Discurso durante a 22ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento contrário à autonomia do Banco Central, destacando matérias jornalísticas sobre o tema, publicadas no Jornal do Brasil.

Autor
Roberto Saturnino (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Roberto Saturnino Braga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
BANCOS.:
  • Posicionamento contrário à autonomia do Banco Central, destacando matérias jornalísticas sobre o tema, publicadas no Jornal do Brasil.
Aparteantes
Geraldo Mesquita Júnior, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 18/03/2005 - Página 5247
Assunto
Outros > BANCOS.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CRITICA, PROPOSTA, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), POLITICA MONETARIA, INFLUENCIA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, AREA, RESPONSABILIDADE, GOVERNO.
  • CRITICA, ARTICULAÇÃO, ANTONIO PALOCCI, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), NEY SUASSUNA, SENADOR, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), TENTATIVA, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), DESAPROVAÇÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, abordarei sucintamente um assunto que demandaria muito tempo para ser discutido adequadamente. Trata-se de tema da maior importância, que é a dita autonomia do Banco Central.

Farei referência a dois artigos, a meu ver de uma lucidez muito grande e que expressam pontos de vista com os quais estou de inteiro acordo, publicados no Jornal do Brasil na edição de 12 de março último. Um é de autoria do jornalista Rodrigo de Almeida, editor de opinião do JB, e o outro, do jornalista Sérgio Prado, chefe da sucursal do JB em Brasília.

Sr. Presidente, solicito a transcrição na íntegra desses dois artigos nos Anais da Casa, mas lerei alguns trechos - não teria tempo de fazer a leitura por inteiro -, que considero muito iluminadores dessa questão.

Diz o primeiro artigo, de Rodrigo de Almeida:

Não cheira bem um projeto que precisa se mover das mãos do Planalto para as cabeças do PMDB. Uma explícita traquinagem política para livrar o governo de desgastes adicionais. O temor é justificável: o projeto que concede autonomia formal ao Banco Central (BC), cujo DNA foi transferido para o senador paraibano Ney Suassuna, é danoso ao país. Uma operação de risco, capaz de fazer o PT-governo envergonhar-se de assumir a paternidade.

Adiante diz o jornalista:

O argumento segue o roteiro de sempre: a segurança institucional; a conquista da credibilidade dos “mercados”;...

Sr. Presidente, o velho argumento: a conquista da credibilidade dos mercados. Governos e governos têm passado e levado a economia do País a descaminhos grandes, sempre na busca da conquista da credibilidade dos mercados.

... a luz do fim do túnel para a tão desejada redução de juros [essa conquista da credibilidade].

Lorota [diz o jornalista Rodrigo de Almeida].

E adiante:

Aliás, no fundo, o discurso sobre credibilidade é uma enganação do mercado para mera obtenção de dividendos, mas isso é uma outra história.

Além de tornar o voto do cidadão uma peça mais inútil do que já é, a autonomia do BC é inconveniente por problemas igualmente inquietantes. O nó, diga-se, está justamente onde o projeto é mais elogiado pelos defensores da equipe econômica: a perspectiva de que a direção do Banco Central não será mais demissível, ad nutum, como se diz.

Sr. Presidente, imagine que o Governo Lula hoje chegue à conclusão de que essa política de juros mais elevados do mundo é danosa porque está impedindo o desenvolvimento da economia do País, porque está aumentando o endividamento extraordinariamente, porque está produzindo necessidade de superávits primários muito grandes. Imagine que o Governo queira mudar a política econômica, o que é absolutamente normal. A política monetária é um capítulo importantíssimo da política econômica em geral e é responsabilidade dos Governos decidir sobre a política econômica em todos os seus aspectos. Imagine o que aconteceria se o Banco Central tivesse autonomia! O BC é constituído, normalmente, de técnicos sempre ligadíssimos ao mercado financeiro, os quais saem dessa instituição, cumprem a quarentena e, logo depois, são empregados com salários elevadíssimos. Imagine o que acontecerá se o Presidente da República não puder substituir os diretores do Banco Central. Isso é um absurdo, é uma abdicação de uma das ferramentas principais da política econômica, que é precisamente a política monetária.

O ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, que implantou no País esse neoliberalismo destruidor de nossa economia, não teve coragem de propor a autonomia do Banco Central. O Presidente Lula, também pressionado pelo Ministro Palocci, recuou e disse não. Disse que isso não era conveniente. Sabiamente, o Presidente Lula desistiu dessa idéia. Assim se expressou o Líder Aloizio Mercadante aqui muito corretamente, muito lucidamente.

Agora, vem essa manobra, essa articulação do Ministro Palocci, utilizando o Senador Ney Suassuna para implementar esse projeto, que seria desastroso, como diz o articulista Rodrigo de Almeida. E continua:

Tão trágico quanto a relação íntima que os diretores têm hoje com os bancos particulares.

Alguém duvida? Basta consultar o currículo dos nomes que adornam a diretoria do BC [para ver que todos eles são representantes legítimos do chamado mercado financeiro] - e que rumo tomaram os ex-diretores. Autonomia formal significará o aprofundamento da dependência da instituição aos interesses financeiros privados. Menos do que muitos gostariam, mais do que o país tem condições de suportar.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (Sem Partido - AC) - Senador Roberto Saturnino, V. Exª me concede um aparte?

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Ouço, com muito interesse, o aparte do nobre Senador Geraldo Mesquita Júnior.

O Sr. Geraldo Mesquita Júnior (Sem Partido - AC) - Senador Roberto Saturnino, estou atento ao seu discurso e ao tema que V. Exª traz ao Senado. Eu também me preparei para falar hoje sobre o mesmo assunto, mas tomo a liberdade de aparteá-lo para perguntar a mim, a V. Exª e à Casa que maior autonomia quer o Banco Central se o atual Presidente dessa instituição, ao assumir suas elevadas funções, em apenas duas penadas, mandou arquivar processos de fiscalização que lá se encontravam, há alguns anos, antes da posse dele, envolvendo transferências de recursos do banco que ele presidiu. A suposição era a de que haveria indícios de irregularidade, tanto assim que se instalaram processos de fiscalização. Pois bem, que autonomia é essa que quer a mais o Banco Central se o seu Presidente, de forma antiética - no lugar dele teria me licenciado do cargo para que o Banco Central pudesse apreciar aqueles processos com independência -, ordenou o arquivamento daqueles processos que envolviam transferências supostamente irregulares de recursos entre agências da mesma instituição que ele presidiu durante anos, o chamado Bank Boston? Então, eu me pergunto: que autonomia a mais é essa que quer o Banco Central e figuras dessa República? Isso é algo que me causa suspeita, Senador Roberto Saturnino. Que autonomia a mais quer o Banco Central se o seu Presidente pode, de forma escancarada, praticar um ato desse, no mínimo, antiético com a instituição, com o País, com a população brasileira? Eu me filio ao pensamento de V. Exª no sentido de que é preciso ter absoluta cautela. Teremos que tratar desse assunto com muita responsabilidade, porque, no meu entendimento, autonomia o Banco Central já tem e autonomia absoluta, inclusive para tratar de temas tão nebulosos como esse.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Muito obrigado, Senador Geraldo Mesquita Júnior. Agradeço a V. Exª o aparte, com o qual concordo em tudo. Acho que, efetivamente, o Senado tem de estar atento e consciente e barrar esse projeto antes que ele prospere, porque é exatamente o que V. Exª está dizendo: é uma autonomia sobre algo que se configura como um direito quase absoluto, que deixa o Presidente e diretores do Banco Central com uma liberdade de ação que nenhum servidor público que serve ao Governo, à Nação, ao povo deve ter.

Sr. Presidente, vou encerrar, mas eu gostaria...

O SR. PRESIDENTE (Mozarildo Cavalcanti. Bloco/PTB - RR) - V. Exª ainda dispõe de dois minutos.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Obrigado, Sr. Presidente. Eu só queria ler o artigo do jornalista Sérgio Prado, da sucursal de Brasília do Jornal do Brasil.

Na semana passada, os aliados do Planalto no Senado brindaram os eleitores com mais uma tucanada. Vão apresentar, em nome do Dr. Palocci, a proposta de independência do Banco Central, que tantos petistas atacaram quando Pedro Malan era Ministro da Fazenda. Para que serve, ninguém explica direito. Só o tal mercado e seus operadores engravatados com cara de boneco.

Sr. Presidente, gostaria até de ler mais da substância desses dois artigos, mas acho que o que foi lido é o suficiente.

Antes de encerrar, ouço, com muita atenção, o Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Ratifico nosso apoio ao reclamo de V. Exª. Neste instante estão realizando reuniões de Comissões. Todo o Senado deveria estar aqui para ouvir a experiência de V. Exª, exitoso conhecedor da vida bancária, um dos melhores nomes que construiu o BNDES. E a Casa está vazia. Queria dar um argumento muito forte para aquele seu pleito, proibindo essas transferências. Está na Bíblia uma das frases mais importantes do apóstolo Paulo, Heloísa Helena: “Isto eu faço”. Só pode fazer alguma coisa. Agorinha estão me chamando para ir à Comissão de Relações Exteriores. Então, a nossa solidariedade. E que isso deva ser repetido pela televisão, porque ninguém tem melhor experiência, nesta Casa, de vida bancária, tais foram os dias vividos por V. Exª no BNDES.

O SR. ROBERTO SATURNINO (Bloco/PT - RJ) - Obrigado, Senador Mão Santa. Efetivamente, eu gostaria também de estar presente na Comissão de Relações Exteriores, pois assuntos muito importantes estão sendo discutidos naquela Comissão, mas há essa coincidência de sessão plenária deliberativa com o tempo das comissões, que é o período da manhã. A sessão do Senado, regimentalmente, às quintas-feiras, é na parte da tarde. Quer dizer, essa convocação só tem sentido, só é aceitável quando há um motivo extraordinário, o que não é o caso de hoje. Então, lavrei o meu protesto de manhã cedo e estou repetindo-o agora, em apoio ao aparte do Senador Mão Santa.

Enfim, o que queria dizer era exatamente o meu ponto de vista sobre essa tentativa de burlar a decisão do Presidente Lula a respeito da chamada autonomia do Banco Central, e fazer tramitar aqui no Senado, sob a liderança do PMDB, um projeto que o Presidente rejeitou, e o seu Governo, como um todo, deveria também rejeitar.

O Governo respeita muito as decisões do Ministro Antonio Palocci. É preciso que o Ministro Antonio Palocci também aprenda a respeitar as decisões do Governo. E a decisão do Governo a esse respeito é de não apoiar e não enviar para a Casa nenhum projeto de autonomia do Banco Central.

Obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ROBERTO SATURNINO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art.210, inciso I e § 2º do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“A falta que faz o chapéu;”

“À dependência da autonomia.”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/03/2005 - Página 5247