Discurso durante a 14ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Investimentos do Governo Federal em infra-estrutura nos próximos quatro anos.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.:
  • Investimentos do Governo Federal em infra-estrutura nos próximos quatro anos.
Aparteantes
João Capiberibe, Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 22/07/2003 - Página 19366
Assunto
Outros > POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, REUNIÃO, PARTICIPAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, MINISTRO DE ESTADO, PRESIDENTE, BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO ECONOMICO E SOCIAL (BNDES), BANCO DO BRASIL, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), ELABORAÇÃO, PLANO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, IDENTIFICAÇÃO, SETOR, PRIORIDADE, INVESTIMENTO, DISPONIBILIDADE, RECURSOS FINANCEIROS, FINANCIAMENTO, MELHORIA, INFRAESTRUTURA, DESENVOLVIMENTO.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, CLAUSULA, ACORDO, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), REFERENCIA, SUPERAVIT, FACILITAÇÃO, GOVERNO, IMPLEMENTAÇÃO, PLANO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, INVESTIMENTO, INFRAESTRUTURA, TRANSPORTE, ENERGIA, RETOMADA, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na semana passada, o Presidente da República realizou uma reunião de fundamental importância para o País. Essa reunião envolveu todo o alto escalão do Governo. Estavam presentes 12 Ministros; o Vice-Presidente da República, José Alencar; e os Presidentes do BNDES, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, dos principais fundos de pensão do País e das nossas principais estatais - de forma muito especial a Petrobras. Nessa reunião, que teve mais de cinco horas de duração, foi debatido e apresentado todo o plano de desenvolvimento do País, foram dados encaminhamentos e diretrizes para que possam ser realizados os investimentos em obras de infra-estrutura que são de fundamental importância. O Brasil, nas últimas décadas, não investe em infra-estrutura de forma adequada nas áreas de energia, de estradas, de portos, em todos aqueles setores que sustentam o desenvolvimento do nosso País e que infelizmente estão sucateados, desvalorizados e menosprezados.

Além do investimento em infra-estrutura, todo o debate nessa reunião foi realizado sob a ótica do financiamento, de onde sairão os recursos. Todos sabemos que o investimento internacional é muito pequeno. Há uma crise internacional, portanto não há sobra de capitais para realização de investimento, principalmente em países como o nosso, em desenvolvimento; a poupança interna brasileira infelizmente não tem acúmulo suficiente e necessário para fazer toda a sustentação desse projeto, desse programa de desenvolvimento sustentado para o nosso País.

Então, foi uma reunião muito importante e que ganhou registro nos jornais, nas revistas do final de semana como algo fundamental. A manchete de uma das revistas foi “Acelera, Brasil”. Talvez impulsionados pela vitória de Rubens Barrichello, consigamos agora, efetivamente, dar a aceleração de que este País necessita, para buscarmos o “espetáculo de crescimento” que o Presidente da República, de forma otimista, está propondo-se a coordenar.

Nessa reunião, falou-se na possibilidade efetiva de alocação de R$400 bilhões para esses investimentos no financiamento dessas obras de infra-estrutura para os próximos quatro anos. Esse montante representa algo em torno de 7,5% do PIB, o que é um volume de recursos significativo, que não tem tido a sua realização nas últimas três décadas. E é importante recordar que, durante o “milagre econômico” de 1970 a 1977, tivemos investimentos em infra-estrutura da ordem de 11% do PIB. Portanto, se dermos condições para que esse programa de investimento do Governo Lula se viabilize, ainda assim não conseguiremos recuperar aquilo que o Brasil já fez, há três ou quatro décadas, em termos de infra-estrutura para o desenvolvimento.

De qualquer forma, esses R$400 bilhões são de fundamental importância, porque envolvem as obras que vou listar. Pela simples menção às obras e aos valores, pode ficar muito claro o que isso significa em termos de criação de empregos, mão-de-obra, desenvolvimento econômico distribuído em todas as Regiões do País.

As obras e os valores respectivos estão assim definidos: transposição do rio Tocantis para o rio São Francisco, da ordem de R$24 bilhões; interligação do rio Amazonas com o rio Orinoco, R$18 bilhões; interligação da bacia do rio Amazonas com a bacia do rio da Prata, R$13 bilhões; investimentos em usinas hidroelétricas, R$38 bilhões; investimentos em usinas termelétricas, R$8 bilhões; investimentos em refinarias, R$12 bilhões; investimentos em plataformas de exploração de petróleo, R$10 bilhões; obras rodoviárias e ferroviárias, R$19 bilhões; ampliação da rede de metrô de São Paulo e do Rio de Janeiro, R$30 bilhões; redes de metrô em outros locais, R$15 bilhões; porto de Santos, R$3,5 bilhões; porto de Sepetiba, no Rio de Janeiro, R$3 bilhões; linhas de transmissão de energia elétrica, R$8 bilhões; distribuidoras de energia elétrica, R$15 bilhões.

Portanto, são R$400 bilhões que têm perspectiva de serem alocados, ao longo destes quatro anos, para que a infra-estrutura de energia, estradas, transmissão e de portos possa dar condições para que este País se desenvolva.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senadora Ideli Salvatti, V. Exª me concede um aparte?

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Gostaria de ouvi-lo, Senador Roberto Saturnino, porque V. Exª deve ter ficado muito feliz porque o porto de Santos tem a perspectiva...

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - O porto de Sepetiba, no Rio de Janeiro, Senadora.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Pois é. O porto de Santos, com a perspectiva de R$3,5 bilhões, e o de Sepetiba, R$3 bilhões. São dois portos importantíssimos para a escoação das exportações brasileiras.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senadora Ideli Salvatti, cumprimento V. Exª por trazer ao Senado essa notícia, que é da maior importância. Não creio que possa haver notícia mais importante do que a decisão de o Governo tomar as providências para executar esse investimento público, porque há uma correlação fortíssima, nítida, na história da economia do País, entre o crescimento da economia brasileira e a realização de investimentos públicos na infra-estrutura econômica do Brasil. Recorrendo a toda série histórica se verifica isso claramente. É fundamental, essencial que isso seja realizado. Até se reclama muito da taxa de juros, que está elevada, mas reduzir juros ou o compulsório dos bancos certamente algum efeito produzirá sobre a economia e nós poderemos crescer 2,5% ou 3%. Mas este não é o crescimento que o Brasil precisa. O País, com este quadro social insustentável que apresenta, para a resolução desses problemas sociais e a obtenção de uma economia mais justa e uma distribuição eqüitativa, precisa crescer 6% ou 7%, sua taxa histórica. Esse crescimento somente se atingirá na medida em que houver esse investimento público em infra-estrutura que V. Exª está trazendo. Agora, sim, ficamos com certeza de que iremos assistir ao espetáculo do crescimento. Certamente. Claro que não será ainda este ano, que está prejudicado pela necessidade que o Governo teve de puxar os freios, em razão da crise gravíssima que havia quando assumiu. Mas nós vamos ter, sim, um crescimento econômico e com fundamento, com uma base sólida nesse investimento que V. Exª está anunciando a esta Casa. Meus parabéns, meus cumprimentos.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço a V. Exª, Senador Roberto Saturnino, e registro que as medidas adotadas na reunião da última quinta-feira obtiveram uma excelente repercussão junto ao setor privado, ao empresariado nacional. Inclusive, o Presidente da Grendene, Eugênio Staub, foi muito enfático - e está nos jornais - ao afirmar, de forma muito clara, que o País não investe adequadamente em infra-estrutura há uns dez anos.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Isso mesmo. Senadora Ideli, até mesmo o capital estrangeiro será atraído por esse investimento.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Com certeza.

Eu gostaria de também conceder um aparte ao Senador João Capiberibe.

O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senadora Ideli Salvatti, esta é uma notícia que nos alegra e enche os nossos olhos de brilho. Mas eu gostaria de fazer um contraponto. Acredito que precisamos de investimento em infra-estrutura, mas temos de solucionar um problema estrutural da sociedade humana e, em particular, da sociedade brasileira, qual seja, a concentração urbana provocada pelo processo de industrialização. Penso que estamos vivendo a era pós-industrial, em que esse importante setor da economia já não responde pela geração dos empregos necessários para atender a esse flagelo, a essa tragédia que estamos vivendo, que é o desemprego. Ao mesmo tempo em que trabalhamos, em que o Governo Lula, em que o Presidente está preocupado com esse viés keynesiano, em contraponto a essa combinação de política econômica de mercado - o Governo se esforça para levantar os ativos restantes, pois há muita coisa que sumiu pelo ralo das privatizações ao longo dos últimos doze anos -, precisamos de uma alternativa para a desconcentração urbana. É possível aliar um grande programa de infra-estrutura a essa inversão de modelo, pensar em uma volta da ocupação dos espaços amplos, de que este País dispõe, e fazer não apenas uma reforma agrária, que não podemos mais adiar.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Escamotear.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Adiar. Nem mais um minuto. Precisamos de mais do que uma reforma agrária. A reforma agrária é geradora, sim, de empregos, mas ela pode ser a mudança de modelo de que tanto necessitamos e, também, pode ser essa desconcentração das populações urbanas que hoje estão sem saída. Cada vez em que se modernizam as indústrias, moderniza-se para gerar menos empregos. Ao invés de ampliar o número de empregos, eles diminuem, em função da tecnologia, da tecnologia de gerenciamento, da automação. Esse é um processo cuja estrutura temos de modificar. O Plano Nacional de Reforma Agrária tem de vir com essa dimensão, aliado a esse programa de investimento e também com essa mudança de modelo. Na questão da violência urbana, quanto mais concentramos investimentos nos centros urbanos, maior será a atração. Temos de dividir esses recursos e concentrá-los na reforma agrária e na urbanização do campo brasileiro. Tenho a impressão de que urbanizando as áreas rurais, dotando-as de condições adequadas de vida, colocando escolas adequadas e em consonância com a vida das pessoas que moram no campo, elas vão ficar lá e nós vamos ter resposta. Eu acho que o Governo do Presidente Lula tem que vencer esses grandes desafios que foram postergados até hoje. Muito obrigado.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço ao Senador João Capiberibe.

Fiz questão de ler as obras porque elas dão esta dimensão de descentralização e também essa dimensão de urbano e rural. A transposição do rio Tocantins para o rio São Francisco, Nordeste e Centro-Oeste sendo atingidos, a interligação da bacia do rio Amazonas com o rio Orinoco, atingindo todo o Norte do nosso País, e a interligação da bacia do rio Amazonas com a bacia do Prata podem melhorar as condições de vida em todo o País.

Mas há um problema que eu gostaria de abordar. Boa parte desse financiamento terá que vir das nossas estruturas de financiamento, do BNDES, do Banco do Brasil, da Caixa Econômica. E, infelizmente, temos uma amarração que tem impedido inclusive de utilizar recursos que existem, que estão trancados no BNDES, na Caixa Econômica por conta do acordo com o FMI.

Há dois itens do acordo com o FMI que precisamos revogar, que precisamos refazer. Estamos agora na iminência de um novo acordo. O ideal seria que não precisássemos renová-lo. O Ministro Antonio Palocci tem trabalhado nessa linha, mas, infelizmente, talvez isso não aconteça. Indiscutivelmente, quando a missão do FMI chegar ao Brasil, no mês de setembro, temos que estar com este País mobilizado, com as suas principais lideranças, com todos aqueles que defendem o desenvolvimento efetivo conscientes de que o acordo com o FMI, se for renovado, precisa ser feito em outro patamar.

O que precisamos revogar para poder desafogar, inclusive um recurso que o Brasil tem e está colocado nos seus bancos, mas que não pode usar? Em primeiro lugar, a questão de o investimento público ser considerado como despesa e ir diretamente lá no déficit.

Temos recurso lá no BNDES, temos recurso para fazer investimento nas nossas estatais, mas, infelizmente, não podemos construir refinaria, não podemos construir usinas, não podemos dispor de inúmeros instrumentos de desenvolvimento porque há uma restrição, porque não pode ser considerado como investimento, mas, sim, como déficit, como despesa, e aí o limite do superávit barra, restringe, impede que esse dinheiro que está disponível possa ser utilizado.

A outra questão, mais triste, é a questão do superávit impedindo a obtenção de empréstimos para as prefeituras brasileiras. Há um limite no total das prefeituras. Temos, hoje, mais de duas mil prefeituras absolutamente adimplentes. Elas têm capacidade de endividamento, estão com todas as suas dívidas quitadas e não podem pegar empréstimos junto ao BNDES ou à Caixa Econômica para fazer obras fundamentais nos seus municípios, na área de saneamento, de habitação, de infra-estrutura.

Só para se ter uma idéia, a Caixa Econômica Federal tem disponíveis mais de R$2 bilhões para obras de saneamento e habitação, mas somente R$600 milhões podem ser liberados, porque essa restrição no acordo com o FMI impede que as Prefeituras acessem esses recursos.

Concedo um aparte ao Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Senadora Ideli Salvatti, em duas palavras, esses são os pontos que mostrarão à sociedade brasileira que o Governo Lula não é o Governo Fernando Henrique Cardoso e que não estamos mais no neoliberalismo. Vamos libertar a economia brasileira dessas amarras, porque o nosso compromisso firme com a Nação brasileira é esse.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Exatamente.

Essas duas questões são imprescindíveis para esse programa de investimento de R$400 bilhões. Se não conseguirmos captar financiamento externo, se isso está muito difícil e se não temos condições de disputar os parcos recursos internacionais para a realização de investimentos, precisamos utilizar os recursos disponíveis no nosso País. Para isso, não podemos ter as amarras do acordo do FMI impedindo que, existindo dinheiro, não possamos usá-lo na ampliação das nossas estatais e das nossas empresas públicas e também no investimento das nossas Prefeituras. Precisamos tomar providência em relação a esses dois gargalos que estão no acordo do FMI.

Nesse contexto, o Senado da República tem papel fundamental e decisivo em iniciar esse debate e em mobilizar toda a sociedade brasileira. Estamos agora em convocação extraordinária e não podemos realizar, neste momento, nenhuma atividade relacionada a esse assunto, porque ele não está na pauta da convocação; mas, neste momento, estou trazendo o assunto para o Plenário porque devemos começar os trabalhos ordinários do Senado, agora em agosto, tendo essa questão como eixo, como centro da nossa atividade. Temos que desenvolver atividades no Senado que tragam esse assunto, que vejam como vamos mobilizar todas as autoridades - mobilização pelo interesse do País, e suprapartidária.

Estive com os Prefeitos de quatro Prefeituras do meu Estado quando se reuniram com o Presidente do BNDES, Professor Carlos Lessa. Os Prefeitos fizeram a seguinte pergunta. “Presidente, como não podemos acessar o empréstimo? Temos capacidade de endividamento, estamos adimplentes, não devemos nada. Estamos pedindo R$50 milhões, mas temos capacidade para 20, 30, 50 vezes mais!” E o Professor Carlos explicou o acordo de forma muito clara, relatando-nos que essas cláusulas do FMI são antigas: são da época de Dilson Funaro, em 1986.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Senadora Ideli Salvatti, lamento informar que o tempo esgotou. Mas o pronunciamento de V. Exª deu novas asas àquela esperança que venceu o medo do povo brasileiro.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Com certeza.

Sr. Presidente, eu queria concluir dizendo que é inadmissível a continuidade de algo que amarrou o desenvolvimento deste País desde 1986! Por isso, estou levantando este assunto, pois tenho certeza de que o Senado da República vai capitanear toda a mobilização política para que o Sr. Horst Köhler, Diretor-Geral do FMI, quando vier ao País em setembro, a fim de renegociar um novo acordo - se este for necessário -, encontre o Brasil em pé de guerra. Dessa forma, talvez tenhamos as condições de desenvolvimento possibilitadas pelo FMI à Rússia e ao México, quando flexibilizou as condições do acordo para viabilizar o desenvolvimento e o investimento em infra-estrutura, tão necessários na geração de empregos e no crescimento dos países.

Sr. Presidente, muito obrigada e desculpe-me por ter ultrapassado um minuto do meu tempo.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Muito bem, Senadora Ideli Salvatti.

(Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/07/2003 - Página 19366