Discurso durante a 53ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Leitura do artigo intitulado "Quando o anonimato é traição", de autoria do Juiz de Direito da Comarca de Macapá, Dr. Rui Guilherme Vasconcellos de Souza Filho, publicado no jornal A Gazeta, abordando a questão do voto secreto no Congresso Nacional.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • Leitura do artigo intitulado "Quando o anonimato é traição", de autoria do Juiz de Direito da Comarca de Macapá, Dr. Rui Guilherme Vasconcellos de Souza Filho, publicado no jornal A Gazeta, abordando a questão do voto secreto no Congresso Nacional.
Aparteantes
Alvaro Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 09/05/2006 - Página 15092
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • GRAVIDADE, PERDA, REPUTAÇÃO, LEGISLATIVO.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, A GAZETA, ESTADO DO AMAPA (AP), OPOSIÇÃO, VOTO SECRETO, MOTIVO, ISENÇÃO, RESPONSABILIDADE, ESPECIFICAÇÃO, ATUAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, ABSOLVIÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, PROCESSO, CASSAÇÃO, CONSELHO, ETICA, CORRUPÇÃO, MESADA, ANALISE, VOTO, AMBITO, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, ELEITOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o momento pelo qual o País está passando, principalmente a situação que estamos vendo, na qual forças que têm influência tentam negativar o Congresso Nacional, principalmente a Câmara dos Deputados, despertou em todos nós a sensação de que nós, Parlamentares, devemos sempre reagir a fatos que realmente são mentirosos, que tendem politicamente a denegrir a imagem do Parlamentar.

E lendo artigos, ouvindo comentários de políticos, comentários de jornalistas, muitos deles tendenciosos, mas que, de qualquer maneira, servem para que possamos fazer a nossa opinião sobre o caso, deparei-me com um artigo escrito pelo juiz de Direito da Comarca de Macapá, Professor Dr. Rui Guilherme de Vasconcellos Souza Filho, de quem tive a honra de ser aluno de Língua Inglesa em 1966, ou em 1967, se não me engano, e esse artigo bate exatamente com aquilo que penso sobre a questão do voto secreto. Mas, confesso aos senhores que não teria a capacidade que o Professor Dr. Rui Guilherme teve em traduzir os nossos sentimentos.

Então, Sr. Presidente, passarei a ler o artigo escrito pelo Professor Dr. Rui Guilherme de Souza Filho divulgado no jornal a A Gazeta do meu Estado. O título do artigo é “Quando o anonimato é traição”, cujo teor é o seguinte:

           Anonimato é ato traiçoeiro? Nem sempre. Mas quase sempre. Em certas circunstâncias, sempre. Seguramente sempre.

           Não há traição na denúncia anônima quando desta resulta a elucidação de um crime, ou a prisão de um foragido. Mas quando se trata de denunciação falsa, valendo-se de mentira para acusar quem é sabidamente inocente, então aí não há quem duvide que o denunciante valeu-se de torpe traição para praticar um ato de vindita pessoal; ou, pior ainda: para causar mal a alguém por pura inveja, ou por motivo mais vil. Neste último caso, o denunciante é um canalha. E um canalha covarde, porque se serve do anonimato para prejudicar aquele de quem tem medo de confrontar em campo aberto.

           Quanto ao eleitor que sufraga protegido pelo sigilo, o que dele se pode dizer é que seu voto é escudado por uma forma de anonimato perfeitamente legítima, cujo fundamento está na liberdade de escolha, de modo a que o direito de voto seja exercido livre de qualquer forma de pressão. Pelos meios de controle legais, sabe-se quem votou, pois a identidade do eleitor é obrigatoriamente conferida pelos órgãos da Justiça Eleitoral. Mas não se sabe em qual candidato aquele eleitor votou. Quando da apuração, será revelado o quantitativo de votos depositados e para quais candidatos foram dirigidos os votos válidos, mas anula-se obrigatoriamente o voto que contenha qualquer vestígio de identificação do votante entre outros defeitos que levam à nulidade do voto.

           Ao contrário dessas circunstâncias anteriores apontadas em que o anonimato é um dever-ser, outras há em que o melhor mesmo é que tudo se resolva às claras, evitando-se o anonimato sempre que este é nocivo, na medida em que acoberta indevidamente a identidade do autor do voto, isentando-o de responsabilidade que deve assumir de público. Abertamente. De modo claro e insofismável, para que todos saibam com precisão a origem do voto que, proferido em decisão coletiva, aprovou ou rejeitou determinada matéria de interesse público.

           O exemplo mais flagrante, e também mais recente, de quanto o voto fechado se iguala ao anonimato nocivo, foi dado pelo Congresso Nacional, ao decidir, em plenário, sobre as recomendações de cassação do Conselho de Ética.

           Não se está querendo dizer que os ilustres parlamentares federais deveriam unanimemente votar pela cassação daqueles a quem o Conselho recomendou a perda de mandato. Isso levaria à prática de ato defeituoso, na medida em que, como já consagrado em bordão popular, a unanimidade, muita vez, é burra. Apresentada ao Plenário o parecer final do Conselho de Ética, caberia aos Congressistas dizer “sim” ou “não” ao recomendado pelo Conselho. Vale dizer: o Deputado ou Senador, poderia livremente votar pela cassação do indiciado a quem o Conselho recomendasse a absolvição, e pela absolvição daquele cuja cassação fora aprovada pelo Conselho. O que se entende injustificável é um mandatário da vontade popular esconder-se no anonimato para não permitir à Nação saber se ele votou pela cassação ou pela absolvição, em cada um dos casos julgados.

Fica muito fácil para o parlamentar dizer, em certas rodas, que votou pela cassação e, em outras e ao sabor das circunstâncias, afirmar que votou pela absolvição. Pelo mesmo viés, ao não declarar em aberto o seu voto, o parlamentar escamoteou de seu eleitorado o “sim” ou “não” que a Nação ansiosamente esperava conhecer.

Inaceitável o argumento de que, ao votar sob sigilo, o parlamentar pode expender sua decisão livre do assédio da imprensa, dos correligionários e dos adversários políticos, da pressão de suas bases eleitorais e tudo o mais. O parlamentar é um mandatário da vontade popular. O povo é o mandante. Como tal, espera que o outorgado cumpra a vontade dele, outorgante. Ou, no mínimo, que deixe o povo saber, com toda clareza e honestidade, qual a posição que ele, parlamentar, assumiu ao votar matéria de interesse público.

           Quando o Congresso estava votando se os implicados nos mensalões e outros escândalos, cuja cassação o Conselho de Ética recomendou, e, quem sabe mercê do escudo do anonimato, o julgamento do plenário rejeitou o recomendado pelo órgão apurador e decidiu pela absolvição, deve-se perguntar se o anonimato, nessa especial circunstância, é legítimo ou nocivo. Inclino-me pela nocividade do voto sigiloso. Afinal de contas, o eleitorado tinha, e tem, direito pleno de saber qual foi a direção dada pelo parlamentar/julgador ao voto de que resultou a aprovação, ou a reprovação, do decidido pelo órgão apurador. Entender o contrário é legitimar que o mandatário aja do jeito que melhor lhe aprouver e sem levar em conta a vontade do mandante, sem prestar conta de seu agir ao povo, cuja vontade deve ser cumprida. Todo poder emana do povo e em seu nome será exercido. Ou não?

Emblemático é que não houve um só registro de indiciado cuja absolvição tivesse sido recomendada pela Comissão de Ética e que o Plenário tivesse resolvido pela cassação, ainda que por decisão colegiada proferida com votos depositados sob a proteção do anonimato.

Concedo um aparte ao Senador Alvaro Dias com muita honra.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Papaléo Paes, V. Exª traz um tema por demais oportuno à tribuna no dia de hoje. Creio que se trata de estabelecer a autodefesa da instituição parlamentar. Nesta hora de grande indignação no País, a generalização acaba preponderando. É necessário, portanto, que adotemos todos os mecanismos necessários para evitar que isso ocorra. O voto secreto, lamentavelmente, é uma blindagem para os coniventes, neste caso do mensalão, com a corrupção. Portanto, estabelecer o voto aberto para deliberações desta natureza é fundamental para que a população possa distinguir uns dos outros. Como pode o eleitor brasileiro selecionar melhor se ele não tem a oportunidade de avaliar a atuação de cada um dos seus representantes em função de determinados mecanismos de blindagem que protegem os maus e os colocam no mesmo patamar dos corretos? V. Exª tem razão em fazer este apelo da tribuna, tem o nosso apoio, e nós esperamos que a Câmara dos Deputados delibere rapidamente sobre a proposta que estabelece o voto aberto para as votações que hoje são secretas na Câmara dos Deputados, a fim de que o Senado possa também apreciar a matéria.

O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Senador Alvaro Dias.

            Deixo registrado aqui que este artigo, que considero um brilhante documento, um brilhante instrumento para nossa reflexão, foi escrito por um Juiz da Comarca de Macapá, um homem muito inteligente, muito capaz, o Dr. Rui Guilherme Vasconcelos de Souza Filho, a quem agradeço. Farei cópias deste documento, deste artigo, e as remeterei a todos os parlamentares federais.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/05/2006 - Página 15092