Discurso durante a 21ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Quinquagésima quinta reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC, realizada em Recife/PE.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. PROPRIEDADE INDUSTRIAL.:
  • Quinquagésima quinta reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC, realizada em Recife/PE.
Aparteantes
José Jorge.
Publicação
Publicação no DSF de 31/07/2003 - Página 20725
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA. PROPRIEDADE INDUSTRIAL.
Indexação
  • REGISTRO, REUNIÃO, SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIENCIA (SBPC), REALIZAÇÃO, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), ELOGIO, PRESIDENTE, IMPORTANCIA, ENTIDADE, VINCULAÇÃO, POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.
  • ANALISE, NECESSIDADE, REFORÇO, ORGÃO REGIONAL, SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIENCIA (SBPC), ESTADOS, DESCENTRALIZAÇÃO, PESQUISA, BENEFICIO, DEMOCRACIA, REGISTRO, DADOS, DISTRIBUIÇÃO, RECURSOS.
  • DEFESA, AUMENTO, INTERCAMBIO, UNIVERSIDADE, EMPRESA, PRODUÇÃO, TECNOLOGIA, NECESSIDADE, INCENTIVO, PATENTE DE REGISTRO, PATENTE DE INVENÇÃO.
  • IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), CONSELHO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLOGICO (CNPQ), FINANCIADORA DE ESTUDOS E PROJETOS (FINEP), COORDENAÇÃO DE APERFEIÇOAMENTO DE PESSOAL DE NIVEL SUPERIOR (CAPES), CONTINUAÇÃO, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, REGISTRO, DADOS, INVESTIMENTO, SETOR, BENEFICIO, CIDADANIA, EDUCAÇÃO.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Srª Presidente Senadora Serys Slhessarenko, Srªs e Srs. Senadores, a 55ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC, realizada este mês em Recife, reafirmou o tradicional protagonismo da entidade como consciência crítica dos nexos entre a evolução científica e tecnológica e o desenvolvimento socioeconômico no nosso País.

Nas palavras do físico e agora professor da Universidade do Espírito Santo, Ennio Candotti: “Há vinte anos, as reuniões [da sociedade] vêm crescendo, assim como sua importância no cenário da ciência e tecnologia. Ela foi protagonista [lembra o professor Candotti] da reconstrução do Ministério da Ciência e Tecnologia, extinto por duas vezes. Além disso, a SBPC tem o que dizer sobre os grandes temas, como a questão dos transgênicos, proteção da biodiversidade e recursos genéticos”.

O professor Candotti declarou ser uma de suas tônicas à frente do SBPC o fortalecimento da presença da entidade nos Estados, com a criação de regionais onde elas ainda não existem e o estímulo ao crescimento das já instaladas, pois, a seu ver, “os desafios da educação e do desenvolvimento se encontram nos Estados”.

Essa preocupação do cientista reflete um dos dois grandes desafios atuais da produção científica brasileira. Trata-se do imperativo de desconcentrar, ou melhor, democratizar geograficamente as pesquisas puras e aplicadas. Muito embora 22 Estados já tenham suas fundações de amparo à pesquisa, as chamadas FAPs, que, pela lei, deveriam receber repasses entre 1% e 2% da arrecadação estadual, somente a Fapesp, de São Paulo, se beneficia integralmente desse dispositivo.

Os números também evidenciam o grave desequilíbrio regional na divisão do bolo de recursos destinados pelos Estados à ciência e tecnologia, sobretudo se considerarmos o horizonte a partir da Constituição de 1988. Enquanto na Região Sudeste a fatia de 2001 correspondeu a 71,49% do total, à Região Sul couberam apenas 14,3%, ao Nordeste 10%, ao Centro-Oeste 2,31% e ao Norte somente 1,9%. Isso deve ser considerado pelas autoridades e pela opinião pública como um alerta para as graves conseqüências de um desenvolvimento científico tão pouco harmonioso e integrado para um País grande e diverso como o nosso.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, até mesmo os centros regionais mais ricos e com sólida tradição científica sofrem com a falta de recursos e com a ausência de uma política atenta às diferentes ciências nesses estratégicos segmentos da criação do saber. Em São Paulo, pós-doutores da USP, na sua legítima luta por uma sobrevivência digna, são crescentemente recrutados para lecionar em universidades particulares, afastando-se assim de suas bancadas nos laboratórios, onde uma bolsa não ultrapassa a R$2.100,00 mensais. Um mestrando ganha de R$725,00 a R$930,00; um doutorando de R$1.072,00 a R$1.770,00.

Creio que a situação poderia estar melhor se houvesse no Brasil uma mais forte associação entre a universidade e as empresas nacionais ou transnacionais, que poderiam transformar os conhecimentos ali produzidos em tecnologia comercializável e altamente lucrativa. É bom lembrar que essa associação entre empresa e universidade é muito forte nos chamados países do Primeiro Mundo. Talvez, por isso mesmo, sejam nações que tenham avançado muito na geração e intercâmbio de tecnologias e se tenham caracterizado por grandes avanços no campo científico.

Norberto Bobbio disse, com propriedade, poucos anos atrás, que “o mundo vai se dividir entre as nações que sabem e as que não sabem”. Daí a importância, friso, para o Brasil em investir cada vez mais em educação, ciência e tecnologia.

Ainda que o número de mestres e doutores se tenha expandido fortemente nos últimos anos, que o País ainda tem 80% dos seus cientistas trabalhando em universidades e institutos de pesquisa e apenas 20% na iniciativa privada. O inverso do que ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, onde 80% dessa mão-de-obra qualificadíssima transforma pesquisa em riquezas dentro das próprias empresas.

As descontinuidades formam um quadro bastante complexo e desafiador. Se, ao longo das últimas duas décadas, nossa produção de artigos para publicações científicas pulou de 1889, em 1981, para mais de 11 mil no ano passado, pouquíssimas descobertas foram devidamente patenteadas. Os prejuízos de nossa insuficiente cultura de patenteamento e, portanto, da fraca cooperação universidade-empresa são simbolizados pelo caso do captopril, medicamento anti-hipertensivo extraído do veneno da jararaca, que, hoje, movimenta US$5 bilhões do mercado financeiro mundial. O princípio ativo da referida droga foi descoberto no final da década de 60 por um cientista brasileiro, Sérgio Henrique Ferreira, pesquisador da Faculdade de Medicina da USP em Ribeirão Preto, em parceria com investigadores britânicos ligados ao Royal College. No entanto, passados 10 anos de intensos estudos, quem ficou (e lucrou) com a patente foi - segundo informam os jornais - um grande laboratório dos Estados Unidos.

Não se trata, vejam bem, Srªs e Srs. Senadores, de uma apropriação estrangeira de descobertas em grande medida produzidas pelo talento de cérebros brasileiros, mas, simplesmente, do fato de que empresas do mundo desenvolvido identificaram corretamente a necessidade de pesados e contínuos investimentos de pesquisa e tecnologia até que se chegasse ao produto final. Essa consciência ainda é muito tênue entre nós e, se não absorvida e aplicada à construção de boas leis e instituições, o Brasil perderá a nova janela de oportunidade condizente com a transformação do tesouro da nossa biodiversidade em fonte de riquezas e justiça social para o nosso povo.

Srª Presidente, neste ponto, cumpre lembrar que o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso nos legou um trabalho pioneiro de institucionalização que não pode ser descontinuado. Com efeito, entre o final da década de 80 e o ano passado, o País decuplicou a sua formação de doutores. Desde de 1998, a quantidade de patentes requeridas por cientistas brasileiros vem crescendo mais de 80% ao ano. Isso também se deve, em grande parte, à sanção da Lei de Propriedade Industrial ou de Propriedade Intelectual, assim também chamada, que ensejou ao País um salto qualitativo nessa questão de marcas e patentes.

Entre 1998 e 1999, o Brasil exportou US$4 bilhões em produtos e serviços de alta tecnologia, com firme tendência de crescimento. O País ganhou visibilidade graças à competitividade dos aviões exportados pela Embraer, ao mesmo tempo em que a Fiocruz e a Embrapa, entre outras conquistas, firmam nossa presença mundial. A primeira exportando tratamento para portadores do vírus HIV e desenvolvendo vacinas; a segunda, revolucionando a produção e barateando o consumo de grãos e carnes. O Brasil ocupa, hoje, o quarto lugar no mundo em número de incubadoras para o desenvolvimento de novos produtos e processos tecnológicos para o mercado, as quais se multiplicam a um ritmo de 30%.

Um dos indicadores mais significativo desses avanços, verificados na chamada Era FHC, foi a evolução dos investimentos em ciência e tecnologia do patamar de 0,9% para 1,4% do PIB, graças à criação de vários fundos setoriais de apoio, concebidos nas gestões do professor Israel Vargas, do economista Bresser Pereira e do embaixador Ronaldo Sardenberg, à frente do Ministério da Ciência e Tecnologia.

Nessa, como em outras áreas, o Brasil precisa continuar avançando, pois há muito ainda o que fazer para aproximar a pesquisa universitária da economia de mercado; democratizar geograficamente a produção científica; aumentar o conteúdo científico e tecnológico de nossas exportações; colocar os frutos do conhecimento ao alcance das microempresas, que geram 70% dos empregos e 21% do PIB, mediante a articulação mais eficaz entre empreendedores, fundações de amparo, laboratórios universitários, sistemas Sebrae e Finep (a financiadora de estudos e projetos do MCT); e, claro, perseverar no objetivo de dar continuidade e prioridade à educação, multiplicando a escolaridade da nossa força de trabalho (em média paralisada na faixa de 4,9 anos de ensino básico), paralelamente à modernização e democratização do ensino técnico de nível médio e o aumento da percentagem dos universitários matriculados, sobretudo em cursos de matemática, ciências físicas, biológicas e engenharia.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Concedo o aparte, com prazer, a V. Exª, Senador José Jorge.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Senador Marco Maciel, solidarizo-me com V. Exª pelo tema que traz a esta Casa: o desenvolvimento científico e tecnológico em nosso País. Efetivamente, alcançamos alguns patamares de excelência em certos segmentos, graças ao esforço do Governo Federal, juntamente com setores da iniciativa privada, com fundações etc. Em relação a essa questão, há um assunto que me preocupa bastante e que gostaria de incluir também em seu pronunciamento: a formação de professores na área de tecnologia. Hoje em dia, no ensino fundamental e no ensino médio, há uma grande deficiência de professores de Física, Química e Biologia, o que faz com que, muitas vezes, um aluno do 2º Grau termine uma série sem ter a orientação de um professor dessas matérias. Esses professores não existem no mercado. Antigamente, eram utilizados profissionais liberais, como engenheiros e médicos, mas, agora, isso está proibido pela legislação educacional. Então, principalmente no interior, mas mesmo nas regiões metropolitanas, isso é muito importante. É necessário que todo esse esforço de tecnologia desenvolvido, que permitiu a exportação, coligue-se a um esforço no sentido de que as crianças possam ter noções de ciência desde cedo, porque daí sairão os futuros cientistas. V. Exª já falou sobre o assunto, mas eu gostaria de agregar um detalhamento maior ao seu pronunciamento.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Nobre Senador José Jorge, eu agradeço o seu substancioso aparte e quero dizer que V. Exª fala de cátedra do tema, posto que foi duas vezes Secretário de Educação em Pernambuco e tem, tanto na Câmara dos Deputados como agora, no Senado Federal, se preocupado muito com o que, a meu ver, é a questão central brasileira: a educação. É o desafio ainda não resolvido, se bem que tenhamos conseguido avançar, e muito, sobretudo nos últimos anos.

Tem razão V. Exª quando chama a atenção para a formação de profissionais em áreas que hoje são estratégicas, já que o mundo vive uma grande revolução científico-tecnológica que se ancora basicamente no desenvolvimento da engenharia genética, da química fina, da mecânica de precisão, da informática, tecnologias da informação e do conhecimento, produção de novos materiais, pesquisas espaciais, etc. Isso nos faz, mais uma vez, chamar a atenção para o enlace que há entre educação, ciência e tecnologia, assuntos interligados e fundamentais não somente para o adequado exercício da cidadania, mas também para que nós possamos construir uma nação desenvolvida social e economicamente.

Ademais, tenho convicção de que o Brasil ainda terá um papel destacado na sociedade do século XXI. Certamente, para que isso aconteça, será fundamental que continuemos a entender que educação e desenvolvimento científico e tecnológico são essenciais.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu concluo as minhas palavras dizendo que condição fundamental para o cumprimento de todos esses objetivos é, sem dúvida nenhuma, o firme compromisso do MCT e de seus órgãos mais importantes, como a Finep, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e o MEC, via Capes, com a continuidade das diretrizes e dos programas que acabo de referir, tendo em vista as mais altas aspirações nacionais por inclusão social, criação de empregos, crescimento econômico e integração do Brasil, como falei há pouco, na sociedade internacional.

Sr. Presidente Senador Augusto Botelho, eu não gostaria de encerrar as minhas palavras sem antes apresentar votos de aplausos à Drª. Glaci Zancan, que acaba de concluir o seu mandato, com dedicação e operosidade, à frente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, e também ao Professor Ennio Candotti, pelo reconhecimento dos seus pares ao elegê-lo novamente para presidir tão reputada instituição.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/07/2003 - Página 20725