Discurso durante a 170ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Solidariedade aos familiares do casal de jovens barbaramente mortos em São Paulo. Dúvidas quanto à diminuição da imputabilidade penal.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO PENAL. POLITICA SOCIO ECONOMICA. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Solidariedade aos familiares do casal de jovens barbaramente mortos em São Paulo. Dúvidas quanto à diminuição da imputabilidade penal.
Publicação
Publicação no DSF de 26/11/2003 - Página 38656
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO PENAL. POLITICA SOCIO ECONOMICA. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, FAMILIA, ADOLESCENTE, VITIMA, HOMICIDIO, AUTORIA, MENOR, DELINQUENCIA JUVENIL.
  • OPOSIÇÃO, REDUÇÃO, IDADE, IMPUTABILIDADE PENAL.
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, CARTA, AUTORIA, ORADOR, ENCAMINHAMENTO, LUIZ INACIO LULA DA SILVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INFORMAÇÕES, TRAMITAÇÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, RENDA MINIMA.
  • COMENTARIO, EVOLUÇÃO, DEBATE, SENADO, APRECIAÇÃO, EXPECTATIVA, VOTAÇÃO, PLENARIO, PROJETO, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, ESCLARECIMENTOS, POSIÇÃO, ORADOR, ASSUNTO.

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, também como cidadão paulistano, expresso ao Sr. Ari Friedenbach e à sua família, bem como aos pais do rapaz que foi morto juntamente com Liana, meus sentimentos de pesar e de solidariedade. Hoje tive oportunidade de, no gabinete do Senador Magno Malta, com ele dialogar. Ali estavam alguns Senadores e o Deputado Luiz Antônio Fleury, e expressei ao Senador Magno Malta que não estou persuadido, tal como ele e o Deputado Fleury, da necessidade de diminuirmos a idade para maioridade penal, ainda mais para 13 anos, ou mesmo para 16 anos. Tenho dúvidas sobre isso. Assim como Dom Luciano Mendes de Almeida expressou, sábado ainda, na Folha de S.Paulo, as decisões tomadas pela Constituinte e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, os compromissos que o Brasil assumiu internacionalmente. Sinceramente, penso que o importante é criarmos condições para que todas as pessoas tenham direito à vida com dignidade.

E por essa razão, tenho batalhado há muitos anos para que se garanta uma renda a todo e qualquer cidadão no Brasil. O projeto que institui uma renda básica de cidadania está em fase de tramitação conclusiva. O Senador Francelino Pereira apresentou parecer favorável ao meu projeto, com ligeira modificação, a principal delas dizendo que, a partir de 2005, seria instituída uma renda básica de cidadania a todos os cidadãos brasileiros, iniciando-se por aqueles mais necessitados. Tendo, portanto, sido aprovado, por unanimidade, em dezembro de 2002, esse projeto foi para a Câmara dos Deputados, na Comissão de Finanças e Tributação, recebendo parecer favorável do Deputado Paulo Bernardo, PT do Paraná. Em outubro último, foi aprovado de maneira conclusiva. Apenas o Deputado Mussa Demes afirmou que, já tendo se convencido da proposta de garantia de uma renda mínima por meio do Imposto de Renda negativo, não concordava que se instituísse uma renda básica de cidadania para todos. Entretanto, a grande maioria dos Deputados concordou com os argumentos relativos às grandes vantagens de terem todas as pessoas, não importa a origem, raça, sexo, idade, condição civil ou mesmo socioeconômica, o direito de partilhar da riqueza do País, recebendo uma renda básica, ainda que modesta e na medida do possível, suficiente para atender às necessidades vitais. O projeto define que tal renda básica de cidadania será definida pelo Poder Executivo, por seus critérios, levando em conta tanto o grau de desenvolvimento do País, quanto as disponibilidades orçamentárias.

Aprovado no mérito conclusivamente, na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados, foi para a Comissão de Constituição, Justiça e de Redação, na qual foi designado Relator, pelo Presidente Luiz Eduardo Greenhalgh, o Deputado Irineu Colombo, também do PT do Paraná, que deu seu parecer favorável na última quarta-feira. O Deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e de Redação, transformou a reunião em audiência pública, para que eu pudesse prestar esclarecimentos sobre o projeto. Após duas horas e vinte minutos de debate, alguns Parlamentares, como o Deputado Zenaldo Coutinho e outros, pediram vista para melhor exame da matéria, cuja votação havia sido marcada para hoje, às 15 horas. Como o Deputado Irineu Colombo encontra-se em missão oficial no exterior, e só poderá estar aqui amanhã, ficou marcada para amanhã, às 10 horas, a reunião em que será votado, em caráter terminativo, o projeto de lei que institui a renda básica de cidadania.

Tendo em vista essa evolução, encaminhei ontem ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva uma carta, nos seguintes termos:

Prezado Senhor Presidente:

Por um dever de lealdade e responsabilidade, considero importante informar a Vossa Excelência que a votação, em caráter terminativo, do Projeto de Lei nº 254,de 2003, originalmente Projeto de Lei do Senado nº 266, de minha autoria, que institui a Renda Básica de Cidadania no Brasil, a partir de 2005, está prevista para amanhã, terça-feira 25 de novembro, às 15 horas, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados.

Os ministros do Governo de Vossa Excelência, especialmente o Ministro da Casa Civil, José Dirceu de Oliveira e Silva, conforme me relatou há duas semanas; o Ministro da Fazenda, Antonio Palocci; a Coordenadora do Programa Bolsa Família, Ana Maria Medeiros da Fonseca, e os que interagem com os programas de renda e emprego, como os Ministros José Graziano, Jacques Wagner, Cristóvam Buarque, Guido Mantega, Benedita da Silva, Humberto Costa e Ricardo Berzoini, têm acompanhado de perto a tramitação do projeto e observado a consistência de seu conteúdo com os passos que têm sido dados até agora por sua administração.

A proposição em exame é um amadurecimento do projeto de lei que apresentei em abril de 1991, que institui o Programa de Garantia de Renda Mínima, através de um imposto de renda negativo, que foi aprovado por unanimidade pelo Senado, em dezembro de 1991. Tendo ido para a Câmara dos Deputados, recebeu o parecer favorável do Deputado Germano Rigotto (PMDB - RS), na Comissão de Finanças, em 1992, e lá se encontra pronto desde então, para ser votado .

Tendo em conta o estudo mais aprofundado do tema, interagindo com os que mais têm estudado as formas de garantia de renda nos mais diversos países, fiquei convencido de que equivalente, mas ainda mais racional e eficiente, é se garantir uma Renda Básica Incondicional, simplesmente igual para todos, na medida do possível suficiente para a sobrevivência de cada pessoa, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou mesmo socioeconômica.

Por essa razão, apresentei o novo projeto de lei, em dezembro de 2001, visando instituir a renda básica de cidadania a partir de 2005. O projeto recebeu parecer favorável do Senador Francelino Pereira (PFL - MG), que apresentou algumas modificações de acordo comigo, com o objetivo de tornar a proposição inteiramente consistente com os dispositivos constitucionais e legais, especialmente visando respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal. A principal modificação proposta pelo Senador Francelino Pereira é que a abrangência da renda básica de cidadania deve ser alcançada gradualmente, a critério do Poder Executivo, iniciando-se pelas pessoas mais necessitadas.

Justamente essa modificação é que torna a proposição consistente com a decisão recém-tomada por V. Exª de coordenar, racionalizar e unificar as diversas transferências de renda no Programa Bolsa Família, que pode ser visto como um passo em direção à renda básica de cidadania. As condicionalidades previstas no programa como a vacinação das crianças, o acompanhamento de sua nutrição, a freqüência das crianças na escola, a alfabetização e a capacitação dos adultos são consideradas positivas no processo de transição gradual para que, um dia, as condições possam ser extintas.

Outra modificação proposta foi que não haveria a necessidade de um referendo junto à população: “Afinal, quem se colocaria contra um projeto de uma renda básica mensal a todos os cidadãos?”, perguntou o Senador mineiro.

O PLS nº 266, de 2001, foi assim aprovado, por unanimidade, pelo Senado, em dezembro de 2002. Tramitando na Câmara dos Deputados, já como PL nº 254, de 2003, recebeu parecer favorável do Relator, Deputado Paulo Bernardo (PT - PR), na Comissão de Finanças e Tributação, onde foi analisado conclusivamente quanto ao seu mérito. Em outubro último foi aprovado pela referida comissão, tendo recebido apenas um voto contrário, do Deputado Mussa Demes, (PFL - PI), que prefere a garantia de renda mínima através do imposto de renda negativo. A grande maioria dos Deputados compreendeu a racionalidade e as vantagens da renda básica incondicional: será efetivamente a forma de atingir de fato todos os mais pobres, eliminando-se a burocracia envolvida em se ter que saber os ganhos do mercado formal e informal de cada um; será eliminado o sentimento de estigma de se precisar dizer o quão pouco ganha para se obter o que deve ser um direito; é a maneira de se ampliar o grau de liberdade e dignidade de cada ser humano; será sempre mantido o estímulo ao trabalho, pois tudo o que se obtiver pelo empenho de cada um lhe será assegurado. Entenderam também os Deputados que, obviamente, os mais ricos contribuirão mais para que eles próprios e todos os demais venham a ter o direito de serem sócios do Brasil. Além disso, o mecanismo é consistente com a maior competitividade, eficiência e eqüidade de nossa economia.

O projeto seguiu para a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, onde recebeu parecer favorável, quanto a sua constitucionalidade e juridicidade, do Deputado Irineu Colombo (PT - PR). Foi colocado na pauta para discussão na última quarta-feira, dia 19, pelo seu Presidente, Deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT - SP), que transformou a reunião em audiência pública e convidou-me para também prestar esclarecimentos. Após duas horas e vinte minutos de debates, alguns Deputados pediram vista para melhor exame do assunto. Assim, dado o prazo regimental de cinco dias, a votação do projeto, com caráter terminativo, será amanhã, nesta quarta-feira próxima.

Quero assinalar que a proposta da renda básica de cidadania está redigida de forma compatível com o previsto no Parágrafo Único do art. 203 da Proposta de Emenda à Constituição referente à Reforma Tributária, já aprovada pela Câmara dos Deputados e pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, segundo o qual “a União instituirá o programa de renda mínima destinado a assegurar a subsistência das pessoas e das famílias, priorizando-se inicialmente as de baixa renda, podendo ser financiado e realizado por meio de convênio com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, na forma da lei”.

Caso aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, haverá dez dias úteis de prazo durante os quais poderão pelo menos 10% dos Deputados requerer que a matéria seja votada também pelo Plenário da Câmara dos Deputados. Caso isso não ocorra, a lei aprovada seguirá para sanção ou veto do Presidente da República. Se a decisão for positiva, o Brasil será a primeira nação na História a aprovar uma lei que institui, mesmo que gradualmente, uma renda básica de cidadania. Lembro que o Alasca possui um sistema de dividendos anuais pagos igualmente a todos os seus habitantes, vigente desde 1980, e muito bem-sucedido, que contribuiu de maneira decisiva para torná-lo o mais igualitário dos cinqüenta Estados americanos. Trata-se, porém, de um Estado, não de um país.

Por ocasião da visita do ex-Primeiro Ministro de Portugal António Guterrez, durante o Congresso da Internacional Socialista em São Paulo, eu tive a oportunidade de conversar com ele sobre o diálogo que manteve com toda a sua equipe de governo sobre os programas sociais. Soube, primeiro por Ana Fonseca e, então, por ele próprio, de como havia expressado que deveríamos caminhar para a instituição de uma renda básica incondicional. Ele conhece bem o tema, pois foi quem convidou o Professor Philippe Van Parijs para fazer uma palestra sobre a instituição de uma renda básica no século XXI, para todos os Chefes de Estado da União Européia, em fevereiro de 2000, em Almancil, Portugal.

Aproveito a oportunidade para lhe enviar a cópia da conferência que fiz no último dia 15 de novembro em Manila, na forma de uma carta aberta à Presidente das Filipinas, Gloria Marcapagal-Arroyo, a convite da FIAN - Pelo Direito de Todos se Alimentarem, sobre o desenvolvimento dos programas de transferência de renda no Brasil e da renda de cidadania. Também fui convidado para proferir palestra sobre esse tema, de 2 a 4 de dezembro, na conferência que está sendo organizada pela Coalização da Renda Básica da África do Sul, que congrega mais de doze entidades, tais como a Cosatu, que ali é equivalente à CUT; a Conferência Nacional das Igrejas e a Conferência Nacional das Igrejas e dos Bispos Católicos daquele país, as quais estão propugnando pela instituição de uma renda básica. Devido à importância das votações que ocorrerão, nos próximos dias no Senado, será difícil poder me ausentar. Enviarei, entretanto, a palestra por escrito sobre a importante notícia que poderá ocorrer no Brasil.

Colocando-me à inteira disposição para qualquer esclarecimento, assim concluo a carta ao Presidente Lula.

Sr. Presidente, saúdo todos aqueles que, dos mais diversos lugares do Brasil, vieram hoje para testemunhar a votação da reforma da Previdência. Depois de um período de um grande debate havido, primeiro, na Câmara dos Deputados; depois, no Senado Federal, nós, aqui, chegamos ao dia decisivo.

O Senador Tião Viana, Relator da matéria, considerou que será importante termos um procedimento em duas etapas. A primeira etapa seria consubstanciada em seu parecer relativo à proposta de Emenda à Constituição nº 67, para que se aprovasse a reforma da Previdência tal como foi votada na Câmara dos Deputados. Assim, teríamos a votação concluída para que o texto não voltasse àquela Casa, porque, de outra maneira, teria de ser votado novamente.

Considerando diversos aspectos, tais como a questão do teto, sobretudo nas Unidades da Federação, a questão das regras de transição, a questão das pessoas com grave doença, a questão relativa ao senso e outras ainda pendentes, o nobre Senador Tião Viana resolveu apresentar a Proposta de Emenda à Constituição nº 77, de 2003, que leva em consideração muitos dos pontos levantados, inclusive, por entidades hoje representadas no Senado.

Pessoalmente, transmiti aos Senadores Tião Viana e Aloizio Mercadante que votarei de acordo com a proposição do Governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O Senador Tião Viana tem acompanhado tudo pari passu. Portanto, votarei favoravelmente à matéria, embora compreenda que, de alguma maneira, muitos servidores do Judiciário e do Legislativo, auditores e entidades das universidades públicas gostariam que modificássemos alguns termos.

Levando em consideração proposições e audiências que tive com as entidades representativas da USP e da Unicamp, apresentei propostas ao Senador Tião Viana. Respeitarei o seu parecer contrário às minhas proposições, pois compreendo suas razões.

Sr. Presidente, acompanhei muito de perto a angústia de alguns dos nossos companheiros de Bancada, a exemplo do Senador Paulo Paim, das Senadoras Serys Slhessarenko, Ana Júlia Carepa e Fátima Cleide, do Senador Flávio Arns, da Senadora Ideli Salvatti e do Senador Roberto Saturnino, do Rio de Janeiro - onde a base dos servidores é extraordinária. Entendo o que a Senadora Heloísa Helena vem passando, como nossa companheira de Partido.

Informo ao querido Líder Tião Viana, ao caro Líder do Governo nesta Casa, Senador Aloizio Mercadante, e aos companheiros da Bancada que, em algumas das palestras que tenho feito regularmente - duas, três, quatro, cinco por semana - sobre o tema renda básica de cidadania, obviamente pessoas perguntam-me se o PT, de fato, vai sancionar de forma drástica a Senadora Heloísa Helena. Ontem isso ocorreu no Ceu de Perus.

Eu participava da inauguração do teatro de Perus, que estava bastante cheio - havia mais de 250 pessoas, muitas delas simpatizantes da nossa base do Partido dos Trabalhadores -, quando ouvi o forte apelo para que respeitemos o posicionamento de alguém que contribuiu para a história do nosso Partido. Pediram-me para transmitir aos meus companheiros, inclusive ao Presidente do Partido, José Genoino, a seguinte solicitação: se sanção houver à Senadora Heloísa Helena, que não seja definitiva, que não seja de exclusão. Na verdade, quando perguntaram-me se ela deveria ser sancionada de qualquer maneira, praticamente todos levantaram-se para dizer que ela não devia sofrer qualquer sanção.

Senadora Heloísa Helena, eu queria dizer a V. Exª que isso está-se dando em diversos lugares onde se reúne a base do nosso Partido.

Com muita lealdade e companheirismo, votarei de acordo com o projeto de Governo, mas quero expressar também esse sentimento.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/11/2003 - Página 38656