Discurso durante a 215ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Encaminhamento à Mesa do Senado, de requerimento de convocação do Ministro das Cidades, Sr. Marcio Fortes, tendo em vista a publicação do artigo da revista Veja, intitulado "Severino virou Ministro", sobre a influência do ex-deputado no Ministério das Cidades.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Encaminhamento à Mesa do Senado, de requerimento de convocação do Ministro das Cidades, Sr. Marcio Fortes, tendo em vista a publicação do artigo da revista Veja, intitulado "Severino virou Ministro", sobre a influência do ex-deputado no Ministério das Cidades.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Mão Santa, Tião Viana.
Publicação
Publicação no DSF de 06/12/2005 - Página 42853
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, ATUAÇÃO, SEVERINO CAVALCANTI, EX-DEPUTADO, EX PRESIDENTE, CAMARA DOS DEPUTADOS, EXERCICIO, FUNÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DAS CIDADES, LIBERAÇÃO, RECURSOS, FAVORECIMENTO, ELEIÇÕES, ESTADO DE PERNAMBUCO (PE), JUSTIFICAÇÃO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, CONVOCAÇÃO, TITULAR, OBJETIVO, ESCLARECIMENTOS.
  • REPUDIO, INFLUENCIA, GOVERNO FEDERAL, POLITICO, SUSPEIÇÃO, CORRUPÇÃO.
  • ANUNCIO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, CONVOCAÇÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DE MINAS E ENERGIA (MME), PRESIDENTE, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), ESCLARECIMENTOS, COMISSÃO DE FISCALIZAÇÃO E CONTROLE, PRORROGAÇÃO, CONTRATO, EMPRESA, PUBLICIDADE, INVESTIGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI).

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou encaminhando à Mesa um requerimento de convocação do Ministro das Cidades, Sr. Marcio Fortes, para vir a este plenário prestar esclarecimentos à Nação sobre um fato escandaloso; ou melhor, seria escandaloso se não vivêssemos em tempos tão degenerados, degeneração que aumentou com o Governo que aí está.

Sr. Presidente, faço referência à matéria publicada na revista Veja desta semana e não contestada pelo Ministro, com o seguinte título, que vou ler para conhecimento dos espectadores da TV Senado que não leram a revista: “Severino virou Ministro”. Refere-se a Severino Cavalcanti, ex-Deputado, ex-Presidente da Câmara, que renunciou porque, comprovadamente, exigiu e recebeu propina do arrendatário do restaurante da Câmara. Renunciou porque seria cassado.

Pois bem, segundo a revista, em matéria não contestada pelo Ministro, Severino virou ministro de fato das Cidades. Diz a matéria, assinada pela jornalista Julia Duailibi:

Há dois meses e meio, o ex-deputado Severino Cavalcanti [...] chegou ao fundo do poço de sua carreira pública ao ter de renunciar ao mandato depois de ser pilhado cobrando propina de um dono de restaurante. O surpreendente [...] é que a tal renúncia do ex-deputado não foi propriamente um fundo de poço. Talvez tenha sido o contrário. Na prática, após largar o mandato para fugir da cassação, Severino tornou-se ministro das Cidades do governo do presidente Lula. É isso mesmo: Severino é o ministro das Cidades, um ministro informal, pois o seu nome não saiu no Diário Oficial da União, mas, mais poderoso que muito ministro formal. No Ministério das Cidades, Severino é tratado pelos funcionários como o que de fato é - ou seja, a maior autoridade do pedaço. Ele despacha rotineiramente no ministério, cujo orçamento para este ano chega a 2,7 bilhões de reais. [que gordo orçamento, Sr. Presidente!] Usa a garagem e o elevador privativos do ministro e recebe políticos na sala de reunião do 2º andar, bem ao lado do gabinete do titular da pasta, Marcio Fortes [...]. A rotina de Severino no ministério não deixa margem para dúvidas: ele é o verdadeiro sucessor do petista Olívio Dutra...

O ministro Severino tem agenda intensa. Nos fins de tarde, muitas vezes ele se instala dentro do próprio gabinete do ministro e [...] atende prefeitos e parlamentares em busca de recursos para suas bases eleitorais. Em média, recebe uns dez políticos por dia. Ouve com atenção as reivindicações, promete empenho pessoal na liberação das verbas e - o que é mais importante - tem sido altamente bem-sucedido. Como pretende voltar ao Congresso na eleição do ano que vem, Severino, é claro, prioriza os políticos de seu Estado, Pernambuco. “Em pouco tempo, ele conseguiu liberar dinheiro para cisternas e construção de casas populares”, comemora o prefeito de Cumaru [...], do PP, o mesmo partido de Severino. “Por isso [diz o Prefeito], acho que ele vai ter mais voto em 2006 do que teve em 2002. Só aqui, vou conseguir mais de 5.000 votos para ele” [...]. Na sexta-feira passada, Pernambuco voltou a reinar no ministério. Ao lado do ministro Fortes, o ministro Severino recebeu uma comitiva composta de treze políticos do estado. Outra prova do prestígio do ministro Severino: em apenas um mês, ele conseguiu mais de um milhão de reais para contemplar as emendas orçamentárias de sua própria autoria. É uma situação ideal: por não ser um ministro formal, talvez Severino nem possa sequer ser acusado de agir em causa própria...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Jefferson Péres...

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Já lhe concedo o aparte, Senador Mão Santa. Deixe-me concluir esta leitura, que é altamente esclarecedora para o povo deste País saber a que ponto chegamos nesse Governo que veio para moralizar a Administração Pública.

O ministro Marcio Fortes, o formal, chegou ao cargo por indicação do ministro Severino Cavalcanti, o informal - e não parece se incomodar com a situação. Na semana passada, o formal viajou [o Marcio] e, sem cerimônia, o informal [Severino] voltou a instalar-se no gabinete ministerial [na ausência do ministro]. Além das questões de saneamento e habitação, próprias de sua pasta, o ministro Severino foi acionado pelo governo para dar uma mãozinha a José Dirceu na luta contra a cassação. A estratégia de ação foi combinada diretamente com seu colega de ministério, Jaques Wagner, com quem se reuniu dias antes.[...]

Severino Cavalcanti deve ter se reunido no Palácio do Planalto com o Ministro Jaques Wagner, obviamente com o conhecimento, senão com ordem, do Presidente da República. Severino Cavalcanti, que renunciou porque recebeu propina, devia ser proibido de entrar em Palácio e em qualquer ministério, a não ser como cidadão comum. Devido aos direitos de ir e vir - claro -, ele não pode ser impedido de fazer isso, mas ser o ministro de fato, recebido em Palácio, beneficiado com liberação de verbas! Isso não é um escândalo, Senador Cristovam Buarque, de abalar os alicerces de um governo?

Já lhes dou os apartes.

Além das questões de saneamento e habitação, foi encarregado de defender José Dirceu.

Não foi a primeira vez que o governo se socorreu da capacidade de articulação de Severino. Ele trabalhou muito para convencer seus antigos aliados a apoiar [...] Aldo Rebelo para lhe suceder na presidência da Câmara. Na quarta-feira passada, dia da votação do processo de José Dirceu, Severino esteve no Congresso e fez um corpo-a-corpo com os parlamentares do baixo clero, pedindo votos contra a cassação do ex-ministro da Casa Civil.

Dizia Severino nos corredores:

“Estou falando com deputados do meu partido para se colocarem no lugar de Dirceu e dizerem se gostariam de ser cassados sem direito a ampla defesa” [é o jurista Severino preocupado com a falta de defesa de Dirceu. Grande patriota esse Severino!] [...] A única dificuldade que o ministro Severino encontrou em seu périplo pela Câmara foi para se desvencilhar dos inúmeros pedidos de audiência que recebia, [Senador Mão Santa, audiência no Ministério].Severino não conseguiu livrar José Dirceu da cassação, mas também não se abateu. No dia seguinte, novamente instalado no gabinete do ministro das Cidades, soube [foi informado] que o governo nomeara o novo diretor do Departamento Nacional de Trânsito. O contemplado, Alfredo Peres da Silva, foi indicação sua. Que ninguém se surpreenda, portanto, se Severino voltar a aparecer em breve, desta vez na pele de chefe do Denatran.

É ministro das Cidades e, agora, vai ser chefe do Denatran.

Concedo o aparte a V. Exª, Senador Mão Santa.

O SR. MÃO SANTA (PMDB - PI) - Senador Jefferson Péres, eu estava olhando ali o nosso Rui Barbosa e V. Exª na tribuna. Tem muito a ver; é muito semelhante a crença no Direito, a firmeza, a pureza. Lembrei-me do que ele disse: “De tanto ver as nulidades proliferarem, a corrupção lardear, rir-se da honra, vais ter vergonha de ser honesto!”. Esse dia chegou. É o Governo do PT. Gostaria apenas de lembrar o seguinte: a globalização não é só de dinheiro e de mercado, não, mas de ética, de vergonha, de democracia. No Canadá, por causa de um ministro em relação ao qual havia indícios de corrupção, o Parlamento fechou e o povo foi convocado. Aqui, eles são aplaudidos e fortalecidos. V. Exª adverte, e a presença de V. Exª é muito importante. Como disse Francisco, o santo, onde houver desespero, que haja esperança. O Partido de V. Exª - Partido de um dos maiores estadistas da história deste País, Leonel Brizola - tem dois extraordinários nomes para concorrer à Presidência: o de V. Exª, Senador, que não foi o Águia de Haia, mas é o águia do Amazonas, e o do professor e mestre Cristovam Buarque. Essa é esperança que o povo brasileiro tem de ter.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Mão Santa.

No Canadá, país parlamentarista, o Ministério caiu, o Governo caiu, e, daqui a três meses, haverá novas eleições. Ah, como lamento que este País não seja parlamentarista!

Ouço o aparte do Senador Cristovam Buarque.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Jefferson Péres, o pronunciamento de V. Exª me traz três surpresas. A primeira surpresa é a de que isso tenha acontecido - aliás, não se passa um dia sem que tenhamos surpresas. Sinceramente, é surpreendente ler essa notícia. A segunda surpresa é a de que não tenha saído nenhum desmentido. Depois que saiu a notícia, poderíamos ter ouvido algo como: “É engano, a imprensa cometeu algum exagero”. Mas a gente não vê nada disso. A terceira surpresa é a nossa impotência. Felizmente, há parlamentares como V. Exª que vêm aqui e repetem, lembram, põem na televisão fatos como esse, para que o povo tome conhecimento. No entanto, o Congresso hoje está absolutamente impotente. V. Exª mesmo disse que, se vivêssemos em um regime parlamentarista, no qual o Congresso manda porque coloca e tira primeiros-ministros, não teríamos nosso trabalho limitado a denúncias. Até quando o Congresso vai continuar apenas como crítico? Quando é que a gente vai começar a ter um papel efetivo e a influir nos destinos do País? Felizmente, há parlamentares como V. Exª, que não deixam o assunto passar em branco. Fiz questão de registrar estas três surpresas e incômodos que sinto: o fato em si, o fato de não haver desmentido e a impotência que eu, sendo Senador, sinto diante de fatos como esses.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Obrigado, Senador Cristovam Buarque. Seu sentimento de impotência e de indignação é o mesmo que o meu. V. Exª hoje honra o PDT, honra, sobretudo, a mim por ser meu companheiro de Partido e de jornada, V. Exª que saiu do PT indignado com os desmandos deste Governo.

Não se admire, Senador Cristovam Buarque, não se surpreenda se esse meu requerimento convocando o Sr. Márcio Fortes para dar explicações - não a mim, mas à Nação - for rejeitado pela maioria governista! Espero que petistas honrados, como o Senador Tião Viana, que hoje me ouve - V. Exª é um dos muitos petistas honrados; não coloco todos como farinha do mesmo saco, não -, ajudem-me para que, do seio de sua Bancada, não surja um movimento para impedir que o Senado Federal ouça o Ministro das Cidades, Márcio Fortes, que substituiu, sucedeu o Ministro do seu Partido, Olívio Dutra. Que S. Exª diga aqui se isso é verdade ou não! Se for verdade e se S. Exª permanecer na Pasta, esse é um escândalo que não podemos suportar!

Concedo-lhe um aparte antes de encerrar meu pronunciamento.

O Sr. Tião Viana (Bloco/PT - AC) - Senador Jefferson Péres, pelo respeito que tenho pela sua trajetória, pela luta cotidiana de V. Exª na defesa da ética, da responsabilidade dos homens com a função pública, pela cobrança justa que faz a todos os governos - conheço a sua atuação; V. Exª é um Parlamentar que é referência moral para o País -, concordo inteiramente com o pronunciamento de V. Exª. Reconheço a necessidade de o Ministro Márcio Fortes vir aqui prestar todos os esclarecimentos que se fazem necessários.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Tião Viana. Eu não esperava outra coisa de V. Exª.

Para concluir, informo à Casa que, na Comissão de Fiscalização e Controle, vou apresentar outro requerimento, convocando o Ministro das Minas e Energia e o Presidente da Petrobras para darem explicações também sobre a prorrogação do contrato com a empresa de publicidade do Sr. Duda Mendonça.

 


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/12/2005 - Página 42853