Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações a respeito da inclusão social dos portadores de necessidades especiais. Encaminhamento à Comissão de Direitos Humanos de solicitação de audiência pública para discussão da questão da dependência química. Defesa da Deputada Denise Frossard em episódio sobre relatório referente aos direitos dos portadores de necessidades especiais.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL. DROGA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Considerações a respeito da inclusão social dos portadores de necessidades especiais. Encaminhamento à Comissão de Direitos Humanos de solicitação de audiência pública para discussão da questão da dependência química. Defesa da Deputada Denise Frossard em episódio sobre relatório referente aos direitos dos portadores de necessidades especiais.
Aparteantes
Sérgio Zambiasi.
Publicação
Publicação no DSF de 25/02/2006 - Página 6612
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL. DROGA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • IMPORTANCIA, DEBATE, INCLUSÃO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, SAUDAÇÃO, APROVAÇÃO, EXAME VESTIBULAR, UNIVERSIDADE DE BRASILIA (UNB), SERVIDOR, CEGO, GABINETE, ORADOR, LEITURA, DEPOIMENTO.
  • DEFESA, URGENCIA, APROVAÇÃO, ESTATUTO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, COMENTARIO, TRAMITAÇÃO, DEBATE, SOCIEDADE CIVIL.
  • ELOGIO, PROJETO, INCLUSÃO, CIDADANIA, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), PARCERIA, INICIATIVA PRIVADA, GOVERNO MUNICIPAL, GOVERNO ESTADUAL.
  • DEBATE, GRAVIDADE, DEPENDENCIA, DROGA, JUVENTUDE, ALCOOLISMO, ANUNCIO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS.
  • DEFESA, DENISE FROSSARD, DEPUTADO FEDERAL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), RATIFICAÇÃO, RELATORIO, PROJETO, BENEFICIO, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, ELOGIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Heloísa Helena; Senador Sérgio Zambiasi; Srªs Senadoras e Srs. Senadores, uso a tribuna hoje para falar de um caso específico, mas que, no meu entendimento, é um exemplo a ser seguido por outras pessoas que são portadoras de deficiência.

Senadora Heloísa Helena, sei que V. Exª tem um trabalho belíssimo nessa área. Contou-me experiências vividas ao longo de sua vida, o seu compromisso com a inclusão das pessoas portadoras de deficiência. A sociedade precisa entender a importância e o papel das pessoas com deficiência, que, infelizmente, acabam sendo discriminadas.

Senador Sérgio Zambiasi, aqui presente, sei também que V. Exª tem realizado um trabalho no Rio Grande do Sul. Eu comentava, há minutos, sobre o trabalho que V. Exª tem feito, na Subcomissão que presido, referente à inclusão e ao combate aos preconceitos em relação aos dependentes químicos. Pretendemos - e eu já conversava com V. Exª também sobre isso - dialogar mais, nesta Casa, sobre propostas e encaminhamentos relativos a essa questão. No mínimo, deve ser feito um grande debate, em nível nacional, sobre o tema.

Mas, hoje, quero comentar sobre uma bela surpresa - e tem a ver também com o tema das pessoas portadoras de deficiência - que tive em meu gabinete há uma semana.

Srª Presidente, na semana passada, foi divulgado o resultado do vestibular da UnB. E foi enorme a minha satisfação quando um dos meus assessores, o Luciano, que V. Exª conhece e pelo qual tenho um carinho muito grande, adentrou a minha sala - ele é cego -, dizendo que havia passado no vestibular da UnB. Não é um vestibular qualquer, no meu entendimento, o da UnB.

Acho que a maioria dos Senadores conhece o Luciano, porque ele, seguidamente, está recolhendo assinaturas para projetos e PECs e percorre este plenário quase diariamente. Confesso-lhe, Senadora Heloísa Helena, coisa que eu não havia dito e vou dizer agora, que tenho dito ao Luciano que ele deveria quebrar quase um tabu existente aqui no Congresso. Ele aceitou o desafio e já se inscreveu. Refiro-me ao cão-guia. Ele, por ser cego, tem todo o direito de circular dentro do Congresso Nacional com um cão-guia. Ele está inscrito, mas, até hoje, não veio o cão-guia.

Estou falando do Luciano e da importância de ele ter passado no vestibular como um exemplo a ser seguido, de que é possível chegar lá, inclusive a uma universidade federal. O Luciano escreveu parte deste meu pronunciamento e me perguntou se eu poderia trazê-lo à tribuna. Respondi a ele que sim. Escreveu o Luciano o seguinte texto:

A VITÓRIA DO HOMEM

Nos últimos anos, a minha perda visual se tornou mais significativa. Não enxergo praticamente nada. Todavia, este é também o período onde consegui as minhas maiores vitórias.

Perdi a visão, mas não perdi o amor pela vida.

Preciso destacar, antes de mais nada, que essas vitórias não foram obtidas sem o apoio de grandes amigos que encontrei pelo caminho.

Ao deixar a casa de meus pais no município de Alto Paraíso (GO), e vir para Brasília, morei durante alguns meses com um casal de amigos: Marcos e Denize.

São amigos a quem ele quer aqui agradecer. Confesso que não os conheço.

Contei também com a ajuda da prima Karla, com Maria Helena, através da qual consegui meu emprego aqui e a quem carinhosamente chamo de minha segunda mãe.

Ela que deve ter intercedido aqui junto ao Senado; é bom dizer que o Luciano é contratado pelo Senado e está à disposição de meu gabinete; quero dar o mérito ao Diretor Agaciel, que foi quem contratou o Luciano.

Se pudesse citaria aqui o nome de todos que encontrei e que fazem parte de minha história, que fazem parte daquilo que sou, daquilo que aprendi.

Gostaria de agradecer muito aos professores, funcionários e alunos do Centro de Ensino Especial de Deficientes Visuais - CEEDV; não posso esquecer também dos voluntários do Clube do Ledor que me ajudaram a enxergar os meus limites e minhas possibilidades de atingir meus objetivos.

Gostaria também de agradecer a todos os Senadores e Senadoras o apoio que têm me dado em minha circulação permanente, inclusive no plenário do Senado. Agradeço também a meus colegas de gabinete, no dia-a-dia, no convívio rotineiro, o incentivo que têm me dado.

Tenho que agradecer principalmente...

Repito, para quem está assistindo à TV Senado, que é um rapaz cego que trabalha conosco aqui no Senado.

...minha família: minha mãe, Corina Trindad; meus irmãos: Flávio, Eliane e Leandro e, em especial preciso dedicar esta vitória a meu pai, João Ambrósio, que jamais deixou que eu me sentisse incapaz e que há seis meses partiu deste mundo e não pôde ver ingressar na universidade o único de seus quatro filhos que ainda não possuía formação superior.

Ele dizia sempre: “Nunca desista, vá sempre em frente, seja até um pouco atrevido”.

Preciso agradecer acima de tudo a Deus, a oportunidade da vida, as experiências que me levaram à compreensão de que se me faltam os olhos físicos, não me faltou a visão interior, a visão que me permite ver a beleza da criação de Deus, a beleza do ser humano que traz em si a capacidade da superação dos limites.

Portanto, o texto não é meu, é todo ele do Luciano. Foi ele que o escreveu.

Espero que essas palavras do Luciano sirvam de incentivo a outros portadores de deficiência que sonham com uma vaga na universidade. Não desistam, é o que dizem essas palavras em sua essência e o que tem que estar permanentemente nos acompanhando.

Congresso Federal, não deixe, não perca a oportunidade de aprovar o Estatuto da Pessoa com Deficiência!

Senador Sergio Zambiasi, esse é o texto que o Luciano escreveu e que fiz questão de ler. Ouço agora o aparte de V. Exª.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador Paulo Paim, quero me somar à emoção de V. Exª. Conheço o Luciano, cruzo com ele quase todos os dias nos corredores deste Congresso, onde ele faz, entre muitas outras atividades em seu gabinete, exatamente a coleta de assinaturas.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Ele opera com a maior tranqüilidade os computadores, sem enxergar. Já eu, de olhos abertos, opero quase nada. Inclusive V. Exª, Senadora Heloísa Helena, me ajudou a colocar o slogan há algum tempo.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - E veja V. Exª como nós ainda somos preconceituosos, inclusive nas expressões, pois nós, sociedade, ainda chamamos e identificamos pessoas como o Luciano como deficientes. Na realidade, deficientes, que nada! Essas pessoas, em muitos casos, são mais eficientes que nós, pessoas ditas normais.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito bem colocado.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Quero refletir exatamente sobre essa manifestação, essa mensagem que o Luciano escreveu, essa vitória pessoal dele, rompendo com as inúmeras barreiras que ainda existem para as pessoas portadoras de deficiência. Chamo a atenção para o trabalho de V. Exª, para o Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência. Infelizmente, ainda precisamos de leis para que as pessoas portadoras de deficiência possam ser respeitadas. Lembro, Senador Paulo Paim, que os prédios, as cidades ainda não se adaptaram. Presidi a Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul em 2001 e 2002 e encontrei a Casa absolutamente despreparada para receber pessoas portadoras de deficiência. Os 55 parlamentares e suas assessorias nos mobilizamos para que nos adaptássemos, e o fantástico foi que, na eleição seguinte, dois parlamentares portadores de deficiência foram eleitos e encontraram o plenário adaptado, inclusive com elevador, para chegarem até a tribuna em suas cadeiras de rodas e poderem se manifestar adequadamente com todas as condições.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Esse é um pleito das pessoas com deficiência, inclusive na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, e que V. Exª, quando estávamos juntos à Mesa, já tinha colocado que seria preciso fazer também no Senado. Quero dar este testemunho.

O SR. SÉRGIO ZAMBIASI (PTB - RS) - Presidenta Heloísa Helena, nestes momentos, em que o Parlamento discute essas questões, provocamos reflexões junto à sociedade; temos que olhar como nós, sociedade, estamos buscando soluções para essas questões. É importante realmente levantar o debate, Senador Paulo Paim, e, com isso, fazer andar o Estatuto, para que, logo ali, em frente, esse documento possa estar nas mãos de cada cidadão, nas mãos de cada família, que possa estar lá na sala de aula, para que essa questão comece a ser enfrentada de forma coletiva e, assim, não haja segregação. O grande problema é exatamente a segregação. Lembro, e quero aqui registrar, que, nas últimas feiras do livro, em Porto Alegre - uma das manifestações culturais mais bonitas que acontecem no Brasil e talvez na América do Sul -, a presença do Senado Federal com suas publicações em braile. Distribuímos Constituições em braile, Senador Paulo Paim. Estivemos, junto à Associação de Cegos, recolhendo sugestões para novas publicações, que já estão junto à administração do Congresso. Por isso, cumprimento V. Exª pela abordagem desse tema extremamente importante. Penso que são espaços generosos que estamos recebendo a fim de que a sociedade saiba que estamos preocupados em buscar soluções contra esses preconceitos, que ainda são muito pesados na vida dessas pessoas.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Senador Sérgio Zambiasi, agradeço a V. Exª, que fortalece na sua fala a importância do debate sobre o Estatuto da Pessoa com Deficiência, cujo Relator, Senador Flávio Arns, está dialogando com a sociedade. Disse-me S. Exª, ainda ontem, que a última versão - naturalmente vai apresentar um Substitutivo a partir da visão global da sociedade - será divulgada na semana que vem, já que a CNBB decidiu que a Campanha da Fraternidade buscará a inclusão da pessoa com algum tipo de deficiência. Aproveitando a Campanha da Fraternidade da CNBB deste ano, um dos eixos será o Estatuto da Pessoa com Deficiência.

Terminando essa parte ligada ao Luciano, ele quis somente que eu comentasse na tribuna que o exemplo dele é um dos tantos outros que existem no País. Mas que seja divulgado que é possível chegar lá.

Bom, Srª Presidente, o Luciano, assim como o Santos Fagundes, que trabalha conosco no Rio Grande do Sul, é também cego e cursa, lá no Estado, a Ulbra.

E aqui quero dar um dado interessante. Alguém pergunta: Como é que o Paim se envolveu tanto - são tantos os deficientes - exatamente com os cegos? É que eu tive uma irmã, Senadora Heloísa Helena, que era cega. Infelizmente ela faleceu há cerca de 6 ou 7 meses; tinha glaucoma com diabete e foi chegando a um ponto em que, infelizmente, faleceu.

Só quando senti - e V. Exª também me contava algo semelhante - o problema na família - ela ficou cega há aproximadamente 20 anos -, é que percebi o quanto estávamos longe de entender, trabalhar e contribuir para que a sociedade aceite e não discrimine as pessoas com deficiência.

A Marlene está lá em cima neste momento, e tenho certeza de que ela está nos olhando, pois tem um carinho muito grande por nós todos. Ela não via, naturalmente, porque era totalmente cega, mas ouvia os debates que fazíamos aqui no Congresso Nacional.

Falo um pouquinho também, por questão de justiça, de Santos Fagundes. Um dia talvez possamos trazê-lo aqui para uma audiência pública, e ele vai falar do projeto Cantando as Diferenças, do qual é o mentor. Esse projeto cresce muito no Rio Grande do Sul e tem por objetivo a inclusão política, econômica e social das diferenças, articulando municípios e comunidades para a adoção de medidas práticas que contemplem idosos, negros, índios, portadores de deficiência, os que ganham salário mínimo, desempregados, enfim, aquele setor da sociedade que normalmente é marginalizado.

Já temos como parceiros, nessa grande caminhada: Ipesa, Ulbra, Copelmi, Sintec, Medex, Prefeitura Municipal de Gravataí, Prefeitura Municipal de Santa Rita, Prefeitura Municipal de Taquari, Banco do Brasil - já está colaborando com o projeto Cantando as Diferenças -, Comissão dos Direitos Humanos da Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul também já está colaborando com esse projeto - quando digo colaborando, não me refiro a verbas, pois não há verba alguma, mas o fazem divulgando, imprimindo cartazes, participando das audiências, mandando representantes -, Faders e o programa Elo Nativo, da Rádio Vale Feliz - lá do Caí.

Várias cidades estão tendo resultados muito positivos. Houve uma semana do Cantando as Diferenças em que nós, principalmente o Santos Fagundes - eu disse a ele que não adianta o Senador Paulo Paim ir lá fazer o discurso, porque quem tem que falar na praça é ele, que é o articulador -, colocamos quatrocentas, quinhentas, mil, duas mil pessoas na praça para discutir as diferenças. Foi belíssimo. Isso ocorreu em Gravataí, Santa Rita e Itaquari.

No dia 17 de março, o projeto Cantando as Diferenças 2006 será realizado em Gravataí, com apoio do Ministério da Educação nesse caso e da Prefeitura Municipal de Gravataí, por meio da Secretaria de Educação. Teremos também seminários e 36 oficinas que irão abordar as diferenças. Dessas oficinas, todo o material produzido será em forma de poesias, que participarão do Festival Musical do mês de junho em Gravataí. As poesias classificadas serão gravadas em CD.

Esse projeto é uma ampla e gradual mudança do modo de enxergar as mais variadas diferenças de gênero, raça, idade, condição física, ou seja, uma mudança de consciência e atitude - quero dizer que grande parte desse pronunciamento agora que estou fazendo quem escreveu foi Santos Fagundes, sendo que o Luciano escreveu a primeira parte - junto à sociedade, a empresários e ao poder público, pelo reconhecimento da diversidade de sua gente. E, em um resgate histórico, dar-se-á cada vez mais voz à grande maioria do nosso povo, que, por um motivo ou outro, sempre esteve discriminado.

O reconhecimento pelo Estado ao direito pleno da acessibilidade de todos os seus cidadãos, independentemente de sua origem étnica, da faixa etária ou da condição física, aos benefícios de uma política que os contemple com suas diferenças é a expressão plena da cidadania e da democracia.

Srªs e Srs. Senadores, concluindo, Cantando as Diferenças é um projeto de cuja criação tenho muito orgulho de ter participado. A idéia desse projeto surge no Rio Grande do Sul, no CIPP* (Centro de Integração Paulo Paim), que é o símbolo do meu gabinete e cujo coordenador é o Santos Fagundes, junto com o Flávio.

Na verdade, Srª Presidente, esse é um sonho de nós todos, creio, de um dia podermos cantar juntos, homens e mulheres, deficientes ou não, brancos e negros, índios, judeus, palestinos, em que prevaleça, na discriminação religiosa, o culto ecumênico, em que todas as religiões sejam bem-vindas, em uma grande canção, e que a poesia seja o ponto de ligação, pela magia da rima, forma como os poetas, enfim, contam a vida dos povos e da humanidade; em que os desempregados recebam a solidariedade dos empregados e dos próprios empregadores; em que os pobres, Senadora Heloísa Helena - V. Exª bate muito nessa tecla -, possam ter o direito de sentar-se à mesma mesa dos ricos e ver, efetivamente, o pão dividido; em que os idosos e as crianças cantem e caminhem juntos; em que a poesia e a igualdade se encontrem; em que o salário mínimo e os benefícios da Previdência não sejam mais discriminados e, sim, valorizados; em que os homens falem do respeito à natureza. Enfim, Srª Presidente, em que o amor esteja em primeiro lugar. Esse é o Cantando as Diferenças. Por isso, tenho orgulho de ter visto esse projeto nascer, em Canoas, no Rio Grande do Sul.

Senador Sérgio Zambiasi, V. Exª pede mais um aparte, e é com muita satisfação que o concedo a V. Exª.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Senador Paulo Paim, acompanho a sua manifestação, em que faz diversas abordagens, mas, no fundo, aponta para o caminho do respeito e da solidariedade. E é exatamente esse o princípio proposto pelo evento Cantando as Diferenças. São esses movimentos realmente que nos provocam a reflexão, a participação e a superação desses problemas que ainda enfrentamos no nosso dia-a-dia, no nosso cotidiano. V. Exª abriu a sua manifestação abordando uma questão que é comum praticamente em todas as classes sociais, que é o problema da droga, da drogadição. Aliás, um dos jornais de hoje, daqui de Brasília, trata da prisão de sete jovens, aqui no Lago. Até lembro o início da matéria: “Ricos, cultos e traficantes”. Foram apreendidas drogas, e presos seis ou sete rapazes que estariam com alguma reserva de droga para ser vendida agora, no carnaval. Recebi esta semana um e-mail que, com a permissão de V. Exªs, Senador Paim, Senadora Heloísa Helena, eu gostaria de ler para registrar aqui o que é o drama da drogadição junto às famílias pobres das periferias, que buscam socorro, que gritam, mas seus gritos não encontram eco, levando uma mãe a ameaçar jogar-se diante de um carro na frente do fórum para buscar a internação do seu filho adolescente, dependente de drogas, dependente de crack. Quero ler as expressões de quem me mandou o e-mail para que se possa perceber a profundidade do drama que essas pessoas vivem e dimensionar o que é, para uma mãe pobre, que tem dificuldade de pagar uma passagem de ônibus, buscar socorro, lutar para salvar o seu filho de dezesseis anos de idade. É a irmã dele que escreve para mim e, seguramente, para toda a sociedade - ao escolher se dirigir a uma pessoa pública, mostra que quer revelar à sociedade o seu drama e quer denunciar o seu problema.

Meu irmão mais novo é dependente químico. Ele usa, entre outras drogas, pedra (crack). Infelizmente, por este motivo, ele acaba roubando tanto na rua como dentro de casa. Ele tem dezesseis anos e já usa drogas há muito tempo. Nunca quis se ajudar, foi internado várias vezes. Todas essas vezes foi muito complicado, pois minha mãe é faxineira, vive das suas faxinas e do que ganha dos outros. Ela faz o possível e o impossível para ajudá-lo, e dá o que pode para ele e minhas outras duas irmãs. Ela sempre encontra muita dificuldade para interná-lo, precisa pedir passagem aos vizinhos e, quando chega ao fórum, é mal atendida, e nunca deixam ele tempo suficiente nas clínicas para que ele possa se desintoxicar.

E ela acrescenta:

Desta vez foi pior. Apareceram uns homens armados que minha mãe não sabe quem são na casa deles, procurando meu irmão para matá-lo. Eles se fecharam em casa com medo, meu irmão se deitou no chão da cozinha desesperado, com medo que eles atirassem na casa e pegasse nele. Eles rondaram a casa por muito tempo e depois foram embora. No outro dia, minha mãe foi correndo ao fórum pedir socorro. Ela pediu para que prendessem meu irmão...

Vejam só o desespero da mãe: ela vai ao fórum...

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Pedir que prendam o menino para protegê-lo.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Ela foi ao fórum pedir que prendessem o seu filho - como ele é menor, seria uma detenção.

Ela continua:

Ela pediu para que prendessem meu irmão, pois, na cabeça dela, preso ele estaria seguro, pois lá eles não poderiam matá-lo. [Mal sabe a mãe que matam também dentro das prisões.] A advogada disse que isso não era possível, que ela não poderia mandar prendê-lo. Então, minha mãe disse que não ia sair de lá enquanto eles não a ajudassem.

Essa é uma realidade cruel, dura. Algumas elites podem até imaginar que a leitura de uma carta como essa pode ser apelativa, mas acho que não é.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Não é apelativa e V. Exª não está falando de um caso individual, por isso procede a leitura que V. Exª faz. As famílias que têm dependentes químicos e quem está nos assistindo neste momento sabe que essas ameaças são reais e acontecem na maioria das famílias, só que ninguém tem coragem de fazer essa denúncia que V. Exª está fazendo com a leitura da carta que recebeu.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Sei que não é convencional ler uma manifestação como esta num pronunciamento em plenário, mas acho que temos de trazer, Senadora Heloísa Helena, aqui para dentro, a realidade das ruas, a realidade das vilas, a realidade das periferias. É assim que a periferia vive, esse é o cotidiano da periferia, distante da proteção do poder, Senador Paulo Paim, poder inacessível a essas pessoas. 

Sr. Presidente, Srs. Senadores, acho que essa realidade tem de ser descortinada para, de forma coletiva e solidária, buscar-se uma solução.

Perdoe-me, pois minha fala está avançando no tempo de V. Exª. Agradeço a generosidade...

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - O pronunciamento de V. Exª já faz parte do meu discurso, portanto, V. Exª tem todo o direito - entendo que a nossa Presidente também pensa assim - de concluir com a tranqüilidade devida.

A SRª PRESIDENTE (Heloísa Helena. P-SOL - AL) - Para um tema tão importante como este, os senhores terão todo o tempo que entenderem necessário.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - Agradeço a V. Exª, Senadora Heloísa Helena.

Concluo esta minha manifestação dando voz a um desabafo, a um grito de socorro de uma família que chegou às minhas mãos e eu gostaria de tornar público.

Continuo lendo:

Minha mãe disse que não ia sair de lá enquanto eles não a ajudassem ou então sairia e [olhem o desespero da mãe que, não encontrando outra saída, disse que] se atiraria na faixa na frente do fórum.

A pessoa que escreve diz ainda:

Com muita dificuldade conseguiram uma clínica para ele, mas se negaram a ficar com ele por mais de um mês. Disseram que o governo não libera verba, que o prefeito tem de pagar para ele ficar por lá por mais tempo, e ele só paga um mês. Sempre disseram que, quando ele realmente quisesse se ajudar, ele ia ter essa ajuda, mas agora constatamos que isso é mentira. Ele está implorando por ajuda, mas sabe o que fizeram? Liberaram ele em quinze dias, pois disseram que não podem ficar com ele por mais tempo.

Aqui é revelada a dureza da realidade:

Ele é menor, viciado, pobre... e está implorando ajuda. Por favor nos ajude. Não temos dinheiro nem para passagem, quanto mais para pagar uma clínica particular. Se ele voltar para casa vão matá-lo ou então o crack o mata.

As duas opções que o jovem tem: volta para casa, e os que o tornaram dependente podem matá-lo, porque ele tem conta, ele está devendo, ou então o próprio crack vai matá-lo.

Mas parece que ninguém está preocupado com isso. Minha mãe está aterrorizada, doente dos nervos e da pressão. Por favor nos ajude a manter meu irmão vivo.

Quero dizer que tão logo recebi esse e-mail, Senador Paulo Paim, movimentei todas as minhas relações com a comunidade em Porto Alegre. Estamos, junto com a mãe, com a irmã, a família, tentando encontrar saídas. Mobilizei imediatamente o Centro Vita, que V. Exª conhece, o Major Sérgio...

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Conheço. Belíssimo trabalho de V. Exª.

O Sr. Sérgio Zambiasi (PTB - RS) - ...a assistente social Maria Luísa e outras instituições que, de alguma maneira, buscam apoiar pessoas nessas situações. Estamos, junto com a família, tentando reencaminhar esse jovem para que ele possa desintoxicar-se, possa voltar a uma escola e possa, quem sabe, encontrar um caminho adequado para a sua vida.

Fiz questão de utilizar o espaço de sua manifestação porque sei do seu trabalho voltado para essas minorias que, aos poucos, estão se concentrando na base de uma pirâmide de gelo cada vez mais larga e vivendo em situação cada vez mais difícil. Entendemos que o setor público, ou seja, a Prefeitura, o Governo do Estado e o Governo Federal, devem, de forma conjunta, apoiar programas para que essas questões sejam efetivamente combatidas.

Agradeço a generosidade da Presidente Heloísa Helena e a oportunidade que V. Exª, Senador Paulo Paim, abre para que esses temas de relevância social possam ser abordados da tribuna do Congresso Nacional e, repercutindo no País, encontre-se uma saída conjunta. Muito obrigado.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Senador Sérgio Zambiasi, primeiro cumprimento V. Exª pela contribuição que trouxe ao meu pronunciamento. Esse é um tema que considero de suma importância. É a nossa juventude envolvida nessa dependência. Aí, Senadora Heloísa Helena, podemos falar do crack, maconha, cocaína e tantas outras.

Quero partir dessa última frase que V. Exª disse baixinho aí. Ontem assisti a um discurso de V. Exª - também participou o Senador Magno Malta - sobre o álcool. O álcool é uma droga tão perniciosa, tão perigosa e tão maldita quanto essas outras. Ontem, embora estivesse em meu gabinete, ouvi V. Exª dizer aqui - o Senador Magno Malta pode confirmar - que o álcool é tão perigoso quanto essas outras drogas, mas que é mais fácil ter acesso a ele - permita-me repeti-la, Senadora Heloísa Helena.

É mais fácil libertar um jovem da dependência das drogas chamadas pesadas do que do álcool. Quem ficar dependente da bebida alcoólica terá mais dificuldade de se libertar - veja bem o absurdo dessa realidade. Por isso, Senadora Heloísa Helena, encaminhei à Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa - sei que terei o apoio de V. Exª - e foi aprovado por unanimidade, proposta de realizarmos durante o mês de abril, para termos um mês para preparar, uma audiência pública sobre este tema - sei que V. Exª, inclusive, tem diversos projetos que até hoje não foram votados e não sabemos por que não votar projeto nessa área -, para discutirmos esta questão da dependência química na sua amplitude, que vai do álcool, do famoso álcool, a todas as outras. E fazermos um grande debate na sociedade para combater o crime que é cometido contra a nossa juventude.

Mas para concluir, se V. Exª me permitir, Senadora Heloísa Helena, vou falar de uma pessoa que sei que V. Exª gosta muito também. Recebi diversas correspondências em meu gabinete criticando a Deputada Federal do Rio de Janeiro Juíza Denise Frossard, e estranhei: mas a Denise, Deputada que V. Exª e eu conhecemos, por quem temos o maior carinho? Antes de fazer qualquer pronunciamento que fosse ou de fazer uma crítica, até numa rádio do Rio de Janeiro, como estavam propondo, liguei para ela. Depois de falar com ela, resolvi vir à tribuna e falar um pouquinho em defesa dela. Refiro-me, neste momento, a um fato que ocorreu há alguns dias e que a imprensa inclusive veiculou bastante. Refiro-me às palavras utilizadas pela Deputada Juíza Denise Frossard em fundamentação ao seu relatório a um projeto - o de nº 5.448 - que trata da pessoa com deficiência, do Deputado Nelson Pellegrino.

Na ocasião, muito foi dito a respeito, e senti-me no dever de procurar a Deputada e esclarecer o ocorrido. Entrei em contato com a Deputada e prontamente ela me explicou o que estava havendo. Ela me relata que o fato ocorrido foi um erro no parecer de um relatório apresentado, estritamente técnico, de um projeto sobre a pessoa com deficiência.

A Deputada, emocionada, desculpa-se do fato a todas as entidades, salientando inclusive que já havia pedido desculpas publicamente. Ela disse também que o antigo parecer que suscitou a crítica por algumas entidades havia sido recolhido, e ela inclusive, mostrando o seu compromisso com as pessoas com deficiência, pediu que as entidades fizessem o relatório: “Sentem comigo e vamos fazer o relatório a quatro mãos”. Assim mesmo as críticas continuaram a ser colocadas na Internet.

A Deputada esclareceu a questão a todos aqueles que a procuraram, encaminhou correspondência à Coordenação Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, cujas cópias gentilmente encaminhou ao meu gabinete.

Srªs e Srs. Senadores, se fiz menção a este fato é porque senti que abordá-lo era minha obrigação, em defesa de uma pessoa por quem tenho o maior apreço, pela sua conduta ao longo de sua vida, independentemente da questão político-partidária. Fiz isso em nome da sensibilidade que vem a ser o foco deste pronunciamento. Fico feliz que a Deputada Juíza Denise Frossard tenha reconhecido o erro cometido pelo assessor que trabalhou nessa matéria e tenha recolhido o seu relatório para que ele fosse realmente concluído com a participação das entidades das pessoas com deficiência.

Termino dizendo que foi um gesto de coragem, de sensibilidade e de humildade de uma grande mulher. Somente aqueles que conseguem ver, no meu entendimento, além do horizonte é que fazem gestos como este. Por isso, parabéns, Deputada Juíza Denise Frossard.

Esse gesto nos lembra de pronto o quanto temos de tratar com a devida sensibilidade este tema, para não cometer injustiças como essa que queriam fazer com a Deputada. Felizmente, a questão agora está resolvida.

Fico muito feliz também em poder trazer aqui, pelo espaço que V. Exª me permitiu, um pouco da história do Luciano e do Santos. Concluo a minha fala dizendo: parabéns, Santos! Parabéns, Luciano! Vocês são vencedores. Obrigado pelo exemplo que vocês estão dando. Entendo que as pessoas com deficiência haverão de ocupar o espaço a que têm direito na sociedade.

Por isso, Senadora Heloísa Helena, termino dizendo: parabéns Luciano! Parabéns a todos vocês, familiares, entidades e àqueles que se dedicam à causa da inclusão, da participação, da cidadania das pessoas que têm alguma deficiência. Sempre digo que nós todos ao chegarmos na velhice, se Deus quiser, também teremos deficiências. Já as temos hoje. Eu tenho as minhas. Mas teremos outras pela velhice, que é natural: não correremos tanto, já estaremos com a espinha um pouco mais curvada, a memória não será a mesma, a visão não será a mesma, é um processo irreversível. Então, não ter esse carinho, esse respeito com as pessoas bem mais jovens que têm algum tipo de deficiência e com as bem mais velhas que têm outras deficiências e outras mais terão, infelizmente, é não ter solidariedade, é não ter grandeza, é - como eu gostaria de dizer - não ver além do horizonte. Por isso, parabéns a vocês todos que têm sensibilidade com aqueles que são discriminados, entre eles as pessoas com deficiência.

Muito obrigado, Senadora Heloísa Helena.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/02/2006 - Página 6612