Discurso durante a Reunião do Senado Federal, no Senado Federal

Pesquisa com células-tronco no Brasil.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Pesquisa com células-tronco no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2004 - Página 23090
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, SEGURANÇA, BIOTECNOLOGIA, APROVAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, AUTORIZAÇÃO, UTILIZAÇÃO, EXCEDENTE, EMBRIÃO, PROCESSO, INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL, CLONE, VALOR TERAPEUTICO, PESQUISA CIENTIFICA, VIABILIDADE, DESCOBERTA, TRATAMENTO, DOENÇA GRAVE, INCENTIVO, PROGRESSO, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, PAIS.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o texto atual do projeto da nova Lei de Biossegurança, aprovado na Câmara dos Deputados em fevereiro e que ora tramita nesta Casa, prevê a proibição das pesquisas com células-tronco embrionárias.

Só será permitida a pesquisa com células-tronco provenientes de cordões umbilicais, medulas ósseas ou placentas. Embriões descartados pelas clínicas de fertilização in vitro ou produzidos por clonagem terapêutica não poderão ser usados para a obtenção de células-tronco.

Sr. Presidente, o Senado Federal está diante de duas alternativas claras. A primeira é a de acompanharmos o texto da Câmara dos Deputados e ratificarmos a proibição das pesquisas com células-tronco embrionárias.

Tomando esse caminho, estaremos interpondo sérios obstáculos ao progresso científico neste País. Estaremos assumindo, voluntariamente, uma posição secundária em um campo do conhecimento, a biologia, que já se consolidou como a grande fronteira da ciência neste século que se inicia.

Sabemos, Sr. Presidente, que a proibição das pesquisas com células-tronco embrionárias não foi resultado de debates desapaixonados e racionais sobre o assunto. Ela resultou, verdade seja dita, da pressão de grupos religiosos, que, agora, voltam suas atenções para o Senado Federal.

Srªs e Srs. Senadores, é no mínimo curioso que um projeto dessa magnitude seja influenciado por argumentos de natureza religiosa.

Se não me engano, vivemos num país laico, onde Igreja e Estado são duas instituições separadas e independentes. Embora a religião tenha um papel importante em vários aspectos da vida social, ela não pode ser o fator determinante numa discussão que envolve aspectos estranhos ao universo religioso.

Podemos nos decidir, no Senado Federal, por trilhar o caminho dessa primeira alternativa e, como resultado disso, atravancar o progresso científico do País. Mas, em vez disso, o Senado Federal pode demonstrar a maturidade, a coragem e a independência necessárias para seguir uma segunda alternativa: a de alterar o texto aprovado pela Câmara e liberar as pesquisas com as células-tronco embrionárias.

Caso façamos a opção pela alternativa da liberação, estaremos concedendo aos nossos cientistas a possibilidade de realizar pesquisas de ponta nessa área sensível e estratégica. Estaremos dando a eles a oportunidade de medir forças com os cientistas de países em que a pesquisa não parou, como a Inglaterra e a Coréia do Sul. Esses países, inclusive, estão atraindo um número considerável de cientistas renomados, oriundos de lugares em que esse tipo de pesquisa foi proibido, como os Estados Unidos.

A menção de outros países nos lembra de que, independentemente do que se decida no Brasil, as pesquisas com células-tronco embrionárias continuarão sendo realizadas em outras partes do mundo. Diante desse fato, não é difícil imaginar um cenário futuro em que, nos países em que a pesquisa está sendo incentivada, se descubra a cura para várias doenças, como a diabetes, o mal de Alzheimer, o mal de Parkinson, a distrofia muscular e outras enfermidades que vitimam milhões de pessoas a cada ano.

Nesse cenário, o Brasil, juntamente com os países que proibiram as pesquisas, se verá na condição de mero comprador dos medicamentos e das tecnologias produzidos a partir das pesquisas com células-tronco.

É possível prever, também, que essas inovações não serão baratas. O Brasil terá de pagar um preço bastante alto para ter acesso aos medicamentos que proporcionarão a cura para os males que mencionei.

O Senado Federal, não resta dúvida, tem a opção de adotar a primeira alternativa e proibir as pesquisas com células-tronco no Brasil. Nesse caso, estaremos escolhendo o caminho do atraso, do obscurantismo e da dependência tecnológica. Estaremos aceitando argumentos da Idade Média para justificar decisões tomadas no século XXI. Estaremos atando as mãos de nossa comunidade científica e, na prática, expulsando nossos melhores cérebros, que buscarão melhores condições de trabalho longe daqui.

Sr. Presidente, meu posicionamento já ficou claro nas outras ocasiões em que tratei desse assunto. Defendo a adoção da segunda alternativa e sou plenamente favorável à liberação das pesquisas com células-tronco no Brasil.

Creio que o País conta com um enorme potencial para participar ativamente do desenvolvimento dessas novas tecnologias. Possuímos centro de excelência no que se refere às ciências biológicas e temos, em nossos quadros, pesquisadores de alto gabarito, reconhecidos internacionalmente.

Proibir as pesquisas com células-tronco embrionárias seria desperdiçar todo esse potencial. Seria um desperdício similar ao que já ocorre, e continuará ocorrendo, caso o projeto da Lei de Biossegurança seja aprovado em sua forma atual: periodicamente, milhares de embriões continuarão a ser descartados pelas clínicas de fertilização, embriões que poderiam ser utilizados para a obtenção de células-tronco e, conseqüentemente, para a descoberta da cura de várias doenças graves.

Diante de tudo isso, apelo a V. Exªs para que alteremos o projeto da Lei de Biossegurança, no sentido de permitir, em nosso País, a pesquisa com células-tronco embrionárias. Não podemos perder mais uma oportunidade de nos posicionarmos na dianteira dos avanços científicos e tecnológicos, sobretudo por preconceito e desinformação.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2004 - Página 23090