Discurso durante a 121ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Sugestões para que a III Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, dê prioridade na análise dos desníveis regionais e dos meios de promover políticas públicas para investimentos nas regiões Nordeste e Norte do país.

Autor
Marco Maciel (PFL - Partido da Frente Liberal/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Sugestões para que a III Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, dê prioridade na análise dos desníveis regionais e dos meios de promover políticas públicas para investimentos nas regiões Nordeste e Norte do país.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 29/07/2005 - Página 25846
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • ANUNCIO, OCORRENCIA, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), CONFERENCIA NACIONAL, CIENCIA E TECNOLOGIA, MODERNIZAÇÃO, OBJETIVO, DEFINIÇÃO, PRIORIDADE, GOVERNO, POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, PARCERIA, ESPECIALISTA, COMENTARIO, HISTORIA, REALIZAÇÃO, EVOLUÇÃO, SETOR, BRASIL, ATUAÇÃO, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO E TECNOLOGICO (FNDCT).
  • NECESSIDADE, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, CIENCIA E TECNOLOGIA, IMPORTANCIA, PARTICIPAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, ATRAÇÃO, INICIATIVA PRIVADA, BENEFICIO, COMPETIÇÃO INDUSTRIAL, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, COMBATE, DESIGUALDADE REGIONAL, DESCENTRALIZAÇÃO, POLITICA DE DESENVOLVIMENTO, SOLICITAÇÃO, APOIO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT).
  • REGISTRO, DADOS, ANALFABETISMO, INFERIORIDADE, ESCOLARIDADE, REGIÃO NORDESTE, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, INDUÇÃO, DESENVOLVIMENTO, ESPECIFICAÇÃO, DEFESA, ESTUDO, ECOSSISTEMA, REGIÃO ARIDA.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, Srªs e Srs. Senadores, a história das nações, observou, certa feita Tancredo Neves, é a história de suas crises. Percebe-se, nestes tempos, o quanto é importante para o Brasil possuir instituições sólidas, capazes de produzir políticas de longo prazo que tenham horizonte e futuro.

            O tema que hoje suscito, Sr. Presidente, é essencial para que o futuro habite entre nós. Refiro-me ao tripé educação, ciência e tecnologia - eixo estruturador de um processo autêntico de desenvolvimento. Faço tais considerações por desejar registrar que, em outubro próximo, aqui em Brasília, entre os dias 24 e 27, realizar-se-á a III Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. Diferentemente dos encontros anuais da SBPC, como aquele encerrado há dias em Fortaleza, que congrega comunidades do setor, a Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação tem por objetivo estabelecer as prioridades governamentais, em parceria com os especialistas no assunto.

A primeira edição dessa conferência ocorreu em 1985, foi iniciativa do Deputado Renato Archer, então Ministro de Ciência e Tecnologia do Governo José Sarney, e da qual tive a oportunidade de participar na condição de Ministro da Educação. Pela vez primeira, Governo e representantes da comunidade científica e dos segmentos empresariais mais dinâmicos procuravam traçar diretrizes de política para o desenvolvimento científico e tecnológico da Nação. Em 2001, no Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Ministro Ronaldo Sardenberg retoma a iniciativa, realizando a II Conferência, que, além de produzir um balanço da situação da ciência e tecnologia no País, na virada do milênio, já que 2001 foi o primeiro ano do novo milênio e do novo século, produziu também um Livro Verde, que, ao reunir dados e fatos dispersos sobre a ciência e a tecnologia no Brasil, passou a servir de referencial para os centros de pesquisas, universidades, empresas, órgãos financiadores e outras instituições comprometidas de alguma maneira com o avanço tecnológico no País.

Ao longo dos tempos, esforços têm sido feitos no sentido de fortalecer a atividade científica e tecnológica no Brasil. Em 1969, a propósito, foi criado o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FNDCT, com o propósito de fomentar novas iniciativas no campo e proporcionar mais recursos para a pesquisa científica e tecnológica. Em 1990, após a Constituição de 1988 portanto, diante da possibilidade de extinção desse Fundo, em virtude de limite estabelecido no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988, tive a iniciativa de apresentar projeto de lei visando assegurar a sua continuidade.

Graças a essa intervenção, foi possível ver o projeto aprovado e transformada na Lei que permitiu fazer com que o FNDCT continuasse a viger, criando condições para alavancar novas iniciativas no campo estratégico da pesquisa, da ciência e da tecnologia. E isso ficou evidente por ocasião da Conferência do ano 2001, a que já me referi.

O FNDCT serviu para abrigar a decisão de se criarem os fundos setoriais, que cresceram em significação sobretudo depois do processo de privatização ocorrido no Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. A propósito, devo também mencionar, no início deste mês, a Câmara dos Deputados aprovou a regulamentação do FNDCT e a forma como os recursos dos fundos setoriais que estão agora sendo instituídos poderão ser aplicados.

Francis Bacon, no século XVII, afirmou: “a tecnologia é a dimensão social da ciência”. A sua notável percepção, Sr. Presidente, era provavelmente fruto da sensibilidade de uma pessoa que reúne em si a percepção do filósofo e a intuição do estadista, capaz de fazer ocorrer um século, antes da revolução industrial portanto, todo o alcance da tecnologia.

Hoje, esse entendimento é generalizado. Pois, como asseverou Norberto Bobbio, o mundo se dividirá entre os que sabem e os que não sabem. Isso quer dizer que é fundamental para qualquer país que queira ter alguma presença, algum protagonismo neste século, terá que investir em educação, ciência e tecnologia. Esse tripé - educação, saúde e tecnologia - é um saudável, consistente e auto-sustentado processo de desenvolvimento.

Não há nação que se destaque no mundo que não tenha transformado recursos em riqueza, para assentar seu progresso e bem-estar.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Marco Maciel,...

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - ...na sociedade brasileira, isto é, precisamos ter a consciência de que essa é uma questão estrutural sem a qual não há desenvolvimento sustentável.

Ouço V. Exª, nobre Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Marco Maciel, V. Exª, sem dúvida nenhuma, deveria ser lembrado para candidato à Presidência da República, pelas virtudes cristãs que possui e que tanto fazem falta. Mas V. Exª passou pelo Ministério de Educação e vou mostrar a V. Exª a gravidade, uma visão de futuro. Ontem, S. Exª o Presidente da República sancionou o salário dos magistrados. Um pico que vai a R$27 mil. Atentai bem, meditai, refleti, professora: quanto é hoje o salário inicial de um pesquisador das nossas universidades federais? Professor, ele está dizendo que é R$1 mil. Então, vamos para a realidade, Marco Maciel, a perspectiva deste País. A mocidade que tem a vida pela frente, os inteligentes, quem tiver um QI alto diz: eu vou fazer é Direito. Direito é que está rendendo, é que está garantindo. Jamais eu vou me dedicar à ciência e tecnologia, à pesquisa, à universidade federal, à Embrapa, pelos salários vis que estão aí. Então, essa é uma grande reflexão. E entendo que erramos. Esse negócio de salário está errado neste Senado. Eu fui prefeitinho no momento mais difícil, o da inflação, no Governo do Presidente Sarney. Todo mês tinha aumento de salário, porque estava em 80% a inflação, mas era para todas as classes. Atualmente, o que se faz é para alguns privilegiados e não há perspectiva nenhuma de subsistir o pesquisador no Brasil.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Muito obrigado, nobre Senador Mão Santa, pelo aparte.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Senador, vou dar mais cinco minutos para V. Exª.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Chamo a atenção para a questão da educação, ciência e tecnologia. Mas, Senador Mão Santa, malgrado tal constatação, os investimentos nessa área, no Brasil, ainda são extremamente reduzidos. As nações mais avançadas e as chamadas economias emergentes gastam em torno de 2,5% a 3% do seu PIB nessas atividades, enquanto o Brasil, infelizmente, vem investindo menos da metade dessa proporção, algo em torno de 1,5% ao ano. Certamente esses números refletem apenas um lado da questão. Há muitos aspectos de ordem qualitativa e menos visíveis que mereciam ser analisados.

Restrinjo-me a ponderar alguns pontos destacados na Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, realizada em 2001. Há imprescindibilidade de um maior envolvimento do Congresso Nacional na promoção e desenvolvimento da ciência e tecnologia no País. Aliás, eu me felicito pelo fato de, nos idos de 1983 e 1984, haver tomado a iniciativa de propor algo que ao final se converteu em resolução inscrita no Regimento Interno: a criação nesta Casa, como aconteceu na Câmara, de uma Comissão de Ciência e Tecnologia. Essa é uma matéria a respeito da qual o Congresso Nacional precisa ter uma inserção maior, tal a significação de uma proposta de desenvolvimento alicerçada em bases robustas, sólidas.

O Poder Legislativo, como formulador de regras, órgão de fiscalização e fórum de reflexão crítica dos nossos problemas, tem significativa tarefa a cumprir. Por mais importante que seja a presença do Poder Executivo e por mais significativa que seja, hoje, o interesse das empresas em investir, nada dispensa que o Congresso Nacional se insira mais nesse tema, para que possamos alocar mais recursos e gerar políticas públicas consistentes com a nossa realidade, voltadas, para a solução de problemas especificamente brasileiros.

De qualquer forma, se os investimentos públicos dependem de orçamento público, os investimentos privados em ciência e tecnologia dependem de muitas formas da ação do Estado. Não apenas no que tange à ordem jurídica e à base institucional proporcionadas pelos órgãos do governo. O que torna os investimentos em ciência e tecnologia uma questão pública é o fato de que o desenvolvimento científico e tecnológico não é uma dimensão que afeta apenas as condições de competitividade de indústrias e outras empresas da nação brasileira em relação a de outros países.

Os padrões tecnológicos afetam também as condições de vida vigentes no Brasil, nas suas mais diferentes facetas. Há áreas da atividade econômica nas quais os níveis de competitividade de nossas empresas nos mercados internacionais se destacam, assim como há segmentos da sociedade brasileira que desfrutam de invejáveis padrões sociais, mesmo se comparados a sociedades ricas. Todavia, claramente, os padrões de renda e emprego vigentes estão muito longe de serem considerados satisfatórios.

Ademais, a viabilidade de políticas de educação, saúde, geração de empregos e de promoção da eqüidade social dependem sob vários ângulos de como o conhecimento e a ciência podem ser aproveitados pela sociedade brasileira. Tanto a organização de sistemas de produção e de prestação de serviços, quanto a formação profissional daquele que vai atuar nessas organizações dependem da qualidade e das dimensões de uma adequada infra-estrutura de ciência e tecnologia.

O intercâmbio e a cooperação internacional nessa área, para ser eficaz, depende da existência de instituições capazes de transferir e de receber conhecimento. Dessa forma, nem mesmo a empresa privada tem condições de beneficiar-se da cooperação internacional, a menos que tenha também condições de processar conhecimento.

A rapidez dos avanços tecnológicos, que caracterizam este novo século, tem aumentado cada vez mais as distâncias sociais tanto em termos verticais - entre os segmentos de uma mesma sociedade - quanto entre as nações ricas e pobres, estas cada vez enfrentando maiores dificuldades em acompanhar essa evolução.

Outro aspecto que convém destacar diz respeito aos desequilíbrios regionais no Brasil, a exibir dados preocupantes e que podem ser atenuados por meio de políticas compensatórias. A Região Nordeste, em especial, exibe dados que precisam ser revertidos a fim de que o desenvolvimento da Nação possa ser menos assimétrico. Por exemplo, a média nacional de analfabetismo para pessoas com mais de 15 anos de idade é de 12,94%, enquanto a da Região Nordeste é de 26,6%.. No que se refere ao tempo médio de permanência na escola, o censo do IBGE feito no ano de 2000 mostra que a Região Nordeste apresenta a média mais baixa do País. Enquanto a Região Norte, a segunda mais baixa do País, era de 5,7 anos, o tempo médio de permanência na escola na Região Nordeste era de apenas, 4,2 anos. Esses dados assumem um caráter mais dramático se considerarmos que a média nacional era de 5,3 anos - ou seja, a Região Nordeste era a única abaixo da média nacional.

Como vêem, os dados aqui apresentados não têm nenhuma pretensão de ser novidade. Creio que, na verdade, podem ser incluídos entre aquelas afirmações qualificadas na tradição filosófica inglesa como “verdades evidentes por si mesmas

Os argumentos aqui referidos não são novos, assim como não é novo o fato de que o Brasil continua investindo pouco em ciência e tecnologia. Sejam esses gastos públicos ou privados: algo em torno de 1% do PIB. Por outro lado, também quero insistir, mais uma vez, que o desenvolvimento científico e tecnológico não pode ser reduzido apenas a percentuais do PIB, do orçamento público ou da participação do setor privado. É essencial que as políticas de investimento em ciência e tecnologia contemplem o viés da diversidade regional brasileira. É de pouca valia discutir porque ou como esses desequilíbrios se formaram, mas é fundamental saber que a redução desses desequilíbrios produz benefícios para todos e que, na atualidade, o domínio do conhecimento constitui a única base segura sobre a qual qualquer futuro mais viável pode ser construído.

Há no Brasil, pela expressão do seu território e sobretudo pela sua biodiversidade, problemas que são especificamente brasileiros. Entre muitos, citaria um relativo à minha região. A caatinga, por exemplo, é um bioma que só existe no Brasil. Se não formos capazes de entendê-la e estudá-la, certamente, nenhum outro país o fará por conhecer esse bioma. Então, se não formos nós, quem? Se não for agora, quando? Se não tivermos cuidado, quando viermos lançar luz sobre essa questão, a caatinga já estará extremamente comprometida.

            Mas, Sr. Presidente, gostaria também de dizer que os investimentos públicos são fundamentais nessa área, porque ainda não há no Brasil uma consciência empresarial no sentido de investir, cada vez mais, em ciência e tecnologia, mesmo porque as nossas empresas ainda não desfrutam de condições para investir nesse campo, que nem sempre produz resultados de curto prazo.

Desejo, também, Sr. Presidente, sem querer alongar-me em considerações, dizer que esse encontro que se realizará em Brasília, entre 24 e 27 de outubro, tem um temário que está sendo construído a partir de reuniões em diversas partes do País. Insisto na necessidade de pensarmos na formulação de políticas científicas e tecnológicas voltadas para cada região.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Em dois minutos daria para V. Exª terminar seu discurso, Senador?

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Pois não, Sr. Presidente.

            Percebo, Sr. Presidente, que os investimentos em ciência e tecnologia ainda estão muito concentrados no que eu chamaria o “Triângulo das Bermudas”, quer dizer, no eixo Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais. Certamente, precisamos fazer um processo de descentralização das políticas e de desconcentração dos investimentos, para que a demais regiões do País, sobretudo aquelas de menor nível de desenvolvimento relativo, de que são exemplos o Norte e o Nordeste, possam receber mais atenção.

Acredito que essa Conferência poderá oferecer ao País, não somente ao Poder Executivo, mas também ao Legislativo, condições de formulação de uma política adequada aos nossos tempos, que permitirá um processo coerente e consistente de desenvolvimento.

            Não gostaria, Sr. Presidente, de encerrar as minhas palavras, sem lembrar a opinião do jurista e filósofo Miguel Reale, ao dizer que “a riqueza das nações não resulta da soma de meios materiais de que dispõem, mas, acima de tudo, do cabedal de conhecimento acumulado e do número dos que sabem tirar dele o seu melhor proveito”.

            Sugiro, portanto, Sr. Presidente, ao Ministério da Ciência e Tecnologia que dê prioridade, na agenda da III Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, à análise dos desníveis regionais e dos meios de ampliar os investimentos de ciência e tecnologia nas áreas mais carentes, especialmente no Nordeste, como forma de reverter os baixos indicadores econômicos sociais apresentados em relação ao restante do País.

            Muito obrigado a V. Exª, Sr. Presidente Senador Romeu Tuma, por haver cedido o tempo para que pudesse manifestar-me.

 

            O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Cumprimento V. Exª pelo discurso. Sei da importância dos pronunciamentos de V. Exª.

O SR. MARCO MACIEL (PFL - PE) - Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/07/2005 - Página 25846