Discurso durante a 159ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre entrevista do Ministro-Chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Considerações sobre entrevista do Ministro-Chefe da Casa Civil, José Dirceu.
Aparteantes
Roberto Saturnino.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/2003 - Página 36051
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, MINISTRO DE ESTADO, CHEFE, CASA CIVIL, REFERENCIA, PROBLEMA, SEGURANÇA, AMERICA LATINA, ENTRADA, BRASIL, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA).
  • REGISTRO, NECESSIDADE, REALIZAÇÃO, DEBATE, PROBLEMA, SEGURANÇA, AMERICA LATINA, ESPECIFICAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, DEFESA, REFORÇO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ANTERIORIDADE, ADESÃO, BRASIL, AREA DE LIVRE COMERCIO DAS AMERICAS (ALCA).

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o espírito público do Senador Garibaldi é por demais conhecido. Não é por nada que S. Exª tem uma das carreiras mais brilhantes nesta Casa, apesar de sua mocidade. Ininterruptamente, foi Prefeito de Natal, Senador da República, Governador do Rio Grande do Norte por duas vezes e, novamente, Senador da República - não ficou um dia sem mandato. Por esse motivo, S. Exª pode ter a grandeza dessa gentileza com seus companheiros mais humildes, que lhe são profundamente agradecidos.

Mudo o pronunciamento que eu pretendia fazer depois de ouvir o Senador Saturnino.

Há um aspecto que é real: a América Latina vive um problema da maior profundidade. Que o problema da Colômbia não é somente dela, mas de todos nós, não há dúvida nenhuma. Que temos que ficar atentos, não há dúvida nenhuma. Eu não diria o que o Ministro José Dirceu falou e nem faria críticas como as do Senador Arthur Virgílio, mas não sei se era de falar publicamente algo que, antes de vir a público, merece uma certa postura. Acho que o Ministro José Dirceu falou como se ainda fosse Deputado da Oposição, da forma como falarei agora - mas eu posso, porque não sou do Governo -, e fez uma proposta que é importante. No entanto, não sei se o importante é se fazer uma proposta de unificação dos exércitos, o que é complicado, ou de unificação de idéias, de maneira que, atingindo-se um território da América Latina, atingem-se todas as outras regiões. Acho que ele quis dizer uma coisa e disse outra.

A unificação das Forças Armadas da América Latina é muito complicado, é muito difícil, porque quem vai ser o comandante? Um brasileiro ou um argentino? No entanto, pode-se fazer um entendimento como o que foi feito, aliás, pela política Monroe, quando pensávamos que os americanos eram nossos irmãos, apaixonados por nós. Monroe disse: “Mexer com a América é mexer conosco” e ficamos todos orgulhosos, porque não entendemos que apenas os europeus não podiam fazê-lo. Eles, os americanos, podiam.

A proposta que poderia ser estudada, ao lado da do Mercosul, é a da Organização dos Estados Latino-Americanos, porque a OEA é um órgão em que o americano manda, decide e faz o que bem entende. A Organização dos Estados Americanos, em Washington, tem o Banco Mundial de um lado, o Banco Interamericano de outro, os Estados Unidos e o Departamento de Estado de outro, e sem nenhuma autonomia. Se houvesse a chance de existir, na Costa Rica, a sede de uma Organização dos Estados Latino-Americanos, seria diferente, porque teríamos um status que nos uniria contra a Europa, a Ásia, o mundo - e contra os norte-americanos também, que me perdoem.

Assim, não tenho dúvida de que essa questão deveria ser debatida e analisada.

O Arcebispo de Manaus e o Comandante do Exército na Base da Amazônia compareceram à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional e demonstraram que pensam da mesma forma: o perigo da Amazônia é real. E, lamentavelmente, o Brasil não está olhando o assunto como deveria, porque se falar em preservação da Amazônia é algo de profunda seriedade.

Digo, pela décima vez, desta tribuna, que o problema nº 1 do Brasil é a fome, pois milhões passam fome. O problema nº 2 é a preservação da Amazônia, porque sinto, lendo a literatura internacional da imprensa, que, hoje, a França, a Alemanha, a Inglaterra, os Estados Unidos, o Canadá, todo mundo aceita que a Amazônia deva ser patrimônio da Humanidade. Ela é grande demais, uma reserva imensa, a última floresta tropical, para pertencer apenas ao Brasil. Nela estão as grandes reservas de água doce do mundo.

Quando o meu querido amigo Passarinho, Ministro da Justiça, para surpresa minha, fixou o limite dos ianomâmis na fronteira, falei desta tribuna: sou a favor, dêem as terras para os ianomâmis, façam a defesa dos índios brasileiros como bem entenderem. Sou totalmente favorável à causa indígena. Os índios merecem, têm direito, mas não precisa ser na fronteira. No entanto, fizeram uma reserva na fronteira do Brasil, colocando ianomâmis do lado de cá e buscando, pela América afora, ianomâmis para serem colocados do lado de lá. Agora, já se fala na pátria, na nação, na unificação do povo ianomâmi.

Então, tudo isso faz parte de um contexto. Tenho um mapa, que o americano jura que não fez, mas que apareceu na ONU e em muitas universidades americanas, da América com a Oceania, como se fosse uma Antártica: um território da Humanidade. E como fica feio o Brasil ali embaixo, pequenininho, com 40% da sua área, menor do que a Argentina.

O Presidente tem razão ao analisar esse fato, não sei se criando um exército ou uma unificação dos exércitos latino-americanos, ou se elaborando uma carta de intenção nesse sentido, mas é importante.

            Com relação à Alca, à qual V. Exª se referiu, não estou entendendo, mas acho que o Brasil está avançando demais. Não sei o que aconteceu, mas, de repente, vi as coisas avançarem e já estão preparando uma “agenda positiva” para a reunião de amanhã. Não sei, juro que não consigo entender, porque não tenho competência para isso, não sou economista, mas há essa história de se dizer que os casos da agricultura - que são aqueles de difícil discussão na Alca - serão discutidos na OMC. Se não resolvemos entre nós, por que querem a Alca? Se na questão número um, na questão primeira, fundamental já saímos divididos?

Estou com V. Exª, precisaremos de uns dez, quinze anos. Deixemos o Mercosul se consolidar para podermos dialogar com os Estados Unidos, com a Comunidade Econômica Européia.

Concedo um aparte ao Senador Roberto Saturnino.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - O meu aparte é muito breve, Senador Pedro Simon. Não tenho aqui o texto da entrevista, mas o Ministro José Dirceu falou em integração militar. Integração não é, necessariamente, a unificação das forças, mas pode ser do planejamento de defesa, das operações, enfim...

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Cá entre nós, com todo o respeito, interrompendo o aparte de V. Exª, na época do Cone Sul já havia isso para o outro lado, para garantir a ditadura no Chile, no Paraguai.

O Sr. Roberto Saturnino (Bloco/PT - RJ) - Pois é, agora chegou a hora de fazer a integração com os nossos objetivos democráticos e brasileiros, e não isso. O Presidente Néstor Kirchner tem falado insistentemente do Parlamento Sul-americano, um parlamento efetivo. O Presidente Lula tem falado do embrião da nação sul-americana, nos moldes da nação européia, que está sendo construída. Quer dizer, isso está mais ou menos na linha. Não sei, e V. Exª tampouco, se não há razões para um pronunciamento do teor do Ministro José Dirceu, associado até à questão da Alca. Ignoro, mas é possível que haja razões que só depois saberemos.

O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - É provável, porque acredito que o Brasil, de uma hora para outra, avançou demais em relação à Alca, tudo estava indo bem e quando vejo lá o nosso Chanceler, homem de primeira linha, de primeira grandeza, por quem tenho o maior respeito, e acredito que foi uma das grandes escolhas, um ministro das relações exteriores de primeira grandeza...

Aliás, falando em chanceler, o nosso Itamar não está gostando do Palácio, quer se mudar para um apartamento. O Itamar não gostou da Embaixada do Brasil em Roma, está procurando um apartamento, mas não pode alugar porque é muito caro. A vida é engraçada mesmo! A embaixada do Brasil em Roma é talvez um das mais bonitas do mundo e S. Exª preferiu um apartamento de três quatros.

Digo, do fundo do coração, que o diálogo com a América Latina é da maior importância. Acredito que a defesa da América Latina é fundamental, nesta hora, quando olhamos para o nosso amigo americano e vemos o que está acontecendo no Iraque, o erro primário que cometeram; o mundo inteiro contra e eles a favor. Agora, o mundo volta os seus olhos para eles, os Estados Unidos, e eles não sabem o que fazer ou o que deixar de fazer. Por isso acredito que o Brasil está no caminho certo ao se identificar com a América Latina, quer dizer, se identificar no sentido de se tornar irmão, não no sentido de avançar, de procurar a hegemonia ou de ser antiamericano.

Tenho uma fé enorme no Mercosul, e por isso acredito que o Brasil e a América Latina têm todas as condições de se tornarem um grande continente. Assim como a China, que era um país de miséria e hoje está às vésperas de ser a maior economia do mundo; assim como a Índia, onde, há 15 anos, morriam não sei quantos mil habitantes por dia, e hoje está exportando alimentos, o Brasil tem todas as condições. É preciso tomar algumas providências: terminar com a corrupção e ter capacidade de investimento. Assim, podemos nos tornar, juntos com a América Latina, um grande País, não para formarmos um exército latino-americano, mas para termos uma idéia, um princípio de defesa latino-americano.

Era isso, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/2003 - Página 36051