Discurso durante a 11ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Leitura e comentários sobre a matéria publicada pela revista Veja desta semana, intitulada "Valério ameaça falar".

Autor
Almeida Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Leitura e comentários sobre a matéria publicada pela revista Veja desta semana, intitulada "Valério ameaça falar".
Publicação
Publicação no DSF de 08/03/2006 - Página 7085
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT). ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DECLARAÇÃO, PUBLICITARIO, VINCULAÇÃO, CORRUPÇÃO, MESADA, GOVERNO FEDERAL, AMEAÇA, DENUNCIA, PARTICIPAÇÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), QUEBRA, ACORDO, OBJETIVO, PROTEÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
  • APOIO, RELATOR, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), ASSOCIADO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB).
  • DEFESA, PRORROGAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), NECESSIDADE, DEPOIMENTO, PUBLICITARIO, NEGOCIAÇÃO, DELAÇÃO, CORRUPÇÃO.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, DISCURSO, ORADOR, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMPROVAÇÃO, RECEBIMENTO, INJUSTIÇA, OFENSA, CRITICA, IMPRENSA.

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não tenho conhecimento se esta matéria da revista Veja desta semana tenha sido objeto de leitura no Plenário desta Casa, mas,usando um jargão jurídico, “o que abunda não vicia”. Considero que a matéria é muito importante:

Valério ameaça falar.

O publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, o pagador do mensalão, sentindo-se emparedado pela CPI dos Correios, anda ameaçando fazer revelações capazes de dar nova dimensão à crise - e, além do PT, está deixando o PMDB de cabelo em pé.

Àqueles que não sabem, quero dizer que sou do PMDB.

Do fim de dezembro até agora, o publicitário conversou pelo menos três vezes por telefone com o ex-deputado José Borba, ex-líder do PMDB na Câmara que renunciou ao mandato em outubro passado quando se descobriu que embolsara 2,1 milhões de reais no valerioduto. Nas conversas telefônicas com Borba, Marcos Valério tem lembrado um acordo selado no começo do escândalo: o PMDB colocaria na CPI dos Correios um relator capaz de dar proteção a Marcos Valério, que, em troca, manteria silêncio sobre o envolvimento de peemedebistas com o mensalão. Como já ficou demonstrado que Osmar Serraglio, o relator da CPI dos Correios, não fez acordo algum nem pretende protegê-lo, Marcos Valério ameaça contar o que sabe. Veja ouviu dois senadores que conversaram com Borba. Eles disseram que o publicitário ameaça disparar três petardos que fisgam o PMDB e, claro, o PT.

O terceiro dos três petardos diz o seguinte:

O publicitário tem avisado que pode revelar detalhes de como, nos primeiros meses de 2004, repassou dinheiro para que José Borba pagasse o apresentador Carlos Massa, o Ratinho. O apresentador, em troca do dinheiro, passaria a usar seu programa no SBT como palanque para promover o presidente Lula e a então prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, que se encontrava em campanha eleitoral. (Como se sabe, Ratinho fez uma longa entrevista com Lula durante um churrasco na Granja do Torto. A entrevista-churrasco foi exaustivamente reprisada no seu programa, mas o apresentador sempre negou que tivesse recebido qualquer pagamento.)

O publicitário Marcos Valério, de fato, manteve relações estreitas com José Borba. Um ex-auxiliar do PMDB, que privou da intimidade do ex-deputado, conta que Borba tinha encontros freqüentes com Marcos Valério no hotel Sofitel, no bairro do Ibirapuera, em São Paulo. Nesses encontros, além de Borba e Valério, outros dois personagens das sombras costumavam aparecer: o então tesoureiro do PT, Delúbio Soares, e o advogado Roberto Bertholdo, braço direito de Borba e então membro do conselho de administração de Itaipu. Entre setembro de 2004 e março de 2005, os quatro fizeram pelo menos quatro reuniões no Sofitel. O ex-auxiliar do PMDB, que conversou com Veja sob a condição de ficar no anonimato nunca participou das reuniões, mas sabe que, depois delas, Borba voltava para Brasília e, numa saleta ao lado do seu gabinete de líder, recebia filas de deputados do PMDB. Mas havia uma logística curiosa: os deputados entravam na saleta um a um, nunca em grupo. O entra-e-sai ocorria quase sempre à noite.

Vejam:

O advogado Roberto Bertholdo, sendo o principal assessor de José Borba, era o encarregado de operar o mensalão dentro do PMDB. Um ex-aliado de Bertholdo, em conversa de quase cinco horas com Veja, contou detalhes da façanha. Ele diz que Bertholdo distribuía o mensalão a 55 dos 81 deputados do PMDB. Todos os 55 deputados pertenciam à base do governo. A mesada variava entre 15.000 reais e 200.000 mil reais, conforme o cacife do deputado mensaleiro. O ex-aliado conta que Bertholdo adorava exercer esse papel e, como trabalhava em nome dos interesses do governo, achava que pairava acima da lei. Numa ocasião, em meados de 2004, querendo exibir seu poder, Bertholdo telefonou ao ex-aliado e convidou-o a visitá-lo no Aeroporto Afonso Penna, em São José dos Pinhais. Era noite e chovia nas franjas de Curitiba. Ao chegar ao aeroporto, o ex-aliado encontrou Bertholdo a bordo do Citation II [o avião] que costumava usar e que pertencia ao empresário paranaense Wadi Debes. Dentro do avião, esparramado sobre uma poltrona de couro, Bertholdo mostrou ao amigo uma caixa de papelão aberta, cheia de dinheiro.

‘Tem 8 milhões de reais aí’, disse Bertholdo. Diante da surpresa do interlocutor, que lhe perguntou se não tinha receio de ser preso com tanto dinheiro vivo, Bertholdo respondeu com a empáfia que só a certeza da impunidade proporciona: “Que perigo, o quê? Eu tô operando para o governo”. Na semana passada, VEJA teve acesso a um conjunto de gravações de conversas de Bertholdo nas quais fica claríssimo que, de fato, ele operava em nome do governo - e, nessas conversas, aparecem os bastidores de uma negociação com quem? Com Ratinho, para fazer propaganda do presidente Lula e da ex-prefeita Marta Suplicy. As gravações, que somam quase 200 horas, foram realizadas em 2004 pelo advogado Sérgio Renato Costa Filho, então sócio de Bertholdo no escritório Bertholdo & Costa Advogados. Como Costa Filho gravou as próprias conversas com o Bertholdo, a arapongagem não constitui crime - embora seu conteúdo, já em poder da Polícia Federal, seja suficiente para enquadrar o homem da mala do PMDB em uma fieira de artigos do Código Penal.

Em um dos trechos das gravações, Bertholdo revela ao sócio que está intermediando um acordo entre Ratinho e o PT para que o apresentador fale bem do partido em 2004. “O PT topou pagar. Cinco paus”, diz Bertholdo. A polícia acredita que “cinco paus” sejam 5 milhões de reais. Em outro trecho, Bertholdo informa que a negociação conta também com a presença do então tesoureiro do PT, Delúbio Soares. [A revista traz a transcrição desses diálogos.] Como era maquinista do trem pagador do PMDB, Bertholdo priorizava seu partido quando surgia, digamos assim, um conflito de interesses. Um caso emblemático ocorreu em Itaipu, onde Bertholdo foi conselheiro de 2003 a fevereiro de 2005. Em uma das conversas gravadas pelo sócio, Bertholdo diz que o diretor-geral de Itaipu, o petista Jorge Samek, cobrou 6 milhões de dólares de propina da empresa Voith Siemens para perdoar uma dívida de 200 milhões de dólares para com a estatal. Ele fica uma fera ao saber que o PMDB fora excluído da negociata. “Temos que pegar pelo menos três”, diz Bertholdo.

Há um complemento da matéria que requeiro à Mesa que seja dado como lido, um trecho final. Porém, o mais importante e que me deixou atônito já foi lido.

Em primeiro lugar, repetindo, eu devo dizer o seguinte: eu sou do PMDB, e quero dizer que o Deputado Osmar Serraglio tem demonstrado seriedade e que, portanto, precisa do respaldo do PMDB, do Congresso Nacional e da sociedade brasileira. Não se pode abandonar o Relator da CPI dos Correios neste momento! O Deputado Osmar Serraglio não pode ser atirado às feras!

Segundo, é preciso que se defenda, sobretudo aqueles que não têm rabo preso e telhado de vidro, a prorrogação da CPI dos Correios, não por trinta ou por quarenta e cinco dias, mas por três ou quatro meses. Aliás, bom seria é que a Constituição brasileira permitisse CPI contra a corrupção instalada ad aeternum, sem prazo para terminar. Imaginava-se que tudo estivesse esclarecido, mas agora a revista Veja traz o “mensalão 2”.

Terceiro: o Marcos Valério precisa falar. Recordo-me, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de que, em minha primeira participação na CPI dos Correios, perguntei ao Marcos Valério, em seu primeiro depoimento, exatamente o seguinte - Senadora Heloísa Helena, preste bem atenção. Dirigi-me ao depoente e perguntei se ele confirmava que tinha comparecido à Procuradoria da República para uma negociação jurídica, uma transação jurídica no sentido de prestar esclarecimentos em troca de benefícios na sua pena. Ele confirmou, dizendo que “sim” - não quis confirmar, mas confirmou, até porque o fato era público. Então cheguei à conclusão: “Quer dizer que o senhor tem algo mais a declarar - tanto, que está tentando negociar juridicamente -, mas à CPI no Senado, no Congresso Nacional, o senhor não se dispõe a dizer a verdade?”

Deixei a CPI - indicado por meu partido, fui para outra -, mas entendo que o Marcos Valério precisa falar. E tenho certeza de que o Deputado Osmar Serraglio vai contribuir com esse processo de soltura da língua do Sr. Marcos Valério. Tenho plena convicção de que Osmar Serraglio não vai compactuar em hipótese alguma com essa situação. Inclusive, conversei com S. Exª rapidamente hoje nos corredores do Senado.

Mesmo que esse senhor não solte a sua língua, a esta altura, em benefício maior da sociedade, é preciso acenar com uma negociação jurídica para o Sr. Marcos Valério, com o “careca”. Em benefício do País, é preciso fazer isso, porque esse homem hoje, podemos afirmar, é um pinto; esse senhor hoje é um pequeno em meio a uma grande selva de corruptos espalhados neste País. Na pressão ou numa negociação, esse cidadão precisa falar.

Sr. Presidente, com a benevolência de V. Exª, quero ainda dizer o seguinte: os senhores e as senhoras aqui se recordam - e acho que o Brasil também - de um pronunciamento que fiz daquela tribuna, no dia 2 de março de 2004, quando ainda os escândalos não estavam escancarados. Fiz a denúncia do Sr. José Dirceu e vi o céu do Brasil cair sobre a minha cabeça. Fui triturado pela imprensa do meu País quando, em 2 de março de 2004, eu disse que o Sr. José Dirceu era um corrupto e tinha envolvimento com a corrupção e com o caso Waldomiro Diniz. Deste Plenário, claro que com as honrosas exceções, recebi muita pancada. Recordo-me ainda hoje do que ouvi - aliás, tenho os textos gravados num boletim que fiz.

Eu disse hoje que trataria desta questão aos poucos; eu iria dando respostas individuais, um por um. Eu já dei uma resposta à Senadora Ideli Salvatti quando ela disse que o meu pronunciamento era uma montanha que não tinha parido sequer um rato - ela disse isso naquela tarde de 2 de março. Eu disse que, de fato, não tinha, mas que o partido dela teria parido muitas ratazanas.

Eu me recordo, meu querido povo brasileiro, a quem eu quero me dirigir especialmente neste momento, de que o Sr. Carlos Massa, o Ratinho, apresentador de um programa no SBT, foi um dos que fizeram a maior chacota deste Senador. Fui triturado neste País sem ter cometido nenhum ato de corrupção. Ao contrário, sempre combati e critiquei corruptos, como a história mostrou e ficou provado. Só faltaram arrancar o meu couro, porque a minha alma arrancaram. A minha filha, Juliana Almeida Tavares de Lima, hoje uma acadêmica de Direito, após ter visto o Ratinho me esculhambando naquela noite em Aracaju, recebeu-me chorando.

Pois bem; o Ratinho, exatamente no início de 2004, no momento em que fiz aquele pronunciamento, teria recebido “cinco paus”, cinco milhões de reais para defender o Governo e tentar jogar lama num Senador que, graças a Deus, tem uma vida pública contra a qual ninguém nunca teve condição de levantar sequer meia palavra - e já fui Executivo e Legislativo!

Pois bem; o Ratinho... Ratinho coisa nenhuma; ratão; aliás, Dom Ratón. Esse Ratinho do SBT não é um ratinho, é uma ratazana! Está aqui na Veja, nas declarações. Porque é da imprensa, não vou perdoar nenhum, nenhum. E, aos poucos, falarei de todos eles.

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Senador Almeida Lima, um minuto para concluir, visto que já prorrogamos por cinco minutos o seu tempo.

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE) - Atesto a generosidade de V. Exª. Compreendo. Sei que aqui temos de obedecer ao tempo. Mas me permita, por gentileza, para concluir.

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - V. Exª tem 40 segundos.

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE) - Houve uma nobre jornalista do jornal O Globo que fez uma chacota comigo em um artigo. Ela não deve estar aqui hoje. Gostaria de falar na sua presença, mas ela vai tomar conhecimento. Permita-me, pois, só para concluir.

Outro dia, tomei conhecimento de um artigo do jornalista Sebastião Nery, sob o título ombudsman. Ele dizia assim:

Tereza, a Incrível, diz em O Globo que “já se prevê um final melancólico (sic) para a CPI dos Correios: a CPI que investigou as denúncias de Roberto Jefferson comprovou a existência do valerioduto, desvendou o esquema oculto de financiamento do PT e dos aliados, mas não provou tudo (sic) que foi dito, nem o mensalão (sic) na forma descrita por Jefferson, nem a existência de um sistema organizado de corrupção (sic) no governo, que desviava dinheiro público para os cofres petistas”.

A doce Tereza [prossegue Sebastião Nery] deve ter tido uma recaída stalinista. Ela queria fuzilamentos. A não ser que, nos saudosos jantares que fazia para Lula, Dirceu e a turma do Planalto, tivesse ficado sabendo de coisas ainda mais escabrosas.

(Interrupção do som.)

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE) - É só esta parte que gostaria de destacar, Sr. Presidente. A senhora jornalista Tereza Cruvinel era a cozinheira do Palácio do Planalto, de Lula, de José Dirceu e da turma do Planalto. Então, é por isso que, naquela semana, no artigo que escreveu, ela fez chacota deste Senador, coisa que não deveria ter feito, pois, inclusive, deu-me apelidos para tentar diminuir a minha dignidade e a minha estatura moral.

Tenho aqui um adversário político - não é inimigo - do meu Estado de Sergipe, o Senador Antonio Carlos Valadares, que, como todo o Sergipe, sabe qual foi e qual é a minha trajetória política. Sempre tive dignidade e continuarei tendo, mas jamais vou permitir que façam ou tentem diminuir a minha honra. Esperei e ainda estou esperando para dar respostas a outras...

(Interrupção do som.)

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Peço a sua compreensão.

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE) - Concluo, Sr. Presidente. Não é possível que uma jornalista da estatura de Tereza Cruvinel, que admiro, pela relação pessoal de intimidade e amizade, até como cozinheira do Planalto do Planalto, de Lula - como disse o jornalista Sebastião Nery - tivesse se prestado a isto: em um artigo de jornal, tentar desmanchar a minha dignidade e a minha honra.

A história aí está. Sou PMDB, mas quero que se apure tudo isso e que se prorrogue a CPI por 30, 60, 90, 120 dias para que tudo fique devidamente apurado. E aqueles que não me conhecem, procurem me conhecer melhor para depois tentar diminuir a minha dignidade.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/03/2006 - Página 7085