Discurso durante a 112ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à redução de investimentos sociais previstos no Orçamento da União para o ano de 2004.

Autor
Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ORÇAMENTO.:
  • Críticas à redução de investimentos sociais previstos no Orçamento da União para o ano de 2004.
Publicação
Publicação no DSF de 04/09/2003 - Página 26086
Assunto
Outros > ORÇAMENTO.
Indexação
  • APREENSÃO, REDUÇÃO, RECURSOS, POLITICA SOCIAL, PROJETO DE LEI ORÇAMENTARIA, ESPECIFICAÇÃO, AREA, SAUDE.
  • QUESTIONAMENTO, REDUÇÃO, RECURSOS, PROBLEMA, COMBATE, FOME, REFORMA AGRARIA, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, GABINETE, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
  • EXPECTATIVA, PREVISÃO, AUMENTO, RECURSOS, PROGRAMA, AGRICULTURA, ECONOMIA FAMILIAR, AMPLIAÇÃO, COBERTURA, ABASTECIMENTO DE AGUA.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entramos no nono mês de Governo. O Congresso Nacional recebe o aguardado Projeto de Lei Orçamentária para 2004 e o Plano Plurianual de Investimentos (PPA) de 2004 a 2007.

Essa peça orçamentária deveria ser o documento mais importante de um governo democrático: trata-se de um compromisso oficial de como serão utilizados os recursos públicos, duramente arrecadados de cada trabalhador e de cada empresário do País.

No entanto, recebo com imensa frustração a proposta do Executivo. Encolheram, e de forma significativa, os recursos destinados à área social, num período de reconhecida recessão, quando aumenta, de forma dramática, a demanda pelos programas de assistência.

Os R$42,3 bilhões destinados ao social representam, na verdade, 70,2% das despesas totais, enquanto o Orçamento da área social deixado pelo Governo Fernando Henrique para o ano 2003 representava 72,4% dos recursos.

O mais grave: o Governo criou um recuo sem precedentes em relação ao financiamento da saúde, com risco de comprometer as despesas futuras de um serviço essencial à população.

Ao vetar o § 2º do art. 59 da Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício de 2004, ficou comprometido o mérito da Emenda Constitucional nº 29, de 2000, que trata exatamente de assegurar fontes estáveis e permanentes para o financiamento das reais ações de saúde, inclusive nos Estados e Municípios.

Dessa forma se evita inflar o orçamento da saúde com encargos previdenciários da União, serviços da dívida e despesa do Ministério financiada com recursos do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.

Da mesma forma, Estados e Municípios, que deveriam aplicar 12% e 15% respectivamente em ações de saúde, poderão incluir despesas que não são verdadeiramente de saúde.

O mais grave, no entanto, é que a equipe econômica não teve sequer o cuidado de tratar do assunto no corpo do Projeto de Lei Orçamentária para 2004.

O SR. PRESIDENTE (Leonel Pavan) - Senadora Lúcia Vânia, peço permissão para prorrogar a sessão até as 18h37min. O término do pronunciamento de V. Exª seria às 18h32min, para que depois o Senador Marcelo Crivella possa usar da palavra.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Agradeço a V. Exª a gentileza.

Quanto ao Fome Zero, a redução de recursos para apenas R$400 milhões também representa um recuo de graves proporções. Caberia ao Governo Lula explicar ao Congresso Nacional porque o programa que pretendia revolucionar a área social no Brasil e no mundo teve seu orçamento reduzido em mais de 70%. Por coincidência, o mesmo percentual de aumento de gastos do gabinete da Presidência da República. Ou se tratava apenas de marketing, ou o programa foi desidratado por não apresentar os resultados previstos, provando que os seus críticos tinham razão.

O Congresso recebe, portanto, um orçamento tímido, que vem contrariar as expectativas de toda a sociedade. Expectativas essas criadas pelo próprio PT na campanha eleitoral e no programa de Governo, que me dei ao trabalho de reler. Elas foram consolidadas durante anos pelas críticas à insensibilidade social do Governo passado. E se fortaleceram nos últimos meses, quando o orçamento “engessado” recebido como herança do Governo anterior serviu de desculpa para a timidez das ações e a inoperância dos programas sociais nesses oito meses de Governo.

A decepção toma conta dos que acreditaram na promessa de uma reviravolta em relação ao Orçamento de 2003.

Não há argumentos capazes de explicar aos trabalhadores sem terra que os recursos serão insuficientes para atender menos da metade da meta inicial de 60 mil assentados. Houve erro de planejamento, de metas e de compromisso, com sérias conseqüências, pois tem se agravado a tensão no campo, como comprovam o crescimento do número de áreas invadidas e número de mortes nos conflitos rurais, como foi apontado aqui por outros oradores.

O maior acesso ao Programa Nacional de Agricultura Familiar seria uma boa notícia se o Pronaf não estivesse praticamente parado nestes meses. Merece destaque, entretanto, que o PPA esteja prevendo aumento da cobertura do abastecimento de água de 92,4% para 93,5%.

O SR. PRESIDENTE (Leonel Pavan, fazendo soar a campainha.) - Senadora Lúcia Vânia, faltam apenas dois minutos para o término da prorrogação da sessão.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Sr. Presidente, como o tempo é escasso, vou concluir o meu discurso e pedir que seja incluído nos Anais do Senado.

O SR. PRESIDENTE (Leonel Pavan) - O discurso de V. Exª pode ser dado como lido, Senadora Lúcia Vânia.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - A Lei do Orçamento não tem competência para definir mudanças de mérito nos programas sociais que estão sujeitos a leis específicas. Se for intenção do Governo alterar a legislação vigente, a estruturação e o funcionamento do ponto de vista orçamentário, o Ministro precisa explicar, de forma clara, ao Congresso Nacional.

O País fez uma escolha pela prioridade do social. O Orçamento de 2004 não faz jus ao que foi decidido nas urnas.

Muito obrigada.

 

*********************************************************************************

SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DA SRª SENADORA LÚCIA VÂNIA.

*********************************************************************************

     A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, entramos no nono mês de governo, o tempo de uma gestação tão anunciada pelo presidente Lula, para receber no Congresso Nacional o aguardado projeto de lei orçamentária para 2004 e o Plano Plurianual de Investimentos (PPA) de 2004 a 2007.

     Esta peça orçamentária deveria ser o documento mais importante de um governo democrático: trata-se de um compromisso oficial de como serão utilizados os recursos públicos, duramente arrecadados de cada trabalhador e de cada empresário desse país.

     No entanto, recebo com imensa frustração a proposta do Executivo. Encolheram, e de forma significativa, os recursos destinados à área social, num período de reconhecida recessão, quando aumenta de forma dramática a demanda pelos programas de assistência.

     Os 42 bilhões e 300 milhões de reais destinados ao social representam, na verdade, 70,2% por cento das despesas totais enquanto o orçamento da área social deixado pelo governo Fernando Henrique para o ano 2003 representava 72,4 dos recursos.

     O mais grave: o governo criou um recuo sem precedentes em relação financiamento da saúde, com risco de comprometer as despesas futuras de um serviço essencial à população.

     Ao vetar o parágrafo segundo do artigo 59 na Lei de Diretrizes Orçamentárias para o exercício de 2004, ficou comprometido o mérito da Emenda Constitucional 29, de 2000, que trata exatamente de assegurar fontes estáveis e permanentes para o financiamento das reais ações de saúde, inclusive nos estados e municípios.

     Dessa forma se evita inflar o orçamento da saúde com encargos previdenciários da União, serviços da dívida e despesas do Ministério financiada com recursos do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.

     Da mesma forma, Estados e Municípios, que deveriam aplicar 12% e 15% respectivamente em ações de saúde, poderão incluir despesas que não são verdadeiramente de Saúde.

     O mais grave, no entanto, é que a equipe econômica não teve sequer o cuidado de tratar do assunto no corpo do Projeto de Lei Orçamentária para 2004. 

     Quanto ao Fome Zero, a redução de recursos para apenas 400 milhões de reais também representa um recuo de graves proporções. Caberia ao governo Lula explicar ao Congresso porque o programa que pretendia revolucionar a área social no Brasil e no mundo teve seu orçamento reduzido em mais de 70%. Por coincidência, o mesmo percentual do aumento de gastos do gabinete da Presidência da República. Ou se tratava apenas de marketing, ou o programa foi desidratado por não apresentar os resultados previstos, provando que os seus críticos tinham razão.

     O Congresso recebe, portanto, um orçamento tímido que vem contrariar as expectativas de toda a sociedade. Expectativas essas criadas pelo próprio PT na campanha eleitoral e no programa de governo, que me dei ao trabalho de reler. Elas foram consolidadas durante anos pelas críticas à insensibilidade social do governo Fernando Henrique. E se fortaleceu nos últimos meses, quando o orçamento “engessado” recebido como herança do governo anterior serviu de desculpa para a timidez das ações e inoperância dos programas sociais nesses 8 meses de governo.

     A decepção toma conta dos que acreditaram na promessa de uma reviravolta em relação ao orçamento de 2003.

     Não há argumentos capazes de explicar aos trabalhadores sem terra que os recursos serão insuficientes para atender menos da metade da meta inicial de 60 mil assentados. Houve erro de planejamento, de metas e de compromisso com serias conseqüências, pois tem se agravado a tensão no campo, como comprovam o crescimento de áreas invadidas e número de mortes nos conflitos rurais.

     O maior acesso ao Programa Nacional de Agricultura Familiar seria uma boa notícia se o Pronaf não estivesse praticamente parado nesses meses. Merece destaque, entretanto que o PPA esteja prevendo aumento da cobertura do abastecimento de água de 92,4% para 93,5% e da coleta de esgoto de 50,9% para 57,9%. Outra área privilegiada, e que terá impacto na saúde da população é o saneamento, merecedor de verbas significativas, embora não tenha sido gasto nenhum recurso até agora em 2003.

     Quanto aos servidores públicos, além da surpresa da reforma da previdência, e da taxação dos inativos, não há previsão de aumento dos seus salários para o ano de 2004, contrariando uma justa representação do PT ao STF contra o governo anterior.

     O orçamento de 2004 apresenta, no entanto, senhores, algumas leituras interessantes.

     Em primeiro lugar, pode representar uma oportunidade de autocrítica para o PT. Pois o Partido que sempre marcou posição ao criar gastos sem se preocupar com arrecadação, hoje se vê na posição delicada de equilibrar receita e despesa.

     Por outro lado, a falta de inovação no orçamento comprova que estávamos no caminho certo. A prometida unificação de programas repete de forma mais tímida o extinto Projeto Alvorada, na medida em que só contempla os programas de transferência de renda, com o agravante de reduzir o universo de pobres atendidos. Sim, porque até o final de 2002 foram cadastradas 7 milhões de famílias e já são atendidas com pelo menos um programa de transferência mais de 9 milhões de famílias. Em oito meses de governo, foram identificadas apenas mais 100 mil famílias. O orçamento prevê atender apenas 7 milhões e 600 mil famílias, só 300 mil a mais do que em 2003. E número inferior às 9 milhões e 700 mil famílias com renda per capita de meio salário mínimo, identificadas no censo de 2000.

     E mais, senhores: apesar de sucessivas críticas à limitação do público alvo identificado pelo cadastro unificado, o governo será obrigado a excluir cidadãos já atendidos pelos programas. Será que a sociedade não preferiria incluir um universo maior de pessoas, ainda que com benefícios menores?

     A identificação de pobres e indigentes pela renda de cem e 50 reais, respectivamente, sem qualquer vinculação com o salário mínimo, e sem previsão de reajuste anual, reduzirá o universo da população atendida, contrariando o discurso da universalização, conforme o Programa do PT.

     Esperava ainda mais ousadia dos aguardados programas de transferência de renda. Onde eles estão contemplados no orçamento? Ou o PT improvisou um programa de governo que não foi suficientemente debatido, feito apenas para ganhar eleição, ou não dispõe de técnicos para transformar boas intenções em ações concretas.

     Senhores, sugiro aqui que o Senado convoque o Ministro Mantega para explicar a redução de despesas da área social em relação às despesas totais, e principalmente, como se dará a unificação dos programas e como se dará a exclusão das famílias.

     A Lei do Orçamento não tem competência para definir mudanças de mérito nos programas sociais que estão sujeitos a leis específicas. Se for intenção do governo alterar a legislação vigente, a  estruturação e o funcionamento do ponto de vista orçamentário, o Ministro precisa explicar de forma clara ao Congresso Nacional.

     O país fez uma escolha pela prioridade social. O orçamento de 2004 não faz jus ao que foi decidido nas urnas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/09/2003 - Página 26086