Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a explosão da violência ocorrida em São Paulo no final da semana passada, que demonstra a desordem urbana e o domínio das cidades pelo crime organizado.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. DROGA.:
  • Considerações sobre a explosão da violência ocorrida em São Paulo no final da semana passada, que demonstra a desordem urbana e o domínio das cidades pelo crime organizado.
Aparteantes
Arthur Virgílio, Eduardo Suplicy, Heloísa Helena, Sibá Machado.
Publicação
Publicação no DSF de 19/05/2006 - Página 17401
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. DROGA.
Indexação
  • GRAVIDADE, OCORRENCIA, VIOLENCIA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEMONSTRAÇÃO, DOMINIO, CRIME ORGANIZADO, CRITICA, NEGLIGENCIA, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, CONGRESSO NACIONAL, ADIAMENTO, PROVIDENCIA.
  • FALENCIA, ESTADO, OCORRENCIA, NEGOCIAÇÃO, COMANDO, CRIME ORGANIZADO, CRITICA, CLASSE POLITICA, RESTRIÇÃO, CONFLITO, POLITICA PARTIDARIA.
  • PROTESTO, INEXISTENCIA, POLITICA NACIONAL, SEGURANÇA PUBLICA, ARTICULAÇÃO, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, EFEITO, CRESCIMENTO, TERRORISMO, CRIME, CRITICA, POLITICA PARTIDARIA, ERRO, DIAGNOSTICO, SITUAÇÃO, VIOLENCIA, MISERIA, CORRUPÇÃO, DEFESA, PACTO, DEBATE, SOLUÇÃO, TRAFICO, ESPECIFICAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, DROGA, AMBITO, CONVENÇÃO INTERNACIONAL.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM. Pela liderança do PDT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, por coincidência, está presidindo esta sessão V. Exª, um dos mais respeitados policiais por profissão deste País.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PFL - SP) - Muito obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - O meu tema será o mesmo que a grande maioria tem abordado nos últimos dias, ou seja, a explosão da violência ocorrida em São Paulo no final da semana passada.

Fiz questão de esperar alguns dias, Sr. Presidente, Senador Romeu Tuma, para falar sem emocionalismo, de cabeça fria. Mais do que nunca, pareceu-me que o discurso do Ministro Marco Aurélio de Mello, por ocasião de sua posse no Tribunal Superior Eleitoral, foi um dos melhores que já ouvi neste País nos últimos tempos. S. Exª disse que o Brasil é o país do faz-de-conta e o é.

De repente, ocorre aquele horror em São Paulo e faz-se de conta que somente agora tomaram conhecimento de que a desordem urbana campeia neste País há muito tempo, de que Rio de Janeiro, São Paulo e cidades menores há muito estão dominados pelo crime organizado. Parece que não existia isso antes e somente agora tomaram conhecimento do fato. Estão fazendo de conta de que se trata de novidade. Agem assim todos os que se omitiram e foram negligentes, Sr. Presidente. Como disse o Senador Arthur Virgílio, todos os Governos dos últimos 15 ou 20 anos foram negligentes: Federal, Estaduais, o atual Governo do Presidente Lula, o de Fernando Henrique Cardoso, o de Itamar Franco.

Por que foram negligentes? Porque nunca encararam o gravíssimo problema da insegurança urbana como prioridade nacional. Nós, do Congresso, também nunca encaramos assim - é verdade. Eu mesmo fiz alguns discursos até apaixonados sobre a situação do Rio de Janeiro. Entretanto, não fiz nada mais além disso. Portanto, todos nós, principalmente os Governos e inclusive a sociedade brasileira em geral, somos culpados por tudo isso. O que se verifica depois da guerra travada em São Paulo, com a bandidagem desafiando o Estado brasileiro, o Estado nacional, que se curvou e teve de negociar. Essa que é a verdade. Do contrário, as operações não teriam cessado. Houve negociação, tudo indica.

O Estado brasileiro está semifalido, está de joelhos. O crime campeia, já chegou à minha cidade de Manaus, onde se assaltam consultórios médicos, restaurantes etc.

Disse-me um Senador, ontem, que o Serviço Secreto da Polícia Militar de não sei qual Estado, não sei se é o dele, informou-lhe que há, inclusive, um plano de incendiar, simultaneamente, várias cidades brasileiras. Não duvido que consigam. O PCC mostrou coordenação em São Paulo. O CV do Rio de Janeiro já disse que vai se articular com o PCC. E ficam os políticos ou a adotarem soluções emergenciais para um problema que é crônico, permanente, ou a se acusarem.

Ninguém tem culpa neste País. Nunca se vê alguém assumir publicamente culpa. A culpa é sempre dos outros. Para o Governo de São Paulo é culpa do Governo Federal, e é. Mas para o Governo Federal é culpa do Governo de São Paulo, e é também. São ambos culpados.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Jefferson Péres.

            O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Já lhe concedo o aparte, Senador Arthur Virgílio.

Não há uma política nacional de segurança. O que é uma política nacional de segurança? É um conjunto de medidas articuladas em todos os setores, na mudança da legislação penal, no reaparelhamento e saneamento de todas as polícias, na reforma profunda do sistema penitenciário, no policiamento intenso das fronteiras e dos portos por onde entram livremente as armas.

Existe isso, União, Estados e até Municípios, com a Guarda Municipal, atuando articuladamente e com uma coordenação central, Senador Romeu Tuma? Não existe. Não existe! São ações dispersas, pontuais. Fingem que não vêem o problema que é gravíssimo, que não existe em países mais pobres do que o Brasil. A bandidagem colocar a cabeça de fora e desafiar o poder, ocupar bairros inteiros, fechar ruas, mandar o comércio fechar, metralhar delegacias, invadir quartéis, isso não existe na grande enormidade, quase totalidade dos países do mundo. Isso é um fenômeno brasileiro. É impressionante isso! Prestem atenção todos a isso!

Ouço o Senador Arthur Virgílio, com prazer.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Jefferson Péres, seu discurso - e vou ser tautológico - é lúcido. Estamos diante de uma encruzilhada. Ou ganhamos o Brasil para a sociedade, ou o perdemos para o crime organizado. Portanto, essa política pinóquio, de empurrar culpa para cá e para acolá, só vai fortalecer o verdadeiro inimigo de todos os que não são do crime organizado. Dizer, por exemplo, que o crime organizado está localizado em São Paulo é uma inverdade. Não foi em São Paulo que compraram um funcionário da Câmara a mando do PCC; nem se deu em São Paulo o que se deu em Mato Grosso do Sul, no Rio de Janeiro, com o Exército, no Paraná, ou o que está se dando na nossa cidade, com o crescimento dos seqüestros relâmpagos, dos assaltos. Um cidadão do Bairro do Mauazinho, que V. Exª conhece tão bem e que admira tanto, disse: Não agüento mais morar aqui. E foi embora. Ou seja, o drama da insegurança começa nas veias abertas das fronteiras onde há o tráfego de drogas e de armas e termina na placidez com que a sociedade encara essa prática nociva e cada vez mais avassaladora que é o consumo dessas drogas pesadas. Portanto, a sociedade e todos nós da vida pública - não há por que o Presidente bancar o inocente dessa vez - temos culpa, e V. Exª vem corroborar o discurso daqueles que querem propor um efetivo debate para chegarmos a uma efetiva solução. Meus parabéns a V. Exª! O Brasil tem muito orgulho do seu mandato.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Arthur Virgílio. O seu discurso de ontem me inspirou, porque V. Exª também assumiu a culpa. V. Exª disse que, em oito anos de Governo Fernando Henrique Cardoso, não houve uma política nacional de segurança, e esse reconhecimento somente o engrandece.

O Sr. Arthur Virgílio (PSDB - AM) - Senador Jefferson Péres, acabei de falar ao telefone com o Presidente Fernando Henrique, que está em Nova Iorque, e relatei-lhe o que eu disse no discurso de ontem. Obrigado.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito bem, Senador Arthur Virgílio.

E os diagnósticos que fazem? É impressionante como cometem equívocos. A Direita pensa que apenas colocar polícia nas ruas e matar bandido resolve o problema. É claro que isso não resolve a questão. A Esquerda faz a leitura equivocada de que esse é um problema de desigualdade social. Então, eles querem esperar 50 anos para resolver as desigualdades sociais e só então combater a criminalidade. Ora, que atitude mais equivocada!

Por que, em países bem mais pobres que o Brasil, como a Índia ou o Egito, há um índice de criminalidade muito mais baixo, que não desafia o poder público? Por que essa situação ocorre no Brasil? Por que, em países africanos mais pobres que o Brasil, não há problemas tão agudos como o nosso? Por que, em países mais ricos, há problemas de criminalidade, analfabetismo, educação?

Claro que educação é problema prioritário por tudo! Porque a educação é o enriquecimento de um ser humano. Porque a educação prepara a pessoa para a vida e para a ascensão social, além de enriquecê-la interiormente. É claro que deveria ser prioridade em todos os governos. Mas, pensar que é por isso que a criminalidade é grande no Brasil... O analfabetismo e a pobreza levam ao pequeno crime, ao crime desorganizado. O crime organizado não tem nada a ver com o analfabetismo. Os chefes de tráfico são pessoas muito inteligentes e alfabetizadas. O Sr. Marcola é homem de QI altíssimo! Eu vi, outro dia, uma socióloga que teve contato com ele. Ele já leu, nos anos em que está na prisão, dois mil livros. Dois mil livros! Eu acho que não li dois mil livros em toda minha vida. Pensar que é por causa de analfabetismo que o crime organizado existe? Mas que bobagem! Mas que bobagem! O crime organizado, hoje, é principalmente produto do narcotráfico, que movimenta bilhões. É altamente organizado, tem um poder corruptor imenso. Um poder corruptor e intimidador.

Outro dia, um ex-diretor da Penitenciária de Manaus disse-me: “Senador, é impossível impedir a ação do narcotráfico nas penitenciárias”. Porque eles oferecem, Senador Sibá Machado, a um guarda penitenciário que ganha R$1.000,00 por mês R$10.000,00 para introduzir algo na prisão. E se o guarda for - coitado - tão honesto que, ganhando R$1.000,00, não aceite R$10.000,00, eles dizem: Mas nós sabemos onde moram sua mulher e seus filhos. Vão para a intimidação, e ninguém resiste porque sabe que matam mesmo! Então, não se pode pensar que vão conter o narcotráfico só colocando polícia nas ruas e matando.

Concedo-lhe um aparte, Senador Sibá Machado.

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Senador Jefferson Péres, eu tive oportunidade de acompanhar a comitiva que foi a Cuiabá, coordenada e liderada pelo Senador Romeu Tuma. Lá o Senador Romeu Tuma ficou até um pouco emocionado quando se reportou ao chamado “comendador”. Ele recebeu as comendas, sim, foi homenageado pela Assembléia Legislativa e pela Câmara Municipal. O “comendador” disse que não tem muita escolaridade, mas que dirige uma economia, declarada por ele, de aproximadamente R$500 milhões. Eu até disse a ele que não discuto a escolaridade diante da inteligência. Para mim, elas podem até se somar, mas uma não depende da outra. Fico impressionado com os números que vi do crime organizado, particularmente do que lida com drogas e armas. Fala-se de uma economia da ordem de US$1 trilhão.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Um trilhão?!

O Sr. Sibá Machado (Bloco/PT - AC) - Um trilhão! Isso significa dois Brasis, toda a economia brasileira multiplicada por dois. Então, não pagam impostos, é uma rede que trabalha com a compra direta, digamos assim. E, é claro, coloca-se nos desafios da vida. Outra coisa que me impressionou nos dados é que a vida útil de um jovem que entra para esse mundo é de cinco anos, em média. Ao adentrar, ter uma vida mais prolongada é muito difícil. Geralmente, são cinco anos de vida útil, quando ele chega no chamado núcleo de sistema. Ainda na minha impressão, a forma como o Brasil trata dessa situação acaba por criar verdadeiros líderes desse mundo, porque me parece que aquele chamado “prazer do poder” também existe nas mentes dessas pessoas. A destinação de um presídio de segurança máxima, o transporte por helicóptero, o aparato policial utilizado para fazer a cobertura de um translado ou coisa parecida - como o caso do comendador, em que o helicóptero foi pegá-lo no presídio e trazê-lo até a sede militar -, a imprensa em cima e o pessoal querendo saber o que era aquilo, esses fatos criam líderes, no meu entendimento. Fiquei muito impressionado com isso. Por ter ido à Itália, acompanhando o Senador Magno Malta, para vermos de perto o resultado da “Operação Mãos Limpas”, vi de perto a chamada “cabeça pensante” - o cérebro pensante da máfia - presa, presa mesmo, não tendo acesso ao mundo exterior, não tendo acesso físico de ninguém, nem do familiar, nem do advogado, nem de ninguém. Quem quiser ainda falar, precisa da barreira do vidro. Além disso, a conversa é gravada - tanto o áudio quanto o vídeo - e há uma série de outras questões. Penso que, no Brasil, o caso é muito simples; se for para trancar de verdade, há jeito, é possível fazê-lo e assim por diante. Então, nessa ciranda toda, quero reafirmar que a posição de nossa Bancada é no sentido de que isso tudo aconteceu para chamar a atenção de todos nós. Trata-se de um acinte à autoridade: quem sentar na cadeira de governante, não importa quem seja, vai defrontar-se com essa situação. E não é bom para ninguém, absolutamente, muito menos para a figura de Estado, conviver com uma incerteza como essa que vimos nesse final de semana. Portanto, julgo que o pronunciamento de V. Exª vem a contribuir ao máximo com a grandeza desse entendimento que temos que ter aqui no Congresso Nacional.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Sibá Machado. Creio que a situação é tão grave porque no Brasil se conjugam três doenças terríveis disseminadas: a violência, a miséria e a corrupção. E nós políticos de todos os partidos, principalmente dos maiores, ou deixamos de lado a política miúda, Senador Sibá Machado, e fazemos a grande política para tentar um grande pacto nacional por este País ou não sei onde vamos parar.

E nesse pacto entraria tudo, inclusive algo que é tabu e que precisa ser quebrado neste País. Posso até perder votos por isso, mas nunca vou deixar de dizer o que penso. Já está na hora de a sociedade brasileira quebrar esse tabu e discutir. Talvez a única maneira de acabar com o narcotráfico, que é um câncer incurável - nem os Estados Unidos, com bilhões de dólares, cura esse câncer -, seja começar a discutir, Senador Sibá Machado, se não é hora de se descriminalizar a droga, porque a única maneira de se matar o narcotráfico é pisar no tubo de oxigênio que o alimenta. O Sr. Beira-Mar ficará desempregado no dia em que se descriminalizarem as drogas. Ele perde emprego e vai ser assaltante de banco, porque narcotráfico não existirá mais.

Por outro lado, é de se perguntar se temos o direito de privar uma pessoa adulta - não menores - de fazer o que quer da sua vida, inclusive consumir droga? Não sei. Nunca consumi droga, não tenho filho que consuma droga, tenho horror a drogas, mas penso que já está em tempo de começarmos a discutir isso, Senadora Heloísa Helena, ouvindo todos: o mundo acadêmico, políticos, população. Se a única maneira de acabar com o narcotráfico for a descriminalização, a legalização, que se discuta isso. Não adianta ficarmos na ilusão de que mobilizar Polícia, Marinha, Exército e Aeronáutica vai acabar com o narcotráfico, porque não vai. Não há país no mundo que acabe com isso. Enquanto houver consumidores de droga - e haverá sempre - haverá quem venda drogas. Não há força armada no mundo que impeça isso.

Ouço o Senador Eduardo Suplicy com muito prazer.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Quero cumprimentá-lo, Senador Jefferson Péres, por trazer este debate à tona. V. Exª tem a companhia do eminente jurista Evandro Lins e Silva, que, pouco antes de falecer, deu uma entrevista à revista ISTOÉ, nas páginas vermelhas, em que expôs exatamente o ponto de vista segundo o qual a possível legalização das drogas poderia contribuir em muito para que não houvesse esse problema das quadrilhas de narcotraficantes. Ainda hoje, no início da sessão, a Senadora Heloísa Helena ponderou que seria muito difícil um País como o Brasil tomar essa direção se outros países não o fizessem. Muito respeitosa e amigavelmente à Senadora Heloísa Helena, penso que, apesar de ser bastante difícil, não creio que seja impossível. Diante dos episódios que têm acontecido na Grande São Paulo e em diversos outros Estados, como o Rio de Janeiro, e assim por diante, creio que V. Exª faz bem em estimular o debate a esse respeito. Quero dizer que estou aberto para conhecer mais. Não tenho ainda posição completamente formada, mas considero muito importante que nós, inclusive, possamos ouvir pessoas que tenham estudado essa problemática. Dentre outros, até por causa do conhecimento que tem acumulado a respeito, avalio que seria importante uma pessoa como o Sr. Walter Maierovitch trazer o seu depoimento ao Senado. Inclusive, por essa razão, sugeri que ele comparecesse à CPI dos Bingos.

(Interrupção do som.)

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Talvez ainda haja tempo antes da conclusão dos trabalhos. Mas, se não puder ser lá, talvez possa fazê-lo em outra comissão. Também o cumprimento por trazer o debate sobre esse assunto, com o sentido da responsabilidade, que, na verdade, é de todos nós, de todos os partidos políticos e de todos os governos - incluindo a nós, que somos parte do Governo no Legislativo -, para reconhecermos a problemática e contribuirmos para trazer soluções. Meus cumprimentos pela postura de V. Exª.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Suplicy. Eu e V. Exª temos um grande defeito político: nós dizemos o que pensamos. Por isso, sofremos muito em política. Somos quase uns marginais. Eu sei disso.

(Interrupção do som.)

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Senador Suplicy, amanhã, devo receber um monte de e-mails de pessoas me condenando, pensando que estou defendendo as drogas, quando o que quero é acabar com o narcotráfico. E não quero que o Brasil tome medida alguma nesse sentido; quero, Senadora Patrícia, iniciar uma discussão. Se não é tabu, por que não se discute? Por que não se discute isso?

Senadora Heloísa Helena, com prazer eu a ouço.

A Srª Heloísa Helena (P-SOL - AL) - A forma como o Senador Eduardo Suplicy fez o aparte não dá conta da forma como eu tratei da questão. Então, quero apenas repor o que eu disse. Primeiro, cobrei uma atitude do atual Governo Lula, que é covarde, à semelhança do Governo Fernando Henrique, e não diminuiu sequer a possibilidade de uso de uma droga psicotrópica, que é o álcool - uma droga psicotrópica socialmente aceita e irresponsavelmente estimulada por um governo covarde, como o era o Governo passado. O que eu cobrei foi um passo em relação a isso.

Tenho dúvida quanto à liberação das drogas porque, se apenas o Brasil libera, os outros países, com toda sua produção, venderão no Brasil; o preço cairá, o Governo, covarde, continuará sem proibir a publicidade e sem orientar suas crianças em relação ao álcool. E assim, com o preço baixo e a ausência de prevenção da demanda da droga, aí é que a meninada vai comprar mesmo!

Então, foi nesse sentido que eu fiz a colocação e que disse o quanto respeito V. Exª. Já acompanhei esse debate várias vezes e tenho dúvidas em relação a ele. Agora, a minha maior dúvida é esta: com o aumento da produção em outros países, que virão para cá pela liberdade de venda, o que isso vai significar em preço, estímulo e outras questões mais? Então, o Governo já poderia fazer algo assim.

Senador Jefferson Péres, todas as pesquisas mostram que o álcool mata mais do que a cocaína e outras drogas. Muito mais. Todas as estatísticas de desemprego, de assassinato, de como transformar um cidadão pacato num assassino potencial, tudo isso é mostrado em relação a uma droga psicotrópica. O problema do narcotráfico é grande em relação ao consumo, à demanda, que precisa, de alguma forma, ser minimizada, mas envolve bilhões de dólares. Trinta e cinco por cento da nuvem financeira do capital volátil que paira sobre o planeta Terra é de droga pesada, produção de dinheiro de grandes e poderosos. Então, foi nesse sentido que eu falei. Entendo completamente o debate. A dúvida que eu tenho é sobre a operacionalidade em função dos outros países.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Encerro, Sr. Presidente.

Muito lúcido aparte de V. Exª, Senadora Heloísa Helena. Não me escapou a armadilha que poderia ser apenas o Brasil legalizar as drogas. Isso terá de ser feito no marco de uma Convenção Quadro Internacional, porque, se apenas o Brasil legalizar as drogas, pode acontecer o seguinte: as drogas produzidas legalmente para cá seriam contrabandeadas para os países onde ela é proibida - o Brasil seria um grande exportador de drogas - e poderia se iniciar o narcoturismo. Como o consumo aqui estaria legalizado, uma corrente de drogados, uma corrente de dependentes viria para o Brasil apenas para comprar legalmente as drogas. Mas se isso fosse feito por um grande conjunto de países, poderia ser a solução para este gravíssimo e incurável problema.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/05/2006 - Página 17401