Discurso durante a 77ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários ao artigo do advogado Renato Zerbini Ribeiro Leão, publicado no jornal Correio Braziliense, edição de 9 do corrente, sobre a decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que condenou a taxação de inativos no julgamento de demanda de cinco aposentados do Peru. Críticas à política de juros altos do governo federal. Considerações acerca de notas publicadas na coluna Painel, de ontem, do jornal Folha de S.Paulo, informando que o BankBoston tem estimulado o investimento em juros no Brasil por considerar um ótimo negócio.

Autor
Antero Paes de Barros (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MT)
Nome completo: Antero Paes de Barros Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Outros:
  • Comentários ao artigo do advogado Renato Zerbini Ribeiro Leão, publicado no jornal Correio Braziliense, edição de 9 do corrente, sobre a decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que condenou a taxação de inativos no julgamento de demanda de cinco aposentados do Peru. Críticas à política de juros altos do governo federal. Considerações acerca de notas publicadas na coluna Painel, de ontem, do jornal Folha de S.Paulo, informando que o BankBoston tem estimulado o investimento em juros no Brasil por considerar um ótimo negócio.
Publicação
Publicação no DSF de 14/06/2003 - Página 15541
Assunto
Outros
Indexação
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, CORREIO BRAZILIENSE, DISTRITO FEDERAL (DF), NECESSIDADE, ATENÇÃO, GOVERNO BRASILEIRO, DECISÃO, CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS, OPOSIÇÃO, COBRANÇA, CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIARIA, APOSENTADO, PAIS ESTRANGEIRO, PERU.
  • EXPECTATIVA, REVISÃO, GOVERNO FEDERAL, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, RESPEITO, DIREITO ADQUIRIDO, JUSTIÇA SOCIAL.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, ATUAÇÃO, HENRIQUE MEIRELLES, PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), EX PRESIDENTE, BANCO ESTRANGEIRO, MANUTENÇÃO, SUPERIORIDADE, TAXAS, JUROS, FAVORECIMENTO, BANCOS.
  • EXPECTATIVA, REUNIÃO, CONSELHO, POLITICA MONETARIA, REDUÇÃO, TAXAS, JUROS.

O SR. ANTERO PAES DE BARROS (PSDB - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho hoje à tribuna para chamar a atenção do Governo do PT para o risco que está correndo ao insistir, equivocadamente, com a cobrança dos servidores inativos, mesmo porque o Partido dos Trabalhadores foi ao Supremo Tribunal Federal para que essa cobrança fosse declarada inconstitucional.

Ontem, e hoje está nos jornais, o Presidente Lula afirmou que as cobranças corretas merecem uma avaliação do Governo. Pode ter passado despercebido pela Assessoria do Governo, mas quero aqui registrar um artigo de Renato Zerbini Ribeiro Leão, advogado, mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília, ex-funcionário e diplomado pelo Instituto Interamericano de Direitos Humanos e professor titular do Centro Universitário de Brasília.

Esse artigo foi publicado na segunda-feira, dia 9 de junho, no jornal Correio Braziliense, no caderno especial Direito e Justiça, e narra o seguinte:

Corte Interamericana condena taxação de inativos.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (de agora em diante “Corte”), órgão de supervisão da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e cuja jurisdição é aceita pelo Brasil desde 10 de dezembro de 1998, em sua sentença de 28 de fevereiro de 2003 sobre o caso “Cinco aposentados versus Peru” (de agora em diante “Sentença”), deu, involuntariamente, uma importante contribuição para a atual discussão brasileira acerca da legalidade da taxação dos inativos.

Nesse caso, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (de agora em diante “Comissão”) submeteu à Corte, em 4 de dezembro de 2001, demanda contra o Estado do Peru, a partir de denúncia recebida na Secretaria da Comissão em 1º de fevereiro de 1998.

Os aposentados recorreram contra o Estado do Peru, porque houve a taxação dos inativos. O recurso objetivava que “a Corte decidisse se o Peru violara os arts. 21 (Direito à propriedade privada), 25 (Proteção judicial) e 26 (Desenvolvimento progressivo) da Convenção Americana, com relação às obrigações estabelecidas nos arts. 1.1 (Obrigação de Respeitar os Direitos) e 2 (Dever de Adotar Disposições de Direito Interno) de tal tratado, devido à modificação no regime de aposentadorias de que cinco cidadãos peruanos desfrutavam desde 1992 e pelo não cumprimento das sentenças da Corte Suprema de Justiça e do Tribunal Constitucional do Peru ‘que ordenaram a órgãos do Estado peruano pagar aos aposentados uma aposentadoria calculada de maneira estabelecida na legislação vigente para o momento em que estes começaram a desfrutar de um determinado regime de aposentadoria’”.

Portanto, o que quero deixar registrado claramente nesta Casa é que a taxação de inativos foi julgada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos -por iniciativa de cinco aposentados do Peru - e considerada crime contra os direitos humanos. Aquela Corte condenou o Peru a restabelecer a situação anterior. E não são poucos os juristas brasileiros que consideram inteiramente inconstitucional a cobrança dos servidores inativos.

É bom que se reconheça aqui que o Governo Lula tem tido uma atuação internacional que orgulha todos os brasileiros, como aconteceu no recente pronunciamento, em que defendeu, mais uma vez, a criação do Estado palestino e a paz naquela importante região do mundo, bem como na época do conflito que envolveu Estados Unidos, Inglaterra e Iraque, em que o Brasil ficou com a posição lúcida de defender a paz.

Portanto, não fica bem para o Brasil insistir nesse absurdo que é a cobrança dos inativos, mesmo porque, além de ser inconstitucional, essa cobrança não resolve os problemas da Previdência Social. Essa cobrança é injusta porque os servidores que já se aposentaram estão impedidos de construírem uma aposentadoria complementar. Como o cidadão aposentado vai recolher 35 anos de aposentadoria complementar, retrocedendo no tempo, para poder desfrutar de uma aposentadoria complementar? É impossível fazer isso; é impossível voltar na máquina do tempo.

Então, com relação à questão dos aposentados e pensionistas, faria muito bem o Governo brasileiro se recuasse, por uma questão de justiça social e de não afrontar o direito adquirido.

E vou mais além: não penso que aqui se trate de limite de R$1.058,00, de que, se ampliar o limite para R$2,4 mil, nós votamos. Ampliar o limite para R$2,4 mil diminui a injustiça, mas não elimina a inconstitucionalidade, porque as pessoas que contribuíram com a Previdência o fizeram segundo aquela regra em que teriam direito à aposentadoria do jeito que estão.

O princípio da irredutibilidade do salário está garantido em nossa Constituição. E é impossível para um jurista provar que o cidadão tem um rendimento, sobre o qual serão cobrados 11%, e que não houve redução de salário, sendo que isso não estava previsto quando ele contribuiu para a Previdência Social do Brasil.

Dito isso, quero, mais uma vez, tratar do seguinte assunto: Banco Central, presidido por Henrique Meirelles. Não vou discutir, tecnicamente, se S. Sª faz ou não uma boa gestão à frente daquela instituição; acredito até que tem condições técnicas para isso, mas não a está fazendo, porque insiste nessa política de juros altos, desnecessária.

Passo a ler uma situação de difícil explicação por parte de S. Sª. Está na Folha de S.Paulo de ontem:

Sem medo de ser feliz

O BankBoston, do qual Henrique Meirelles (BC) foi presidente, enviou carta a clientes defendendo que “investir em juros no Brasil tem sido um ótimo negócio”. Diz que o Copom manteve em maio a taxa Selic num “nível bastante elevado”, “suficiente para manter a atratividade das aplicações de renda fixa”.

É o Banco de Boston que diz isso em carta a seus clientes!

Acima da inflação

O “Guia Boston de Investimentos” diz que quem buscou nos últimos anos o “refúgio dos fundos de renda fixa do banco manteve o poder aquisitivo de seus recursos e até o ampliou”, em comparação com o índice de inflação usado pelo Banco Central para definir a taxa de juros.

Mais duas notas complementam as informações da coluna “Painel”, da Folha de ontem:

Curriculum vitae.

Presidente do BC, Henrique Meirelles, ainda hoje recebe do BankBoston uma aposentadoria de US$750 mil por ano.

Questão técnica.

Maurício Damico, superintendente-executivo de investimentos do BankBoston, diz que recomenda a seus clientes investir “no que é mais rentável, independentemente de ser ruim ou bom para o país ter juros altos”.

O Presidente do Banco Central leu essas notícias e deu explicações à coluna “Painel”, da Folha de S.Paulo. Hoje, há mais duas notas:

Ah, bom

Henrique Meirelles (BC) diz que o BankBoston demonstrou confiança na economia ao aconselhar clientes a investir em juros no Brasil. Se outros bancos internacionais fizerem o mesmo, o risco-país cai e a taxa Selic poderá ser reduzida, afirma.

Previdência dos sonhos

Meirelles diz não ter nenhum interesse pessoal no sucesso comercial do BankBoston. Seu contrato de aposentadoria de US$750 mil anuais com a instituição prevê o pagamento mesmo em caso de falência.

Esta última comenta a previdência dos sonhos, que é bem diferente daquela que Lula quer para os nossos aposentados.

Em junho, os juros vão baixar, até porque há um artigo na Folha de S.Paulo de hoje, do economista Paulo Nogueira Batista, que mostra claramente que a questão dos juros não é só técnica, mas também política; e, no artigo publicado na Folha de S. Paulo, mostra, à exaustão, que o Presidente Lula foi, sim, consultado quando da elevação da taxa de juros para 26,5%. O jornal diz, inclusive, que ninguém vai desmentir essa informação, porque tem conhecimento de quem a forneceu à coluna “Painel”. Portanto, se o Presidente Lula foi consultado, é evidente que essa decisão foi técnica, mas também política. Recomenda-se, agora, técnica e politicamente, uma significativa redução na taxa de juros, porque o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, que Lula criou e disse fazer questão de ouvir, está sugerindo claramente isso, apesar de alguns setores estarem propondo também a supressão de todos os direitos trabalhistas.

Apenas um setor no Brasil - não entendo bem o motivo por que só ele recebe o nome de mercado -, ou seja, os bancos, querem que a taxa de juros continue como está. Portanto, não tenho mais nenhuma dúvida de que, em junho, haverá uma redução. E digo mais: não pode ficar em viés de baixa, nem ser uma redução pífia; precisa ser uma redução significativa.

Penso que o Banco Central deveria observar como estavam as taxas de juros do Brasil quando a economia brasileira tinha as características atuais. No Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, quando o risco-país do Brasil encontrava-se em 700 pontos e o dólar no presente patamar, como estava a taxa de juros? Não fiz essa pesquisa, mas vou realizá-la um pouco antes da decisão do Copom. Portanto, a taxa de juros do Governo Lula pode, perfeitamente, seguir os mesmos moldes da estabelecida para a economia brasileira no Governo do Presidente Fernando Henrique, quando apresentava esses sinais de vitalidade.

Espero que seja verdadeira - e acredito na sinceridade do Presidente Lula - essa disposição de examinar as críticas feitas ao Governo.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, que o Brasil passou a integrar a partir de 10 de dezembro de 1998, puniu o Peru por taxar pensionistas e aposentados. Gostaria que o Governo brasileiro não nos submetesse a essa humilhação internacional de sermos julgados no futuro por um tribunal que defende os direitos humanos. Portanto, que se respeitem os aposentados do Brasil.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/06/2003 - Página 15541