Discurso durante a 184ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reivindicação de investimentos nas estradas e ferrovias brasileiras.

Autor
Alberto Silva (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PI)
Nome completo: Alberto Tavares Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Reivindicação de investimentos nas estradas e ferrovias brasileiras.
Publicação
Publicação no DSF de 13/12/2003 - Página 41086
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • REITERAÇÃO, PROPOSTA, PROJETO, ORADOR, MANUTENÇÃO, TOTAL, RODOVIA, BRASIL, JUSTIFICAÇÃO, INEFICACIA, EXCESSO, BUROCRACIA, REVISÃO, TRECHO, PERDA, RECURSOS.
  • ANALISE, DADOS, TRANSPORTE DE CARGA, PRECARIEDADE, TRANSPORTE RODOVIARIO, DETALHAMENTO, PROJETO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, CONTRIBUIÇÃO, INTERVENÇÃO, DOMINIO ECONOMICO, EXPECTATIVA, APOIO, GOVERNO.
  • NECESSIDADE, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, OPERAÇÃO, EXTINÇÃO, REDE FERROVIARIA FEDERAL S/A (RFFSA).
  • SUGESTÃO, SUSPENSÃO, EXTINÇÃO, REDE FERROVIARIA FEDERAL S/A (RFFSA), TRANSFORMAÇÃO, AUTARQUIA, OBJETIVO, GESTÃO, FERROVIA, SITUAÇÃO, ABANDONO, FISCALIZAÇÃO, CONCESSIONARIA, REVISÃO, CONTRATO, RECUPERAÇÃO, PATRIMONIO DA UNIÃO, BENEFICIO, TRANSPORTE FERROVIARIO.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje, ocupo a tribuna para trazer à Casa, aos nossos companheiros e ao País, que me está ouvindo pela TV Senado e pela Rádio Senado, dois assuntos que, na minha opinião, deverão ser objeto de consideração por parte do Governo e desta Casa. É daqui que partirá uma proposta para o Governo.

Lembro-me que, no Governo passado, o problema das estradas já existia. Em todos os Estados, estradas federais estavam destruídas e estavam sendo remendadas. Os Governos têm feito isso. O Ministério dos Transportes, por intermédio do DNER na época, os Governadores e os Parlamentares chegavam aqui para arranjar dinheiro para determinada estrada. Argumentavam que a estrada estava destruída, cheia de buracos. Então, apanhavam uma certa verba, alocavam na sua emenda, que ia para o Ministério dos Transportes, onde entrava naquela burocracia já conhecida. Depois, ia para o DNER, que fazia um projeto, porque não se pode consertar uma estrada sem projeto.

Todo esse processo demora, pois deve haver primeiramente uma licitação, depois da qual a empresa vencedora manda seus técnicos para o campo, para furarem o asfalto e observarem a base. Com isso, sabe-se se o asfalto está estragado ou não. Isso leva quatro, cinco ou seis meses. E se acaba fazendo um projeto daquele pedaço de estrada. Depois de tudo pronto, o dinheiro diminui, é contingenciado, e, assim, o recurso mingua. Aí se conserta um pedaço da estrada em determinado Estado.

Apresentei uma proposta ao Governo do Sr. Fernando Henrique Cardoso, com quem tinha uma certa liberdade, já que S. Exª havia sido nosso companheiro aqui. A proposta visava consertar todas as estradas de uma vez. Em determinado dia, começaria tudo de uma vez. Para tanto, seria necessário fazer um projeto expedito e rápido, sem perda de tempo em processos antiquados, burocráticos e irreais.

Suponho que me consideravam uma espécie de Dom Quixote - parecia-me isso. O Ministro dos Transportes recebeu a proposta, colocou-a na gaveta, e nada aconteceu. A situação das estradas piorou, Srªs e Srs. Senadores.

Ontem, demos a nossa contribuição, aprovando propostas do Governo consideradas essenciais, necessárias ao andamento da boa marcha da administração federal. Ficamos aqui até a meia-noite e apreciamos praticamente tudo que o Governo queria: aprovamos a PEC nº 67, iniciamos a apreciação da PEC nº 77, que é uma reparação da PEC nº 67 e que, seguramente, ajudará muitos trabalhadores, principalmente funcionários públicos, e ainda a da PEC da reforma tributária.

Demos nossa contribuição ao Governo naquilo que estava precisando e que considerava urgente. Agora, pergunto: será que o Governo não precisa se debruçar sobre esse problema, que me parece dos mais graves?

Notem bem: o Brasil optou pelas rodovias, no lugar das ferrovias. Não fomos colonizados como os americanos. Quando assistimos a filmes de cowboy, vemos as estradas de ferro entrando território adentro e os índios brigando com os que construíam as estradas. Na verdade, os americanos têm estradas de ferro por todos os lados, ligando o Atlântico ao Pacífico - não sei quantas são as empresas -, e todas as mercadorias americanas, praticamente, são conduzidas por ferrovias ou por hidrovias. As rodovias existentes transportam outro tipo de mercadoria. A mercadoria pesada, acima de 50 toneladas, é transportada em cima do trem. Conheço isso como a palma da minha mão, pois sou ferroviário de origem e conheço bem o sistema americano e o europeu de trabalhar com cargas.

Aqui, no Brasil, há 1,8 milhão de carretas, fruto da nossa opção pelo rodoviarismo. São fábricas e mais fábricas, e, cada vez, as carretas vão ficando mais pesadas, chegando a 50 toneladas, em caminhões de três eixos. Alguém pode dizer que, nos caminhões de três eixos, a carga é bem distribuída e que isso não faz mal à estrada. Conversa fiada! Quem está falando aqui é um engenheiro que conhece isso muito bem de perto. Desculpem-me, mas isto nada tem a ver com promoção pessoal; é experiência própria e vivida. Uma carreta de 50 toneladas pode ter dez eixos. Ela distribui a carga pelos eixos, é claro. A carga de cada eixo está distribuída, mas, na hora em que acelera ou desacelera ou dá uma freada, a carreta leva um pedaço do asfalto, proporcionalmente a uma lei chamada “coeficiente de atrito”. Existe uma força resultante do peso, multiplicado pela aceleração ou desaceleração, uma força terrível, que arranca o asfalto mesmo. Então, as carretas, ao frear e acelerar, vão danificando o asfalto. Vamos parar as carretas de 50 toneladas? Não. As nossas estradas devem ser feitas para o progresso, para agüentar uma carreta de 50 toneladas. Mas o ponto que quero abordar é que as estradas estão destruídas.

Elaborei um trabalho, que por mim foi atualizado. Conversei com representantes da Federação dos Transportadores de Carga. Existem 1,8 milhão de carretas. Eles me forneceram dados sobre o estado das estradas. Vou fazer um resumo: é preciso trocar todo o asfalto de 25 mil quilômetros de estradas federais no País. Essa história de tapar buraco é do Governo passado, do Ministério dos Transportes, que inventou a operação tapa-buraco. Isso é uma vergonha nacional. O asfalto envelheceu, e, assim, é necessário colocar outro no lugar. Essa operação tapa-buraco significa um desperdício absurdo de dinheiro, e não se consertou coisa nenhuma. Tapa um buraco aqui, e abre-se outro ali. E assim fez o Governo, e nós aceitamos.

Está na hora de tomarmos uma medida séria, e é isso que estou propondo hoje aos meus companheiros. Vejo aqui os meus companheiros Paulo Paim e Sérgio Zambiasi, que estiveram atentos à PEC nº 77. E acredito que todos nós nos podemos juntar para fazer uma proposta ao Governo Federal. Não quero dizer que a minha proposta é a melhor, mas pelo menos é um caminho. A certeza que tenho é a de que o Ministério dos Transportes, sem estrutura e com aquela burocracia, não consertará os 32 mil quilômetros de estrada nem em dez anos.

Faço uma proposta para repararmos essas estradas em 36 meses, colocando-se em funcionamento 120 empresas de engenharia, que estão paradas, com suas máquinas enferrujando por aí. E os empresários brasileiros estão procurando serviço no exterior. As grandes empresas brasileiras de engenharia - e não vamos chamá-las de empreiteira; não suporto o termo “empreiteira”, que, para mim, quer dizer consertador de muro - já deram um exemplo ao mundo. O Brasil fez Itaipu. Quando eu era estudante, tudo isso era feito pelos ingleses ou pelos canadenses. Hoje, aqui há empresas de alto nível técnico que estão paradas esperando do Governo uma autorização.

Um caminho é este: vamos reparar as estradas em 36 meses. Seria feita a reparação de onze mil quilômetros de estradas por ano. Seria gasto R$1,6 bilhão. Tem o dinheiro? Tem; da Cide. Não são R$10 bilhões? Os Estados pediram R$2,5 bilhões. Dá-se esse dinheiro para os Estados, que poderão consertar as suas estradas, fazer o que quiserem e ainda sobrará dinheiro.

Então, cria-se uma câmara de gestão, como foi feito no tempo do “apagão”. Com ela, o Governo nomeia um núcleo gestor, com pessoas altamente competentes, representantes dos transportadores, das empresas de engenharia, do planejamento, transporte, finanças, para fazer os projetos pelos processos mais modernos. Existem processos rápidos, expeditos de fazer projeto de estrada. A USP inventou um carrinho - que acho que trabalha com infravermelho - que, à medida que vai andando, vai dizendo como está o asfalto, como está a base.

Nesse caso, temos todas as armas na mão. Vamos fazer uma proposta ao Governo Federal.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Alberto, gostaria de dar um testemunho sobre a sua competência em engenharia.

O SR. ALBERTO SILVA (PMDB - PI) - Muito obrigado, meu caro, mas me deixe concluir para ver se armamos um dispositivo em favor do Brasil.

O Presidente Lula disse que quer consertar as estradas e quer mexer nas ferrovias. Em seguida, falarei também sobre as ferrovias, rapidamente, para não tomar o tempo dos meus companheiros que estão inscritos.

Eu queria que ficasse bem claro que o prejuízo hoje é da seguinte ordem: em óleo diesel desperdiçado, jogado fora - senhores, anotem este número -, um milhão e oitocentas mil carretas. Se os trinta e dois mil quilômetros de asfalto estivessem bem direitinho, elas gastariam doze bilhões de litros de óleo diesel por ano. Mas, com as estradas esburacadas, colocam-se mais 39% em cima disso. Isso dá quatro bilhões de litros de óleo diesel; a R$1,40, vamos para R$7 bilhões jogados fora. Pelo amor de Deus! Jogados fora R$7 bilhões? Não podemos tirar R$1,6 bilhão da Cide e consertar onze mil quilômetros por ano? Em três anos, estaria tudo arrumado por mais vinte anos.

É isso que estou propondo. Esse projeto está na mão do Governo. Tenho confiança absoluta, e acho que todos nós devemos ter confiança, no Governo que está lá, do Presidente Lula. Sua Excelência disse que faz, e tenho confiança no Presidente Lula e, mais ainda, no seu Ministro-Chefe da Casa Civil. Tenho conversado com S. Exª, que é um homem inteligente, um homem capaz, que absorve, e está com esse projeto na mão, esperando, talvez, uma oportunidade, mas S. Exª é, sobretudo, um homem que decide. Eu, como sou engenheiro, sou desses que decidem. Por isso é que fizemos aquele estádio e outras coisas no Piauí, por decisão de engenharia.

Portanto, acho que o Ministro Dirceu está, como se diz, com a faca e o queijo na mão, no Governo Lula. Se começarmos a fazer isso, senhores, vamos gerar um milhão de empregos imediatamente, e a alegria tomará conta dos Estados. Não tenho dúvida. Bastará ver as máquinas roncando em todos os Estados da Federação ao mesmo tempo. E teremos a certeza de que não haverá mais buraco em estrada. Não vamos tapar buraco, pelo amor de Deus! Vamos fazer asfalto novo, como queremos. Se somos rodoviaristas, vamos ter estradas que prestem.

Esse é o primeiro ponto.

Agora, vamos para as ferrovias. Os senhores têm visto a Globo mostrando o estado calamitoso das nossas estradas. Aquilo é um patrimônio de mais de R$20 bilhões, Senador Mão Santa. Está em torno de R$50 bilhões. O patrimônio ferroviário brasileiro anda na classe dos R$50 bilhões.

O que o governo passado fez? Isto é caso até, eu nem diria de uma CPI, mas de uma investigação mais profunda desta medida absolutamente errada, absolutamente sem nenhuma lógica. O que fizeram? Inventaram que a Rede Ferroviária estava devendo R$6 bilhões. Conversa fiada. A Rede nunca deveu R$6 bilhões. Mas determinaram a extinção da Rede e empurraram também a Fepasa de São Paulo, que entrou nesse bolo trazendo uma dívida de precatórios, ou sei lá de quê, de R$3 bilhões. E mais, a Rede Ferroviária entrou com R$1,6 bilhão para o capital da CBTU. E o governo passado arranjou uma manobra, que é preciso ser investigada, de tal maneira que suas ações foram desvalorizadas. Que história é essa? A Rede Ferroviária era acionista da CBTU em R$1,6 bilhão e, de repente, esse montante não valia mais. E ainda se determinou que se extinguisse a Rede Ferroviária. Tem uma comissão de liquidação da Rede.

A minha proposta hoje, senhores, é a seguinte: vamos fazer uma moção e colocar ao Presidente Lula que, se Sua Excelência quiser recuperar as estradas de ferro, tem duas medidas a tomar: primeiro, suspender a extinção da Rede, que ainda tem pessoal altamente qualificado, engenheiros de primeira categoria, experimentados em ferrovia, que estão esperando uma decisão. Como há todas as superintendências das estradas de ferro, podemos pedir ao Governo que transforme a Rede numa autarquia, que teria como atribuição não apenas gerir os ramais que foram abandonados como fiscalizar essas concessões, que precisam ser olhadas de perto.

Essa é outra vergonha. Entregaram para as concessionárias, mediante concorrência pública, locomotivas e trechos de estradas de ferro novos, absolutamente, para que elas administrassem esses ramais concedidos e pagassem à Rede e à União uma taxa mensal ou anual. Qual o resultado, Srªs e Srs. Senadores? Dividiram a malha ferroviária brasileira entre cinco, seis ou sete concessionárias, que não pagam coisa nenhuma. Talvez apenas uma pague. Tenho todos esses dados. Na hora H, vou colocá-los à disposição dos companheiros. Um exemplo é o trecho ferroviário São Luís-Teresina-Fortaleza-Recife, que transporta combustível de São Luís para Teresina. Dispensou os operários, não troca nenhum dormente e vai usando, usando e não paga nada à União, não dá a mínima bola. Está transportando, recebendo dinheiro, mas não paga nada. Enquanto isso, a malha ferroviária está-se deteriorando. Não trocam dormentes há quatro ou cinco anos; as locomotivas que vão quebrando, eles vão encostando; e, quando não tiver mais, entregam para a Mãe-Pátria a sucata de uma medida equivocada, errada e, a meu ver, quase lesiva aos interesses do patrimônio nacional.

Penso que deveríamos propor ao Governo Federal que suste imediatamente essa história de liquidação da Rede, porque isso é coisa do governo passado, que não tinha criatividade para fazer com que as ferrovias brasileiras trouxessem a sua presença ao desenvolvimento nacional. Disseram que era porque as ferrovias, uma vez dadas a concessionários privados, iam tirar a carga do rodoviário e botar no ferroviário. Conversa fiada! Coisa nenhuma! Fizeram foi seccionar a extensão da Rede. Antigamente, ia-se do Rio Grande do Sul a São Luiz direto; hoje, não se vai mais. São pedaços de estradas de ferro atendidos por concessionários que não cumprem - anotem bem - com aquilo a que se propuseram.

A primeira medida do Governo do Presidente Lula, que quer acertar as coisas, que quer ver suas ferrovias e o Brasil andando noutro rumo, a primeira coisa que deveríamos pedir é mandar imediatamente sustar essa história do governo passado de liquidar a Rede. E mais: mandar rever essas concessões. Para as que não estão cumprindo o contrato, decreta-se a caducidade do contrato - que permite isso.

Vamos, portanto, rever essa história e recuperar outra vez o que temos de precioso, que é a nossa malha ferroviária brasileira, construída com sacrifício, amor e patriotismo pelos nossos antepassados, que, há cerca de 50 anos, ligaram o Brasil todo por estradas de ferro. Essa é a verdade. Como assistimos na reportagem da Globo, é doloroso ver, de repente, o abandono de seis mil quilômetros de ferrovias, e o resto entregue a concessionárias que não estão nem aí, que não dão a mínima bola, não pagam ao Governo e estão deixando que se acabe um patrimônio sagrado do povo brasileiro.

Prezados companheiros, acho que esta Casa deve fazer uma moção e oferecer ao Presidente da República uma oportunidade. Tenho elementos suficientes para garantir a veracidade do que estou falando. Tenho levantamentos feitos pelo Tribunal de Contas que indicam que essas concessionárias não vão bem, porque elas não estão cumprindo nada. Nós não queremos abrir CPI. O que queremos é que o Governo mande parar imediatamente com essa história de acabar com a Rede, mande rever essas concessões, porque elas são absolutamente lesivas aos interesses nacionais, e recupere a Rede Ferroviária.

Acho que dei o meu recado ao Brasil e aos meus companheiros. Essa situação é grave e precisamos tomar as providências. Isso é apenas um começo. Vamos apresentar a nossa proposta. O Senado pode, com os seus engenheiros e os seus representantes que foram governadores, apresentar ao Governo Federal uma solução para as rodovias e as ferrovias.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/12/2003 - Página 41086