Discurso durante a 165ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apresenta solidariedade ao Senador João Capiberibe e sua esposa Raquel Capiberibe e protesta contra decisão do STF.

Autor
Ideli Salvatti (PT - Partido dos Trabalhadores/SC)
Nome completo: Ideli Salvatti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA.:
  • Apresenta solidariedade ao Senador João Capiberibe e sua esposa Raquel Capiberibe e protesta contra decisão do STF.
Publicação
Publicação no DSF de 24/09/2005 - Página 31957
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), MESADA.
Indexação
  • PROTESTO, DECISÃO, JUDICIARIO, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, JOÃO CAPIBERIBE, SENADOR, CONJUGE, DEPUTADO FEDERAL.
  • REGISTRO, DEPOIMENTO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, PAGAMENTO, MESADA, CONGRESSISTA, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), BANQUEIRO, PARTICIPAÇÃO, CORRUPÇÃO, CRIME, DENUNCIA, VINCULAÇÃO, GOVERNO, FERNANDO COLLOR DE MELLO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, CRITICA, CONDUTA, SENADOR, TENTATIVA, DESVIO, ATENÇÃO, INVESTIGAÇÃO.
  • ESCLARECIMENTOS, ENCONTRO, ORADOR, EMPRESARIO, RECEBIMENTO, ATA, LICITAÇÃO, SOLICITAÇÃO, ANEXAÇÃO, DISCURSO, SUSPEIÇÃO, ILICITUDE, AQUISIÇÃO, EQUIPAMENTOS, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), COMENTARIO, INSUFICIENCIA, PROVA, ACUSAÇÃO, CORRUPÇÃO, GOVERNO, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB).
  • LEITURA, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, CONGRESSISTA, PRESERVAÇÃO, FONTE, INFORMAÇÕES, QUESTIONAMENTO, CIRCULAÇÃO, INTERNET, MATERIA, DETALHAMENTO, CONTEUDO, DOCUMENTO, RECEBIMENTO, ORADOR.
  • CRITICA, FALTA, SEGURANÇA, EXERCICIO, MANDATO PARLAMENTAR, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, SUSPEIÇÃO, EMPRESARIO, TENTATIVA, COMPROMETIMENTO, ORADOR.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, quero, de público, apresentar a minha mais irrestrita solidariedade ao Senador João Capiberibe e à sua esposa. Tivemos muito trabalho, tentando preservar o digno, o legítimo mandato de S. Exªs. A decisão da Justiça nos causa profundo constrangimento. Com todo o respeito que podemos e devemos ter à Justiça brasileira, o ato de cassação desse Senador e dessa Deputada é injusto. Já tive oportunidade de dizer isso inúmeras vezes, inclusive, desta tribuna.

O que me traz à tribuna, mais uma vez, esta semana, é o meu senso de responsabilidade. A crise exige de todos nós responsabilidade ainda maior por nossos atos e palavras - principalmente de mim, pois me encontro na condição de Vice-Líder do Governo e de membro da CPMI dos Correios e da CPI dos Bingos.

Vivemos um clima de denuncismo, de disputa, inclusive de quem tem o dossiê mais bombástico, de quem tem a notícia ou a manchete que provoca o maior frisson. São centenas e centenas de denúncias que nós, que estamos participando das CPIs, recebemos toda semana. Todos os dias, nós as recebemos e analisamos; e temos a obrigação de trabalhar com muita responsabilidade, para encaminhar as que tiverem efetivamente consistência.

A Constituição nos dá o direito, no art. 53, § 6º, de preservar as fontes. Lerei o referido artigo, para que não paire nenhuma dúvida:

§ 6° Os Deputados e Senadores não serão obrigados a testemunhar sobre informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem sobre as pessoas que lhes confiaram ou deles receberam informações.

O direito de preservação da fonte é constitucional para nós, Parlamentares. Ele existe também para os jornalistas. Por isso, por mais afrontosa, inverídica ou infundada que seja qualquer matéria veiculada, nunca se pergunta a fonte; há que se respeitar o direito de preservação das fontes.

Esta semana foi muito agitada. Houve a renúncia do Presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, a disputa pela sucessão na Câmara, depoimentos extremamente delicados nas CPIs, como o de Toninho da Barcelona. Tive a oportunidade de vir à tribuna e entregar o documento lavrado, com escritura pública, que comprova que o Dr. Ricardo Sayeg, advogado do Toninho da Barcelona, tentou seduzir e cooptar outros condenados nos processos do Toninho, para que confirmassem inúmeras declarações, na lógica da mentira premiada. Ou seja: pode mentir, pode falar, pode dizer, pode exagerar, porque o objetivo é, fazendo o ataque ao Governo e ao PT, conseguir a tal delação premiada, que corre grande risco de se transformar, em alguns casos, em mentira premiada.

Houve o depoimento do Sr. Daniel Dantas nas duas CPMIs, na CPMI dos Correios e na CPMI da Compra de Votos.

A jornalista Miriam Leitão fez talvez o melhor retrato da importância e do significado daquele depoimento. Ela disse textualmente que, em cada dez das maiores maracutaias deste País, no último período, o Sr. Daniel Dantas está metido nas dez. São dezenas de processos no Brasil, nos Estados Unidos, na Inglaterra.

Quando quer ser contundente, a Deputada Juíza Denise Frossard diz: “Há meio Código Penal contra V. Sª”. Creio que há um Código Penal e meio contra o Sr. Daniel Dantas.

Infelizmente, agressões, bate-bocas, destemperos verbais e machismos lamentáveis ocorridos naquela reunião - deixo registrado meu repúdio a todos os exageros cometidos por quem quer que seja naquele episódio - acabaram desviando a atenção do depoimento do Sr. Daniel Dantas, do centro da investigação, quando finalmente se estava tentando chegar aos corruptores, aos grandes interesses econômicos e financeiros que estão por trás dos grandes crimes e da sustentação da corrupção.

Tivemos a oportunidade de fazer um relato, no depoimento do Sr. Daniel Dantas, dos seus vínculos, das suas tentativas, das suas artimanhas, para, há mais de 20 anos, sempre estar próximo do poder, usufruindo das benesses do poder e dos poderosos. Isso ocorre desde a época em que ele, muito novinho, já era um dos principais assessores, na Bahia, do Sr. Antonio Carlos Magalhães. E também houve de sua parte vinculação e intermediação no Governo Collor. Ele foi um dos principais sacadores quando houve o seqüestro da poupança no Brasil. Ele conseguiu sacar, exatamente pela proximidade que tinha com o poder.

Relatamos ainda toda a sua ligação com os processos de privatização, as fitas em que estava gravada a voz do Presidente Fernando Henrique Cardoso, autorizando usar o seu nome para intervir a favor do consórcio que o Sr. Daniel Dantas capitaneava. Toda a busca de proximidade, as intermediações que estamos agora investigando com o Sr. Marcos Valério, a tentativa de aproximar-se para a grande disputa comercial que está em jogo hoje entre os fundos de pensão, o Banco Opportunity e o Citibank, que envolve mais de R$16 bilhões, tudo isso estamos investigando.

Portanto, seria fundamental que o depoimento do Sr. Daniel Dantas fosse focado na busca dos corruptores. Infelizmente - volto a dizer -, os incidentes desviaram a atenção.

Ontem, exatamente um dia depois do depoimento do Sr. Daniel Dantas, ocorreram alguns episódios envolvendo as minhas atividades parlamentares. O que ocorreu, no meu ponto de vista, é grave, dentro do contexto aquecido politicamente desta semana. Houve a veiculação on-line de uma reunião em São Paulo e do recebimento de documentos que provariam uma falcatrua de US$100 milhões ocorrida em 1999 na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, tendo como título “Pegaram os Tucanos”. Isso exigiu, de minha parte, um desmentido em plenário. E a minha presença em plenário já representava um desmentido. Obviamente, eu não estava em São Paulo.

Vou reproduzir o que disse, para que não paire qualquer dúvida. E o Senador Alvaro Dias é testemunha, porque estava na tribuna e me permitiu falar antes dele para fazer o registro. Ontem, minhas palavras na tribuna foram: “Estou fazendo questão de desmentir, ao vivo e a cores. Gostaria, realmente, de ter recebido o dossiê. Não vou ser falsa a ponto de dizer que não gostaria de ter um dossiê do porte como está sendo veiculado. Ainda não recebi nenhum dossiê que pegue os tucanos da forma como está sendo veiculada. Se alguém tiver, pode encaminhar. Não vou ficar infeliz por conta disso”.

No entanto, recebi, sim, um empresário em meu gabinete. Esse empresário realmente me encaminhou documentos, que não estão aqui comigo - vou pedir para que depois sejam registrados na ata desta sessão. É uma ata da Licitação 16/99 dos Correios para compra de equipamentos, em que aparecem as quatro empresas habilitadas, entre elas a do empresário, as duas que ganharam e quais foram os lotes. Somando-se os três lotes, o valor se aproxima de R$90 milhões. O empresário me apresentou ainda dois contratos de gaveta, garantindo que as duas empresas que ganharam iriam comprar os equipamentos dele. Recebi ainda dois documentos que, do meu ponto de vista, não têm ligação com a tal da licitação. Esses foram os documentos que o empresário me entregou.

Pode haver falcatrua? Pode haver licitação dirigida? Pode haver superfaturamento? Quero dizer aqui que pode. No entanto, os documentos entregues não são provas suficientes e cabais. Há necessidade de investigar, há necessidade de aprofundar essa investigação, até porque um contrato de gaveta que assegure ao empresário que foi desqualificado não entrar com recurso e garantir que serão comprados dele os equipamentos pelas duas vencedoras é forte indício, mas não é prova. É forte indício apenas, mas não é prova.

Por isso, eu os recebi reservadamente, não divulguei, preservei o encontro, o empresário, a reunião, porque a Constituição me garante este direito: de me preservar, de preservar as minhas fontes. E a minha responsabilidade me exige que eu não fale antes de ter provas, que eu não fale, que eu não insinue, que eu não estabeleça ilações antes de fazer a comprovação.

Eu não conhecia o empresário, não sabia o que ele estava me trazendo, não tinha condições de avaliar, na hora, se aqueles documentos apresentados e entregues eram indícios suficientes para vir a público e dizer alguma coisa, como muitas vezes procedem vários parlamentares que compõem as CPMIs. Estou convencida de que, até qualquer prova em contrário, agi com a responsabilidade necessária ao momento político que estamos vivenciando.

Mas a gravidade do que aconteceu, Senador Alvaro Dias, está no seguinte: alguém entra no meu gabinete, em reunião reservada - que eu não divulguei, ninguém divulgou -, e, no mesmo horário, on-line, na mesma hora, no mesmo minuto, o assunto já está circulando. Posteriormente, são divulgados detalhes, encadeamentos, fatos, palavras, reações, em minúcias tão impressionantes, que nem script de filme registraria. Nem alguém que estivesse dirigindo uma filmagem teria o cuidado de detalhar tantas minúcias. E aí é que está a minha estarrecida indignação: por que tantos detalhes, tantas minúcias? Ou foi uma armação, ou foi um vazamento do próprio empresário, ou é uma arapongagem ou é a mistura de tudo isso, ocorrido, nada mais, nada menos do que no gabinete de uma Senadora da República.

E é por isso que quero tratar deste assunto com o Presidente do Senado, Senador Renan Calheiros, aqui, no plenário, sobre as condições de segurança para o pleno exercício do mandato de cada um de nós. Então, semana que vem, quero trazer este assunto de novo aqui ao plenário, com a presença do Senador Renan Calheiros, porque considero o assunto gravíssimo.

Já tomei algumas providências. E quero dizer que considero o que ocorreu comigo fundamental para todos nós. Portanto, não estou trazendo para cá...

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Se a Presidente da sessão permitir, eu teria ainda uns dois ou três minutinhos, se for possível.

A SRª PRESIDENTE (Heloísa Helena. P-SOL - AL) - Já concedi 16 minutos a V. Exª. Pode ter mais o tempo que achar necessário, mas só para deixar registrado.

A SRª IDELI SALVATTI (Bloco/PT - SC) - Agradeço. Vou terminar logo.

Quero aqui deixar registrado que vou trazer o assunto novamente para que possamos tratá-lo com a gravidade que ele tem, porque considerei isso uma afronta ao exercício do mandato de uma Senadora da República, uma afronta ao Senado Federal e isto tem que ser tratado por todos nós.

Só que esse episódio não aconteceu numa semana qualquer, num momento político qualquer nem num dia qualquer; aconteceu exatamente no dia seguinte ao enfrentamento político em que duas CPIs puseram, finalmente, o Sr. Daniel Dantas no banco para depor e prestar esclarecimentos. O Sr. Daniel Dantas, o oportunista-mor, veio, inclusive na condição de réu confesso; foi convidado, mas veio na condição de réu confesso porque pediu habeas corpus para não correr risco nem de ser preso e de poder calar-se para não se auto-incriminar.

E foi exatamente no dia seguinte ao fato de que eu iniciei a minha inquirição ao Sr. Daniel Dantas lendo um trecho da carta aberta do Ministro Edson Vidigal, Presidente do Superior Tribunal de Justiça. E quero aqui terminar relendo o mesmo trecho com o qual comecei a minha inquirição ao Sr. Daniel Dantas:

Tão logo, há alguns meses, decidindo em favor dos fundos de pensão, cassei uma liminar cujos efeitos incomodaram, e ainda incomodam, interesses poderosíssimos no setor de telecomunicações, fui avisado de que ações de trabalho sujo se desencadeariam contra mim. Seria ‘grampeado’, seguido, filmado. Meus amigos, familiares, auxiliares e pessoas mais próximas passariam a estar, eles também, sob intensa vigilância.

Essas são as palavras da carta aberta do Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Edson Vidigal, referindo-se, indiscutivelmente, à liminar que cassou os interesses do Sr. Daniel Dantas, do Banco Opportunity.

Isso para mim não é mera coincidência!

Muito obrigada, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

 

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DOCUMENTOS A QUE SE REFERE A SRª SENADORA IDELI SALVATTI EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

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Matérias referidas:

“Ata da Reunião de Licitação - Concorrência Internacional nº 016/99 - CEL/AC;

“Minutes of meeting” - Alstom”;

“Minuta de Reunião - Siemens”;

“Brockveld”;

“Notas taquigráficas 22/09/2005”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/09/2005 - Página 31957