Discurso durante a 152ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre os programas de transferência de renda do governo. (como Líder)

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIVIDA PUBLICA. POLITICA SOCIAL.:
  • Reflexão sobre os programas de transferência de renda do governo. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 31/10/2003 - Página 34497
Assunto
Outros > DIVIDA PUBLICA. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DISCURSO, SENADOR, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, ESPECIFICAÇÃO, PAGAMENTO, DIVIDA PUBLICA, ANUNCIO, ITAMARATI (MRE), PERDÃO, PARTE, DIVIDA, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, POSSIBILIDADE, MELHORIA, NEGOCIAÇÃO, CREDOR, BRASIL.
  • COMENTARIO, DECLARAÇÃO, ANTONIO ERMIRIO DE MORAES, INDUSTRIAL, CRITICA, PROGRAMA, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, FOME, MOTIVO, AUSENCIA, INCENTIVO, TRABALHO.
  • ESCLARECIMENTOS, IDEOLOGIA, TRANSFERENCIA, RENDA, PARTICIPAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE, RIQUEZAS, PAIS, REGISTRO, DADOS, PROGRAMA ASSISTENCIAL, RENDA MINIMA, PRIMEIRO MUNDO, ELOGIO, DECISÃO, GOVERNO, UNIFICAÇÃO, PROGRAMA, DEFESA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, TOTAL, POPULAÇÃO, BENEFICIO, CIDADANIA, AUXILIO, COMBATE, DESEMPREGO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador César Borges, como o Senador José Agripino, antes, e o Senador Arthur Virgílio estavam comentando os problemas do endividamento e que o Governo brasileiro, o Presidente Lula, mencionou a muitos de nós, do PT, a possibilidade de uma renegociação da dívida.

Com respeito à Bolívia, o Ministro Celso Amorim mostrou que poderemos iniciar a renegociação, até dando exemplos, pois o Brasil anunciou que perdoa US$10 milhões da dívida. Quem sabe agora os nossos credores possam seguir o exemplo, e possamos até diminuir o serviço da dívida, assinalada como tão pesada?

Sr. Presidente Eduardo Siqueira Campos, eu gostaria de fazer uma reflexão sobre os programas de transferência de renda e uma observação significativa feita pelo Sr. Antônio Ermírio de Moraes - certamente considerado por todos, e com justa razão, o maior empresário brasileiro. A respeito do Programa Fome Zero, ele disse que “ninguém quer viver de esmola” e que o País precisaria mesmo de um programa desemprego zero. Justamente quando o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou o Programa Bolsa-Família, que unifica os programas de transferência de renda - o Bolsa-Escola, o Bolsa-Alimentação, o Cartão-Alimentação e o Auxílio-Gás.

O superintendente da Votorantim disse que “o brasileiro tem boa formação moral e ninguém gosta de receber esmola” e que “as pessoas têm muita satisfação em trabalhar e receber aquilo que merecem”. Concluiu que o programa “não é bom porque vicia a população na coisa errada. O sujeito precisa lutar, trabalhar, para conseguir sobreviver”.

Nesse dia, sexta-feira última, Antônio Ermírio de Moraes comemorou a expansão da Companhia Brasileira de Alumínio, da Votorantim, que envolveu investimentos de US$370 milhões, gerando 400 empregos diretos e 1.600 indiretos. Ressaltou a empresa que 70% dos investimentos foram com recursos da própria CBA. A Votorantim, como quase todos os grupos nacionais, teve, ao longo de sua história, um vigoroso apoio do Poder Público, sobretudo por meio de empréstimos do BNDES, que são realizados a taxas de juros menores do que as que normalmente são cobradas pelas instituições privadas. Isso se torna viável porque os recursos dos BNDES são em grande parte do Fundo de Amparo do Trabalhador, um patrimônio dos trabalhadores.

As observações de Antônio Ermírio guardam relação com as palavras do próprio Presidente Lula. No lançamento do Bolsa Família, disse nunca se esquecer das palavras de Luiz Gonzaga: “Uma esmola a um homem que é são ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”. Ressaltou também “que todo mundo sente orgulho em fazer por merecer”. Durante a campanha presidencial, foram inúmeras as vezes em que Lula relembrou o episódio em que havia perdido o emprego. Preocupado com o que diria a sua mãe, chegava a sujar o seu macacão de graxa para dizer que passara o dia trabalhando.

O que Antônio Ermírio precisa compreender, e que o Presidente Lula já o fez, é que todos os brasileiros e não apenas os clientes do BNDES têm o direito inalienável de serem sócios do Brasil. Empresário de larga visão, Antônio Ermírio tem a responsabilidade de perceber que nos países desenvolvidos há inúmeros programas de transferência de renda que tornam suas economias mais competitivas em relação à nossa se não instituirmos um programa com desenho bem feito. Os Estados Unidos, para 2003, destinarão US$35 bilhões na forma de crédito fiscal por remuneração recebida aos trabalhadores cuja renda não atinja determinado patamar para elevar seus rendimentos de maneira a poder sair da condição de pobreza absoluta. No Reino Unido, há o crédito fiscal familiar de igual natureza; quase todos os países da União Européia hoje têm garantia de renda.

A decisão de unificar os programas de transferência de renda constitui um passo do Presidente Lula na decisão correta; trata-se de simplificar e racionalizar o sistema. Às famílias de renda mensal até R$100 será assegurado um complemento de renda de pelo menos R$50 mais R$15, R$30 ou R$45 se a família tiver respectivamente duas, três ou mais crianças. Como contrapartida da Bolsa-Família deverão os pais demonstrar que as crianças estão sendo vacinadas, que o seu grau de nutrição é acompanhado por postos de saúde, que estão freqüentando a escola, e os pais realizando algum curso de alfabetização ou capacitação.

A minha recomendação ao Presidente Lula e à Coordenadora do Programa, Ana Fonseca, é que examinem com atenção em que extensão estarão presentes as chamadas armadilhas do desemprego ou da pobreza, que são debatidas na literatura sobre o tema. Os maiores estudiosos da matéria recomendam que cheguemos gradualmente à instituição de uma renda básica de cidadania, uma modesta renda, suficiente para atender às necessidades de sobrevivência de cada pessoa, paga igualmente a todos, não importa a sua origem, raça, idade, sexo, condição civil ou mesmo sócio-econômica.

Mas como? Então vamos pagar até para o Antonio Ermírio? Sim. Aos Senadores César Borges, Tasso Jereissati, Antonio Carlos Magalhães, ou Eduardo Siqueira Campos? Sim. Eles e todos os que não precisariam - o Senador Suplicy - vão colaborar para que nós próprios e todos os demais venham a receber. Dessa maneira, ninguém ficará excluído. Será a maneira de efetivamente atingirmos todos os mais pobres. Pois não precisará cada pessoa declarar, para fins de receber a renda de cidadania, quanto ganha no mercado formal ou informal. Eliminaremos qualquer sentimento de estigma ou de vergonha de a pessoa ter que dizer “eu só recebo tanto, e por isso mereço receber tal complemento”. Mais importante, do ponto de vista da dignidade e da liberdade do ser humano, será muito melhor para cada pessoa saber de antemão que nos próximos doze meses, e daí para frente a cada ano, cada vez mais com o progresso do País, ela, e cada uma na sua família, receberá uma modesta renda como direito de participar da riqueza da Nação.

Será que a renda de cidadania vai viciar o cidadão, Senador Antonio Carlos? Antonio Ermírio teve o direito de receber os rendimentos provenientes do acúmulo de capital proporcionado pelos empreendimentos do seu pai, sem ter tido a obrigação de trabalhar, e mesmo assim resolveu sempre estudar nas melhores escolas - inclusive na Politécnica - e muito trabalhar, sem ter se viciado. Da mesma maneira, todo brasileiro que receber a renda de cidadania terá o estímulo para estudar, trabalhar e progredir sabendo que tem o direito de receber aquele modesto rendimento.

Tenho a convicção que, pela seriedade com que tem se dedicado aos problemas brasileiros, Antonio Ermírio, ao estudar em maior profundidade a proposição, ficará convencido, como muitos laureados com o Nobel de Economia, a exemplo de James Edward Meade e James Tobin, de que a renda básica de cidadania será também o instrumento eficiente para chegarmos ao objetivo importante que almeja: o Desemprego Zero.

Sr. Presidente, acabo de telefonar para o Sr. Antonio Ermírio de Morais - vou lhe encaminhar este pronunciamento - e combinei com ele uma visita, às 10 horas de sábado, na sede de sua empresa, ele que trabalha inclusive aos sábados, para dialogar e trocar idéias, porque tenho a certeza que ele acabará vendo o mérito desta proposição e de como o objetivo de extinguir a fome e a pobreza - quando feito de maneira mais racional, conforme o instrumento da renda básica da cidadania, ao lado de outros instrumentos, como a reforma agrária, o microcrédito, o apoio às formas cooperativas, a educação pública e assim por diante - esse instrumento é eficaz e consistente com o objetivo do Desemprego Zero.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/10/2003 - Página 34497