Discurso durante a 35ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Saudação à criação da Comissão de Desenvolvimento Regional.

Autor
Ana Júlia Carepa (PT - Partido dos Trabalhadores/PA)
Nome completo: Ana Júlia de Vasconcelos Carepa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Saudação à criação da Comissão de Desenvolvimento Regional.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 08/04/2005 - Página 8156
Assunto
Outros > SAUDE. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • SOLIDARIEDADE, DISCURSO, FRANCISCO PEREIRA, SENADOR, DEFESA, PESQUISA, MEDICINA.
  • QUALIDADE, VICE-PRESIDENTE, SAUDAÇÃO, CRIAÇÃO, SENADO, COMISSÃO PERMANENTE, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, COMPROMISSO, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, BUSCA, JUSTIÇA SOCIAL, REFORÇO, DEMOCRACIA.
  • ANALISE, CRITICA, MODELO, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO, FAVORECIMENTO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, IMPORTANCIA, DEBATE, ALTERAÇÃO.
  • SAUDAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, SENADO, PARTICIPAÇÃO, AUTORIDADE, DEBATE, SOBERANIA NACIONAL, REGIÃO AMAZONICA, NECESSIDADE, AUMENTO, FISCALIZAÇÃO, EXPLORAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, BUSCA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL.
  • COMENTARIO, TRABALHO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), TERRAS, INVESTIGAÇÃO, RESPONSABILIDADE, VIOLENCIA, OPOSIÇÃO, REFORMA AGRARIA.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, também gostaria de me solidarizar com o Senador Francisco Pereira. A causa de V. Exª é, com certeza, a de muitos brasileiros e brasileiras, e conta com nosso apoio e nossa solidariedade.

Falarei de um assunto que já havia preparado há algum tempo.

Ocupo a tribuna para saudar a criação da Comissão de Desenvolvimento Regional, iniciativa do Senador Antonio Carlos Magalhães. Como Vice-Presidente, tenho a honra de trabalhar com o Senador Tasso Jereissati, Presidente da Comissão. Apesar das nossas divergências políticas e ideológicas, acredito que a Comissão tem muito a ganhar com dois Senadores das regiões menos privilegiadas do País conduzindo seus trabalhos. As regiões Norte e Nordeste têm acumulado déficits sociais, têm sofrido com a ausência de políticas ou, melhor dizendo, com políticas equivocadas, ao longo dos séculos. Esse novo fórum vem renovar nossas esperanças de que providências sejam adotadas para minimizar, preferencialmente anular, as diferenças regionais que hoje persistem no quadro socioeconômico brasileiro.

Em 1974, o economista Edmar Bacha cunhou a expressão “Belíndia”, símbolo da convivência de dois extremos: um Brasil rico, outro miserável; um Brasil com índices econômicos e sociais equivalentes à Bélgica, outro que mais se aproximaria da Índia. Esse termo popular perdeu fôlego: a Índia hoje se insere entre as economias mais dinâmicas do mundo, mais promissoras, e que tem conseguido avanços consideráveis, apesar de ainda haver, com certeza, índices que deixam a desejar em termos de qualidade de vida. A Bélgica continua existindo no Brasil, mais pujante do que nunca, mas a Índia cedeu lugar ao Burundi. A região Norte tem índices sociais piores do que alguns países africanos. Essa é uma vergonha nacional. A nenhum país é moralmente permissível que a riqueza chegue a uns em desproporção tão grande, em detrimento das populações mais pobres.

Só podemos falar em democracia efetiva quando houver igualdade de oportunidades e condições para uma qualidade de vida eqüitativa.

Portanto, a criação da Comissão de Desenvolvimento Regional vem cumprir importante papel para a consolidação da democracia no Brasil. Decorridos mais de 40 anos em que o desenvolvimento regional ganhou espaço na agenda política, verificamos que o tão propalado desenvolvimento socioeconômico, particularmente na Amazônia, onde se situa o meu Estado, o Pará, aconteceu, sim, mas de forma absolutamente desigual, porque atingiu apenas alguns. Com uma orientação essencialmente voltada para a exploração mercantil, uma tentativa, inclusive, de homogeneizar a Amazônia, não foram criadas bases para o desenvolvimento regional sustentável, como a dinamização da economia, a geração de empregos e o aumento de renda da região de forma eqüitativa.

A política regional para o Norte do País foi implementada por meio da concessão de recursos a grupos que representavam a elite local e, quase sempre, voltada para a exportação. A distribuição de recursos obedeceu a critérios no mínimo discutíveis, seguindo uma lógica arcaica e elitista.

Ao contrário do que se esperava, na maioria das vezes, esse modelo de desenvolvimento revelou-se concentrador de renda e predatório à região, com conseqüências nefastas, sobretudo no caso da Amazônia. Essa região, não obstante seu enorme potencial natural, foi muitas vezes vista como problema, como entrave ao desenvolvimento econômico. Com efeito, nunca se conseguiram os resultados esperados de crescimento e de dinamização da economia regional, a melhora das condições de vida foi insuficiente e verificou-se, de forma lastimável, a destruição da natureza com incentivos governamentais.

Além disso, constatou-se que a concentração de renda é maior nas regiões menos desenvolvidas. Isso porque, ao buscar o desenvolvimento regional a partir de uma visão macronacional, o que aconteceu foi a criação de focos de dinamismo que estabelecem uma relação de complementaridade ao padrão de desenvolvimento das regiões Sul e Sudeste. Não é exagero dizer que esse padrão de desenvolvimento levou à fragmentação do País, ou seja, à consolidação de uma realidade onde “ilhas de dinamismo” convivem com numerosas sub-regiões marcadas pela estagnação, pobreza, retrocesso e até isolamento.

No Brasil continental, heterogêneo, diverso e desigual, não servem nem as soluções centralizadas, nem o localismo atomizante. Temos que construir políticas nacionais que articulem ações descentralizadas.

Discutir, debater e buscar formas de desenvolvimento regional capazes de fazer frente a esse desafio é o que pretendemos fazer no âmbito da Comissão de Desenvolvimento Regional. Em cada lugar, há potencialidades latentes a serem apoiadas. Identificar essas potencialidades é o nosso desafio. Esperamos dar nossa contribuição.

Esse foi o pronunciamento que eu havia feito para saudar a importância da Comissão de Desenvolvimento Regional. Complemento e cito como exemplo a discussão travada na reunião de hoje da Comissão de Relações Exteriores, presidida pelo Senador Cristovam Buarque. Foi uma audiência pública muito importante, mas confesso, Senador, que não me lembro do nome do Almirante.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PT - DF) - Almirante Miguel Ângelo Davena.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Pois bem, estiveram presentes o Almirante Miguel Ângelo Davena, o Sr. Samuel Pinheiro, na condição de Ministro em exercício do Ministério das Relações Exteriores, o Professor Armando Mendes - que conheço, do Estado do Pará - e o Sr. Clóvis Brigagão.

Foi uma aula para todos nós, especialmente para aqueles que conhecem menos a Amazônia, o que não constitui demérito algum. Ao contrário, é importante que haja esse tipo de audiência pública para o Brasil inteiro. Houve, inclusive, uma grande audiência pela TV Senado, haja vista a grande quantidade de perguntas que chegaram. A iniciativa do Senador Cristovam Buarque é digna de registro. Parabéns, Senador! O que é bom tem que ser, sim, copiado. Dessa forma, as pessoas que assistiam à TV Senado puderam enviar perguntas e observações, o que foi importantíssimo.

Percebe-se claramente que existe uma preocupação com a questão da internacionalização, não de forma xenófoba ou usando-se de má-fé, como alguns tentam utilizar, mas de forma responsável, conseqüente. Entende-se realmente que não existem países amigos, mas, sim, interesses de países, que devem ser vistos com o devido cuidado.

A questão da internacionalização da Amazônia tem sido utilizada de má-fé por aqueles que mais têm contribuído para expor o País e a Região Amazônica, ou seja, pelos que não querem uma regularização fundiária, pelos que não querem um controle da exploração dos nossos recursos naturais; ao contrário, querem o desmatamento de forma insustentável.

Cedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque, que comandou a nossa audiência pública hoje.

Senador Cristovam, com muito prazer.

O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PT - DF) - Senadora, eu pedi a palavra para dizer que raramente ouvimos o que a senhora está falando. Eu gostaria de lembrar que, no caso do Brasil, pobreza não é falta de riqueza, é riqueza chegando a poucas mãos. Eu queria lembrar também que tem que ser uma função da nossa Casa elaborar projetos que façam com que a renda chegue a todos os lugares. E estamos adiando isso. Devo dizer, com toda a tristeza, que o nosso Governo - seu, meu, nosso Partido - ainda não mostrou um projeto de erradicação da pobreza. Ainda não mostramos com clareza o nosso projeto de redução da concentração de renda. Ainda não mostramos o nosso projeto para reduzir a desigualdade regional. O seu discurso traz essa preocupação, e eu a felicito por isso, porque a maior parte dos discursos apenas diz que precisamos crescer para resolver a situação da pobreza. E há cem anos o Brasil cresce aumentando a desigualdade e sem diminuir a pobreza.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - É verdade, Senador. Agradeço a V. Exª. Precisamos crescer, sim, mas crescer com distribuição de renda e com projetos sustentáveis, principalmente para a nossa região. E aqui faço questão de registrar a nossa CPMI da Terra. O Senador Demóstenes Torres foi extremamente feliz naquela comissão que acompanhou as investigações da morte da Irmã Dorothy ao fazer um diagnóstico muito positivo da situação da região.

Ficamos tristes, porque, quando começávamos a avançar e chegar aos responsáveis pela violência...

O SR. PRESIDENTE (Garibaldi Alves Filho. PMDB - RN. Fazendo soar a campainha.) - Senadora Ana Júlia Carepa, V. Exª, a partir de agora, dispõe de apenas dois minutos.

A SRª ANA JÚLIA CAREPA (Bloco/PT - PA) - Obrigada, Sr. Presidente. Vou tentar concluir.

Quando tentávamos chegar aos responsáveis pela violência, não apenas a violência da morte, mas a violência que expulsa trabalhadores da terra... Nossa Constituição é clara: as terras da União prioritariamente têm que ser cedidas aos projetos de reforma agrária. Então, quando vamos chegando perto, tenta-se encobrir, criminalizar os movimentos sociais. Fico impressionada com isso! Às vezes se discute tanto, faz-se alarde, porque se repassam recursos para uma entidade de trabalhadores. Faz-se um escândalo em relação à má utilização, quando a vida inteira pagamos e ainda estamos pagando por esses ditos grandes proprietários que estão financiando a violência, muitas vezes com dinheiro público, com financiamentos que receberam de bancos públicos, de programas públicos.

Lamento essa tentativa de encobrir a verdadeira chaga da violência no campo. Quem são os responsáveis? É só ver quem morre. Infelizmente, mais de 90% dos que morrem são trabalhadores.

Saúdo a Comissão de Desenvolvimento Regional. Pretendemos fazer um bom trabalho, para contribuir para um Brasil melhor e assim realizar o que a Constituição estabelece: diminuir as diferenças regionais no nosso País, porque todos somos brasileiros e brasileiras, filhos de Deus, temos o direito à qualidade de vida.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/04/2005 - Página 8156