Discurso durante a 94ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Homenagem pelo Dia do Advogado, oportunidade em que registra o artigo do Presidente da OAB-MG, Dr. Marcelo Leonardo, intitulado "Dia do Advogado". Homenagem ao Poder Judiciário, criticando campanha da imprensa contra os magistrados e reiterando sua posição favorável ao teto dos juízes aprovado na reforma da Previdência, na Câmara dos Deputados.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. JUDICIARIO.:
  • Homenagem pelo Dia do Advogado, oportunidade em que registra o artigo do Presidente da OAB-MG, Dr. Marcelo Leonardo, intitulado "Dia do Advogado". Homenagem ao Poder Judiciário, criticando campanha da imprensa contra os magistrados e reiterando sua posição favorável ao teto dos juízes aprovado na reforma da Previdência, na Câmara dos Deputados.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 12/08/2003 - Página 23082
Assunto
Outros > HOMENAGEM. JUDICIARIO.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA, ADVOGADO, ESTUDANTE, JUSTIÇA, LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, PRESIDENTE, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), ESTADO DE MINAS GERAIS (MG).
  • DEFESA, POLITICA SALARIAL, JUDICIARIO, VALORIZAÇÃO, CARREIRA, JUIZ, INEXATIDÃO, DECLARAÇÃO, IMPRENSA, SUPERIORIDADE, SALARIO, AMBITO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL.
  • IMPORTANCIA, URGENCIA, TRAMITAÇÃO, REFORMA JUDICIARIA, BENEFICIO, DEMOCRACIA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e os Srs. Senadores, alguns oradores que me antecederam já registraram o fato de hoje comemorar-se o Dia do Advogado e o Dia do Estudante. Comemora-se hoje também o Dia da Justiça.

É interessante essa coincidência: Dia do Advogado, Dia da Justiça e Dia do Estudante. Os estudantes, com certeza, são o futuro desta Nação. Não há caminho para Nação alguma melhorar suas condições nos aspectos social, econômico e outros senão por meio da educação.

Aliás, reportagem recente que li mostra que as pessoas que hoje ocupam a elite brasileira - se assim podemos dizer - vieram exatamente das camadas mais baixas. Foi por intermédio dos estudos, do investimento na educação e na tecnologia que puderam galgar posições sociais melhores.

Neste momento faço uma análise paralela e convergente do Dia do Advogado e do Dia da Justiça.

Quanto aos advogados, gostaria de ler, Sr. Presidente, o artigo escrito pelo Dr. Marcelo Leonardo, Presidente da OAB de Minas Gerais, que tem o título: “O Dia do Advogado”:

Em 11 de agosto de 1827, o Imperador Dom Pedro II criou os dois primeiros cursos jurídicos do Brasil, em Olinda e em São Paulo. Entre os primeiros formandos dessas históricas faculdades, destacou-se logo o notável Rui Barbosa. O baiano Rui formou-se pela Academia do Largo do São Francisco, em São Paulo, tendo sido eleito havia muito tempo pelo exemplo de desassombro, ética e competência no Direito e na profissão, como patrono dos advogados brasileiros.

Em razão daquela data, o 11 de agosto foi escolhido para comemorar o Dia do Advogado. Os estudantes de Direito malandramente fazem a tradicional “pendura”. Turma de acadêmicos devidamente engravatados vão a restaurantes onde, após apreciar a boa mesa e a degustação etílica, em eloqüente discurso recomendam ao dono da casa pendurar a conta em local de destaque.

Brincadeiras à parte, impõe-se neste dia lembrar a importância da atividade do advogado e de sua entidade de classe, a Ordem dos Advogados do Brasil, para a vida do cidadão e o bem-estar da sociedade. Desde o longínquo ano de 1827, a história brasileira vem registrando as inúmeras lutas dos advogados em favor dos direitos da cidadania e da conquista e preservação dos princípios fundamentais do Estado democrático de direito. Não há momento ou fase relevante da vida nacional em que não avulte a figura de um advogado como intransigente defensor desses ideais.

Nomes como Bernardo Pereira de Vasconcelos, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, Sobral Pinto, Barbosa Lima Sobrinho, Heleno Cláudio Fragoso, Milton Campos, Pedro Aleixo, Evandro Lins e Silva fazem parte da galeria de extraordinários advogados cuja vida, dedicada ao Direito, confunde-se com as lutas do povo pelo respeito à liberdade e à democracia.

Ao lado dos advogados, a partir de 1930, a OAB faz parte da história brasileira como a mais importante entidade da sociedade civil organizada, verdadeira voz da cidadania, com marcante atuação nas lutas e campanhas contra a ditadura, o arbítrio, a violência, a tortura, a corrupção, a favor da anistia, das eleições diretas, da Constituinte, dos Direitos Humanos, dos direitos do consumidor e do meio ambiente.

Atualmente, a proliferação indiscriminada de cursos jurídicos no País, desacompanhada da manutenção da qualidade de ensino do Direito, tem contribuído para a massificação da profissão, maior disputa pelo mercado de trabalho, dando ensejo ao desejável surgimento de comportamentos desviados das normas disciplinares do profissionais.

A Ordem dos Advogados do Brasil a tudo isso se mostra vigilante: denuncia aquela proliferação, procura selecionar entre os bacharéis os aptos ao exercício da advocacia, mediante o exame de Ordem, e exerce seu poder disciplinar diante dos faltosos. Mas esses são poucos, pois a maioria exerce a sua dignificante profissão fiel aos princípios acima referidos com muito denodo e ética.

As dificuldades, deficiências e defeitos do Poder Judiciário são objetos de repetidos diagnósticos. Há anos clama-se por uma reforma do Judiciário e uma reforma da legislação processual para facilitar o acesso à Justiça, o direito do cidadão e melhorar a vida profissional dos advogados, que muitas vezes aparece perante os seus clientes como culpados daqueles defeitos, entre os quais avulta a crônica morosidade.

O Governo Federal e o Congresso Nacional estão, agora, às voltas com as reformas previdenciária e tributária. Os advogados, neste seu dia, gostariam de receber de presente a inclusão na agenda política nacional, como prioridade, daquelas outras duas reformas, pois o que desejam é continuar a trabalhar com afinco, lealdade, ética e competência pela defesa dos diretos do cidadão, da sociedade e da democracia.

Sr. Presidente, esse é o artigo do Presidente da OAB de Minas Gerais em homenagem aos advogados. Endosso-o plenamente, porque reconheço, Sr. Presidente, embora não sendo advogado, a importância de termos em qualquer circunstância quem defenda o direito dos mais fracos, o direito dos oprimidos, quem realmente levante a bandeira contra as tiranias, contra as mais diversas formas de ditadura.

            Nesse momento, para que o advogado exerça esse trabalho, ele precisa de um Judiciário livre, de um Judiciário altivo. É preciso portanto, neste dia, lembrar com muita serenidade o que está sendo feito em termos de campanha contra o Judiciário de uma maneira geral no momento em que se analisa a questão da reforma da Previdência.

Nenhuma categoria teve embutida na questão da reforma da Previdência a redução de salários. No entanto, os juízes - e imprensa divulga que estão brigando por um salário que corresponde hoje a valores próximos a R$15 mil. Mas, Sr. Presidente, na verdade, esse salário um pouco acima de R$15 mil representa o topo da carreira da magistratura nos Estados, representa o salário do Presidente do Tribunal de Justiça de um Estado e não do magistrado que acaba de passar num concurso e começa a sua carreira. Esse, na maioria dos Estados, ganha entre R$3 mil e R$4 mil e vai, portanto, galgando aos poucos os seus salários até chegar, depois de vinte anos, talvez à condição de desembargador e ganhar menos que R$ 12 mil, e, portanto, só atingindo o ápice de R$ 15 mil quando no topo da carreira, como Presidente de Tribunal de Justiça. Infelizmente, esse valor é generalizado pela imprensa, como se fosse o salário de qualquer juiz; não se faz a diferença entre ele e o de um juiz recém-concursado, que começa na terceira entrância e, aos poucos, chega a juiz substituto, a juiz titular, depois, a desembargador e, finalmente, um dia, a Presidente de Tribunal de Justiça.

Então, é preciso que haja serenidade, clareza e verdade ao mostrar a realidade do Poder Judiciário.

Portanto, aproveitando o Dia do Advogado, que, com certeza, é o guardião-maior dos direitos e das garantias constitucionais perante os tribunais, lembro que esse profissional somente terá êxito quando tivermos um Poder Judiciário forte, respeitado e, acima de tudo, transparente.

Como Parlamentares, seja como Senadores ou Deputados, não podemos ficar apenas fazendo coro a uma verdadeira paranóia criada contra o Poder Judiciário, porque, na verdade, o responsável pela sua reforma é o Legislativo.

Há uma proposta de reforma do Poder Judiciário que passou dez anos na Câmara dos Deputados e está há três no Senado Federal. Se algo precisa ser mudado no Poder Judiciário, nós devemos efetivá-lo.

É preciso que haja também coragem para reconhecer que, se há mazelas no Judiciário, muitas delas existem por culpa do Poder Legislativo por não aprovar a reforma daquele Poder; mas também certa parcela cabe ao Poder Judiciário, que se acomodou perante o status antigo, de ver o Magistrado como alguém que devia ficar distante da sociedade, sem se comunicar, sem acompanhar o dia-a-dia da sociedade. Com isso, ficavam alheios ao que se passava, ao sofrimento do cidadão comum. Mas não se corrige injustiça cometendo-se injustiça, não se corrigem distorções cometendo-se novas distorções.

Por isso, neste dia, presto minha homenagem aos advogados, por intermédio da OAB nacional e das suas seccionais nos diversos Estados, e também ao Poder Judiciário, que precisa, sim, ser olhado com mais carinho, porque não conheço nenhum regime democrático com um Judiciário fraco. Não conheço nenhum regime realmente de liberdades em que o Judiciário seja manietado. Em todas as ditaduras, temos um Executivo forte, mandando; um Legislativo fechado e um Poder Judiciário amordaçado.

No momento em que se discute a reforma da Previdência e também que se começa a rediscutir, no Senado, a reforma do Judiciário, é muito importante que tenhamos em mente que aquele Poder, juntamente com o Legislativo, é um dos maiores pilares da democracia. Se um deles fraquejar, a democracia vai embora.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª permite-me um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Ouço com prazer V. Exª, Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Mozarildo Cavalcanti, lembro-me de François Mitterrand, que o mundo conhece. Assim como o Presidente Lula, Mitterrand candidatou-se várias vezes à Presidência, com idéias esquerdistas, e conseguiu eleger-se, em segundo turno, na França. Governou aquele país por 14 anos. No fim de sua vida, com câncer, pediu auxílio a um amigo ganhador do Prêmio Nobel para escrever um livro, pois não tinha mais forças para fazê-lo. Mitterrand disse que, se voltasse, queria deixar uma mensagem: fortalecer os contra-poderes. Quero advertir o povo brasileiro de que, aqui, a história é diferente. Quando se iniciou o Senado, havia 42 Senadores, excluindo-se os portugueses do Império; 20 magistrados; 2 advogados, 10 militares; 7 eclesiásticos; 1 proprietário rural e 2 do campo. Naquela época, Montaigne já dizia que o pão de que mais a humanidade necessita é a justiça. Portanto, houve esse domínio no Brasil. Analisem o caso dos salários. Sei da necessidade de um aposentado e da injustiça que ele sofre. Conheço vários médicos. Na minha cidade, por exemplo, há um médico, com 94 anos, que está operando e dirigindo uma Santa Casa, porque os salários são ínfimos. O mesmo ocorre com veterinários, odontólogos, enfermeiras, professores universitários. Precisamos fazer justiça salarial neste País. Isso é uma vergonha. Olhem os níveis de diferença. O Senado Federal respeita tanto os advogados que homenageia Rui Barbosa, mas não podemos esquecer que também representamos nesta Casa outros profissionais. Na política, houve médicos muito importantes, haja vista o exemplo de Juscelino Kubitschek e de V. Exª, Senador Mozarildo Cavalcanti, que tão bem representa a classe.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Senador Mão Santa, com muito prazer, incorporo o aparte de V. Exª ao meu pronunciamento.

Sinto-me à vontade, não sendo advogado, mas médico, em fazer este pronunciamento homenageando os advogados e a Justiça brasileira pelo seu dia.

Evidentemente, não podemos esquecer os menos aquinhoados, os menos atendidos na questão salarial. Mas não ajudaremos esses, entre os quais eu e V. Exª estamos incluídos, Senador Mão Santa - somos médicos aposentados e ganhamos um pouco mais de R$2 mil - mutilando ainda mais um Poder que representa a parte mais importante do pilar da democracia: o Judiciário. Repito: não podemos fazer falsas afirmações, meias verdades, afirmando que os magistrados ganharão um pouco mais de R$15 mil, porque esse salário, nos Estados, corresponde ao maior salário da Justiça, que é o do Presidente do Tribunal de Justiça, e só é alcançado depois de mais de duas décadas de trabalho. Portanto, trata-se de uma carreira típica de Estado, e os magistrados precisam ser vistos com um olhar não de benevolência ou de supremacia sobre as demais categorias, mas como integrantes de um Poder que merece ser respeitado, sem cuja existência não existem os demais Poderes, sequer uma imprensa livre.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/08/2003 - Página 23082