Discurso durante a 178ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexões sobre o referendo do desarmamento, no próximo dia 23 de outubro.

Autor
Magno Malta (PL - Partido Liberal/ES)
Nome completo: Magno Pereira Malta
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. POLITICA CULTURAL. DROGA.:
  • Reflexões sobre o referendo do desarmamento, no próximo dia 23 de outubro.
Publicação
Publicação no DSF de 12/10/2005 - Página 34925
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. POLITICA CULTURAL. DROGA.
Indexação
  • ANALISE, REFERENDO, DESARMAMENTO, EXCESSO, GASTOS PUBLICOS, DESNECESSIDADE, CONSULTA, POPULAÇÃO, MOTIVO, REPRESENTAÇÃO, DEMOCRACIA, CRITICA, CAMPANHA, MEIOS DE COMUNICAÇÃO.
  • DEFESA, DESARMAMENTO, DEPOIMENTO, RISCOS, POPULAÇÃO, ARMA DE FOGO.
  • NECESSIDADE, MOBILIZAÇÃO, COBRANÇA, ESTADO, CUMPRIMENTO, GARANTIA, SEGURANÇA PUBLICA, COMBATE, CRIME.
  • ELOGIO, FILME, BIOGRAFIA, CANTOR, ESTADO DE GOIAS (GO), DIVULGAÇÃO, CULTURA, SITUAÇÃO, POPULAÇÃO CARENTE.
  • DEFESA, APLICAÇÃO, LEI FEDERAL, OBRIGATORIEDADE, ESTUDO, DROGA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, PREVENÇÃO, PROBLEMA.

O SR. MAGNO MALTA (Bloco/PL - ES) - Sr. Presidente, falo para o público de casa e para as pessoas que me ouvem. Depois de um mês fora desta Casa, volto à tribuna quando a Nação está, mais uma vez, com um abacaxi na mão para decidir, em plebiscito, pelo “sim” ou pelo “não” na questão do desarmamento.

Nesta semana, fui questionado pela minha filha mais nova: “Tive informações, meu pai, de que o que se vai gastar com esse plebiscito é muito maior do que o que se gastou com as eleições há dois anos”. Disse ela: “Eu estou indignada, porque votei, dei meu voto a um político em que acreditei, para que ele decidisse por mim”. Quando se vota, dá-se uma procuração. Dois anos depois, nós somos chamados para decidir um assunto tão complexo como esse.

Na propaganda colocada na televisão, cada qual usa e manobra as imagens como quer. Tenho visto pessoas usarem a exceção para tentar fazer a regra. A regra é a regra. A exceção é a exceção. A exceção é pontual. Pega-se a exceção, discute-se a exceção, e, se necessário, pode-se enquadrá-la dentro da regra.

Sr. Presidente, presidi a CPI do Narcotráfico. Não tenho medo de dizer que presidi a maior CPI deste País, a que mapeou o crime organizado e que revelou o Estado bandido, criminoso, existente no Estado de direito. A violência que estamos vivendo é uma exceção, Senador Mão Santa, do ponto de vista da segurança pública. Não é deixando a população armada que vamos resolver essa questão.

Dizem: “Vamos tirar as armas do cidadão de bem e deixar o bandido armado”. Em primeiro lugar, bandido não compra arma. A arma do bandido é tomada do cidadão de bem, é proveniente de contrabando ou de assalto. Perdeu-se tanto o limite, que bandidos invadem o paiol da Aeronáutica e roubam granadas! Invadem o paiol do Exército! Passaram dos limites! Invadem delegacias, zombam dos delegados, algemam-nos, tomam as armas, soltam presos, arrombam as portas com granadas! Estamos vivendo acima do limite. O estado é de exceção.

Eu gostaria de ver, na televisão, cidadãos de bem dando depoimentos de que suas armas salvaram suas vidas.

Existem alguns fatores que beneficiam o bandido, e o fator surpresa é o mais forte. Quando planeja invadir uma empresa, uma casa, uma residência, o sujeito o faz mesmo, com a cobertura de um carro na rua, para avisar se a polícia virá ou não - há casos em que a cobertura é dada pelo policial-bandido. O sujeito, portando armamento pesado, entra com outros três ou quatro na casa de uma família que está dormindo, que está à mesa ou que está assistindo à televisão. A família fica atônita. Só o fato de o bandido perguntar se a família tem arma em casa causa medo, pois se pode imaginar que o bandido descobrirá onde a arma está. O medo pode provocar um infarto em alguém e matá-lo no mesmo momento, sem que tenha sido disparado um tiro.

A possibilidade de morrer é muito maior para quem tem arma em casa. Estou falando daquela arma que o filho pega no guarda-roupa ou na gaveta do pai e leva para a escola e com a qual atira no colega. Estou falando da arma do crime passional, em que o marido assassina a mulher por causa de uma briga em casa ou em que a mulher atira no marido, seja lá o que for.

Lembro-me, Senador Raupp - eu era menino pobre, filho de Dona Dadá, uma faxineira do interior da Bahia -, de que, na rua em que eu morava, havia uma família muito rica, fazendeira. Lembro-me de que eles tinham uma grande fazenda na Bahia e outra em Goiás e de que o pai viajava muito. Eu tinha dois amigos: um se chamava Jorginho, e o outro, Mino. Mino pegou a arma do pai. O irmão havia acordado, e ele, brincando, disse-lhe: “Vou-te matar!”. O irmão, quando viu a arma, gritou para a mãe: “Olha, ele está brincando com a arma do papai aqui!”. O menino se apavorou, a arma disparou, e, sem que ele tivesse mirado, o tiro pegou no coração do irmão. Sabe o que aconteceu com aquele irmão que atirou? Ficou louco. Ficou louco. Ficou louco. Ficou louco.

Lembro-me de dois amigos adultos: um se chamava Tonho Santana, e o outro, Melosa, um morenão forte, cidadão de cor, meu grande amigo. Ele jogava futebol pela seleção de Itapetinga, onde fui criado. Os dois, na flor da idade, mostravam uma arma um ao outro, quando ela disparou na mão de Melosa, e o tiro atingiu Tonho Santana, que caiu na rua. Ele morreu pedindo para o pessoal: “Não façam nada com ele, ele é meu amigo! Foi um acidente! Foi um acidente! Ele é meu amigo! Pelo amor de Deus!”. Ele foi-se esvaindo, esvaindo-se, e foi embora.

Estou falando desse tipo de coisa, do cidadão que, por não olhar no retrovisor - isso acontece comigo, com qualquer pessoa -, dá um esbarrão no carro do outro ou até o empurra para o lado um pouquinho. O outro fica nervoso, fala palavrão, faz gesto obsceno, e ele, que está com a esposa do lado, grita e fala palavrão também, está armado, tira a arma e atira. Ele mata e, depois, fica arrependido numa penitenciária, com os filhos vivendo mal e a esposa passando constrangimento para visitá-lo na penitenciária.

É desse tipo de arma que estou falando. Não estou falando de AR-15, de granada, de arma de grosso calibre, que entra por contrabando, por assalto.

Quem deve tratar de bandido é a Polícia. Essa é outra discussão. Se o Estado não faz nada, vai ter de fazer. A sociedade precisa-se mobilizar para obrigar o Estado a agir. A sociedade não pode ficar, de longe, dizendo: “Ah, o Estado não faz”.

Quero saber quem fez justiça e a quem uma “arminha” defendeu.

Dizem: “O cidadão do campo não tem arma, vai ficar sem ela e, até que a Polícia chegue, já morreu”. Esses dramas são a exceção, e o Estatuto do Desarmamento diz que o cidadão, se acreditar que precisa da arma, deve procurar a Justiça, que avaliará se há ou não necessidade dela.

Por exemplo, amanhã, pode-se entender que os policiais aposentados precisam andar armados. Nesse caso, faz-se um movimento, discute-se e pode-se concluir: “É verdade, precisam andar armados”. Isso é pontual. Lei não é eterna, pode ser mudada, e o Estatuto do Desarmamento diz isso.

Estão fazendo uma propaganda enganosa. A propaganda do “não” é muito mais bem elaborada que a do “sim”.

Eu disse ao Senador Renan Calheiros que colocar artistas para falar - e digo isto com todo o respeito que por eles tenho - não diz nada a ninguém, porque os artistas moram em condomínio, com tudo fechado, com câmera, com segurança. Eles estão meio sem autoridade para falar do negócio.

Deveriam colocar uma mãe de família com a foto do filho que morreu assassinado na porta da escola, aos 14, 15 anos, pelo colega, que o matou com uma arma calibre 38, que estava dentro de casa. É disto que estamos falando, Senador Mão Santa, desse tipo de crime praticado especialmente nos grandes centros urbanos, nas periferias, com a arma pequena comprada por um cidadão bem-intencionado, que depois a perde para um bandido.

O meu empresário, Senador Valdir Raupp, na semana passada, dizia, ao me levar ao aeroporto: “Vou votar Não”. Eu disse: “Muito bem! Não esqueço uma frase do meu tio, Pastor Manoel Nascimento, dirigida a mim, quando eu tinha 17 anos de idade: ‘Meu filho, o homem é aquilo que ele decide ser’”.

O SR. PRESIDENTE (Valdir Raupp. PMDB - RO) - Prorrogo a sessão por mais 20 minutos, a fim de que V. Exª conclua o seu pronunciamento, a Senadora Heloísa Helena profira seu discurso e eu também fale um pouco ao final da sessão.

O SR. MAGNO MALTA (Bloco/PL - ES) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Eu disse a ele: “No mês passado, seu carro foi roubado na porta de sua casa, não foi?” Ele estava chegando com o filho e, quando desceu do carro, foi rendido e implorou ao bandido: “Não, pelo amor de Deus! Deixe meu filho fora. Minha criança só tem nove anos”. O sujeito ordenou-lhe: “Não, leva tudo, leva tudo! Entra, vagabundo. Entra, vagabundo”. Ele, então, foi obrigado a entrar no carro. O homem perguntou-lhe: “Tem arma aí?” “Não, não, não”. “Tem dinheiro?” “Não”. Ele me disse que, bem devagar, pegou o dinheiro que estava no bolso e o colocou nas costas. E o cara advertiu-o: “Se você estiver com dinheiro na hora em que eu for revistar você, eu mato você”. E ele começou a morrer ali. Eu disse a ele: “Se você estivesse armado, por amor a seu filho, quando ele o abordou e você sentiu que era um assalto, provavelmente, teria trocado tiros com ele e tanto você quanto seu filho teriam morrido. Mas, se você tremesse na base, porque normalmente o cara se arvora, dizendo que tem uma arma na cintura, mas, quando se aproxima o bandido com uma arma de baixo calibre, dá uma alegria nas pernas e ele tem medo até de dizer que está armado. E se você estivesse armado?” Ele falou que o bandido o teria matado. “Então, vote Não. Vote Não!”

É disso que estamos falando. Precisamos fazer uma discussão, o Estado precisa cumprir o papel que é dele. Claro que temos que fazer. É o Estado que tem de cumprir mesmo este papel: desarmar bandido.

Acho que essa PPP tinha de servir, Senador Raupp, para trazer as grandes empresas para construir presídio de segurança máxima, onde o sujeito teria de trabalhar para se manter, para ressarcir a família da vítima, pagar o que o Estado gasta com ele, mas um presídio onde o cara tivesse a possibilidade de estudar, de pagar a pena com dignidade. Mas essa é uma outra discussão a ser feita.

Quero encerrar, porque o meu tempo já está se encerrando e ainda há dois oradores, Sr. Presidente, dizendo que por duas vezes assisti ao filme “Os Dois Filhos de Francisco”. Sou amigo particular de Zezé Di Camargo e do irmão. Tive o prazer de tê-los em meu último CD. Ter uma figura como Zezé Di Camargo num CD gravado ao vivo, cantando uma música maravilhosa composta por Samuel e Daniel, dois meninos aqui de Goiânia, que nós gravamos juntos. Somos grandes amigos.

“Os Dois Filhos de Francisco” é a história de milhões de brasileiros, anônimos que vão ao cinema e choram, porque é como se estivessem vendo a própria história. E muitas lições existem ali, sobre as quais quero falar na próxima semana: a de um pai - hoje em que se comemora o Dia do Professor -, analfabeto funcional, que sentiu a necessidade de os filhos aprenderem a ler e a escrever. Foi atrás do prefeito e disse que ouviu no rádio que a lei diz que o prefeito tem que dar a escola. E o prefeito foi lá e fez a escola na sala da casa dele, na roça, para os filhos estudarem. As carteiras, ele mesmo fez, para que Zezé e os irmãos aprendessem a ler e a escrever.

A melhor homenagem que se pode fazer hoje, no Dia do Professor - e esse filme, que foi indicado ao Oscar, é a história de cada um de nós. Sou filho de uma faxineira, é a minha própria história -, é lembrar o pai do Zezé, quando foi procurar a autoridade máxima do seu Município, o prefeito, para exigir dele escola para os filhos.

A Lei nº 6.368 tem mais de 35 anos, Senador Valdir Raupp, institui o estudo sobre drogas nas escolas brasileiras - a historicidade, a moralidade e os malefícios físicos, psicológicos, morais e familiares daquilo que a droga faz - e até hoje não foi disciplinada. É a informação que forma o homem; a falta de informação produz deformidade. Por isso, temos uma sociedade deformada, por falta de informação. Chamo a atenção do Poder Público, do Governo Lula, do Ministro da Educação, pois vivemos um problema avassalador de drogas nas escolas.

Se os meninos fossem informados nas escolas há 35 anos - hoje, eles já são pais e alguns até avós -, quem sabe teríamos uma geração diferente por conta da informação. Então, no Dia do Professor, uso a figura de Francisco, homenageando-o, e daquela que me ensinou a escrever meu nome e as primeiras letras, e chamo a atenção do Governo: as famílias choram por conta do flagelo das drogas. É preciso rapidamente, Senadora Heloísa Helena, instituir a Lei nº 6.368, que estabelece estudo sobre drogas, Senador Mão Santa, para formar o indivíduo e não termos, daqui a mais 15 anos, uma sociedade deformada como temos hoje, do ponto de vista do uso e do consumo das drogas.

Muito obrigado, Sr. Presidente, pela benevolência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/10/2005 - Página 34925