Discurso durante a 205ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre programas de transferências de renda. Saudações aos participantes da marcha em homenagem ao "Dia Nacional da Consciência Negra", ocorrida em Brasília.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA SOCIAL. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Considerações sobre programas de transferências de renda. Saudações aos participantes da marcha em homenagem ao "Dia Nacional da Consciência Negra", ocorrida em Brasília.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2005 - Página 40611
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA SOCIAL. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, DIALOGO, ORADOR, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), LIBERDADE, TRANSITO, CIDADÃO, AMERICA, POSSIBILIDADE, RENDA MINIMA, POPULAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, IRAQUE, OBJETIVO, PAZ.
  • REGISTRO, SUGESTÃO, ORADOR, COORDENADOR, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), PAIS ESTRANGEIRO, IRAQUE, IMPLANTAÇÃO, RENDA MINIMA, POPULAÇÃO, SEMELHANÇA, REGIÃO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
  • ESCLARECIMENTOS, IMPLANTAÇÃO, RENDA MINIMA, CIDADÃO, REGIÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PRODUÇÃO, PETROLEO, DEFESA, POSSIBILIDADE, DIFUSÃO, PROJETO, MUNDO.
  • ANUNCIO, REALIZAÇÃO, PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATOLICA (PUC), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), SEMINARIO, AMBITO NACIONAL, ANALISE, PROGRAMA, TRANSFERENCIA, RENDA, POPULAÇÃO.
  • ANUNCIO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO SOCIAL E COMBATE A FOME, CONGRESSO, INICIATIVA, ASSOCIAÇÃO NACIONAL, CURSOS, POS-GRADUAÇÃO, ECONOMIA, REALIZAÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE (RN), DISCUSSÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, GOVERNO FEDERAL.
  • CONGRATULAÇÕES, PAULO PAIM, SENADOR, PARTICIPANTE, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, PROTESTO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, REALIZAÇÃO, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF).

O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Renan Calheiros, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, no último dia 6 de novembro, exatamente após 22 minutos de sua palestra em Brasília sobre o objetivo de maior integração entre as Américas, o Presidente George Walker Bush desceu alguns degraus em direção à platéia para cumprimentar alguns convidados. Quando estendeu as mãos para mim - creio que fui o oitavo a ser cumprimentado -, tivemos uma rápida, porém relevante conversa:

- “Sou o Senador Eduardo Suplicy, do Partido dos Trabalhadores. Com relação à integração das Américas, deveríamos ter o objetivo de não somente permitir o livre movimento de capital, bens e serviços, mas principalmente o livre trânsito dos seres humanos, do Alasca até a Patagônia. Mais do que isso, deveríamos ter o que vocês já têm no Alasca com sucesso, renda básica de cidadania para todos os residentes naquele Estado”.

- “No Alasca, eles têm muito petróleo” - disse o Presidente.

- “Mas podemos ter uma renda básica proveniente de todas as formas de riqueza que são criadas. Gostaria também de sugerir que, para criar as condições para uma paz real, com base na justiça, no Iraque, deveríamos estimular os iraquianos a seguir o exemplo do Alasca, que distribui todos os anos uma renda básica a toda a sua população”.

- “We are working on that. We are working on that. Nós estamos trabalhando para isso! Obrigado” - disse assertivamente o Presidente.

Fiquei bastante surpreso e satisfeito com as suas observações, por várias razões. Em maio de 2003, após a nomeação do brasileiro Sérgio Vieira de Mello como Coordenador das Ações das Nações Unidas no Iraque, escrevi-lhe sugerindo que aconselhasse os iraquianos a seguir o exemplo do Alasca, para criar condições reais de justiça, igualdade, liberdade e paz entre a população, após longo tempo de caos, violência e guerras.

No início dos anos 60, o Prefeito de Bistrol Bay, Jay Hammond, uma pequena vila de pescadores, observou que de lá saía grande riqueza, mas que muitos continuavam pobres. Propôs, então, a introdução de um imposto de 3% sobre o valor da pesca. Demorou cinco anos para persuadir a população. O sucesso foi tão grande, que, dez anos depois, ele se tornou Governador no Estado do Alasca - que, naquela época, descobriu grandes reservas de petróleo.

Em 1976, já Governador, Jay Hammond disse aos 300 mil habitantes do Estado que eles deveriam pensar não apenas na sua geração, mas nas gerações vindouras, uma vez que o petróleo é um recurso não-renovável. Sugeriu separar 50% dos royalties provenientes da exploração de recursos naturais para a constituição de um fundo que pertenceria a todos.

Desde o início dos anos 80, 50% de royalties foram aplicados em investimentos imobiliários, títulos do governo dos Estados Unidos, ações de empresas do próprio Alasca, contribuindo para diversificar a sua economia, ações de empresas internacionais, incluindo, hoje, as ações de 16 empresas brasileiras, dentre as quais diversas teles, o Banco Itaú, a Companhia Vale do Rio Doce, e assim por diante. Ou seja, nós, brasileiros, também contribuímos para que isso exista lá. O patrimônio líquido do Fundo Permanente do Alasca subiu de US$1 bilhão, no início dos anos 80, para US$31,5 bilhões em 2005.

Cada residente no Alasca há mais de um ano recebe um dividendo anual que aumentou de US$300 para cerca de US$1 mil, dos anos 80 até hoje, independentemente da origem, sexo, raça, estado civil ou condição sócio-econômica. Durante a década de 90, o Alasca distribuiu a todos os seus residentes cerca de 6% do seu Produto Interno Bruto. Qual foi a conseqûência? O Alasca tornou-se o mais igualitário dos 50 estados norte-americanos. Hoje, tem 700 mil habitantes.

Prezado Governador de Sergipe, João Alves, pode perfeitamente o Estado de Sergipe criar um fundo com base na sua principal riqueza, o petróleo, de natureza semelhante.

Eu, então, sugeri a Sérgio Vieira de Mello que propusesse a instituição de um fundo como o Fundo Permanente do Alasca, com os dividendos, mas também lhe expliquei que, no Brasil, eu havia proposto a instituição de uma renda básica de cidadania e que, de fato, já existe uma lei instituindo a sua introdução gradual - começando pelos mais necessitados -, sancionada pelo Presidente Lula em janeiro de 2004. Sérgio respondeu-me dizendo que iria propor a idéia às autoridades administrativas do Iraque. Em 23 de junho de 2003, em Amã, na Jordânia, durante o Encontro de Reconciliação Mundial, o Embaixador Paul Bremmer III, que então era o administrador, pelos Estados Unidos, do Iraque, afirmou que estava sugerindo aos iraquianos seguirem o exemplo do Alasca. No dia primeiro de agosto, Sérgio me telefonou de Bagdá, dizendo que a idéia havia sido muito bem aceita e que a missão do Banco Mundial a considerava viável. No dia 19 de agosto, entretanto, ele foi, infelizmente, assassinado.

Muitos outros autores escreveram a favor da renda básica no Iraque e em todas as nações, como James Tobin, John Kenneth Galbraith, James Edward Meade, Guy Standing, Philippe Van Parijs e Jay Hammond, que faleceu, aos 83 anos, no último 2 de agosto. Encontrei-o na Conferência da Rede Norte-Americana da Renda Básica de 2004, em Washington D.C. Perguntei-lhe se conhecia a proposta de Thomas Paine no seu ensaio de 1795, “Justiça Agrária”, para a Assembléia Nacional da França, onde ele explicou por que todos deveriam ter o direito de participar da riqueza de cada nação por meio de uma renda e de um capital básicos. Ele não a conhecia, mas ficou muito feliz por já ter a sua idéia sido defendida por um dos principais fundadores das Revoluções da América e da França. Disse-me estar tentando uma conversa com o Presidente Bush para disseminar a idéia para toda a América e também para os iraquianos.

Acredito firmemente que o Presidente Bush deve, realmente, trabalhar para isso.

Eu quero, Sr. Presidente, anunciar que, nesta semana, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a coordenação dos professores Drª Maria Ozanira da Silva e Silva, da Universidade Federal do Maranhão, Drª Maria Carmelita Yazbek, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, e Geraldo Di Giovanni, da Unicamp, será organizado um seminário nacional sobre o Programa de Transferência de Renda.

No dia 23, quinta-feira, às 9 horas, dar-se-á a sessão de abertura, com a participação da professora Maria Ozanira da Silva e Silva, sobre os Programas de Transferência de Renda no Contexto do Sistema Brasileiro de Proteção Social, e da professora Drª Maria Helena Guimarães Castro, Secretária Estadual do Desenvolvimento Social de São Paulo, ocasião em que Antônio Floriano Pereira Pesaro, Secretário Municipal da Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo, falará sobre os programas municipais de transferência de renda e sua articulação com o Bolsa-Família.

Haverá inúmeras mesas, com a apresentação de trabalhos, no dia 23 à tarde e no dia 24. No dia 25, haverá a apresentação, pela Drª Márcia Lopes, Secretária Executiva do Ministério do Desenvolvimento Social, e por Rosani Cunha, Secretária de Programas de Transferência de Renda, a partir das 15 horas. Às 16 horas e 30 minutos, farei a apresentação oficial da Rede Brasileira da Renda Básica de Cidadania, para a qual estão sendo convidadas todas as pessoas que se interessarem pelos programas de transferência de renda e que venham a propugnar para que possamos, o quanto antes, implementar no Brasil uma renda básica de cidadania.

Quero assinalar, Sr. Presidente, que no Congresso da Associação Nacional dos Cursos de Pós-Graduação em Economia (Anpec), nos próximos dias 08 e 09 de dezembro, em Natal, no Rio Grande do Norte, haverá uma mesa-redonda, com a minha participação e a do Ministro Patrus Ananias, em que iremos discutir a transição do programa Bolsa-Família para o Renda Básica de Cidadania.

Quero, Sr. Presidente, neste dia, saudar os participantes da marcha realizada hoje, em Brasília, em homenagem a Zumbi dos Palmares e ao Dia da Consciência Negra, ocorrido em 20 de novembro, e saudar o Senador Paulo Paim, responsável, sobretudo, pela apresentação do Estatuto da Igualdade Racial, que está tão relacionado ao resgate da cidadania para todos os brasileiros, em especial os afro-descendentes e os descendentes de indígenas. Cumprimento S. Exª pela sua batalha.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2005 - Página 40611