Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa de projeto de lei do Senado, de autoria de S.Exa., que regulamenta o repasse para o Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente de verbas de desvios dos cofres públicos recuperadas.

Autor
Patrícia Saboya (PSB - Partido Socialista Brasileiro/CE)
Nome completo: Patrícia Lúcia Saboya Ferreira Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • Defesa de projeto de lei do Senado, de autoria de S.Exa., que regulamenta o repasse para o Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente de verbas de desvios dos cofres públicos recuperadas.
Aparteantes
Heloísa Helena, Ideli Salvatti, Leonel Pavan, Rodolpho Tourinho.
Publicação
Publicação no DSF de 20/01/2006 - Página 1170
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • ELOGIO, MELHORIA, ATUAÇÃO, POLICIA FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), COMBATE, CORRUPÇÃO.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, DESTINAÇÃO, FUNDO NACIONAL, CRIANÇA, ADOLESCENTE, VERBA, DESVIO, CORRUPÇÃO, RECUPERAÇÃO, ESTADO.
  • DEFESA, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO, DOAÇÃO, IMPLEMENTAÇÃO, ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, SOLUÇÃO, INFERIORIDADE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, FUNDO NACIONAL, GRAVIDADE, PRECARIEDADE, ATENDIMENTO, INFANCIA, BRASIL.
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AMPLIAÇÃO, TEMPO, LICENÇA-MATERNIDADE.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de tudo, quero agradecer ao Senador Heráclito Fortes por ter-me permitido usar o seu tempo para falar de um assunto que considero de fundamental importância e que, certamente, muito por coincidência, neste debate que aconteceu hoje nesta Casa, tem a ver justamente com o assunto corrupção, desvio de dinheiro, etc. e tal.

Aproveito, então, esta oportunidade, apesar de já estar aqui tentando falar há algum tempo - e já estamos quase no fim desta sessão -, e gostaria de retomar o assunto numa outra ocasião para poder tentar ampliar o debate que me traz hoje a esta tribuna.

Iniciamos 2006 com a responsabilidade e a inadiável missão de dar respostas concretas à população brasileira nos mais variados setores. Vivemos, em 2005, momentos muito difíceis, momentos duros, marcados pela profunda crise de credibilidade da classe política que se expôs hoje num debate bastante apaixonado e acirrado. Um período em que todos nós, brasileiros, sofremos e sentimos o peso da enxurrada de denúncias de corrupção, envolvendo Parlamentares de diversos partidos e integrantes do Poder Executivo.

Precisamos, agora, retomar o rumo do desenvolvimento econômico, da geração de mais empregos e renda, da construção e da consolidação de políticas públicas que sejam capazes de resgatar a dignidade do povo brasileiro, seguindo com mais firmeza e determinação na caminhada por um País socialmente mais justo.

Estou convicta de que nessa luta é imprescindível melhorarmos os mecanismos de combate à corrupção. É certo que tivemos algumas importantes vitórias nos últimos anos. A Polícia Federal, o Ministério Público e mesmo as CPIs e o Parlamento, muitas vezes tão criticados, têm cumprido um papel fundamental na cruzada contra os crimes de colarinho branco. Mesmo assim, é importante avançar muito mais.

Um dos nossos maiores desafios é, sem dúvida, o aprimoramento dos instrumentos de recuperação do dinheiro desviado do Erário por ações de corrupção. Ao mesmo tempo em que precisamos avançar nessa seara, precisamos definir, com clareza e transparência, a aplicação dos recursos que foram recuperados pelo Poder Público.

Nesse sentido, Sr. Presidente, apresentei, no final do ano passado, um projeto de lei prevendo que as verbas desviadas dos cofres públicos por ações de corrupção, que forem recuperadas pelo Estado, sejam destinadas ao Fundo Nacional para a Criança e o Adolescente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senadora Heloísa Helena, com quem já tive a oportunidade de conversar sobre esse tema e de quem recebi toda a solidariedade e apoio para que aqui realizasse um debate a respeito dessa causa, o Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece que a política de atendimento dos direitos da população infanto-juvenil se fará por meio de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal. Entre essas diretrizes, destaca-se justamente a manutenção dos fundos estaduais, municipais e federal, vinculados aos respectivos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Os recursos que constituem a receita desses fundos decorrem de fontes governamentais e de doações de pessoas físicas e jurídicas. O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que as doações feitas podem ser deduzidas do Imposto de Renda de forma a incentivar a captação de verbas.

Sabemos, no entanto, que os recursos destinados a esses fundos não têm sido suficientes para garantir os cumprimentos dos direitos da criança e do adolescente. Isso porque as dotações orçamentárias para eles têm sido irrisórias e porque os problemas operacionais e o próprio desconhecimento da legislação acabam impedindo que o maior volume de doações de pessoas físicas e jurídicas deságüe nesses fundos.

Um estudo realizado pelo Ipea, Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, em 2000, revelou, Senadora Heloísa Helena, que somente 0,6% das empresas brasileiras - 0,6%! - com imposto a pagar fizeram doações para o Fundo da Criança e do Adolescente. Foram apenas R$6,5 milhões destinados a esses fundos em um universo de renúncia potencial de quase R$100 milhões.

O que queremos é aprimorar essa legislação de doações e recuperar esses recursos que são desviados todos os anos e que retornam, quando recuperados, ao Tesouro Nacional. Há uma discussão, da qual tenho participado ao longo da minha vida, em relação a assegurar os direitos da criança e do adolescente estabelecidos na Constituição, no Estatuto da Criança e do Adolescente. A cada ano que passa, deparamo-nos com cortes absurdos, com um orçamento, eu diria, ridículo, irrisório em relação à demanda, à necessidade urgente, daquilo que cada vez mais se vê na nossa sociedade, que é o abandono de crianças, a falta de políticas públicas sociais, ousadas, criativas, que compreendam as necessidades, os anseios, os desejos, os sonhos das nossas crianças e dos nossos jovens, para que possam crescer com dignidade, ter uma infância saudável e a possibilidade deles, quando adultos, cuidarem de suas famílias, ou terem uma profissão, enfim, de serem felizes.

As crianças nos pedem muito pouco. Agora mesmo eu dizia para a Senadora Heloísa Helena que visitei um orfanato em Fortaleza, a minha cidade. Vi ali, apesar da dedicação das funcionárias, do carinho da coordenadora da creche, do amor que aqueles funcionários dão àquelas crianças abandonadas, a delicadeza, a tristeza, de cortar coração, de ver crianças tão pequeninas, crianças de meses, se ninando porque não existem braços suficientes para cuidar delas.

Cada vez mais me choca o descaso dos governos em relação a algo que considero fundamental, prioritário, que deve vir em primeiro lugar, na cabeça, no coração de qualquer homem e de qualquer mulher de bem que deseje governar um estado, que deseje governar uma cidade, que deseje governar o País, que é cuidar, em primeiro lugar, de quem mais precisa. É simples. É como nós, mulheres, fazemos ao cuidar dos nossos filhos: se nós temos um orçamento pequeno, com o qual vivem os homens, as mulheres e os trabalhadores do País, com um salário mínimo, e precisam sustentar seus filhos, que são cinco, seis, divide-se o pão, dá-se um pouco a cada um. Não vai dar-se a um e deixar de dar aos outros.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Leonel Pavan, na tribuna desta Casa, nos debates que participo, nas reuniões, nos encontros, sempre digo que é hora de deixar de fazer discursos. Todas as vezes, principalmente na época de campanha, fazem-se discursos sobre o tema. Eu própria, que sou política, não agüento mais ouvir dizer que as crianças são o futuro deste País. Que futuro essas crianças terão se apenas 1,5% do Orçamento de bilhões que o Brasil tem é destinado às crianças e aos adolescentes? E o Brasil gasta apenas R$1,00 por dia com 60 milhões de seres humanos de 0 a 17 anos, que não têm escola ou qualidade no ensino, não têm oportunidade de ter uma casa, um teto para morar, nem a oportunidade de ter aquilo que é essencial na infância: a dignidade, a tranqüilidade, o conforto, a alegria naquilo que vemos nossos filhos fazerem quando são pequenos, como jogar bola, soltar pipa, brincar na areia, brincar de correr, brincar de pega-pega. É isto que eles querem: nada mais do que o necessário para que possam ter uma vida digna com felicidade. Esse é o sonho que todos os brasileiros de boa-fé têm com relação às nossas crianças.

Sr. Presidente, é por esse motivo que apresentei esse projeto. Sei da sensibilidade de V. Exª em diversas ocasiões, inclusive com o projeto de nossa autoria que prorroga a licença-maternidade de quatro para seis meses. V. Exª já disse que, de sua parte, colocaria em tramitação esse projeto o mais rápido possível. Estamos discutindo o assunto na Comissão de Direitos Humanos e Defesa Nacional, ouvindo sugestões e críticas. O projeto que apresentei está completamente aberto para que possa ser discutido.

Sabemos que há desvio de recursos públicos. Todo santo dia, quando abrimos o jornal, escutamos o rádio ou ligamos a televisão, há denúncia de desvio de recursos, de corrupção, de alguém que está se favorecendo, de políticos envolvidos com essa baderna, com essa nojeira.

Ontem, ouvi um colega Senador dizendo que é constrangedor, às vezes, ao chegarmos a um lugar, ver a maneira como as pessoas nos olham, como se todos fôssemos bandidos. E, ainda ontem, ouvi a Senadora Heloísa Helena dizendo isso emocionada. Mas para quem é sério e faz da política um instrumento, uma ferramenta de transformação da sociedade, de melhoria das condições de vida do nosso povo; para quem educa seus filhos, cuida das suas famílias sem receber propinas, usando aquilo que lhe é de direito, não há o que temer, embora dificuldades existam.

Claro que os nossos salários são muito maiores, muito acima da média do povo brasileiro. Mas quem vive aqui com seriedade, com dignidade; quem vai para o seu Estado, trabalha e aqui participa de todas as sessões, não pode se misturar a uma parte dos políticos que tem envergonhado, sim, o nosso Brasil, que tem revoltado a população brasileira pela forma como se tem conduzido na vida pública, fazendo com que o mandato sério, legítimo, se transforme numa moeda de barganha para favorecer aos seus.

Então, esse projeto busca justamente recuperar o dinheiro, que está sendo desviado, do Fundo Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Eu tenho certeza, como o mar de corrupção é muito grande, que esse Fundo vai ter muito dinheiro se essa lei puder ser aprovada e contar com o apoio, a participação e o debate de todos os Senadores.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - Senadora Patrícia, sem pretender interromper V. Exª, até porque sei que V. Exª vai conceder apartes aos Senadores Leonel Pavan, Rodolpho Tourinho e Heloísa Helena, eu quero, sinceramente, parabenizá-la pela coerência, pela ênfase com que sempre defende as crianças e os adolescentes no Brasil. Parabéns por tudo que V. Exª diz no que se refere ao Orçamento, ao contingenciamento desses recursos, que já são tão poucos. Um país que não tem compromisso com suas crianças e seus adolescentes jamais poderá ter certeza com relação ao seu futuro.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. PMDB - AL) - Transferirei a presidência dos trabalhos, enquanto V. Exª concede os apartes, ao Senador Wellington Salgado.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - V. Exª me permite um aparte?

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Ouço, com prazer, o Senador Leonel Pavan.

O Sr. Leonel Pavan (PSDB - SC) - Senadora Patrícia Saboya, eu não quero apenas aqui endossar tudo que V. Exª disse, mas sim, primeiro, cumprimentá-la. Todos os Senadores e o Brasil sabem da sua luta em defesa das crianças brasileiras e, conseqüentemente, do mundo inteiro. Isso tem ocorrido sistematicamente. O seu trabalho tem sido diário em defesa do futuro deste País. Quem defende as crianças está defendendo a segurança e o futuro do Brasil. E isso nos orgulha muito, porque debatemos muito aqui jogos, CPIs, corrupção, desvios, obras sem licitação, falta disso e daquilo. É verdade que também temos esse problema tão ruim que empobrece a classe política e o nosso País, que é essa corrupção toda. Fala-se muito em guerra, em violência, mas existe uma guerra que está à nossa frente, que vitima os nossos filhos, os filhos do povo brasileiro. Fala-se em morte no Iraque e em outros países, mas aqui se morre todos os dias, Senadora Heloísa Helena. São milhares e milhares de crianças à nossa frente. A imprensa nacional veicula que um homem-bomba explodiu, matando uma, duas, três, quatro, cinco ou mais pessoas. Tais notícias são veiculadas no mundo inteiro. Entretanto, todos os dias morrem crianças por falta de carinho, atenção, moradia, saúde, saneamento, prática desportiva, espaço cultural, remédio, médico, assistência nos hospitais etc. Todos os dias nós perdemos crianças. Há uma guerra permanente que está à nossa frente e, de certa forma, somos os responsáveis por isso, quando, por exemplo, corta-se recursos dos Municípios para a construção de uma creche. Eu tinha dez projetos, dez emendas, Senadores Heloísa Helena e Rodolpho Tourinho, para Municípios pobres construírem creches. Para quem são essas creches? Para crianças pobres, mães trabalhadoras que não podem trabalhar, porque seus filhos estão na casa de piso batido, dormindo na cozinha, que é o seu próprio quarto. Os pais não podem trabalhar porque as crianças não têm onde ficar. A este Governo - e a outros governos também não interessa - falta uma política construtiva, uma política pública para as crianças brasileira. Os programas de governo falam em educação como prioridade número um. É muito bonito escrever prioridade. Fui Prefeito três vezes da minha cidade, Balneário Camboriú, e passei a investir seriamente nas crianças. Aí a classe empresarial começou até a me intimar: “Vem cá, Prefeito, aqui é uma cidade turística, e você só fala nos bairros, em creche, em criança?!” Aí, nesse debate, respondi ao Jaime Lerner: “O turista só gosta da cidade se nela encontrar um povo feliz. Pode haver todo tipo de equipamento para turismo, mas, se encontrar um povo desnutrido, criança na rua mendigando, pedindo esmola, o turista não vai gostar. Tem que haver investimento”. Então eu criei o projeto do pão e leite. Na época, ainda em 1989, todas as crianças da cidade que estivessem estudando, quando fossem para casa, levariam dois pacotes de leite longa vida e seis pães, durante sete dias. Na época, a evasão escolar foi zero, porque houve incentivo. Criei escolas em tempo integral para que todas as mães pudessem trabalhar. Implantamos um projeto chamado Odonto Baby, dando atenção às crianças cinco dias após o seu nascimento. Já começaram a atender a criança na higienização bucal, porque, com seis, sete, oito, dez ou doze anos, elas não terão mais cáries, estarão felizes, sorrindo. Estou aqui dando exemplo de dois projetos apenas, mas são inúmeros. É preciso investir na criança e criar um fundo para ela. O seu projeto é um dos mais sérios que estou vendo aqui nesta Casa. Não dá para falar em construção de presídio, policiamento, combate à violência, se não estamos combatendo na raiz; não estamos eliminando o mal na raiz. Vamos eliminar os traficantes de hoje, os bandidos de hoje, mas também estão surgindo outros. Não que queiram, não pela cultura, mas porque eles são obrigados, para comer, para viver, para terem alguma coisa, e acabam caindo na marginalidade, lamentavelmente. A falta de investimento na agricultura, no interior, o êxodo rural, tudo isso é um problema grave que assola o nosso País. Meus cumprimentos, Senadora Patrícia, por esse brilhante pronunciamento e pelo seu projeto.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Muito obrigada, Senador Leonel Pavan. Sempre que venho a esta tribuna defender os direitos da criança e do adolescente, V. Exª tem sido um grande companheiro, solidário nessa luta. Concordo plenamente com V. Exª. Penso que está na hora de levarmos a sério a política social em relação às nossas crianças e aos nossos adolescentes. O que vem acontecendo no Brasil, ao longo dos anos, é que sempre estamos correndo atrás do prejuízo.

Tenho insistido na tese de que se está falando em investimento quando se dá oportunidade a uma mãe de permanecer com o seu filho até os seis meses de idade, quando se constrói uma creche para cuidar com seriedade, com delicadeza das nossas crianças. Está-se investindo quando se cria uma escola boa, de qualidade, como V. Exª fez no seu Município, uma escola em horário integral, em que as crianças têm oportunidade de participar do esporte, do lazer, da cultura, da arte, fazendo políticas que sejam realmente ousadas e que dêem oportunidade aos nossos filhos de saírem da pobreza, de saírem da miséria, da amargura, de serem seduzidas pela prostituição, de serem seduzidas pelo crime organizado, de serem seduzidas pelas drogas, pelo álcool e por tantas outras mazelas que vemos no dia-a-dia da nossa sociedade.

Portanto, só tenho a agradecer a V. Exª por essas palavras, que me incentivam e me estimulam, cada vez mais, a lutar por aquilo que acredito, com muita convicção, que é uma vida melhor para as nossas crianças.

Com muito prazer, ouço o Senador Rodolpho Tourinho.

O Sr. Rodolpho Tourinho (PFL - BA) - Senadora Patrícia, tenho sido testemunha da sua luta pela criança e pelo adolescente, que é muito importante sobretudo para a região de onde viemos e que representamos, respectivamente, o Ceará e a Bahia. Penso que essa deve ser uma luta permanente, com novos projetos, como o que V. Exª apresenta neste momento, que têm de ser levados adiante. Quero dizer - e tenho certeza de que terei a concordância de V. Exª, não só pelo que temos conversado, apresentando e discutindo esse assunto - que, na próxima semana, apresentarei o relatório de um projeto que eu chamaria de hipocrisia da doação fiscal, que tem a ver com o Estatuto da Criança e do Adolescente; aquilo que é montado como se fosse um teatro, para funcionar - e não funciona - como se fosse algo verdadeiro, mas não é. Temos observado que as doações permitidas pela Constituição para a criança e para o adolescente têm diminuído a cada dia. Então, digo que é hipocrisia porque a lei permite, a Constituição prevê, mas a norma impede. Por isso, nosso relatório será exatamente no sentido de não permitir que a norma venha a impedir o desejo expresso na Constituição em relação a doações para crianças e adolescentes. Atualmente, a grande maioria das empresas que pagam imposto neste País - em razão do lucro presumido - não pode doar. Em relação às outras empresas - estamos tratando de pessoas jurídicas -, essas só podem doar naquela parcela menor que recolhem, não na parcela maior. E para a pessoa física existe um grande obstáculo, que é o contribuinte não fazer a doação naquele momento em que está decidindo o seu Imposto de Renda, mas sim, ao longo do ano anterior. No tempo do incentivo fiscal, não era assim - não sei se V. Exª se lembra. Era o contrário, podia na hora. Mas, para criança e adolescente, não pode. Então, estou apenas citando esse projeto e o relatório que vou fazer, no sentido de me somar a essa luta de V. Exª, a que tenho assistido e sobre a qual temos conversado tanto. Tenho certeza de que, por meio desses projetos, que são sérios e importantes, conseguiremos efetivamente melhorar a qualidade de vida dessas crianças e adolescentes do País, sobretudo em nossa região, Senadora.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Obrigada, Senador Rodolpho Tourinho. Tenho uma admiração, um apreço, um respeito enorme por V. Exª. Já confessei isso aqui diversas vezes, principalmente na época em que eu presidia a CPI. Por sentar-se ao meu lado e por ser uma pessoa que tem tanta sensibilidade também nessa área, além de tantas outras, V. Exª foi e tem sido um grande amigo, tem nos ajudado em momentos muito difíceis, momentos em que fico meio perplexa, às vezes até pensando: meu Deus, será que vão me ouvir? Será que um dia vão ouvir isso que eu estou dizendo? O Senador Tourinho sempre foi essa pessoa que me deu todo o apoio, eu diria até de forma muito carinhosa, ouvindo-me e sendo solidário sempre a tudo isso.

Fiquei muito feliz, Senadora Heloísa Helena, quando soube que seria, então, o Senador Tourinho o relator dessa matéria, que é de fundamental importância, uma demanda bastante antiga da sociedade. Tenho certeza de que, com esse parecer do Senador Tourinho, também poderemos arrecadar recursos para o Fundo Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente e, conseqüentemente, para os fundos estaduais, para os fundos municipais, melhorando também a condição das políticas sociais que precisam ser urgentemente implementadas no nosso País.

Portanto, Senador Tourinho, quero agradecer-lhe, mais uma vez, pela forma sensível e carinhosa como V. Exª tem nos ajudado nessa luta pela criança e pelo adolescente.

Agora, ouço, para concluir, com muito prazer, com muito carinho, a Senadora Heloísa Helena - e, em seguida, a Senadora Ideli -, que tem se destacado pela defesa intransigente das pessoas mais pobres, mais humildes, mais sofridas, e principalmente pela autoria de um projeto de que tive o privilégio de participar, discutindo com S. Exª, em diversas ocasiões, que garante a creche para as crianças do nosso País.

Portanto, ouço, com muito prazer, a Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Senadora Patrícia, sabem todos do carinho, do respeito e da admiração que tenho por V. Exª, como mulher, como mãe, como pessoa, como trabalhadora, como Senadora. Em relação à criança, digo que ela é uma causa preciosa, especial, não a única, mas a mais preciosa delas, porque mais preciosa haverá de ser mesmo. Nem vou repetir as mais belas passagens bíblicas que tratam do papel das criancinhas, do significado das crianças no reino do Pai Celestial. Mas por quê? Porque nunca houve - não é pelo que V. Exª verbaliza, não é pelo discurso -, todos sabemos que nunca houve, não há, nunca haverá uma maldita personalidade política que deixe de verbalizar o compromisso com a criança. Há questões de que todos os políticos falam: o honesto e o vagabundo; o sério e o delinqüente; o que patrocina a honestidade no mundo público e o que patrocina o banditismo político. Todos no palanque verbalizam o compromisso com a criança. É algo inimaginável. No entanto, quando observamos a realidade objetiva, como aquela que emocionou V. Exª e que a levou não apenas às lágrimas, mas às lágrimas e à luta em defesa das crianças vítimas da exploração sexual; quando se analisa quem está adotando as crianças pobres brasileiras - isso é o mais doloroso de se identificar -, Senador Tourinho, Senador Pavan, as crianças pobres dos morros, das favelas, das periferias, esteja em Alagoas, no Rio de Janeiro, em Minas Gerais ou em qualquer lugar, quem as está adotando é a maldita estrutura do narcotráfico e do crime organizado. E a faixa etária é cada vez menor. O menininho, Senador Wellington, que vira olheiro do narcotráfico é aquele de cinco, seis anos, que se esconde melhor em uma caixa velha para identificar melhor, quando sobe ao morro, o aparato de segurança pública. E esse menininho que é adotado pela estrutura da marginalidade - à qual seus pais muitas vezes já recorreram como último refúgio - ganha, como prêmio, um sanduíchezinho de mortadela, a “proteção” e a introdução ao crack, porque é através da introdução no mundo das drogas que ele será absolutamente dependente das drogas e usado pela estrutura do narcotráfico. É por isso que é muito importante o projeto de V. Exª, a luta de V. Exª. É muito importante que este Congresso Nacional, além de legislar, seja capaz de fiscalizar a execução orçamentária. Não é possível uma coisa dessas. Não é possível que tudo que é pensado pelas mulheres e homens de bem e de paz - minoria, porém muitos, no Congresso Nacional -, que tudo que é pensado, projetado e apresentado na legislação do País ou na proposta orçamentária vire letra morta, gasta e vazia ou um instrumento de maldita promiscuidade. O governo anterior fazia e o atual governo faz um balcão de negócios sujos para a liberação das emendas da creche, da escola ou de qualquer outra coisa. Isso é muito doloroso, porque não ataca o parlamentar, pois os nossos filhos - somos mães não apenas um dia da semana, mas, muitas vezes, somos pai e mãe segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e domingo - já não precisam mais do aparelho de Estado, embora possam até ser vítimas indiretas do aparelho de Estado que desfavorece o filho da pobreza, que acaba matando o filho da classe média, como já vivenciamos muitas experiências dolorosas. Eu já tive oportunidade de falar aqui sobre um casal de amigos nossos da universidade, do Otávio e da Belmira. A tese de doutorado do Otávio foi sobre a tragédia do capitalismo e a violência na modernidade, e sua esposa, Belmira, professora da universidade, dedicou os últimos anos da sua vida em alternativas de combate à violência contra a mulher. O filhinho mais novo deles, o filho caçula, de vinte anos, que morava em casa, foi assassinado por outro menino de vinte anos. O menino de vinte anos que assassinou foi à televisão e, na mais absoluta frieza - por que a frieza? Porque a sociedade é tão maldita que retira dele toda a emoção, toda a ternura e todo o respeito que ele poderia ter por outras pessoas -, e na mais absoluta frieza, disse: “matei porque ele reagiu ao assalto”. Então, não é uma coisa qualquer o que está acontecendo no País, do mesmo jeito que não é uma coisa qualquer o projeto que vamos discutir. O projeto do Fundeb não está sendo votado na Câmara, mas poderá ser votado hoje ou na próxima semana. Aí queremos ver, no debate que será feito aqui, quem tem compromisso com a educação pública, gratuita e de qualidade e quem verbaliza o compromisso e se distancia dele não apenas no que diz respeito ao ensino fundamental, ao ensino profissionalizante, ao ensino de jovens e adultos, ao ensino médio, mas também à educação infantil. Não é possível que um País como o nosso, Senador Tourinho, não seja capaz de assumir o compromisso de dizer que o Estado vai acolher 100% das suas crianças. Uma ova que não tem dinheiro! Mentira safada, desqualificada, farsa técnica e fraude política dizer que não tem dinheiro para acolher as nossas crianças de zero a seis anos, porque pode até acontecer, mas é muito difícil uma criança que é acolhida, que é adotada pela estrutura do Estado, de zero a seis anos... Como sabe V. Exª, Senador Rodolpho Tourinho, de zero a seis anos é que acontecem todas as conexões neurológicas. Ninguém pode dizer que o filho do Senador é mais inteligente do que o filho do favelado. Mentira! É naquela faixa etária que acontecem as conexões neurológicas, quando a criança precisa ter acesso ao aprendizado, quando ela não pode ter experiências traumáticas, que marcarão para sempre sua alma e seu coração. É nessa faixa etária que ela não pode vivenciar experiências que a marcarão para o resto da vida, porque não se recompõe a infância de uma criança. Esse é o problema. Uma experiência dolorosa que se tenha na fase adulta pode ser superada, mas uma experiência dolorosa na infância nunca poderá ser reconstituída e marcará essa criança para o resto da vida. A infância não se recupera; as fases na vida adulta, sim, mas a infância não pode ser recuperada. É por isso que quero saudar - desculpe ter me alongado no aparte -, mas quero saudar com entusiasmo não apenas o projeto de V. Exª, mas a sua vivência nesta Casa e ao longo da sua história de vida defendendo - é claro que V. Exª defende - os idosos, como eu defendo, a juventude, os pobres, os filhos da pobreza, mas defendendo também aqueles que são mais frágeis, aqueles que muitas vezes ocupam os malditos discursos oficiais e que sempre são vítimas do abismo entre o que falam e o que fazem, entre o que aprovam e o que implementam, entre o que aprovam no Orçamento e o que executam. Portanto, o meu tributo a V. Exª, a minha homenagem a V. Exª pela sua luta, pela sua dedicação, como mulher, como mãe e como pessoa, além de ser militante, Senadora competente, exemplar para todos nós.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Obrigada, Senadora Heloísa Helena.

Cada vez que escuto V. Exª falar, eu me emociono, porque nós, que vivemos na política, sabemos perfeitamente quando uma pessoa apenas verbaliza algo e quando realmente sente a necessidade, a vontade, o desejo de poder transformar. Nas suas palavras, sempre encontro essa pessoa, essa mulher guerreira, forte, que aqui se exalta, que aqui fala grosso e que, ao mesmo tempo, consegue ser esta doçura, esta meiguice, esta mãe tão carinhosa, esta mãe tão protetora, esta mãe tão querida, esta mulher que, certamente, nos ensina muita coisa.

Tenho aprendido muito com V. Exª, Senadora Heloísa Helena, nesta Casa. Tenho aprendido muito, apesar de estarmos em posições políticas diferentes, mas a cada dia aprendo mais, com sua sensibilidade, com sua força, com sua coragem e com a sua determinação, o valor de se fazer uma política séria, honesta, uma política com P maiúsculo, como dizia meu avô. 

V. Exª toca num ponto muito importante, que é justamente a primeira infância, a educação infantil, que aqui alguns de nós, Senadores, temos debatido. São as crianças que mais precisam, são as mais frágeis, são as mais vulneráveis, são as que mais são abandonadas, são as que mais são seduzidas, são as que mais são cooptadas pelo crime organizado e por tantas outras coisas.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, se não formos capazes, todos nós, o Congresso, os governantes, o Presidente de República, os prefeitos, os deputados, os vereadores - e meu esforço tem sido, não só aqui no Congresso, mas também viajando, no meu Estado e em outros, percorrendo municípios, pedir que em cada lugar tenhamos pelo menos um parlamentar que seja referência no cuidado, no zelo pelas nossas crianças e pelos nossos adolescentes. Pouco a pouco, temos conseguido muito êxito em relação a isso.

Antes de passar a palavra à Senadora Ideli Salvatti e de encerrar minhas palavras, quero falar de um Prefeito do meu Estado a quem lancei um desafio quando trabalhava no projeto que prorroga a licença-maternidade de quatro para seis meses. Eu dizia ao Prefeito Marcos, de Beberibe, do PT, Partido de V. Exª, Senadora Ideli Salvatti: “Prefeito, aceite esse desafio”. No dia seguinte, ele marcou uma sessão extraordinária na Câmara Municipal, aprovou o projeto e hoje todas as funcionárias da Prefeitura de Beberibe, Município do meu Estado, do qual tenho muito orgulho, têm a licença-maternidade prorrogada de quatro para seis meses. As mulheres, que vivem, em média, de 72 a 74 anos, agora poderão permanecer seis meses junto a seus filhos recém-nascidos.

Escutei a Senadora Serys Slhessarenko, defensora da causa das mulheres e das crianças, falar, um dia, uma frase que tenho, com a sua permissão, Senadora, repetido em todos os lugares onde chego para falar das crianças: nós, mulheres, somos 52% da população; os outros 48% são nossos filhos. Está na hora de respeitar as mulheres. Está na hora de respeitar nossos filhos. Está na hora de dar a eles condição de crescer. Que esses discursos que sempre são feitos nas campanhas políticas possam se tornar realidade.

Agradeço, sensibilizada, mais uma vez, as palavras tão delicadas, tão generosas da Senadora Heloísa Helena. Espero que a nossa luta aqui continue cada vez com mais força, com mais vontade, com mais garra, aprovando este projeto e tantos outros não só evidentemente os meus, mas daqueles que desejam ver uma vida melhor para as nossas crianças.

Vou encerrar - prometo, Presidente, mas esperei desde às 9h30 para falar - concedendo o aparte à Senadora Ideli Salvatti, com muita honra.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Agradeço, Senadora Patrícia. Não sei se V. Exª conhece inveja positiva. Conhece?

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Eu a tenho do seu projeto que foi sancionado, de que fui Relatora, que é espetacular. Esse é um exemplo de inveja positiva.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Há uma música cantada pelo Milton Nascimento que retrata bem essa inveja positiva. Diz assim: “Certas canções que ouço cabem tão dentro de mim, que perguntar carece como não fui eu que fiz”. Então, Senadora Patrícia, o projeto de V. Exª é maravilhoso. Eu tenho inveja porque realmente ele é muito significativo, vai permitir que tenhamos em números um acréscimo significativo de recursos que vêm do crime para prevenir o crime.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Exatamente.

A Srª Ideli Salvatti (Bloco/PT - SC) - Vêm do crime para prevenir o crime. É a melhor destinação que podemos dar ao dinheiro do crime: prevenção do crime. Outro projeto de que tenho inveja positiva é aquele que o Senador Rodolpho Tourinho vai relatar. Quando vim para esta Casa como Senadora, vim com a idéia de mexer no Fundo da Infância e da Adolescência, porque, da forma como está o repasse do Imposto de Renda, é impossível ser feito mesmo. Não há condição. Espero que consigamos aprimorar e que tenhamos a aprovação de muitos projetos que causem inveja positiva, sempre, principalmente para crianças.

A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE) - Obrigada, Senadora Ideli Salvatti. Além de invejar positivamente o seu projeto que permite que as mulheres, ao terem seus filhos na maternidade, possam estar acompanhadas da pessoa que escolherem, também tenho inveja evidentemente dessa canção tão bonita com que acabou de nos presentear neste plenário. Agradeço a V. Exª pelo apoio, pela dedicação, pela forma como tem trabalhado, agido como membro da nossa CPI que investigou as redes de exploração sexual, que foi de fundamental importância para que pudéssemos aprovar uma nova legislação, para que pudéssemos trazer esse assunto à tona e pudéssemos fazer desse debate um fruto para melhorar a condição de vida nosso povo.

Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/01/2006 - Página 1170