Discurso durante a 37ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Protesta contra medida do Ministério da Saúde de criar normas para selecionar o tipo de paciente que ocupará leito em Unidade de Terapia Intensiva -UTI. (como Líder)

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Protesta contra medida do Ministério da Saúde de criar normas para selecionar o tipo de paciente que ocupará leito em Unidade de Terapia Intensiva -UTI. (como Líder)
Aparteantes
Heloísa Helena, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 12/04/2005 - Página 8651
Assunto
Outros > SAUDE. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, INJUSTIÇA, MINISTERIO DA SAUDE (MS), CRIAÇÃO, NORMAS, SELEÇÃO, PACIENTE, OCUPAÇÃO, LEITO HOSPITALAR, UNIDADE, TRATAMENTO MEDICO, PROGRAMA INTENSIVO, FAVORECIMENTO, DOENTE, POSSIBILIDADE, RECUPERAÇÃO.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, VISITA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DITADURA, PAIS ESTRANGEIRO, CAMARÕES.
  • QUESTIONAMENTO, CONDUTA, GOVERNO FEDERAL, ESPECIFICAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), OMISSÃO, MORTE, CRIANÇA, INDIO, AUSENCIA, DEMISSÃO, MINISTRO, ATENDIMENTO, INTERESSE, POLITICA PARTIDARIA, ELEIÇÃO, JUSTIFICAÇÃO, INTERVENÇÃO, MUNICIPIO, RIO DE JANEIRO (RJ), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, seria risível se não fosse dramático, se não fosse uma absurdidade sem tamanho. Se não fosse desumano. Se não fosse a escuridão no fim do túnel.

Seria risível, desumano, dramático e cruel se isso não fosse mais uma do Governo petista.

Quase não dá para acreditar. E é verdadeiro. O Governo Lula, pelo Ministério da Saúde, está colocando uma porteira nas unidades de terapia intensiva da rede hospitalar pública. Só entra quem provar que não vai morrer. Em palavras menos duras, o Governo - está na imprensa - quer restringir UTI a doentes com chance de recuperação.

Dizem as notícias que o Ministério da Saúde vai estabelecer indicadores de prognósticos, a mais nova frase petista. Esses indicadores devem, como acrescentam as informações, basear-se em evidências científicas (ah, sim!).

Só falta agora vestir o Presidente com o jaleco de médico, ele que sempre se compraz em usar o boné da moda ou de confraternizar-se com ditadores. Ainda ontem, passou o dia ao lado do ditador, há vinte e três anos, da República de Camarões, Paul Biya.

E dizer que o Presidente chegou com aquele slogan do “Lula, paz e amor”. Isso, aliás, foi lembrado na entrevista do Presidente Fernando Henrique Cardoso ao Senador Cristovam Buarque para a revista Comunicação e Política, agora publicada.

Fernando Henrique lembra que no começo tudo era perfeito, até a frase. Só que, como completou, uma coisa é campanha e outra é governo. No Governo não basta esse slogan de “Paz e Amor”. Tem de ter competência e sensibilidade. Pior é que a frase nem existe. A paz foi jogada fora quando o então Ministro da Previdência Ricardo Berzoini colocou os idosos de mais de 90 anos naquelas insensatas filas de recadastramento.

Havia restado o amor.

E o amor acaba de ir para o espaço, com a porteira que o Ministério da Saúde está criando nas UTI’s.

Paz e amor só prevalecem onde há também sensibilidade e este não parece ser - e a meu ver não é - um Governo sensível.

Não é à toa que o mesmo e citado Senador Cristovam disse aqui, neste plenário, na quinta-feira, que “há algo de errado num país quando se diz que não há dinheiro para crianças.” Ele rebatia as críticas ao projeto da Senadora Heloísa Helena, que visa estabelecer a obrigatoriedade e a gratuidade da educação infantil de zero a seis anos.

O que há de errado? Falta sensibilidade. O Governo imaginou que a frase agora despedaçada poderia ser substituída pelos chavões tipo Duda Mendonça, como esse arranjo estropiado do “Brasil, um país de todos”.

Por certo que não é apenas o “Paz e Amor” que se esfacelou.

Afinal, haveria amor se o Governo Lula tivesse ao menos tentado pôr um fim à escandalosa morte de criancinhas indígenas no Mato Grosso do Sul. Só este ano morreram dezoito indiozinhos. De fome. E o Ministro estupidamente diz que isso está dentro da estatística. Ou seja, se morria isso - e ele mente, não morria isso - e continua morrendo isso, não há nenhum problema. O Ministro estaria estatisticamente correto. É uma versão cretina do politicamente correto.

De fome morreram os indiozinhos, num país em que o Governo petista começou com um escamoteado grito de guerra do tal “Fome Zero”.

E o que dizer da recente Medida Provisória nº 242, restringindo o auxílio doença?

E o que dizer do aparelhamento na Funasa e no Instituto Nacional do Câncer?

Sobre essa imoralidade da porteira nas UTIs, transcrevo neste pronunciamento uma frase do Presidente da Associação de Medicina Intensiva Brasileira, Dr. José Maria da Costa Orlando. Eis o que diz ele: “Os médicos não se sentem seguros em decidir quando parar de investir em um paciente sem cura”.

Sr. Presidente, com o fim do “Lula, paz e amor”, o Governo petista ‘insensibilizou geral’, para usar uma expressão que o povo entende. Isso e mais o apreço de Lula pelos ditadores da moda fazem lembrar os tempos dos campos de concentração do nazismo.

A cada dia, o carrasco selecionava cem, duzentos, para o sacrifício. Primeiro as criancinhas, depois os idosos, depois as mulheres e assim ia. Até que a guerra felizmente acabou e muitos puderam se salvar.

Peço, Sr Presidente, inserção nos Anais da matéria da Folha de S.Paulo de hoje, intitulada: “Governo quer decidir quem vai a UTI”. O subtítulo é: “Ministério da Saúde propõe normas para que só doente com chance real de melhora seja internado em unidade de terapia intensiva”.

Da mesma maneira, solicito a inclusão da matéria de dentro da edição da Folha de S.Paulo, que diz: “Governo Federal quer restringir UTI a doentes com chances de recuperação”. O subtítulo é: “Com déficit de leitos no País, Ministério da área decidiu criar normas para selecionar tipo de paciente”.

Peço também, Sr. Presidente, que conste dos Anais as seguintes matérias de O Estado de S. Paulo: “Ditador de Camarões faz festa nas ruas para receber Presidente. Militantes do Partido de Paul Biya ficaram mais de três horas à frente do aeroporto, tocando e dançando músicas africanas.”

A outra matéria do Estadão é: “Há 23 anos no poder, Paul Biya vai ficar mais sete.” Menos tempo do que o outro amigo do Presidente Lula, o ditador do Gabão, que está no poder há 37 anos. Este chegará a 30 anos no máximo.

Encerro, Sr. Presidente, dizendo que...

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Eu gostaria de um aparte, Senador.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Com muita alegria, Senadora Heloísa Helena.

Antes, porém, pergunto: que critérios esse Ministro, que estava demissionário por insuficiência técnica e por denúncia de corrupção envolvendo assessores bem perto dele, vai utilizar? Será o critério do aparelhamento da partidarização? Será preciso ter a carteira de filiação ao PT para ter direito de entrar numa UTI? Se o cidadão for filiado ao PSDB, por exemplo, Partido que irrita muito o Governo atual, irá direto para a câmara de gás ou, pura e simplesmente, ficará no corredor, fora da UTI?

Já se viu que a gestão do Presidente Lula é péssima. Agora, em vez de implantar soluções para a saúde, vêm os petistas novamente propondo alternativas que mais uma vez evidenciam a incompetência administrativa ao lado de uma brutal, de uma dose cavalar de insensibilidade e até de crueldade social.

Ouço V. Exª, Senadora.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Senador Arthur Virgílio - sei que o Senador Tião Viana também está querendo descer para fazer um aparte a V. Exª -, compartilho da preocupação de V. Exª. Quando o assunto é saúde, o Senador Tião Viana e eu acabamos discutindo; às vezes, temos consensos e, às vezes, temos divergências. Sobre a alteração promovida pelo Governo em relação à fila de espera para transplante, eu tinha uma preocupação gigantesca, pois ficava imaginando o caso do filho de um trabalhador rural e o filho de uma grande personalidade da política, alguém que tivesse a chamada carteirinha. Eu sempre tinha muita preocupação em relação a isso. Mas sei que é uma nova metodologia a ser incorporada e que talvez dê mais eficácia ao sistema, porque também não é justo que alguém seja o primeiro na fila para o transplante e uma outra pessoa que esteja atrás na fila e com problema muito mais grave acabe morrendo em razão da metodologia adotada. Sabe V. Exª, como todos na Casa, que meu filho foi atropelado aqui em Brasília e ficou com traumatismo craniano. Muitas pessoas diziam que ele iria ficar com grandes seqüelas ou que talvez não tivesse chance de se capacitar novamente. Quando meu filho leu a manchete do Correio Braziliense, a primeira atitude dele foi mandar uma mensagem para mim, perguntando “Mãe, se essa lei já tivesse sido implementada, eu ficaria na UTI ou eu ficaria à deriva?” É evidente que nós, lá em casa, não pensamos como filho de Senador ou de Senadora; pensamos como uma pessoa comum, como qualquer outra, porque essa porcaria aqui - desculpem-me a expressão, com todo o respeito que tenho à democracia - é absolutamente transitória nas nossas vidas. Imagine V. Exª o que pensam as pessoas? Porque, por mais que existam padrões no Brasil e no mundo para se destinar um paciente à UTI, o que é grave - desculpe-me estar me estendendo no aparte a V. Exª, Senador Arthur Virgílio, mas este é um tema muito caro para os pobres brasileiros - é que, às vezes, famílias inteiras perdem tudo o que têm e até o que não têm. Elas se endividam com qualquer agiota na esquina, para que o seu filho tenha um leito e vá para a UTI. Imagine o que pode acontecer agora, com essa nova metodologia que estabelece quem vai e quem não vai? Então, sempre tenho muita preocupação com esse sistema de seletividade. É preciso haver uma incompetência gigantesca do sistema de saúde, dos profissionais de saúde, se um profissional de saúde não consegue definir qual o paciente que deve ir para a UTI, assim se dá também com a família. É uma situação muito grave. Se o médico diz: “Ele está com falência de três órgãos, não tem mais jeito!”, o pai e a mãe, a família do ente querido querem que haja uma alternativa para o caso dele, uma possibilidade, a não ser que se trabalhe com eutanásia ou com outras formas de interrupção do sofrimento. Mas outras pessoas não; elas querem buscar até a última alternativa; querem a chance de ter de volta o seu ente querido. Já houve muitos casos - quer seja considerado um milagre, quer seja a pouca identificação cientifica da medicina - em que pessoas, sem nenhuma chance de sobrevivência, sobreviveram. Então, se há uma chance entre dez, entre cem ou entre mil, independentemente de qualquer coisa, a família tem o direito - e o profissional, a obrigação - de garantir todas as condições necessárias para que essa pessoa seja devolvida com vida à sua família. Desculpe-me o prolongamento do aparte, mas a área de saúde é um tema muito precioso para mim, porque sei que ela lida diretamente com a dor, com o sofrimento, com a estrutura não apenas anatomofisiológica, mas com a alma, com o espírito das pessoas. E temos que agir com muita delicadeza para combinar a eficácia do sistema com a sensibilidade que o setor público tem a obrigação de ter, porque o setor público é a única alternativa para os pobres - a única! No nosso caso, temos seguro de saúde, temos amigos médicos, amigos enfermeiros, conhecemos alguma forma de diminuir a fila e lá chegar. Porém, o setor público é a única possibilidade, a única referência para uma mãe, para um pai, para um idoso, para uma criança pobre do País. Ele não tem alternativa, só o setor público. Então, tem que se casar a eficácia do sistema com a sensibilidade necessária para se entender que o setor público é a única referência para milhões de pessoas pobres deste País, que têm que ser atendidas com toda a eficácia, sensibilidade e dignidade que merecem. Desculpe-me o prolongamento do aparte.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Foi precioso o que V. Exª reportou, Senadora Heloísa Helena.

Primeiro, pergunto se a sensibilidade ou o critério que vão ter serão parecidos com o critério utilizado para nomear aquelas pessoas que saíram pelas portas dos fundos, acusadas de mil coisas, naquele episódio da Operação Vampiro. Será que o critério é aquele ou vão agir com mais sabedoria?

Segundo, vivo em um momento particularmente difícil. V. Exª falou do seu filho, então vou falar de minha mãe. Ela está em uma UTI hoje; ontem ia ter alta. Ela tem quase 90 anos de idade e é paciente de Alzheimer. Está sendo muito bem atendida por um determinado plano de saúde - espero que ela não esteja sendo bem atendida porque é a minha mãe; espero que o mesmo atendimento correto esteja sendo extensivo aos demais associados do plano.

Somos quatro irmãos. Ontem, o médico se reuniu conosco, no Rio de Janeiro, para dizer que as resistências dela estavam menores, que, a cada dia, as crises tendem a se amiudar e que temos que começar a nos preparar para esse fato da vida. Por outro lado, ele nos chamou a atenção para um ponto - Senador Tião Viana, já lhe concedo um aparte - essencial, que deu a todos nós quatro uma sensação de felicidade. A minha mãe, com todas as dificuldades que tem atravessado, tem recebido um tratamento muito digno, que não é comum às pessoas de fora. Não é esse o tratamento da rede pública, não é esse o tratamento que, de um modo geral, as pessoas na idade dela recebem. Elas acabam indo para um nosocômio.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Já concluo, Sr. Presidente.

Pensei: “Puxa vida, está-se fazendo tudo que se pode”! Tenho um irmão que é muito inconformado com o fato que se aproxima - temos que começar a lidar com isso - e tenho uma irmã que, até por cuidar da minha mãe como cuida, está adoentada; está com uma porção de seqüelas das quais ela precisa cuidar. Ela tem um casamento, tem uma vida. Mas quando li isso nos jornais, pensei: “Meu Deus, se fosse a minha mãe e se ela estivesse internada em um hospital da rede pública, como é que eu faria para esse rapaz enquadrar a minha mãe, que não tem chance alguma - estou sendo muito franco, é muito duro para mim - de sobreviver?” Ela não é nenhuma Terry Schiavo porque passa a maior parte do tempo sem os aparelhos, mas está completamente absorta, completamente ausente. Então o critério seria a minha mãe ficar fora da UTI, porque quem sabe o Ministro dissesse assim: “Não. Tem que ser uma pessoa loira, 1m85 de altura e saudável”.

Enfim, essa atitude é perigosa, porque há um componente direitista, conservador, nazista nessa história de separar as pessoas por critérios injustos. “Já que não consigo dar conta da demanda da saúde pública, vou separar as pessoas por critérios tipo: esse aqui não vai viver!”

Quero lembrar que o Ministro já tinha dito lá em Caruaru: “Os idosos não couberam todos na CTI, mas idoso morre mesmo! - aliás, em trânsito, com bala perdida morre também quem não é idoso. Outra do Ministro: “Os indiozinhos morrem, mas estão morrendo na média. Sempre morreram!” Algo assim que não se parece com a figura que conheci na Câmara, que demonstrava sensibilidade, que só falava no social, o social pelo social. Mas que demonstra agora uma brutal ignorância pela questão econômica, uma brutal despreocupação com a questão econômica. Mas o Ministro Humberto Costa falava do social, do social e do social. Porém, ao chegar ao Poder, diz que as pessoas têm que mostrar que têm chance de sobreviver, senão deixa morrer; que os velhinhos já iam morrer mesmo; que os indiozinhos estão morrendo sempre. É de cortar o coração mesmo!

Senador Tião Viana, se eu puder permitir a V. Exª um aparte, assim farei.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senador Arthur Virgílio, estou acompanhando atentamente o que V. Exª diz. Ao acordar, também tenho o hábito de ler os principais jornais do País. Deparei-me também hoje com a manchete no jornal Folha de S.Paulo, que retratava exatamente o que V. Exª diz. O meu entendimento, como profissional da saúde, como alguém que tem procurado compreender as ações do Ministério foi racional, foi lógico. O Ministério queria dizer exatamente o contrário do que a matéria reportou, mas não soube dialogar politicamente, não soube informar à sociedade, e o resultado é uma tal interpretação jornalística. O meu entendimento é o de que o Ministério estava querendo ali estabelecer os critérios segundo os quais casos graves devem ir para a UTI, e não em casos menos graves. O entendimento veio exatamente no sentido oposto: que alguns casos graves não entrariam na UTI, o que é um percentual inexpressivo de entendimento de alguns médicos no mundo inteiro sobre a situação do doente que já tem um quadro completamente irreversível do ponto de vista clínico. Não estamos falando em eutanásia, não estamos falando em direito de se apropriar da evolução de saúde, da gravidade de um doente; estamos falando exatamente do que é colocar a Unidade de Terapia Intensiva a serviço daqueles que, de fato, precisam. Mas o Governo, por meio do Ministério da Saúde, errou em não saber se comunicar com a sociedade. Uma matéria dessa não pode ser transferida para a opinião pública de maneira precipitada, e o resultado é uma crítica do porte da que V. Exª faz. O cumprimento do consenso se dará até o mês de novembro, ouvidos todos os especialistas do Brasil. Tenho certeza da regra internacional sobre critérios de admissibilidade em Unidade de Terapia Intensiva, cujo propósito é, ao contrário, aceitar os pacientes em estado grave. No Brasil, algumas UTIs têm índice de êxito de tratamento superior a 85%. Como profissionais de saúde, temos de desconfiar muito dessas UTIs. As verdadeiras UTIs aceitam pacientes em estado muito grave. E tem de ser assim porque o doente que não está em estado muito grave pode ser tratado na enfermaria.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Não é justo que, para se livrar de um problema, médicos transfiram para a UTI doente que não está em estado tão grave e que podia ser bem cuidado, tomando o leito de um doente que realmente precisa. Infelizmente, houve uma mixórdia, e pagaremos o preço de mais um bombardeio de críticas por uma falta de comunicação adequada com a sociedade. Não consigo imaginar que esse raciocínio tenha sido o interpretado pelo Brasil inteiro ou, ao menos, pelos que tiveram acesso à Folha de S.Paulo, bem como o feito por V. Exª em solidariedade ao doente. Entendo o seu pronunciamento nesses termos. O Brasil gasta US$10 bilhões por ano com a saúde. Os americanos gastam US$10 bilhões por ano apenas com a doença chamada choque infeccioso que leva o doente à unidade de terapia intensiva. Infelizmente, o Brasil gasta US$200 per capita/ano com saúde. Os irmãos do Uruguai gastam US$600,00, e os irmãos da Argentina, US$450,00. Por isso, há falta de espaço nas unidades de terapia intensiva. É preciso discutirmos, a fundo, o problema da saúde, inclusive das unidades de terapia intensiva, sob pena de pagarmos o preço de escolher quem vai ou não a uma UTI, o que não pode ser o propósito do Governo nunca. Há regras internacionais sobre critério de internação e não de preterição de doentes. Jamais um doente pode ser rejeitado ao querer, junto com seu médico, ser internado numa UTI.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Sr. Presidente, encerro respondendo ao Senador Tião Viana.

V. Exª fala com muita clareza, só não tenho certeza de que era isso que o Governo queria dizer.

Li, e me pareceu muito claro, que o Governo tinha um tratamento não diria racista, porque não estava em jogo a raça, mas de discriminação à vida, ou seja: “Vamos sortear quem vai.”

A Ministra Zélia sorteou o valor que poderia ficar no bolso das pessoas naquele confisco da poupança. O sorteio foi na Academia de Tênis, conforme bem escreveu Fernando Sabino. Agora, também há um sorteio: “Aquele sobrevive, aquele não sobrevive.” Isso é muito duro.

O Ministro tem antecedentes péssimos, tem as confusões dos seus auxiliares naquela operação vampiro, fizeram aquela onda toda, era véspera de campanha eleitoral e cheguei a pensar numa maldade do Governo: “Vão virar para o Serra, vão tentar dizer que é o Serra.” Mas não era. Na verdade, os inquéritos mostraram que todas as pessoas envolvidas eram ligadas ao atual Governo e, no caso, ao Ministro.

Há um tal de Jabur, um lobista que estou convidando, assim como todos eles, para vir aqui. Devemos colocar toda essa gente para falar, mesmo. Chega de lobista calado, vamos colocá-los todos para falar o que têm a dizer. Mas é duro.

O Ministro, Sr. Presidente...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - ... Sr. Presidente, estou encerrando mesmo. Esse sistema é muito nevrálgico.

O Ministro tem os antecedentes: “Indiozinho está morrendo na média. Não estou indignado, só o estaria se estivesse fora da média, mas está na média. Um indiozinho? Qual é o problema? Em segundo lugar, os velhinhos já iam morrer mesmo, lá em Caruaru, então deixem os velhinho morrerem. Velhinhos costumam morrer mesmo, o duro é quando morrem jovens.” No fundo, ele quis dizer isso.

Vejo, com tristeza, um Governo que não demite Ministro por duas razões fundamentais. Primeiro, para manter essa farsa da intervenção federal no Rio de Janeiro, já que não fez intervenção em outros lugares - visa a atingir um candidato à Presidência da República. Agora, não pode tirar o Ministro senão desmoraliza toda aquela história em volta. Segundo, a própria candidatura do Ministro a Governador de Pernambuco. Se substituem o Ministro, eles perdem intensidade lá.

Vou ser sincero. Eu podia falar isso fazendo um charmezinho para um querido amigo, mas não. O Presidente Lula ganharia meu respeito se, tendo a chance que teve, já a tivesse aproveitado: se tivesse colocado um homem com a sensibilidade de V. Exª como Ministro da Saúde - e já lhe disse isso em todas as ocasiões. V. Exª tem a capacidade de explicar, tem o conhecimento técnico, a experiência de campo e seria um Ministro com trânsito e respeito no Congresso. Esse Ministro está aí por obra e graça da inércia de um Governo que é ruim para demitir e para nomear. Não sabe demitir quem nomeou e não sabe nomear quem nomeou, por isso o Brasil vai-se arrastando e a cada dia há um espetáculo, que agora beira o dantesco, o da crueldade em relação a doentes que precisam de Unidade de Tratamento Intensivo.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ARTHUR VIRGÍLIO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e §2º do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Governo quer decidir quem vai a UTI” (Folha de S.Paulo)

“Governo federal quer restringir UTI a doentes com chances de recuperação” (Folha Cotidiano)

“Ditador de Camarões faz festa nas ruas para receber Presidente” (O Estado de S. Paulo, 11/04/05)

“Há 23 anos no poder, Paul Biya vai ficar mais 7”(O Estado de S. Paulo, 11.04.05)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/04/2005 - Página 8651