Discurso durante a 218ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre o reajuste do salário mínimo. Manifestação em defesa da prestação de serviços públicos de qualidade.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL. POLITICA SOCIAL.:
  • Considerações sobre o reajuste do salário mínimo. Manifestação em defesa da prestação de serviços públicos de qualidade.
Aparteantes
Garibaldi Alves Filho, Mão Santa, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 08/12/2005 - Página 43097
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ELOGIO, INICIATIVA, PRESIDENTE, SENADO, CAMARA DOS DEPUTADOS, CRIAÇÃO, COMISSÃO MISTA ESPECIAL, ESTUDO, POLITICA SALARIAL, LONGO PRAZO, DEFINIÇÃO, SALARIO MINIMO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, VALOR, SALARIO MINIMO, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, ALIMENTAÇÃO, VESTUARIO, CIDADÃO, DEFESA, DISPONIBILIDADE, ESTADO, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, SAUDE, SEGURANÇA, POPULAÇÃO.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho falar sobre o salário mínimo, mas venho falar com uma alegria especial, porque nesses últimos dias e semanas tenho escutado aqui especialmente os Senadores Ramez Tebet, Pedro Simon, o próprio Senador Paim e outros manifestarem a angústia de não verem o Senado tomando posição direta sobre os fatos que ocorrem no Brasil, de não verem o PT no Senado, no Governo e os outros Partidos aqui, juntos, trabalhando uma agenda nacional. O Senador Mão Santa também. Temos reclamado de que estamos a reboque do processo, balançando a cabeça às ordens que vêm do Planalto e ordens que pensam apenas no presente sem uma estratégia de longo prazo.

O Senado deveria preencher essa lacuna, organizar-se para formular alternativas. E a gente não vê isso. Hoje, ao meio-dia, eu vi uma esperança: O Presidente Renan Calheiros e o Presidente Aldo Rebelo criaram uma Comissão Mista, do Senado e da Câmara, para estudarmos o salário mínimo. Não é o valor, Senador Mão Santa, não é o valor do salário mínimo para o próximo ano, mas uma política de médio e longo prazo para definir como é que vai estar o salário mínimo, neste País, nos próximos 10, 15, 20 anos.

Essa Comissão deu-me muita alegria e deu-me alegria ver lá o Senador Paulo Paim, que não poderia estar fora, representando o PT. E deu-me muita satisfação - e agradeço aqui ao Senador Osmar Dias, que é Líder do PDT - estar meu nome ao lado do Senador Paulo Paim e de outros Srs. Senadores e Deputados para, juntos, ao longo das próximas semanas, definirmos uma política de salário mínimo para o País.

É incrível que, quando o salário mínimo foi criado - e foi um grande avanço de Getúlio Vargas -, ele foi criado como um valor e não como política; não foi como estratégia de longo prazo que permitisse reduzir a brecha que temos no Brasil entre os ricos e os pobres, mas também entre os salários, que são extremamente diferenciados no Brasil.

Eu vou ficar muito à vontade, porque vejo obviamente a necessidade do aumento do valor do salário mínimo no próximo ano, no outro ano, no outro ano, no ano seguinte, até que possamos chegar a uma confluência do salário mínimo e máximo. Não que seja igual, não que sejam nem próximos, eu diria, mas que não tenham a defasagem de 30, 40 vezes, como a gente vê no Brasil de hoje.

Nos meus debates com o Senador Paulo Paim, isso já ficou explícito. Vou levar, Senador, a idéia de que o salário mínimo não pode ser visto apenas como aquela parte da renda que o trabalhador recebe diretamente no seu contracheque. Vou levar a idéia de que a política de salário mínimo tem que incorporar também os demais itens necessários a uma vida digna do trabalhador.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Com muito prazer, Senador, depois do Senador Paulo Paim, que me pediu antes. Pode ser?

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Pois não.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Depois, com o maior prazer. Só quero antes disso dizer que o salário mínimo tem que ter uma renda suficiente para o trabalhador ter acesso ao mercado, para comprar os alimentos que ele não vai receber grátis; para comprar as vestimentas, que ele não vai receber grátis; para pagar o transporte, que ele não vai ter grátis; para comprar um sapato, que ele não vai ter grátis; para pagar um lazer, que ele não vai ter grátis.

Mas, além disso, o trabalhador tem que receber, e não pelo contracheque, mas por uma oferta pública, os serviços necessários para completar a sua dignidade. E aí entra o sistema de qualidade e de educação para todos os seus filhos até o final do ensino médio. Então entra o sistema de saúde, de água potável, de coleta de lixo, de esgoto, para atender as suas necessidades.

Senador Paulo Paim, quero convidá-lo para trabalharmos juntos nesses dois eixos: um salário direto suficiente hoje, crescente a longo prazo e com responsabilidade fiscal, e um salário mínimo indireto dos serviços públicos, que são até mais necessários para sair da pobreza do que o próprio salário direto sobre a renda.

Concedo, com muito prazer, um aparte ao Senador Garibaldi Alves Filho, já que o Senador Paulo Paim cedeu sua vez a V. Exª.

O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Cristovam Buarque, agradeço ao Senador Paulo Paim pela concessão e também a V. Exª. Saúdo, com grande satisfação, a iniciativa do Congresso Nacional de constituir essa Comissão. Não se trata de comparar as duas iniciativas, mas de dizer que o Congresso não ficou totalmente omisso em relação a essa questão. Quando fui Relator, agora em 2005, da Lei de Diretrizes Orçamentárias, fixamos um critério que poderia servir até de sugestão para as discussões sobre o salário mínimo: fazer com que o salário mínimo fosse reajustado pelo Produto Interno Bruto. No entanto, o Governo não aceitou a colocação apenas do Produto Interno Bruto e fez com que se convergisse para o Produto Interno Bruto per capita, o que não é propriamente o ideal. Não estou dizendo que o Produto Interno Bruto é ideal, mas essa foi uma tentativa de fixar critérios. O Senador Paulo Paim acompanhou bem isso e eu queria dar este depoimento, inclusive sendo suplente nessa comissão, porque, por hora, estou numa CPI e não posso ser titular da comissão do salário mínimo. Muito obrigado a V. Exª, Senador Cristovam Buarque.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu quero complementar, porque talvez sua modéstia não tenha querido explicitar, mas não só V. Exª, no Orçamento, tomou as medidas para o salário, como tentou, fez todos os esforços para colocar a idéia do choque social, que seria a outra parte do salário mínimo. Isso eu quero reconhecer, porque assisti, vi, e o seu esforço foi grande para dar reajuste ao salário mínimo e para haver um choque social que complemente a parte não renda do salário mínimo.

O que vamos fazer agora é um salto adiante que, se V. Exª não tivesse começado, talvez não fizéssemos. É preciso lembrar ao Presidente Renan, ao Presidente Aldo a necessidade de formular uma política de longo prazo para algo tão importante que é o salário mínimo.

Passo a palavra ao Senador Paim e, depois, ao Senador Mão Santa.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Cristovam, faço o aparte a V. Exª lembrando, em primeiro lugar, que V. Exª é Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado. Salário mínimo, para mim, é política de direitos humanos.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito bem.

O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Por isso quero dizer que eu concordo com a tese de V. Exª. Eu ouvi a sua explicação, o seu pronunciamento, e cá comigo eu pensava e dizia “ele tem razão”. Nem que busquemos uma saída, digamos, apontando para o salário mínimo que pode ser adotado a partir de janeiro ou mesmo de maio. Mas nós temos que construir uma política permanente, duradoura, para o salário mínimo, pelas próximas décadas. Que mude o governo, mas que a lei continue na recuperação do valor decente do salário mínimo, para permitir, e ouso dizer este número de novo, que 100 milhões de brasileiros vivam com mais dignidade. Confesso a V. Exª que, no fim do ano passado, tinha aprovado aqui um decreto legislativo para a criação dessa comissão. Felizmente, agora, pelo ato dos dois Presidentes, a Comissão vai ser instalada. Lancei, no mês passado, em Porto Alegre o livro intutulado Salário Mínimo: uma História de Luta, não minha, mas do povo brasileiro. Por isso que me sinto muito bem de estar ao seu lado construindo uma política permanente de recuperação e de valorização do novo salário mínimo. Parabéns a V. Exª.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador Paim, quero dizer que tenho muita esperança de que essa Comissão possa ser um gesto do Senado que defina uma estratégia de longo prazo para a reversão da desigualdade, mais até do que o salário, uma reversão da desigualdade social, que não recebemos do Poder Executivo, pois temos neste órgão apenas transferências de renda que não revertem a desigualdade como deve ser. Essa Comissão poderá, sim, fazer uma política de reversão, e, para isso, tem de ter o salário mínimo sob a forma de renda, no contracheque do trabalhador, e sob a forma dos serviços públicos que a família do trabalhador recebe.

Espero, sem querer intrometer-me, que o Partido dos Trabalhadores, o Bloco do Governo, coloque V. Exª na Presidência ou na Relatoria dessa Comissão, o que será fundamental, uma vez que dará legitimidade e competência maior à Comissão.

Concedo um aparte ao Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Cristovam Buarque, primeiro a minha observação. Parece que V. Exª, quando era adolescente, tinha o Canto do Rio e os times clássicos do Rio de Janeiro. Parece que você saiu e mudou do Canto do Rio para o Flamengo e V. Exª, vestindo a camisa do PDT, está tendo proeminência e influência, o que caracteriza o grande líder que é. Mas esse assunto, Professor Cristovam Buarque, é simples. Deus colocou o homem certo no lugar certo: Davi, Moisés e V. Exª. Atentai bem! Dos países civilizados que V. Exª conhece pelo estudo e, às vezes, já viajou para alguns, a diferença do maior ou menor salário é de dez vezes. Os maiores salários deste país hoje é vinte e sete mil reais no Poder Judiciário. Dez vezes, então, o menor seria...Vamos colocar vinte vezes, o que é um absurdo. O Brasil ainda estaria atrasado e seria mil e trezentos e cinqüenta. Então, atrele o pequeno com o grande porque o grande dá seus pulos e sempre vai subir que nem um foguete como subiram os salários do Poder Judiciário.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - V. Exª trouxe mais um ponto e gostaria de pedir mais um tempinho ao Presidente, que é fundamental nesse debate: é de que não existe reversão de desigualdade subindo todos igualmente. Só há reversão da desigualdade se subir mais os que estão embaixo, pelo menos isso. E, na Suécia, a diferença é de três vezes. Três! A média da Europa, em alguns países, chega até dez. Mas na Suécia é três vezes entre o salário maior e o menor. E um país capitalista, não é um país socialista. E todos têm escola igual.

Concluo, Sr. Presidente, dizendo que vou me empenhar nesta Comissão. Fico muito feliz que o meu partido, o PDT, tenha me indicado para esta Comissão. Creio que é um ponto fundamental para a política brasileira, séria, de longo prazo para reverter a desigualdade. E quero aproveitar a idéia do meu amigo Senador Paulo Paim e vamos colocar também que salário mínimo é uma questão de direitos humanos. Acho que essa é uma idéia que devemos levar adiante. Direitos humanos nos tempos de hoje não pode ser apenas o direito de não ser torturado; é o direito também de sobreviver com dignidade, com salário mínimo de renda suficiente para comprar aquilo que é preciso, e um salário mínimo indireto sob a forma de serviços públicos: educação, saúde, limpeza urbana, habitação, para que o trabalhador brasileiro viva com dignidade e para que reduza essa brutal desigualdade social que o País apresenta.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/12/2005 - Página 43097