Discurso durante a 158ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Desrespeito do INSS ao estatuto do idoso.

Autor
Lúcia Vânia (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Lúcia Vânia Abrão
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Desrespeito do INSS ao estatuto do idoso.
Aparteantes
Arthur Virgílio, José Jorge, Rodolpho Tourinho.
Publicação
Publicação no DSF de 08/11/2003 - Página 35983
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • REPUDIO, ATUAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), DESRESPEITO, IDOSO, BENEFICIARIO, PREVIDENCIA SOCIAL, EXIGENCIA, COMPROVAÇÃO, AUSENCIA, FRAUDE, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS).
  • DEFESA, ENQUADRAMENTO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA PREVIDENCIA SOCIAL (MPS), CRIME, PENALIDADE, PREVISÃO, ESTATUTO, IDOSO, ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), CONVOCAÇÃO, MINISTRO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, BANCADA, APOIO, GOVERNO, FALTA, ATENÇÃO, JUSTIÇA SOCIAL, PROPOSTA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, AUSENCIA, APROVEITAMENTO, EXPERIENCIA, AREA, ASSISTENCIA SOCIAL, EPOCA, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sou de uma geração que aprendeu a respeitar os mais velhos, e hoje estou aqui para associar-me a todos os Srs. Senadores que demonstraram, desta tribuna, a sua perplexidade diante do fato ocorrido ontem, quando o Ministério da Previdência e Assistência Social, por meio de seu Ministro Ricardo Berzoini, determinou que fossem suspensos os benefícios às pessoas acima de 90 anos.

Esta Casa não pode ficar apenas na perplexidade. O ato cometido pelo Ministério da Previdência precisa de ações concretas.

Recentemente, houve total mobilização desta Casa para votar o Estatuto do Idoso. Todos se pronunciaram e aplaudiram o Governo. A Comissão de Assuntos Sociais, representada pela sua Presidente, pôde aqui externar a alegria pelo passo à frente no aparato legal que contempla os idosos deste País. Há pouco menos de um mês, foi sancionado o Estatuto do Idoso, com festas, pompas e circunstância no Palácio do Planalto - aceleramos, num ato de boa-vontade, a votação do Estatuto, para que fosse promulgado no Dia Nacional do Idoso. O Líder do Governo não aceitou sugestão, não aceitou nenhuma colaboração por parte de quem quer que fosse. Foi sancionado o Estatuto.

Para nossa surpresa, o primeiro a infringir as normas do Estatuto foi o próprio Governo. O Ministro Ricardo Berzoini infringiu o art. 96 do Estatuto do Idoso, que diz o seguinte:

É crime desdenhar, humilhar, menosprezar ou discriminar pessoa idosa, por qualquer motivo.

E o Estatuto vai mais além. A pena é de seis meses a um ano de reclusão e multa. Na mesma pena incorre quem discriminar idoso, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, a meios de transporte, ao direito de contratar ou qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania por motivo de idade.

Portanto, acredito que o Senador Paulo Paim, que trabalhou por dez anos - primeiro, na Câmara dos Deputados, e, agora, no Senado da República - para que essa lei fosse aprovada e sancionada, e nós, nesta Casa, que o apoiamos, não podemos permitir que o Estatuto do Idoso seja rasgado em praça pública pelo próprio Ministério da Previdência e Assistência Social, que teria o dever de resguardar e fazer cumprir a lei!

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Concedo um aparte ao Senador José Jorge.

O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Senadora Lúcia Vânia, congratulo-me com V. Exª pelo tema e pela precisão do pronunciamento que faz. Como Presidente da Comissão de Assuntos Sociais, V. Exª acompanhou de perto a aprovação do Estatuto do Idoso. Creio que todos os pronunciamentos feitos nesta Casa no dia de hoje trataram desse assunto. Eu mesmo fiz um pronunciamento e falei a esse respeito. V. Exª fala inclusive com mais precisão. No entanto, há um aspecto que gostaria de levantar, porque, na hora em que falei eu ainda não tinha tomado conhecimento disso. Foi o Senador Rodolpho Tourinho quem me falou. Hoje, no programa Bom Dia Brasil, perguntaram se o Ministro Ricardo Berzoini pediria desculpas aos velhinhos. S. Exª disse que não. Isso é até mais grave do que o que fizeram com os idosos. S. Exª desrespeitou o Estatuto do Idoso duas vezes. Todos os que viram aquela matéria ontem na Rede Globo ficaram sensibilizados, mas S. Exª ainda não. Portanto, temos de pedir ao Ministério Público que processe o Ministro, baseado no Estatuto do Idoso, e que a Comissão de Assuntos Sociais o convoque, para que isso não passe em branco. Do contrário, será como jogar no lixo esse Estatuto que aprovamos com tanta alegria, com tanta comemoração e com o grande apoio de V. Exª. Meus parabéns e muito obrigado.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Agradeço ao Senador José Jorge o aparte, que acrescentou ao meu discurso.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Além de infringir esse item lido por nós, ele infringe outro item, quando exige que os idosos levem ao posto do INSS o título de eleitor, uma vez que o próprio Estatuto isenta os maiores de 65 anos do voto.

Concedo um aparte ao Senador Rodolpho Tourinho, com muito prazer.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Senadora Lúcia Vânia, V. Exª, sempre com muita propriedade, aborda temas sobretudo da área social. Nesse caso, temos absoluta convicção de que não foi bom comemorar o Estatuto do Idoso. Elogio V. Exª por trazer esse tema e fazer essa colocação sobre o desrespeito ao Estatuto do Idoso. Pior, efetivamente, foi ver, na manhã de hoje, no Bom Dia Brasil, o fato a que se referiu o Senador José Jorge: a falta de respeito, outra vez, aos velhinhos, quando o Governo afirma claramente que não pedirá desculpas. Com essa insensibilidade, ficamos preocupados com o que pode vir daí para a frente. Congratulo-me com V. Exª, pela propriedade e competência com que aborda o tema.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Agradeço a V. Exª, Senador Rodolpho Tourinho, que levanta uma questão muito importante: a humildade para reconhecer o erro. O Brasil inteiro esperava do Ministro Ricardo Berzoini uma atitude dessa natureza. Nós, que estamos no Senado, já nos acostumamos com essa arrogância, e deveríamos saber que isso iria acontecer.

Aproveito o aparte de V. Exª, que concedi com muita satisfação, para dizer que é comum, nesta Casa, o Líder do Governo nos convocar para debate qualificado. Entretanto, para o Líder, o debate qualificado se dá apenas com o seleto colégio de Líderes da base aliada. Todas as nossas sugestões - de todos nós, com experiência em uma ou outra área - são negadas e desacatadas.

Na discussão do Estatuto do Idoso, preocupei-me com duas questões que considerei importantes na ocasião. Eu entendia que a redução para 65 anos precisava vir acompanhada de uma provisão orçamentária - porque reduzir a idade de 67 para 65 anos demandava cerca de R$800 milhões. E eu não tinha visto, no Orçamento, nenhuma provisão para isso. Eu sabia que, assim, dificilmente seria cumprido o proposto. Para nossa perplexidade, hoje, o jornal O Globo noticia que os benefícios, também para as pessoas idosas e portadoras de deficiência, não estão sendo atendidos pelos postos do INSS.

Eu dizia que a arrogância tem sido o marco desse Governo, e essa arrogância se consolida, aqui, na discussão da reforma da Previdência, quando todos os Parlamentares desta Casa - pelo menos da Oposição e muitos do próprio Partido do Governo, da base aliada - têm alertado o Governo para a necessidade de humanizar o projeto de reforma tributária. Humanizar significa fazer uma transição mais humana, menos injusta; significa não taxar os inativos; enfim, significa olhar com os olhos daqueles que trabalharam a vida inteira para, no fim da vida, poderem usufruir dos seus salários.

Sabemos todos nós que a reforma da Previdência é necessária, precisa ser feita. Mas, para isso, é preciso também que esta Casa seja ouvida, e os Parlamentares que tiveram experiência, que passaram por governos, por prefeituras, por ministérios. Eu tive a experiência, como Secretária Nacional de Assistência Social do primeiro Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, de implantar a LOAS (Lei Orgânica de Assistência Social), um benefício para o idoso acima de 70 anos na ocasião e à pessoa deficiente. Naquela oportunidade, o Ministro nos reuniu e disse: tenho medo de implementar esse benefício, porque vamos ter problemas sérios nas filas, vamos levar as pessoas portadoras de deficiência a uma situação de desconforto. Eu dizia ao Ministro: vamos manter um QG e vamos evitar que isso aconteça, porque a lei precisa ser cumprida e o nosso País necessita o mais urgente possível.

Fizemos a implantação do benefício, a Secretaria e o INSS, sem nenhum atropelo mais sério. Todo o País de plantão, a sociedade envolvida, assistentes sociais, clubes de serviços e implementamos, no primeiro ano, cerca de 700 mil benefícios para as pessoas portadoras de deficiências e idosos em todo o País.

Nos debates na Comissão de Assuntos Sociais, sempre questiono por que desprezar essa experiência vivida, sofrida e não dar um passo à frente? No entanto, nada disso é ouvido, nada disso tem ressonância nesta Casa.

Há poucos dias, o Senador José Jorge me apresentava o cartão unificado do governo passado, que não foi implantado, mas prestes a ser, e o governo entendeu que era preciso suspendê-lo naquele momento, porque estávamos num período eleitoral. O que fez o governo? Ao invés de pegar o cartão e aproveitá-lo, começou a questionar tudo o que o governo passado fez, que levou um ano para fazê-lo, e hoje a sociedade brasileira perplexa, vê atrasos e o Orçamento da União para a área social gasto apenas em 6%.

Eu gostaria de encerrar as minhas palavras, chamando a atenção para as ponderações feitas pelo Senador Antonio Carlos Magalhães, quando S. Exª, com palavras duras, porém sábias, assentadas na experiência, chamava a atenção do governo para a importância da gestão pública, para a importância de parar, pensar e gerir este País com mais solidariedade, com mais justiça, com mais eficiência, com mais competência.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Permite V. Exª um aparte?

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Com prazer ouço V. Exª.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senadora Lúcia Vânia, V. Exª traz, com sua ponderação, com seu equilíbrio, exatamente o que termina sendo o melhor tempero da sessão. Indignada, como estamos todos indignados, V. Exª argumenta com sensibilidade, portanto, sem frieza, mas argumenta com a razão que a faz admirada por todos nós. Esse artigo do Estatuto do Idoso é precioso. Então, quem maltrata idoso desse jeito, fica preso dois anos. Não me arrependo de ter aprovado o Estatuto do Idoso aqui, embora veja o governo rasgando o seu espírito a cada gesto. Eu me pergunto se não seria possível, Presidente Mão Santa, se fazer a verificação da fraude para ver se havia beneficiários fantasmas. Ou seja, manter o pagamento e ir fazendo uma verificação, de modo a não punir aqueles que precisam para viver dos parcos proventos do INSS. Eu queria chamar a atenção de V. Exª e da Casa, Senador Rodolpho Tourinho, para o fato de que a decisão foi do tipo: nós podemos, nós estamos com a razão, doa a quem doer, então pára tudo e quem for podre que se quebre. Nesse caso, quem se quebraria, a continuar o delírio da arbitrariedade, seriam as pessoas com mais de 90 anos neste País. E ao parabenizá-la por esse discurso tão sereno e proveitoso quero dizer a V. Exª que, primeiro, isso de fato é revoltante. A arrogância se manteve. E o Ministro diz: a minha base me pediu para mexer. Não foi o sofrimento dos velhinhos, foi a base dele. Quer dizer, politicamente não interessava, íamos começar a perder. Então nós, Governo, vamos mudar. Segundo: o Governo tem cometido vários erros, vários pecados; um ministro faz uma trapalhada aqui, a ministra faz outra acolá. Nada que definisse o perfil do Governo aos olhos da opinião pública. Isso aí define e definiu. O Brigadeiro Eduardo Gomes foi injustamente ferreteado com a alcunha de algoz dos marmiteiros.Depois se soube que era uma frase inventada; alguém inventou que o Brigadeiro teria dito que não precisava do voto dos marmiteiros para derrotá-lo na eleição. Isso foi com ele para o túmulo. Homem valoroso, um dos heróis do Forte de Copacabana. Este Governo vai ao final do seu último dia, vai à eleição que vem, e vai para a história como o Governo que ousou impor uma punição injusta aos brasileiros mais enternecedores de todos, que são os brasileiros que se aproximam do centenário. Parabéns a V. Exª.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa) - Eu pediria permissão, Senadora Lúcia Vânia, para prorrogar por dez minutos mais essa sessão, para V. Exª fazer sua conclusão e em seguida ouvirmos o nobre Senador Heráclito Fortes, e dar um testemunho da mudança nesse Congresso Nacional: sexta-feira estamos prorrogando a sessão, porque estamos atentos em criar leis boas e justas.

A SRª LÚCIA VÂNIA (PSDB - GO) - Agradeço ao Senador Arthur Virgílio a sua inserção no nosso discurso e quero dizer, Senador, que V. Exª aponta um aspecto muito importante: a questão da gestão. Quem participa da gestão social tem que ter sensibilidade, do contrário, não pode assumir um posto dessa envergadura.

V. Exª me faz lembrar aqui, na ocasião, a primeira audiência pública do Ministro Berzoini. Dizia-lhe que eu via o Ministério da Previdência totalmente desarticulado, sem condições de ter dados gerenciais que nos dessem o mínimo de segurança para as ações que estariam sendo implementadas. Essas ações do Ministério foram crescendo, foram melhorando, enfim, se especificando de tal forma que a gerência da Previdência tomava um eixo. E eu lhe dizia que fui testemunha de todo esse quadro. Ele me respondia naquela ocasião que tudo que ele tinha encontrado estava errado, que tudo que ele tinha encontrado tinha que ser reformulado.

Portanto, peço mais uma vez dessa tribuna que o Ministro tenha um pouco mais de sensibilidade, um pouco mais de humildade para entender que a gestão social se faz com continuidade, acima de tudo com apoio às ações que são positivas, as ações que foram implementadas com seriedade, que às vezes têm alguns ajustes a serem feitos, mas que não precisam ser abandonadas inteiramente para recomeçar, porque o social só se completa com a continuidade, só se sedimenta com a continuidade.

Portanto, para encerrar, eu gostaria de retomar o início de minha fala, quando disse que esta Casa não pode ficar simplesmente no discurso e na perplexidade. Para tanto, apresentarei à Comissão de Assuntos Sociais um requerimento, solicitando a presença do Ministro Ricardo Berzoini, para que S. Exª, diante da Comissão, venha explicar qual foi o motivo que o levou a infringir o Estatuto do Idoso e se S. Exª, como autoridade máxima responsável pela política nacional do idoso, pode oferecer à sociedade brasileira esse mau exemplo, quando todos nós aqui estamos no trabalho para sensibilizar a família, a sociedade para a importância do idoso em nosso País.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/11/2003 - Página 35983