já elegeu um governador negro - e não era do meu Partido -, o atual Deputado Federal, do PDT, Alceu Collares. O Rio Grande do Sul foi um dos primeiros Estados do País a eleger um Deputado Federal negro, Hélio Santos. S. Exª veio também da Região Sul, do Rio Grande do Sul, e recebeu dois milhões e duzentos mil votos. Portanto, o Rio Grande do Sul tem uma história muito bonita.

Sr. Presidente, depois de 16 anos como Deputado Federal e sendo, por três vezes, o Deputado Federal mais votado do Rio Grande e um dos mais votados, sem sombra de dúvida, da Região Sul, e hoje Senador, dou, de público, dar este testemunho. Tive, sim, o apoio maciço da comunidade negra, mas se não tivesse também o apoio maciço da comunidade branca, eu não seria Senador da República.

É um exemplo bonito. Isso não significa que, no Sul, lá, no meu Rio Grande, tenhamos, de uma vez por todas, resolvido a questão do racismo. Mas estamos avançando e avançando muito bem.

Quero explorar os dados do IBGE.

Segundo a “Síntese de Indicadores Sociais de 2002” realizada pelo IBGE, os negros e pardos, com 12 ou mais anos de estudos, ganham 70% do salário dos brancos. Essas desigualdades não podem ser atribuídas ao nível da escolaridade. De acordo com pesquisa, as desigualdades se mantêm mesmo ao se igualar a escolaridade das pessoas. Os negros se esforçam, vencem todo o tipo de dificuldades, conquistam uma escolaridade e encontram pela frente a barreira racial.

Em Salvador, os afro-brasileiros - eu falava em 90%, mas segundo dado oficial o índice é um pouco menor - são 82% da força de trabalho. O rendimento médio mensal dos brancos, na Grande Salvador, é o segundo maior do Brasil; R$1.233, enquanto os negros e pardos ganham, em média, apenas 34% desse valor: R$421. Ou seja, na Bahia, a média salarial do cidadão branco é de R$1.233, e a média salarial do negro é de R$421.

Destacamos, ainda, os dados de Porto Alegre.

Na região metropolitana, o rendimento da população negra é o que se aproxima da média do rendimento dos brancos. Embora minoritários, os negros gaúchos já têm uma tradição de representação política - já comentei a nossa própria condução ao Senado.

Ontem, referimo-nos desta tribuna ao engajamento do Presidente Lula na superação da desigualdade racial. O Presidente Lula falou da sua determinação no combate ao racismo e tornou público esse compromisso, em pronunciamento em Genebra, onde Sua Excelência mesmo definiu que essa é uma questão de honra para o nosso País.

Os dados do IBGE são oficiais. Devem servir não só à denúncia, mas como parâmetros para o encaminhamento de políticas públicas. O Presidente, entendo eu, muito rapidamente deve responder, de forma positiva, às esperanças e às aspirações daqueles que seguem sofrendo em razão da discriminação racial.

O depoimento ao jornal O Globo, de Gelton de Oliveira, é dramático. Ele é baiano e economista, com pós-graduação em matemática. Para conseguir um emprego em uma empresa de fertilizantes, teve que cortar os cabelos, de modo a não explicitar referências de sua identidade étnica, que incomodavam o empregador.

Três meses depois, a empresa alegou que a necessidade de reestruturação da empresa determinava a demissão de Oliveira. O processo de reestruturação, segundo Oliveira, limitou-se a sua demissão. Não passava de um pretexto. Oliveira vive hoje como pequeno comerciante na periferia de Salvador. Foram anos de preparação e uma carreira profissional abortada pela discriminação racial. Há milhões de brasileiros impedidos de expressar seus talentos e de desenvolver suas vocações por causa das barreiras raciais.

Queremos registrar também que foi importante para nós a assinatura de um convênio entre a Fundação Palmares e a Prefeitura de Porto Alegre, dirigida pelo meu Partido, para elaborar o relatório antropológico que poderá indicar se a área ocupada pela família Silva pode ser definida como um quilombo urbano. A família Silva, como disse o Presidente da Fundação Palmares, é a grande referência para a cultura negra.

O Sr. Luiz Otávio (PMDB - PA) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Senador Luiz Otávio, com muita satisfação.

O Sr. Luiz Otávio (PMDB - PA) - Senador Paulo Paim, V. Exª, como sempre brilhante, traz assuntos palpitantes, atuais e importantes para o Brasil e para o mundo moderno em que vivemos. V. Exª, nesta manhã, discursa sobre o preconceito racial e faz referência à pesquisa do IBGE, que mostra a diferença de ascensão de raças no Brasil. Tive oportunidade de fazer uma avaliação dessa pesquisa e fiquei impressionado com a determinação dos números. Essa diferença entre classes sociais, inclusive entre raças, é muito evidente, principalmente com relação ao negro e ao branco, como V. Exª comenta nesta manhã, citando os casos da Bahia e do Rio Grande do Sul. São muito claros, também, os desníveis salariais entre mulheres e homens. Pergunto: o que podemos e devemos fazer para diminuir, ou até mesmo erradicar, essa diferença, porque os números são frios e as pesquisas continuam e continuarão sempre a apresentar os resultados que, ao longo de muitos e muitos anos, têm sido do conhecimento da população. Eu diria que temos um papel muito importante e a população, por inteiro, deve participar de tudo o que se relaciona com essa mudança, porque está bem claro que se trata de uma questão cultural, que avança há séculos e que permanece da mesma maneira. Portanto, temos que descobrir o que precisamos fazer para diminuir essas diferenças ou até mesmo extirpá-las. Muito obrigado pelo aparte, Senador Paulo Paim.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Senador Luiz Otávio, primeiramente, gostaria de demonstrar minha satisfação por V. Exª participar do meu pronunciamento.

Respondendo diretamente a sua pergunta, entendo que, neste momento, esta Casa, o Parlamento, o Poder Legislativo deve responder a esses dados alarmantes do IBGE. Até há pouco tempo, a mulher recebia praticamente metade do salário de um homem, mas a proporção atual é de 70%. Esse é um dado assustador e entendo que nós, do Poder Legislativo, deveríamos, rapidamente, aprovar o Estatuto da Igualdade Racial, não porque ele seja de minha autoria - quero deixar bem claro. Quando apresentamos um projeto como o Estatuto, é a contribuição dos Senadores e Deputados de todos os Partidos que o torna de alta qualidade.

Foi assim com o Estatuto do Idoso. Eu o apresentei na Câmara, há cinco anos, e ele recebeu contribuição dos Parlamentares do PMDB, do PSDB, do PDT, do PL, do PC do B, enfim, de todos os Partidos. O projeto original tinha em torno de cinqüenta artigos, mas terminou com cento e vinte e três. Assim, o Parlamento construiu esse grande substitutivo.

Tive o cuidado de apresentar o Estatuto da Igualdade Racial, com esses dados do IBGE, na Câmara e no Senado. A Casa que votá-lo primeiro o encaminhará na ordem de apresentação, definindo a matéria, que abrange política de cotas, educação, saúde, habitação, distribuição de renda e o papel da Justiça no combate ao preconceito e ao racismo.

Recebi uma denúncia - que não veio de Brasília - de que as prestadoras de serviço, quando mandam o currículo de alguém para uma empresa, nele colocam um código. Se no documento constar o número 131, isso significa que o candidato é negro e, já de antemão, ele é discriminado. Para fatos como esse, vamos ter que achar uma saída e o Estatuto trata disso. O projeto não resolve tudo, porque não será uma lei que o fará, mas contribui muito para um bom debate.

Sr. Presidente, Senador Valdir Raupp, vim à tribuna com dois objetivos. Eu não poderia deixar de falar desses dados do IBGE, mas também não tenho como não abordar uma segunda questão.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Senador Paulo Paim, permite-me V. Exª um aparte a respeito da questão do IBGE?

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Pois não.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - Quero cumprimentá-lo por comentar, na tribuna, os dados do IBGE e fazer referência a uma matéria publicada, hoje, no jornal O Globo, também a esse respeito. O Senado já aprovou um projeto de minha autoria que diminui esse apartheid social em que está organizada a educação brasileira. Sempre o melhor é oferecido aos mais ricos: o melhor ensino fundamental é para quem tem dinheiro para pagá-lo; o melhor Ensino Médio, também; na melhor universidade pública, que não precisa ser pagar, entra quem tem dinheiro. Por quê? Exatamente porque não temos reserva de vagas. Já aprovamos por unanimidade, no Senado, a reserva de 50% dessas vagas para os alunos da escola pública. Segundo dados do IBGE, na faixa etária de 18 a 24 anos, apenas 25% são universitários; 60% dos estudantes das unidades mantidas pelo Governo Federal pertencem à camada dos 20% mais ricos do País, e apenas 3,4% das vagas são dos mais pobres. Creio que esse critério de 50% atende, em parte, a cota de negros, embora eu defenda também a sua manutenção. O Brasil precisa assumir o debate da discriminação positiva até que ela não seja mais necessária, até o momento em que os negros e os pobres digam: “Parem, não precisamos mais dessa discriminação positiva para que possamos continuar.” Esse apartheid social é uma questão de classe que estabelece, eternamente, que filho de pedreiro será pedreiro, filho de carpinteiro será carpinteiro e filho de doutor será doutor. Entendo que o filho de pedreiro deve ter a oportunidade de ser doutor, embora a profissão de pedreiro seja extremamente respeitável e necessária. Quero cumprimentar V. Exª pois esse é um tema social importante e só depende da Câmara dos Deputados votar o projeto, pois nesta Casa ele já foi aprovado. Gostaria de apelar a V. Exª, pela liderança que exerce no Partido dos Trabalhadores - já que o assunto foi tema da campanha eleitoral do Presidente Lula -, que peça ao Presidente João Paulo que o coloque em votação e diminua esse fosso social existente na universidade pública brasileira.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Senador Antero Paes de Barros, quero cumprimentá-lo pelo feliz aparte, que endosso inteiramente. Esse projeto de sua autoria, que garante 50% das vagas universitárias para estudantes que venham da escola pública, combate a exclusão e garante que os pobres - negros, brancos ou índios - tenham acesso ao nível superior público, livre e gratuito.

A proposta de V. Exª está de acordo com tudo o que falei, por isso não tenho dúvidas de que é fundamental não se passar a impressão, para a sociedade, de que quem quer que os negros tenham cotas na universidades não está preocupado com os pobres que não são negros, contemplados na projeto de V. Exª. O projeto de V. Exª é completo porque principalmente os negros estão na base da pirâmide.

O Sr. Antero Paes de Barros (PSDB - MT) - E os negros, principalmente, estão nas escolas públicas por não terem recursos para pagar a escola particular.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - O projeto de V. Exª contempla os negros e também os brancos que estão na base da pirâmide.

O Sr. Antero Paes de Barros  (PSDB - MT) - Gostaria também de dizer que o Ministro Cristovam Buarque traz a debate a idéia de que, depois de formado, o cidadão pague a universidade. Nós só teremos condições éticas de debater essa idéia depois que estabelecermos essas quotas. Estabelecidas as quotas, um manto de proteção aos pobres e uma política positiva com relação aos negros, podemos discutir a tese do Cristovam. Caso contrário, estaremos discutindo a privatização da universidade pública.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - V. Exª apresenta um argumento de suma importância. Ouço, em relação ao combate do preconceito ao racismo, de quem é contra a quota na universidade, que devemos investir no pré-vestibular, nas categorias de base. Vamos investir, sim, mas por que não assegurar, enquanto isso, a política de quotas, como essa que V. Exª coloca muito bem, sem prejuízo de investir cada vez mais nas chamadas categorias de base?

Sr. Presidente, ainda dentro do meu tempo, gostaria de fazer uma denúncia da tribuna do Senado.

Estou impressionado e indignado com o documento que a Fiesp - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo - teve a ousadia de entregar ontem à Força Sindical, em uma reunião de negociação com sindicalistas sobre reposição de perdas, na busca de um salário decente, já que a renda do assalariado brasileiro, nos últimos doze meses, caiu 10%.

O documento da Fiesp - vejam bem o absurdo - exige o fim do pagamento do descanso semanal! Quer dizer que o trabalhador brasileiro - vejo, na galeria, estudantes que estão nos assistindo - não terá mais direito ao descanso remunerado. Isso é um retrocesso! Pensei que não ouviria e nem veria mais tal absurdo na história do nosso País!

Sr. Presidente, exigir o fim do pagamento do descanso semanal remunerado de domingos e feriados é um absurdo! Assusta-me! Para mim, isso é balão de ensaio para tentar vender a imagem da reforma da CLT.

Senador Antero Paes de Barros, nem aquele projeto famigerado - todos sabem do meu ato na Câmara - encaminhado pelo Governo anterior tomou essa liberdade! Este documento da Fiesp é muito pior do que o projeto encaminhado pelo Governo anterior, ao qual fui radicalmente contra! No entanto, em nenhum momento o Governo anterior teve a ousadia de dizer que os trabalhadores não teriam mais férias e domingos remunerados.

O documento fala também em redução do adicional noturno. Todos sabem que o trabalhador noturno é impedido do convívio familiar, já que o trabalho noturno é a única forma de ele ter um emprego e, ainda assim, eles querem reduzir o adicional! A Fiesp quer ainda a suspensão temporária do próprio contrato de trabalho, revisão dos acordos que reponham a inflação e o parcelamento das férias! Querem parcelar até o abono das férias, que é de um terço!.

Ora, Sr. Presidente, num momento como este, assusta-me a ousadia da Fiesp, que, ao abordar tais questões, caso não haja uma reação em cadeia da sociedade organizada, tentará vender essa imagem!

Por isso que ontem, aqui em frente, em um debate sobre a reforma da previdência, eu apresentava, com muita clareza, minha posição aos trabalhadores.

Temos que fazer a nossa pauta, senão a elite forçará a sua, e essa é uma verdadeira provocação à mobilização dos trabalhadores!

Sr. Presidente, tendo em vista o nosso compromisso com a Mesa para a questão do tempo dos pronunciamentos, não gostaria de ser eu a ultrapassá-lo, peço a V. Exª que registre na íntegra nos Anais da Casa o meu discurso.

É lamentável a ousadia da Fiesp! E digo isso com muita tranqüilidade porque, no dia 20 deste mês, em São Paulo, vou receber um prêmio chamado Leão de Ouro, conferido pelos três Estados do Sul, após, em pesquisa, ouvir empresários e homens políticos dos Estados. Então, tenho a impressão de que os empresários do Sul são mais avançados do que os aqui representados pela Fiesp.

É lamentável! Gostaria de não vir à tribuna para fazer tal denúncia. Entendo que as centrais sindicais, as federações, as confederações de trabalhadores responderão à altura, com uma grande mobilização, não abrindo mão dos direitos dos trabalhadores - 13º, férias, licença remunerada, feriados. Isso é brincadeira de mau gosto! É uma provocação! Tomara que ela não chegue a esta Casa, porque aqui, com certeza, um projeto como esse não passará!

Era o que tinha a dizer.

Obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SENADOR PAULO PAIM.

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O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Sr. Presidente,Srªs. e Srs. Senadores. enquanto o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, órgão de assessoramento do Presidente da República, em reunião no Palácio do Planalto, aprovava ontem uma proposta de reforma trabalhista e sindical para ser discutida no Fórum Trabalhista, praticamente ao mesmo tempo, em São Paulo, empresários do setor metalúrgico ameaçavam iniciar uma onda de demissões se o governo não reduzir juros e se os trabalhadores não aceitarem o fim de parte de seus direitos.

Em documento entregue à Força Sindical, esses empresários, integrantes do Grupo 9 da Fiesp - Federação das Indústria do Estado de São Paulo exigem o fim do pagamento do descanso semanal remunerado (domingos e feriados), redução do adicional noturno de 35% para 20%, suspensão temporária do contrato de trabalho, revisão dos acordos para repor a inflação e o parcelamento do pagamento das férias. O grupo quer ainda parcelar o pagamento das férias e do abono de um terço.

Essa proposta da Fiesp não passa de um arremedo do projeto de reforma trabalhista do governo passado, cuja tramitação foi recentemente suspensa aqui no Senado depois de ter sido aprovado na Câmara dos Deputados. Voltam a pregar abertamente a revogação dos direitos trabalhistas, com se esses direitos fossem a fonte de todo o mal da economia.

O Grupo 9 da Fiesp é composto por empresas de fabricação de máquinas, laminação de metais, equipamentos ferroviários, eletroeletrônicos, balanças, metais sanitários e esquadrias que têm cerca de 380 mil empregados no Estado de São Paulo. São 380 mil famílias ameaçadas com seus chefes encostados na parede para aceitar um acordo a qualquer custo.

As empresas argumentam que a economia está parada por causa dos juros altos impostos pelo governo. Sem o acordo, dizem, haverá demissões. É a velha e surrada cantilena dos empresários, que impotentes para enfrentar suas dificuldades investem preferencialmente sobre os trabalhadores, refém de suas chantagens em busca de mais vantagens. Jamais transferem aos trabalhadores seus ganhos de produtividade.

Mas nem mesmo os cortes e reduções propostos pelas empresas são garantia de estabilidade no emprego. Na reunião os sindicalistas chegaram a pedir uma trégua às empresas para que não haja demissões nos próximos dias, mas a resposta não foi conclusiva. Os empresários disseram que não podiam dar essa garantia.

Os empresários prometem que essas medidas teriam caráter temporário, até que as vendas voltem a crescer. Mas quem garante data de encerramento em nosso país para medidas de caráter temporário ou provisório? A CPMF está aí, transformada de imposto provisório a permanente para confirmar nossa suspeita.

Na reunião que precedeu a entrega do documento, representantes de empregados, empresas e sindicalistas criticaram a política econômica do governo. Ninguém mais do que este Senador tem criticado os juros altos, brigado pela sua redução, reconhecendo a estagnação da economia brasileira. Mas daí para aceitar a revogação de direitos trabalhistas vai uma distância muito grande.

Dentre as propostas da reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social está a possibilidade de estudar o parcelamento do 13.º salário. O Conselho sugeriu a criação do Simples Trabalhista, com objetivo de simplificar a contratação e baratear os custos para as pequenas e micro empresas.

No caso da reforma sindical, o Conselho recomendou o fim do financiamento da estrutura sindical pelo Estado. Houve recomendação, por exemplo, para que as centrais sindicais tenham o direito de fazer convenções coletivas. Outra proposta é de que as convenções e acordos coletivos sejam transformados em instrumentos básicos para modernizar e aperfeiçoar as relações entre capital e trabalho.

Ao mesmo tempo em que as empresas estudam cortes e parcelamentos nos salários de metalúrgicos de São Paulo, dados socioeconômicos do IBGE, divulgados ontem, mostram que metade dos trabalhadores brasileiros ganha até R$ 480 e que mais de 50% não têm sequer seguridade social.

É contra esse trabalhador, já desprovido dos mínimos direitos, que se pretende continuar investindo. Precisamos estar atentos e prontos a denunciar propostas dessa natureza para evitar que essas ameaças acabem se concretizando.

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/06/2003 - Página 15535