Discurso durante a 26ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas à atitude da Deputada Ângela Guadagnin durante a comemoração da absolvição de um colega do PT.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Críticas à atitude da Deputada Ângela Guadagnin durante a comemoração da absolvição de um colega do PT.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 25/03/2006 - Página 9478
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, CONDUTA, DEPUTADO FEDERAL, PLENARIO, CAMARA DOS DEPUTADOS, COMEMORAÇÃO, ABSOLVIÇÃO, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), DENUNCIA, RECEBIMENTO, PROPINA, COBRANÇA, AFASTAMENTO, CONGRESSISTA, CONSELHO, ETICA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, UTILIZAÇÃO, ESTADO, PREJUIZO, CIDADÃO, ESPECIFICAÇÃO, QUEBRA, SIGILO BANCARIO, EMPREGADO DOMESTICO, FAVORECIMENTO, PRESIDENTE, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a paciência abusada vira fúria. Se não me falha a memória, essa frase é de Thomas Fuller.

Venho à tribuna confessar a minha incompetência. Sinceramente, não tenho a necessária competência para refletir, desta tribuna, a indignação que hoje campeia pelo País afora.

Rapidamente, acessei a Internet para verificar, nos e-mails que recebo, o grau de indignação do povo brasileiro diante das imagens de ontem à noite na televisão. Não sei como denominar aquele baile. Não sei como definir aquela dança. Dança macabra? A dança do ridículo, da falta de vergonha? A dança do mensalão? A dança da corrupção? Que festa era aquela, Senadora Serys Slhessarenko? Que saltitar era aquele? A dança da impunidade, da degradação moral, da falência do Poder Legislativo? Não sei se devo definir como a dança do deboche na ilha da fantasia.

Aliás, Senador Mão Santa, podemos levar os nossos filhos à Disneylândia, mas não podemos permitir que se deslumbrem com o impacto dos efeitos especiais, próprios do mundo fantasioso.

Querem transformar Brasília na ilha da fantasia. Não contem conosco, não contem com o povo brasileiro para isso. Não tenho competência, Senadora, para retratar o grau de indignação dos brasileiros relativamente a essa imagem degradada do Congresso Nacional.

Mas creio que a Câmara dos Deputados tem o dever de reagir, e talvez o apelo deva ser feito ao Presidente da Casa, Deputado Aldo Rebelo. Não há como essa “vetusta senhora” permanecer - e Jânio Quadros diria dessa forma, Senadora -, no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. Não sei se caberia, como forma de reagir e de responder às exigências da sociedade indignada, a instauração de um processo por quebra do decoro parlamentar. O plenário da Câmara dos Deputados não se pode transformar em palco para esse baile da indecência.

Enfim, tivemos uma triste semana, quando se desenhou a figura de um Estado policialesco, em que o Estado aparelhado provoca afronta à Constituição com a invasão da privacidade de um trabalhador modesto. Esse aparelhamento do Estado é retratado inclusive no artigo desta insuspeita articulista Miriam Leitão, que diz que o Governo Lula “está usando todo o poder do Estado contra o cidadão. Isso é inadmissível na democracia, mas previsível no Governo Lula”.

Faz referência a esse abuso inusitado contra o trabalhador Francenildo.

Diz ela:

Ontem o Governo escalou e emitiu sinais de que está usando a Caixa, o Coaf e a Polícia Federal para acuar a testemunha. O Coaf investiga as grandes movimentações financeiras. É informado automaticamente apenas de saques acima de R$100 mil. Os valores da conta do Francenildo estão muito abaixo disso.

Portanto, o Presidente Lula é responsável por um Estado policialesco, adotando práticas fascistas, reacionárias, afrontando a Constituição do País e utilizando-se de uma estratégia própria do mundo do crime.

Senador Arthur Virgílio, já estamos acostumados a ver a marginália utilizando-se dessa estratégia de tentar desqualificar quem denuncia e quem investiga para proteger-se das acusações e das investigações. Numa inversão de valores, pretendem investigar o caseiro. Investigam-no de forma legal, usando a Polícia Federal, mas de forma autoritária, usando o aparelho do Estado clandestinamente para invadir a sua privacidade. Investigam-no na esperança de apanhá-lo em postura suspeita na conexão que pretendem com a Oposição, como se estivesse ele sendo orientado para dizer o que viu na chamada “mansão do lobby”, em Brasília, freqüentada pelo Ministro Antonio Palocci.

Ora, Srªs e Srs. Senadores, investiguem o caseiro para valer, agora, porque conferirão a ele certamente o atestado de boa conduta. É um brasileiro que procurou cumprir o seu dever denunciando movimentações suspeitas à margem da ética com a participação de um Ministro de Estado que tem a importância de administrar os negócios da economia nacional.

            Diz Miriam Leitão:

Portanto, a hipótese levantada inicialmente, hoje totalmente desmascarada, de que precisava de tempo para buscar a informação é falsa. Visava a dar tempo à Caixa, onde o Presidente, Jorge Mattoso, arrumava tranqüilamente as malas, certo da impunidade, para ir ao Japão. Quando o tempo fechou em Brasília, ele decidiu não decolar.

Aliás, o Presidente da Caixa foi intimado pela Polícia Federal ontem e não compareceu para prestar depoimento. O seu advogado não apresentou razões, pelo menos por telefone, para a ausência do Presidente da Caixa Econômica.

O caso revela a sem-cerimônia com que o Governo Lula se apossou do Estado, como se fosse seu protetorado e capitania. O Governo do PT tem mostrado uma crônica incapacidade de enxergar a fronteira entre público e privado; entre Estado e Governo.

Aliás, Senador Arthur Virgílio, desde o início das investigações, no seio das diversas CPIs, estamos constatando que o Governo confunde o que é público com o que é privado, e, ao misturá-los, não sabe distinguir. E, naturalmente, quem sofre as conseqüências do prejuízo são o País e o seu povo.

Concedo o aparte ao Senador Arthur Virgílio.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Isso termina, Senador Alvaro Dias, no fundo, no fundo, para sermos crus, jogando o público na privada - essa mistura do público com o privado. É muito oportuna a transcrição nos anais, que V. Exª faz nesse momento, do brilhante artigo de Mirian Leitão. E vamos ser bem claros também: não adianta inventarem duas sardinhas para a Caixa Econômica achando que vamos dispensar os tubarões. Não estamos nem preocupados com as sardinhas. Não vão nos convencer nem a ninguém, nem ao Lula, nem ao Palocci, de que duas pessoas, dois funcionários quaisquer da Caixa Econômica arquitetaram tudo, fizeram tudo, vazaram a informação; enfim, fizeram tudo: do planejamento intelectual até a execução. Não vão conseguir convencer ninguém. Acho bom que as duas sardinhas estejam lá, porque vamos, daqui a pouco, saber dos tubarões mandados pelas orcas. A questão do crime é saber a quem interessa o crime. Interessa ao chefe hierárquico da Caixa Econômica, o Sr. Palocci, a desmoralização do caseiro Francenildo. O outro dado é nós termos a preocupação de articular uma frente ampla, integrada por Parlamentares decentes de todos os partidos, em defesa da reputação do Congresso Nacional, que se está desmoralizando com as agressões que sofre de fora para dentro, com a impunidade que tem legado aos mensaleiros e, até agora, de maneira bem ritualística, pela dança tribal de deboche contra as instituições democráticas feita por aquela Deputada do PT. Obrigado, Senador.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Muito obrigado, Senador Arthur Virgílio.

            A imagem que fica do Governo Lula, um governo esquizofrênico, é essa imagem saltitante da bailarina do deboche que se apresentou ontem no palco da Câmara dos Deputados. Essa é a imagem de um governo que, conforme diz Miriam Leitão:

(...) foi um retrocesso em inúmeros processos de aperfeiçoamento que o País vinha conquistando nos últimos tempos. O uso das agências como cabide de emprego de políticos sem mandato representou um enorme prejuízo em termos de avanço regulatório.

Essa imprecisão se alastrou [diz mais, quando trata da expressão “imprecisos limites éticos”] no atual Governo, contaminou a base partidária e deteriora as instituições brasileiras como a máxima do “fiz, mas quem não faz?” que parece imperar no governo.

            E conclui Miriam Leitão:

O que está acontecendo com o caseiro Nildo é uma perturbação inaceitável do estado de direito, um desrespeito aos direitos individuais. Não é mero evento da campanha eleitoral, como os petistas afirmam. É o governo usando o Estado para ameaçar um cidadão. A democracia não tolera um fato assim.

            Quero, Senadora Serys, antes de concluir, dizer que é evidente que não podemos aceitar que resolvam esse episódio do caseiro penalizando, única e exclusivamente, o servidor da Caixa Econômica Federal, que, utilizando o sistema existente, acessou as contas para revelar à opinião pública a modesta movimentação financeira daquele trabalhador, na esperança vã de “linká-lo” a procedimentos escusos, desqualificando um depoimento que foi o retrato da verdade e da convicção, sobretudo no espelho da serenidade que reproduziu na CPI ou em entrevistas coletivas o caseiro Nildo.

Ora, não basta apontar o responsável pelo acesso ao equipamento, é preciso apontar a autoridade maior responsável por essa operação criminosa. Essa questão não se esgota no plano administrativo. Não basta a demissão de alguém. Essa questão extrapola os limites da Caixa Econômica Federal, passa pelo Ministério da Fazenda, chega à Presidência da República e vai, sim, ao Poder Judiciário. O Tribunal haverá de julgar isso. Trata-se de uma afronta à Constituição, de uma atitude deplorável que tem que ser combatida e condenada, para que não prevaleça como exemplo. É evidente que nós temos que levar aos tribunais os principais responsáveis por esse episódio. Eles não estão localizados na superintendência de redes, que se instala ali, no prédio central, na sede da Caixa Econômica Federal. Eles estão, sim, no andar superior, no gabinete da Presidência e certamente além daquele gabinete, porque essa foi uma operação do Estado policialesco comandado pelo Presidente Lula.

Diante da indignação do povo brasileiro, neste final de semana em que se instalou um verdadeiro circo de horrores em Brasília, queremos lamentar tudo isso.

Henry Kissinger disse certa vez que 90% dos políticos colocam sob suspeita os 10% restantes. É lamentável constatar que Henry Kissinger provavelmente estava dizendo a verdade ao se referir a outro país. Certamente, sua afirmação tem muito sentido nesta hora que estamos vivemos no Brasil. Que nos perdoe o povo brasileiro. Não sei se basta pedir perdão; ou sei, não basta pedir perdão: é preciso reagir em nome daqueles que ainda adotam a postura da dignidade.

Com a permissão da Presidenta, concederei o aparte que não poderia faltar do Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - A Presidenta é muito generosa, tem sensibilidade política e responsabilidade administrativa.

Posso usar a palavra, Srª Presidenta?

A SRª PRESIDENTE (Serys Slhessarenko. Bloco/PT - MT) - Senador Mão Santa, a partir do momento em que o orador concede o aparte, fica concedido.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - É porque nós todos, ele e eu, somos submissos a V. Exª, que representa a grandeza da mulher brasileira. V. Exª fica bem na Presidência. A história se repete. Eu comentava com o extraordinário Líder Arthur Virgílio que, nos idos de 1967, eu estava no Maracanã - e atentai bem para a gravidade do assunto que o Senador Alvaro Dias traz: reputação - quando houve a revolução, porque caiu aqui o crédito, isso aqui caiu no ridículo. Atentai bem! Senador Arthur Virgílio, eu estava no coração da Pátria, no Maracanã. Eu fazia residência em cirurgia. No Maracanã, naquele tempo, todo o mundo tinha aqueles pequenos rádios de pilha - naquele tempo, era como computador. Eu não tinha, pois médico residente ganhava pouco. Havia o que chamávamos de “a boca do mundo”, um alto-falante que dava notícias. Entretido com o jogo, eu não prestei atenção. Quando vi, foi um alvoroço. Nunca vi um entusiasmo como aquele! O Maracanã, lotado, eu sem um rádio, e todo o mundo pulando, gritando. Aí, depois, fui entender. Sabem qual foi a notícia? “Presidente Humberto Castelo Branco acaba de fechar o Congresso Nacional”. Euforia. Eu estava presente. Então, vamos zelar - V. Exª traz o tema mais importante - pela honra, pela reputação, pela moral desta Casa, porque poderá o povo voltar a cantar o fechamento disto, porque, de corrupção em corrupção, de indignidade em indignidade, de ridículo em ridículo, a opinião pública pode dar os aplausos para o fechamento deste Congresso. V. Exª traz um assunto muito sério. Entendo simples isso aí. Primeiro: mentira. Se esse Palocci mentiu, ele tem de sair. Aprendi do meu pai, que está no céu. Ó, Lula, não sei para onde Vossa Excelência vai, mas meu pai, ao som das chibatadas, para me educar com seu cinturão, dizia: “Não minta. Quem mente rouba”. Acho isso uma assertiva. E mais: lá, no Piauí, entende-se que Congresso não é lugar para ladrão. Se há ladrão aqui, devemos mandar para a cadeia!

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR) - Senador Mão Santa, V. Exª tem razão: quem mente rouba. Aqui, mentem e roubam. Portanto, roubam duas vezes. Aliás, Senador Mão Santa, não podemos, de forma alguma, admitir a hipótese de fechar o Congresso Nacional. Mas, sem dúvida, o Maracanã lotado, provavelmente, hoje, aplaudiria o fechamento do Congresso, e isso é dramático, Senador Arthur Virgílio. Chega às raias do absurdo admitir que esse fato poderia ocorrer no Brasil, tal a desmoralização do Congresso Nacional.

A “dança da pizza” ontem retratava a alegria de alguém que se coloca como a advogada dos culpados, a advogada dos envolvidos em corrupção, a advogada do demônio. Na verdade, aquela cena é apenas um retrato do que está ocorrendo no Parlamento brasileiro. A absolvição de Parlamentares envolvidos no escândalo do mensalão depõe contra a imagem do Congresso Nacional, já arrebentada por tantos escândalos. É a preservação daqueles que se envolveram em corrupção em detrimento da imagem do Congresso Nacional, que deve ser construída com a sustentação da bandeira da ética acima de tudo.

Muito obrigado.

Desculpe extrapolar o tempo, mas é uma forma bastante modesta de alguém que se confessa incompetente para retratar, da tribuna, a indignação do povo brasileiro.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/03/2006 - Página 9478