Discurso durante a 142ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a indefinição da titularidade das terras no Estado de Roraima.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PPS - CIDADANIA/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Preocupação com a indefinição da titularidade das terras no Estado de Roraima.
Aparteantes
Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 19/10/2004 - Página 31561
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • GRAVIDADE, FALTA, ESTABILIDADE, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, ESTADO DE RORAIMA (RR), PREJUIZO, ATIVIDADE ECONOMICA, ESPECIFICAÇÃO, AGRICULTURA, EXPORTAÇÃO, SOJA, GRÃO, APREENSÃO, EMIGRAÇÃO, PRODUTOR, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, NECESSIDADE, SOLUÇÃO, CONFLITO, FEDERAÇÃO, POSSE, TERRAS, REGISTRO, TRAMITAÇÃO, JUDICIARIO.
  • SOLICITAÇÃO, URGENCIA, SOLUÇÃO, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, ESTADO DE RORAIMA (RR), EXPECTATIVA, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), DEMARCAÇÃO, RESERVA INDIGENA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a revista Época desta semana traz uma reportagem em que mostra que mais de um terço da soja da Bolívia é produzida por brasileiros. De um lado é muito bom saber que agricultores brasileiros, que empresas brasileiras, estão em um país vizinho produzindo riqueza que pode de alguma forma beneficiar o País. Por outro lado, preocupo-me com o meu Estado, que tem hoje, comprovadamente, a maior produtividade no que se refere à produção de soja, de arroz e outros grãos. E, no entanto, possui uma questão fundiária, quer dizer, uma indefinição quanto à titularidade das suas terras que persiste há algum tempo - e que já vai completar dois anos no Governo Lula - sem que tenhamos uma decisão definitiva sobre ela. Amanhã, o que posso antever - e me preocupa - é que, por exemplo, os nossos produtores de arroz, de soja e de outros grãos possam ir para a Venezuela, ali pertinho, levando as suas máquinas, os seus caminhões, enfim, os seus implementos e ali produzirem, Senador Ney Suassuna. Na verdade, a capital Boa Vista está distante 201 quilômetros da fronteira com a Venezuela. E existem vários empresários venezuelanos querendo uma definição, inclusive, da situação da produção em Roraima porque querem vender o calcário, comprar a soja, e desejam implantar indústrias consorciadamente com os nossos produtores brasileiros para não só vender o grão, mas também para produzir o óleo, o farelo, a ração, incentivando outras atividades como a avicultura, a pecuária, a suinocultura. Estamos amarrados à questão simplesmente de definição de qual terra, enfim, é do Estado de Roraima porque persiste uma situação que reputo um conflito federativo.

Como Constituinte lembro-me muito bem: o Território de Roraima foi transformado em Estado e estava dito que as terras que comporiam o Estado seriam aquelas compreendidas pelos limites geográficos do então Território de Roraima. Portanto, não me parece necessário outra lei para dizer que aquelas terras passariam, a partir daquele momento, a ser do Estado de Roraima. E que se aplicava no mais o que se aplicou na lei que criou o Estado de Rondônia. Este Governo - o Presidente Lula, pelo menos, tem demonstrado vontade de resolver o problema - criou um grupo de trabalho interministerial que estudou todos os aspectos dessa questão, na verdade motivado muito mais pela terra indígena Raposa/Serra do Sol, que é mentirosa desde o nome. O certo é que essa terra hoje está sub judice no Supremo Tribunal Federal por duas razões: primeiro porque houve decisão de um juiz federal de Roraima a favor da suspensão parcial da portaria da Funai que queria simplesmente extinguir o Município, tirar de lá todas as pessoas, até mesmo escolas, prédios públicos, contrariando a maioria dos índios que vivem lá. Depois de perderem em caráter liminar, na Primeira Instância, no Tribunal Regional Federal, no Superior Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal, o Procurador-Geral da República entrou com outra medida, argüindo, aí, sim, o conflito federativo. É curioso que o Ministério Público Federal, durante todo esse tempo, quase três décadas, não tenha percebido, ou pelo menos desconfiado, que esse pudesse ser um conflito federativo. Agora, o Supremo Tribunal Federal vai decidir se, de fato, esse é um conflito federativo e, desse modo, a decisão será dele, inclusive quanto ao mérito. Não sendo um conflito federativo, volta-se para a decisão de primeira instância proferida pelo juiz federal de Roraima.

O certo é que, mesmo tirando essa área indígena, que tem um milhão e setecentos mil hectares, as outras terras também estão indefinidas. São pouquíssimas as terras que têm algum documento de propriedade. Mesmo assim, a produção de soja e de arroz em nosso Estado tem sido surpreendente.

Leio a notícia de que a nova fronteira agrícola nacional está na Bolívia. Pode ser que a outra fronteira agrícola nacional passe a ser na Venezuela, porque, no meu Estado, infelizmente, não há uma definição que se possa dar ao empresário que chega lá. Apesar de tudo isso, todos os dias, chegam empresários, os quais investem, comprando as poucas terras que têm algum tipo de documento e começam a plantar e a produzir, sem nenhum tipo de financiamento. Hoje em Roraima, falta até armazém, para, adequadamente, armazenar a produção.

Então, faço um apelo, em nome da classe produtora de Roraima, para que esse problema seja resolvido rapidamente e o Presidente Lula deixe a situação da Raposa/Serra do Sol ser decidida na Justiça, aliás, não há lugar melhor para isso. Essa decisão não poderia ser tomada pela Funai, porque, com todo o respeito que eu possa ter ao atual presidente daquele órgão, parece que ele está necessitando de um exame psiquiátrico. Há pouco tempo, quando houve aquele problema na reserva indígena Roosevelt, ele disse que os índios estavam agindo em legítima defesa quando mataram 29 pessoas, as quais estavam trabalhando de acordo com os índios. Agora, apesar de todas as evidências da declaração da testemunha que estava ao lado do sertanista Apoena Meireles e da própria filha deste, a qual afirmou que de jeito algum Apoena Meireles estava sendo perseguido, porque, inclusive, ele havia entregado suas armas ao programa de desarmamento, o presidente da Funai continua insinuando que o crime tem outras motivações. É preciso realmente tirar essa paixão. Felizmente a questão da Raposa/Serra do Sol está no Supremo Tribunal Federal. Então o Presidente Lula está livre desse constrangimento e deve agir para resolver situação do restante das terras de Roraima.

Ouço o Senador Ney Suassuna com muito prazer.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Fico pasmo, porque para mim estava tudo resolvido. Quando um Território é transformado em Estado, é óbvio que a terra dele passa a ser do Estado, senão ele continuaria Território. Nunca imaginei que V. Exª, em seu Estado, estivesse vivendo um problema desses. Acompanhamos a discussão a respeito da reserva Raposa/Serra do Sol e achávamos que o Governo Federal havia encontrado uma solução razoável sem extinguir cidades, produção de arroz e tudo o mais. Os próprios índios, como V. Exª bem disse, não querem isso. Quem quer são algumas ONGs, não é isso?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Exatamente

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Abordo esse assunto, porque a CPI das ONGs precisa levar adiante esse tema. No Brasil, há uma ONG que também existe na Holanda. Recebi hoje alguns documentos, informando que lá fizeram um plano para frear a produção brasileira. A ONG que participou desse plano naquele país está criando um movimento ambientalista no Brasil. É uma situação armada, arrumada, organizada por algumas ONGs, não todas, pois, como tudo na vida, há umas boas e outras ruins. Existem algumas que devem ser brecadas porque estão trabalhando contra nosso País.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PPS - RR) - Não tenha dúvida, Senador Ney Suassuna. Presidi a CPI das ONGs, cujos trabalhos já foram concluídos, e ressalto que houve muita dificuldade de investigar as ONGs, porque, primeiramente, não há nenhum registro. Recentemente, há uma seqüência de escândalos com ONGs que fazem contratos e convênios com o Governo brasileiro sem licitação e com valores consideráveis, ONGs transnacionais agem sem que saibamos de onde vêm os recursos e quais são os objetivos delas.

Na CPI das ONGs, identificamos uma ONG canadense e estadunidense chamada Focus on Sabbatical, que veio ao Brasil, particularmente ao Centro-Oeste, propor aos plantadores de soja que não plantassem. Eles receberiam o equivalente à plantação por não plantarem para não concorrerem com a soja canadense e a americana. Realmente, é preciso passarmos isso a limpo porque não dá para entender o que está acontecendo. No caso de Roraima, não precisa sequer derrubar nenhuma árvore. Lá a plantação de soja é feita no que chamamos de “lavrados”, equivalentes aos cerrados daqui, sendo que não há tantas árvores como nos cerrados. São, na verdade, campos naturais, que têm uma produtividade muito boa por estarmos acima do Equador, haver sol o ano todo e um regime de chuva certo. Portanto, não há como entender por que, havendo no Brasil tanta dificuldade de obter alimentos e tanta gente desempregada - no meu Estado, isso é acentuadíssimo -, estamos amarrados a um esquema burocrático e tecnocrático sem fim.

Quero, mais uma vez, fazer esse apelo ao Presidente Lula porque esse grupo já terminou o trabalho e apresentou um relatório, do qual ninguém tem conhecimento. É preciso desenrolar a situação do resto das terras. O que não pode é continuar essa indecisão por causa da reserva Raposa/Serra do Sol, que sofre uma pressão internacional muito forte, a qual é muito fácil de entender. Lá, assim como na reserva Roosevelt, não existem só os índios que são a favor e os que são contra ou os não-índios que moram lá; existe também muito minério, ouro e diamante -- estes se tiram brincando. Outros minerais muito mais nobres, como o urânio e nióbio, também existem. É preciso que o Brasil assuma isso e possamos nós, de Roraima, produzir, gerar empregos, criar indústrias, já que ocupamos posição geográfica privilegiada. Estamos acima do Equador, como eu disse, muito mais próximos dos Estados Unidos, dentro da Venezuela, pois somos uma verdadeira cunha dentro da Venezuela, praticamente ligados ao Caribe e, portanto, muito próximos da Europa. Existe todo essa condição favorável, tendo em vista nossa posição geográfica, mas existe também um complô contra o desenvolvimento do Estado no que se refere às terras, ao falso ambientalismo e ao falso indigenismo.

Encerro, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, reiterando o apelo ao Presidente Luiz Inácio Lula da Silva no sentido de que encontre uma solução definitiva e deixe Raposa/Serra do Sol a cargo da Justiça. A matéria já se encontra no Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte do País, que apreciará a questão. Já não se trata de matéria de discussão de órgão do Governo. O Senado Federal, por meio de comissão temporária externa, que presidi, concluiu a investigação e encaminhou o relatório, que atualmente faz parte do processo no Supremo Tribunal Federal.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/10/2004 - Página 31561