Discurso durante a 37ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Denúncia de crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, usando as loterias da Caixa Econômica Federal. Desvios de verba da Previdência Social.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JOGO DE AZAR. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Denúncia de crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de bens, usando as loterias da Caixa Econômica Federal. Desvios de verba da Previdência Social.
Aparteantes
Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 12/04/2005 - Página 8649
Assunto
Outros > JOGO DE AZAR. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • DENUNCIA, SUSPEIÇÃO, FRAUDE, SORTEIO, LOTERIA, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), GRUPO, VINCULAÇÃO, TRAFICO, DROGA, TENTATIVA, LAVAGEM DE DINHEIRO, REGISTRO, REQUERIMENTO, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, SOLICITAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), ESCLARECIMENTOS, INTERFERENCIA, CRIME ORGANIZADO, CONCURSO DE PROGNOSTICO, DEFESA, CONTINUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, POLICIA FEDERAL.
  • DENUNCIA, GOVERNO FEDERAL, DESVIO, RECURSOS, PREVIDENCIA SOCIAL, FORMAÇÃO, SUPERAVIT, MANUTENÇÃO, DIRETRIZ, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), CRITICA, SUPERIORIDADE, GASTOS PUBLICOS, DESVINCULAÇÃO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL, CONTRADIÇÃO, DISCURSO, GOVERNO, DEFICIT, SEGURIDADE SOCIAL, SOLICITAÇÃO, RESPEITO, TRABALHADOR.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já há algum tempo venho cobrando do Governo providências em relação a fortes indícios de que estaria ocorrendo fraude nos sorteios realizados pela Caixa Econômica Federal, sobretudo da Mega-Sena. Há indícios fortes de que estaria ocorrendo lavagem de dinheiro, que a Caixa Econômica Federal poderia estar sendo utilizada, inclusive pelo narcotráfico, para efetuar lavagem de dinheiro.

Primeiramente, apresentamos um requerimento denunciando determinado sorteio que premiara inúmeros ganhadores, de uma só vez, numa mesma região. Recebemos a resposta superficial da Caixa Econômica Federal, mas não ficamos satisfeitos com a referida resposta.

Apresentamos, então, um novo requerimento que está com parecer favorável da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal. Esse requerimento, dirigido ao Ministro da Fazenda, solicita que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras - Coaf - responda relativamente a essa denúncia de crimes de lavagem de dinheiro, ocultação de bens, direitos e valores, e sobre a suspeita de que o crime organizado e o tráfico estejam utilizando loterias da Caixa Econômica Federal para essa lavagem de dinheiro.

Segundo levantamento do próprio Coaf, há pelo menos 50 casos suspeitos de lavagem. Entre eles o de um grupo de 200 pessoas que teriam acertado 9.095 vezes nas loterias da Caixa entre março de 1996 e fevereiro de 2002. No mesmo período, 98,6% das 168.172 pessoas premiadas alguma vez, em todo o País e em todas as formas de jogo, acertaram somente até quatro vezes, fatos esses, no mínimo, muito estranhos.

Portanto, estamos solicitando informações do Coaf a respeito da suposta lavagem de dinheiro com a utilização da Caixa Econômica Federal pelo crime organizado. Esse requerimento, repito, deve ser votado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Hoje, estamos diante de novas informações, informações que dão conta de que a Polícia Federal teria descoberto fraudes ocorridas no concurso da Mega-Sena. Essas fraudes recentemente descobertas pela Polícia Federal foram noticiadas sem muito destaque pela mídia eletrônica e revelaram o envolvimento de inúmeras pessoas no esquema ilícito, cujo engenho criminoso consistia na adulteração do peso da bolinha utilizada no sorteio.

Por isso estamos requerendo informações ao Ministério da Justiça sobre as apurações levadas a efeito pela Polícia Federal.

A sociedade precisa saber se a Polícia Federal realmente encontrou o caminho da lavagem de dinheiro por meio da Caixa Econômica Federal. Sr. Presidente, precisamos dessas informações para verificarmos quais providências podem ser adotadas nesse caso, afinal, milhares de pessoas deste País reservam parcela de seu orçamento doméstico para participar dos concursos patrocinados pela Caixa Econômica Federal todas as semanas. O cidadão direciona, muitas vezes, os parcos recursos disponíveis para disputar um prêmio milionário que, no inconsciente popular, ganhou contornos de uma utopia coletiva.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é pouco o que a Caixa Econômica Federal movimenta de recursos semanalmente. Portanto, não é possível a omissão, a conivência ou a complacência da autoridade em relação a eventuais desvios que possam estar ocorrendo. Há o dever do esclarecimento, sobretudo quando há notícia de que a Polícia Federal já identificou responsáveis por fraudes no sorteio da Mega-Sena.

Sr. Presidente, o segundo assunto diz respeito a desvios de verbas da Previdência Social. Neste momento, o Senado volta a discutir a PEC paralela e o debate sobre déficit ou superávit da Previdência Social.

No Brasil, a Previdência é deficitária ou superavitária? Segundo o Governo, é deficitária; nós entendemos que é superavitária. Um órgão especializado em assuntos da Previdência, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social (Anfip), também entende e comprova ser a Previdência Social no Brasil superavitária.

O que me traz hoje ao assunto é o desvio dos recursos da Previdência. Sem amparo legal, o Governo Federal subtraiu R$17,630 milhões da arrecadação da seguridade social no ano passado para engordar o superávit primário, conforme afirma a Anfip - Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social. Segundo essa entidade, os recursos desviados contribuíram com 36% da meta de ajuste fiscal da União, excluindo as estatais federais. Pelas contas da entidade, o sistema de seguridade social registrou um saldo positivo de R$42,530 milhões, em 2004. O excedente, de acordo com a Anfip, foi alocado no pagamento de gastos fiscais ou contabilizado diretamente no cálculo do superávit primário.

As contribuições sociais, estabelece a Constituição, são receitas vinculadas criadas para financiar a seguridade social. O Governo, no entanto, faz uso de um mecanismo que é garantido por uma emenda constitucional que estabelece a desvinculação de 20% da receita de impostos e contribuições. É o que chamamos, aqui, de DRU - Desvinculação das Receitas da União.

O Governo ultrapassou esse limite legal da Desvinculação da Receita da União, que pode chegar ao patamar de 20%.

A Anfip calcula que a desvinculação das contribuições sociais, entre elas Cofins e CPMF, autorizaria o Governo a gastar, fora da Seguridade Social, R$24 bilhões no ano passado. Os R$17 bilhões restantes deveriam ser aplicados no Sistema. Não foi o que aconteceu. O Governo não aplicou esse excedente no Sistema.

Os auditores da Previdência destacam que essa não foi uma peculiaridade do ano passado. Entre 2000 e 2004, foram utilizados R$165 bilhões da Seguridade Social para contribuir com o superávit primário.

Veja, Senador Paulo Paim, como é grave essa denúncia. E não é uma denúncia de um Senador da Oposição. Estou fazendo questão de ler exatamente da forma como se expressou a Anfip, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social, que denuncia: foram desviados R$165 bilhões da Seguridade Social para contribuir com o superávit primário. Desse montante, R$76,840 bilhões teriam excedido o limite permitido pela DRU, ou seja, é uma afronta à Constituição. A Constituição estabelece os 20% de desvinculação. O Governo excedeu R$76,840 bilhões de recursos da Seguridade Social para garantir o superávit primário no período compreendido entre 2000 e 2004.

Portanto, estamos destacando que o Governo comete desvio de finalidade, ao utilizar os recursos da Previdência de forma irregular e desonesta para com os trabalhadores do País, Senador Papaléo Paes. Os recursos da Previdência são do trabalhador brasileiro e não podem ser utilizados para compor o superávit primário, estabelecido pelo Fundo Monetário Internacional, em Washington, e consagrado pelo FMI doméstico, por intermédio do Ministério da Fazenda, em Brasília.

O regime não é, pois, deficitário. O Governo o faz deficitário. O Governo quer que seja deficitário. E, para subtrair direitos adquiridos pelos trabalhadores do País, utiliza o pretexto do déficit. O Governo sustenta ser o sistema deficitário e, com esse pretexto, subtrai direitos dos trabalhadores brasileiros.

O levantamento elaborado pelos fiscais reforça a tese de defensores da Seguridade Social. O regime geral da Previdência não é deficitário, uma vez que o Sistema do qual faz parte goza de superávits crescentes. Em 2004, o saldo positivo da Seguridade cresceu 34% em relação ao ano anterior.

Ao isolar o regime geral da Previdência Social do sistema de Seguridade Social e distorcer a composição do seu orçamento, as fontes oficiais omitem da sociedade que os repasses constitucionais, que deveriam ser alocados em saúde, previdência e assistência social, são, na execução, realocados para a cobertura de gastos fiscais e obtenção do superávit primário.

Sr. Presidente, mesmo depois de pagar todos os benefícios previdenciários e saldar todas as despesas previstas com saúde e assistência, houve um saldo positivo na Seguridade Social, no ano passado, de R$42,530 bilhões. Para a Anfip, esse adicional de arrecadação das contribuições deveria ser usado na expansão de ações da Seguridade Social, e não o foi. Houve desvio de finalidade. Lamentavelmente, utilizaram-se indevidamente os recursos dos trabalhadores para alcançar o superávit primário, imposto não mais pelo Fundo Monetário Internacional, mas pelo FMI doméstico, pelas autoridades do nosso País, pelas autoridades governamentais.

Concedo um aparte, com satisfação, à Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (P - SOL - AL) - Senador Alvaro Dias, estávamos eu e o Senador Paulo Paim discutindo a questão abordada por V. Exª, a quem parabenizo. Apesar de não ser um problema novo, a maior hipocrisia - porque não acho outro adjetivo mais grave - seria que simplesmente fôssemos acostumando com os saques que são feitos, de forma imoral e ilegal, nos cofres da Previdência. Então, a DRU - Desvinculação de Receita da União infelizmente foi criada pelo Governo Fernando Henrique e, depois, recriada pelo Governo Lula por medida provisória. Sabe V. Exª que a reforma tributária do Governo Lula não serviu para nada, a não ser reeditar a Desvinculação de Receita da União, que autoriza o Governo a saquear oficialmente, dos cofres da seguridade social, 20% dos recursos. A denúncia que V. Exª traz à Casa, à sociedade brasileira, com os dados apresentados pela Anfip, é muito mais grave do que aquilo que foi feito no passado. Se já é muito grave saquear oficialmente 20% do orçamento da Seguridade Social para jogar na lama da especulação, imagine quando, além disso, saqueiam mais de R$17 bilhões dos cofres da seguridade social. Depois vem a velha cantilena, enfadonha e mentirosa, de déficit da Previdência e que, em função disso, não tem reforma que seja capaz de garantir sua estabilidade. Portanto, parabenizo V. Exª. Sabemos todos nós que a Seguridade Social é superavitária. O Governo desvia tanto recursos que seriam destinados à área de saúde, como a CPMF, como destinados aos cofres da Seguridade Social de forma geral. Inclusive, é necessário solicitarmos a abertura de um procedimento investigatório na Comissão de Fiscalização e Controle, para que o Ministro venha aqui explicar os saques promovidos que, além de imorais, são absolutamente insustentáveis juridicamente.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senadora Heloísa Helena. V. Exª, com autoridade e inteligência, acrescenta ao nosso pronunciamento argumentos incontestáveis, que convocam o Governo para a responsabilidade de corrigir os desvios. Afinal, são R$165 bilhões, de 2000 a 2004. Portanto, não é um fato novo, mas que vem do Governo anterior, e que alcança esta cifra gigantesca de R$165 bilhões, ou seja, R$76 bilhões extrapolando os limites admitidos pela Constituição para a desvinculação das receitas da União. Dessa forma, é inconstitucional. É uma afronta à Constituição do País e, sobretudo, um desrespeito ao trabalhador brasileiro.

O Governo não pode manter-se nessa linha de conduta. O Governo tem de corrigir esses desvios, já que os trabalhadores brasileiros não podem se submeter a este tipo de exploração que parte exatamente da autoridade. Imaginar que um trabalhador possa ser explorado pelo empresário que o contrata é uma coisa; imaginar que os trabalhadores do País, todos eles, sejam explorados, indevidamente, pelo Governo que elegeram, é extrapolar os limites da paciência de cada um de nós.

Sr. Presidente, faço este apelo para que o Governo corrija seus rumos e restabeleça uma postura de maior respeito em relação aos trabalhadores do País.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/04/2005 - Página 8649