Discurso durante a 36ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação em defesa do ex-Governador Geraldo Alckmin, com relação à Febem. Ponderações sobre o direito à habitação, objeto da Emenda à Constituição 26, de 2000.

Autor
Romeu Tuma (PFL - Partido da Frente Liberal/SP)
Nome completo: Romeu Tuma
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA PENITENCIARIA. POLITICA HABITACIONAL.:
  • Manifestação em defesa do ex-Governador Geraldo Alckmin, com relação à Febem. Ponderações sobre o direito à habitação, objeto da Emenda à Constituição 26, de 2000.
Aparteantes
Cristovam Buarque, Demóstenes Torres, Eduardo Suplicy, Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2006 - Página 11256
Assunto
Outros > POLITICA PENITENCIARIA. POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, EX GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFORMULAÇÃO, FUNDAÇÃO ESTADUAL DO BEM ESTAR DO MENOR (FEBEM), OBJETIVO, MELHORIA, SITUAÇÃO, REDUÇÃO, QUANTIDADE, DETENTO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, DIREITO CONSTITUCIONAL, HABITAÇÃO, REGISTRO, SITUAÇÃO, MUTUARIO, SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH), RENEGOCIAÇÃO, DIVIDA, JUSTIÇA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Alvaro Dias, muito obrigado pela gentileza e carinho.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Senador Demóstenes, V. Exª fez referência e, ao final, pediu desculpas aos que sofrem do mal de Alzheimer. Sabemos o que representa essa doença não só para o doente como para a família que convive com ele.

O mal de Alzheimer traz, como conseqüência neurológica, principalmente, a falta de coordenação e de memória. Então, é difícil comparar, porque um faz por doença; o outro, por marketing.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Exatamente.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Então, é um esquecimento programado para faturar em favor da sua campanha.

Desculpe-me dizer isso, mas tenho um filho neurologista, que me ligou e disse: “Pai, é uma doença terrível”.

Mas V. Exª corrigiu ao final com muita clareza.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Por isso, Senador Romeu Tuma, fiz questão de dizer que o Presidente se portava como alguém que sofre, quando é alguém que faz sofrer, não é verdade?

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - É verdade.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Quantos não votaram no Presidente esperando dele um outro tipo de comportamento!

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Obrigado, Senador.

Senador Alvaro, V. Exª é do PSDB, Partido com o qual temos uma coligação. Tenho muito respeito pelo ex-Governador Geraldo Alckmin. Digo aqui para todo mundo ouvir que nunca recebi um cargo no Governo do Governador Geraldo Alckmin. Portanto, não lhe devo nada, como ele não me deve nada, a não ser o carinho e a amizade pelas nossas andanças em campanha e, posteriormente, pela visita que ele fez a cada região, a cada Município, não só para agradecer os votos, mas para assinar acordos e convênios com a maioria dos prefeitos sem olhar a origem político-partidária de cada um deles, Senador Aelton.

E, aqui, houve algumas críticas sobre a Febem. Não posso defender, em hipótese alguma, que a Febem seja elogiada da forma como está. Não, absolutamente! Essa foi uma clara preocupação do ex-Governador, cuja continuidade, acredito, será dada pelo Governador Cláudio Lembo.

O último ato do ex-Governador foi derrubar o muro da pior unidade da Febem, a de Belém, onde os conflitos têm sido gerados. Esta semana mesmo houve três conflitos graves, causados por jovens que habitam essas casas, que chamam de reformatório, e cujas atitudes são de alta periculosidade.

Mas o Governador, há mais de dois anos, Senador Demóstenes, tem lutado para criar pequenas unidades no interior do Estado. Até conseguir alguma coisa, as reações foram terríveis, dos munícipes e dos prefeitos, porque não aceitavam a criação de unidades da Febem por medo, porque há circulação de famílias, de marginais, e isso poderia aumentar o índice de criminalidade nessas regiões, Senador Alvaro.

Hoje, ele já conseguiu uma parte e deve dar seqüência a esse projeto para que essas crianças tenham pequenas unidades - quarenta, cinqüenta - porque, aí, sim, haverá capacidade de o Estado recuperar esses meninos.

Senador Cristovam, V. Exª acabou de falar da grande dificuldade dessas crianças, que não têm opção e, às vezes, são aprisionadas. Lá, recebem um tratamento pior do que aquele da vida cotidiana, do mundo da criminalidade.

Assim, essas pequenas unidades, que são um projeto do ex-Governador e as quais o novo Governador Cláudio Lembo deve dar continuidade, têm toda a infra-estrutura de reeducação, se é que se pode dizer isso, ou de educação, Senador Marco Maciel. Essas crianças têm de entender que o crime não oferece vantagens para o cidadão do amanhã.

Por isso, temos de criar condições de, por meio da educação, por meio da formação, tentar diminuir a criminalidade - não sei se em cinco ou dez anos -, até essas crianças conseguirem entender que a vida, com ordem e com possibilidade de emprego, poderá trazer-lhes um futuro melhor.

Faço a defesa do Governador Alckmin porque ele jamais quis dar continuidade ao processo que recebeu. O Governador Mário Covas tentou, à época; o Governador Geraldo abraçou essa causa de tentar diminuir o número de detentos da Febem em reformatórios e procurou dar-lhes uma oportunidade por meio de pequenas unidades espalhadas pelo interior de São Paulo, tentando trocar com os prefeitos alguns tipos de investimentos, para que houvesse autorização para a construção dessas pequenas casas de recuperação.

Senador Alvaro, V. Exª é um homem muito preocupado - já ouvi discursos seus nesse sentido - com a necessidade de habitação dos brasileiros. O Governo tem de dar mais possibilidade de investimento, principalmente para essas milhões de pessoas que precisam de um teto - talvez se sentissem mais realizadas tendo um teto para morar e um pequeno terreno para produzir do que apenas receber o Bolsa-Família. O orgulho do cidadão, do homem, da família é ter meios para garantir sua sobrevivência com o suor do próprio rosto - esse foi o compromisso de Deus com aqueles que saíram do paraíso.

Recentemente, houve algumas discussões sobre esse assunto. Fui Relator da proposta do Senador Mauro Miranda, de Goiás, que fez um bom trabalho e que propôs a Emenda Constitucional nº 26, que inseriu o direito à habitação no art. 5º como direito constitucional de todo cidadão. É claro que está sendo difícil, não se está conseguindo alcançar esse objetivo. Cada unidade tem procurado, com um esquema reduzido de investimentos, Senadora Heloísa Helena, oferecer uma casa ao cidadão. Se ele tiver uma casa, um teto, uma pequena área para plantar, para ganhar o pão do dia-a-dia com o suor de seu rosto, o cidadão se sentirá muito mais orgulhoso do que se receber o Bolsa-Família ou algo que chamam de esmola. Eu não chamaria de esmola, mas é algo que a pessoa recebe por necessidade, e ela deve se sentir humilhada com essa necessidade, que a faz esperar para receber esses valores.

Pois não, Senadora!

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Romeu Tuma, quero, humildemente, contribuir com o pronunciamento de V. Exª em relação às políticas de assistência social. Entendo e concordo quando V. Exª diz isso. A Lei Orgânica da Assistência Social, que foi aprovada - eu ainda não estava aqui, no Congresso Nacional -, para o senhor ter idéia, ela estabelece os direitos para os pobres, os oprimidos, os marginalizados, ela se estende dos moradores de rua aos idosos, àqueles que têm deficiências físicas, às crianças de rua, ou seja, ela é uma declaração de amor aos pobres, oprimidos e marginalizados. O problema é que existe um abismo entre o que foi conquistado na lei e a realidade objetiva da aplicação da legislação em vigor. Por isso que, muitas vezes, essas políticas de bolsas são importantes como uma política transitória, a partir do momento que a pessoa não tem nada. Nem estou me referindo ao Renda Mínima, que o Senador Eduardo Suplicy propõe, que é algo diferente, porque ele trata de algo como sendo universal. E, pelo caráter da universalidade, não separaria pobre do rico. Esse aí é um outro debate, com certeza, bem mais respeitável do que a outra discussão.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Só para concluir, desculpe-me por me alongar, Senador Romeu Tuma, a política das bolsas é importante em que sentido? No sentido transitório, porque antes que a pessoa conquiste o emprego ou a dignidade, ela precisa de uma fase intermediária para comprar comida, para pagar transporte, para garantir um mínimo na sua casa. A partir do momento em que não há uma vinculação e uma fiscalização do Estado em relação a alguma atividade, isso gera, dentro da população pobre, quase a necessidade de continuar na pobreza e na miséria para que o Estado olhe para ela. Isso é que é escandaloso. Não vou nem falar na demagogia eleitoreira, porque do mesmo jeito que os coronéis do sertão manipulavam a população pobre com a cesta básica, o Presidente Lula a manipula com as bolsas, que, por isso, acabam tendo a conotação da migalha. A população pobre não pode continuar sendo pobre para que o Estado olhe para ela. Do mesmo jeito que há o Bolsa-Escola, que o Senador Cristovam sempre defendeu muito, poderia haver uma bolsa para menina adolescente, para ela não engravidar, para ficar na escola e ter direito de se formar antes de ser mãe, menina e adolescente, porque quando há a vinculação existe o acompanhamento do Estado. Não pode a população pobre dizer: “Vou continuar pobre, preciso continuar pobre, porque se eu não continuar pobre, miserável, o Estado não me enxergará, o Estado não me verá. Se eu não tiver outra criancinha, o Estado não me verá, não me dará os 30, 40 ou 60 para eu poder sobreviver, até sob o ponto de vista da minha estrutura anatomofisiológica”. Então, se fosse para se cumprir o que foi estabelecido na Lei Orgânica da Assistência Social, haveria o caráter transitório até a pessoa estar integrada de fato, com acesso a saúde, a educação, a segurança pública, a emprego. Trata-se de uma política transitória porque as pessoas não podem esperar a revolução socialista ou a democracia com justiça social, já que o seu corpo precisa do alimento e sua estrutura anatomofisiológica precisa dessa fase intermediária. Agora, não pode ser estabelecido que o único destino da população pobre deve ser continuar na pobreza e na miséria senão o Estado não vai enxergá-la.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Obrigado, Senadora.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador, permite-me um aparte?

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Concedo um aparte ao Senador Cristovam Buarque e ao Senador Suplicy.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senão, vou usar o artigo que permite a quem foi citado falar.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Com carinho, Senador.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Ainda que tenha sido citado com carinho. Eu queria dizer, Senador e Senadora, que 11 anos depois da criação do Bolsa-Escola, ele ainda não foi entendido. A bolsa é escola. O que importa não é a bolsa, é a escola. No Distrito Federal, gastávamos um pouquinho com a bolsa e um tantão com a escola. O que vai tirar essa população da pobreza é a escola, não é a bolsa. E não vai haver emprego suficiente, com altos salários, se não educarmos essas crianças de hoje. Não há como existir. Então, volto a insistir: o Bolsa-Escola é uma coisa, o Bolsa-Família é outra. Ninguém reclama e diz que é esmola dar para quem já se formou uma bolsa para doutorado na França, mas consideramos esmola dar uma bolsa, para que permaneça na escola, a uma criança que estava trabalhando.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - É obrigação, Senador.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Agora, desde que exista escola e ela seja boa.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - E que o Estado fiscalize se a criança está na escola.

O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - É claro, que o Estado fiscalize e a escola seja boa, porque se for ruim, não adianta a fiscalização, pois a criança não ficará nela depois de uma certa idade. Então, volto a insistir: Bolsa-Escola é uma coisa, Bolsa-Família é outra.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Senador Romeu Tuma, V. Exª me permite?

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - V. Exª conhece profundamente esse assunto e eu o agradeço, porque enobrece o meu pronunciamento.

Senador Demóstenes Torres, concederei o aparte depois do Senador Suplicy, que já o pediu, e se puder seja rápido, porque o Presidente tem o direito de cortar o tempo.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª, Senador Romeu Tuma, e o PFL, a partir do parecer de alguém que tão bem assimilou o conceito do Senador Francelino Pereira, do seu Partido, aprovaram, assim como todos aprovamos, a instituição gradual no Brasil, segundo a Lei nº 10.835, da renda básica de cidadania, que poderá superar os obstáculos que V. Exª está colocando. Na medida em que todo e qualquer brasileiro ou brasileira, não importa a sua origem, raça, sexo, idade, condição civil ou mesmo sócio-econômica, passar a ter a renda básica, dentro do possível, suficiente para atender às suas necessidades vitais como um direito à cidadania, não será retirada a renda que a pessoa estiver obtendo se por ventura tiver qualquer progresso. É um direito universal de todos. Não quero me alongar demais, mas apenas colocar que, sobretudo com a renda básica de cidadania, superaremos inclusive o problema do estigma e da dependência, que, muitas vezes, acaba causando as armadilhas do desemprego e da pobreza.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Não só o PFL, como os outros Partidos, Senador Eduardo Suplicy, nunca deixaram de reconhecer e elogiar sua iniciativa, que foi aprovada por unanimidade. Esperamos que a expectativa de V. Exª se realize o mais rapidamente possível.

Concedo um aparte ao Senador Demóstenes Torres.

O Sr. Demóstenes Torres (PFL - GO) - Senador Romeu Tuma, quando o Ministro e hoje Senador Cristovam Buarque esteve aqui, tivemos oportunidade de desenvolver um belo debate na Comissão de Educação, onde ele defendia a adoção da escola em tempo integral o mais rapidamente possível, para que o Brasil pudesse evoluir. Quem deve adotar as nossas crianças, especialmente as mais carentes, é o próprio Estado. Ele deve oferecer um estudo de qualidade, que possa fazer com que as pessoas enriqueçam. Senador Romeu Tuma, favela só é bonita em música; fome só serve para dar grandes sambas. Na realidade, precisamos fazer com que a criança tenha um ganho dentro da escola para que ela não a abandone. A escola em tempo integral não pode ter um projeto aleatório - três, cinco, 10, 100, 200 escolas, todas as escolas de primeiro grau. Tive o prazer de apresentar, em 2003, uma proposta que antecipava para 2008 a adoção, nas escolas públicas brasileiras, do sistema integral. Infelizmente, a matéria não foi votada porque, bem sabe nosso ex-Ministro, um dos grandes problemas - que, aliás, o levou à sua queda - foi que reivindicava dinheiro para a educação, quando se queria aplicá-lo no superávit primário. Então, não há essa preocupação do Governo brasileiro com uma escola de qualidade. Agora, defendo, como fez o Senador Cristovam Buarque, a adoção de qualquer remédio que possa deixar a criança na escola e que esta seja de boa qualidade. Oxalá comecemos a implantar logo a nossa escola em tempo integral. Obrigado, Senador Romeu Tuma.

O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP) - Obrigado, Senador Demóstenes Torres. V. Exª passou por vários cargos e tem a dimensão exata da necessidade da educação, principalmente para os jovens do primeiro e do segundo grau.

Sr. Presidente, o meu discurso era mais voltado para a questão dos mutuários do Sistema Financeiro de Habitação.

Um grande número de pessoas acabou perdendo as suas propriedades por falta de dinheiro para pagar as diferenças de reajustes e houve progressão da dívida, como falei com V. Exª há pouco, Senador Aelton, que concordou comigo. Assim, o melhor caminho foi procurarem a Justiça, que está recalculando as dívidas e fixando a mensalidade em algo que possam pagar para não perderem a sua propriedade, que é o resultado do seu sonho.

Se V. Exª permitir que meu discurso seja publicado, eu o deixo aqui, assim como uma tese.

            Conversei com o Senador Aelton, que se interessa pelo problema do reajuste e da luta dos agricultores inadimplentes, sobre se não valeria a pena que esse processo também fosse discutido dentro do projeto de colaboração com a área da agropecuária e da agroindústria, que tanto tem sofrido pela falta de financiamento.

Obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR ROMEU TUMA.

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O SR. ROMEU TUMA (PFL - SP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no início de fevereiro deste ano, subi a esta tribuna para falar de um drama que teima em se desenrolar no interior de muitos lares brasileiros. Não se trata de um problema menor, ou de caráter apenas transitório. Ao contrário, ele perturba diuturnamente o sono de milhares e milhares de famílias brasileiras. De há muito sabemos que o cidadão médio, em geral, sonha com a casa própria, um patrimônio que confere segurança às famílias, liberando-as do aluguel e proporcionando uma forte sensação de bem-estar e acolhimento.

Há muito tempo, por perceber a relevância de sua função social, eu tenho me preocupado com a questão habitacional em nosso País. Para ficar num único e bom exemplo, fui o relator da Proposta, de autoria do Senador Mauro Miranda, que resultou na Emenda Constitucional nº 26, de 2000. Esse dispositivo alterou a redação do art. 6º da Constituição Federal, incluindo o direito à moradia entre os direitos sociais.

Srªs e Srs. Senadores, considero que a habitação de caráter social, destinada às famílias com renda inferior a três salários mínimos, deve ser priorizada pelo Governo Federal. Não nos esqueçamos, porém, que os setores da classe média capazes de contrair financiamento para aquisição ou construção de imóveis merecem igualmente a atenção do Governo - e de todos os parlamentares. É preciso lutar, no primeiro caso, para que a União, em parceria com os governos estaduais, tome para si a tarefa de instituir e desenvolver programas que supram o enorme déficit habitacional que existe em nosso País, estimado em sete milhões e duzentas mil moradias.

Por outro lado, urge tratar da situação de 50 mil famílias brasileiras, em sua maioria pertencentes à classe média, que ousaram sonhar com a casa própria e que hoje vivem um verdadeiro pesadelo. Seu nome: saldo devedor. O adquirente, de boa-fé, contratou um financiamento que virou uma bola de neve, requerendo uma constante ampliação da renda familiar destinada à amortização. Tarefa inglória, pois, ao cabo, os saldos remanescentes não param de crescer.

Em meu Gabinete, Sr. Presidente, muitas vezes me emociono ao deparar com a situação de um chefe de família que não sabe se, amanhã, seus dependentes terão sobre as cabeças a proteção de um teto. Cinco mil famílias já perderam seus imóveis nos últimos quatro anos. Outras dezenas de milhares estão com as dívidas em fase de execução judicial. Se isto não é um problema social da maior grandeza, então, não sei o que seja!

Não me canso de frisar que tenho o mais absoluto respeito pelos contratos livremente assumidos. Mas, é preciso considerar a natureza especial dos contratos de financiamento habitacional. Nestes, o princípio da boa-fé deve sempre prevalecer, com fundamento no respeito e na ética, visando à preservação da dignidade humana. São contratos de longa duração, nos quais há, em geral, uma gama de preciosismos técnicos e artimanhas que desequilibram a relação negocial. No lado forte, está o agente financeiro, o banco. No fraco, o mutuário. O que se defende é que se respeite a legítima expectativa do lado mais fraco, recompondo as condições originais de equilíbrio dos contratos.

Ocorre, Sr. Presidente, que as condições de equilíbrio financeiro foram mantidas, ao longo da história, pelo instrumento da correção monetária. Contudo, a Lei nº 8.177/91, instituiu a chamada Taxa Referencial (TR) como mecanismo para o reajuste do saldo devedor dos contratos de financiamento habitacional, o que, segundo muitos especialistas, tem gerado o fenômeno da capitalização de juros sobre juros. Em decorrência, surgiram enormes distorções e, via de regra, os agentes financeiros lucraram com ela, e os mutuários, na outra ponta, tiveram de arcar com os prejuízos.

A revisão dos saldos devedores de acordo com os princípios que deram origem à criação do Fundo de Compensação das Variações Salariais, para quem tem contratos firmados nessa modalidade de financiamento virou letra morta. Na prática, os salários dos mutuários não acompanham a evolução dos saldos remanescentes e, no limite, muitos imóveis têm sido retomados pelos bancos. A própria Caixa Econômica Federal criou uma empresa -- a EMGEA -- para efetuar a compra de milhares de contratos firmados pelas instituições financeiras nacionais, ao longo dos anos de vigência do Sistema Financeiro da Habitação.

Aos mutuários somente restou a alternativa de se organizar e lutar por seus direitos. E, efetivamente, eles têm procurado as associações de mutuários em busca de orientação. Essas entidades, por sua vez, têm aconselhado o ingresso na Justiça para, com base no Código de Direito do Consumidor, requerer a redução dos valores teoricamente devidos.

Segundo o Sr. Mário de Almeida Costa, diretor regional da Associação Brasileira dos Mutuários do Sistema Financeiro Habitacional, “os contratos são abusivos” e as decisões favoráveis do Poder Judiciário “resgatam o caráter social que os financiamentos habitacionais devem ter”.

O dirigente refere-se a duas decisões recentes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, já transitadas em julgado. Numa delas, o banco foi condenado a pagar o que recebeu a mais do mutuário. Em outra, o pleiteante conseguiu considerável redução no valor de sua prestação mensal: de 972 reais, ela caiu para R$107,80.

Penso que decisões judiciais como as que mencionei compelem os agentes financeiros e o próprio Governo Federal a reconsiderarem a adoção da Taxa Referencial como mecanismo de correção monetária dos contratos de financiamento. Felicito, portanto, o Poder Judiciário pelas decisões de destacado alcance social; decisões que, sem dúvida, não ferem a mais neutra análise técnica.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Obrigado pela atenção!

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ROMEU TUMA EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Mutuários vencem na Justiça do DF.”


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2006 - Página 11256