Discurso durante a 153ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Incompreensão com a normalidade por que passa o país, diante das graves denúncias de corrupção no governo Lula.

Autor
Almeida Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SE)
Nome completo: José Almeida Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. ELEIÇÕES.:
  • Incompreensão com a normalidade por que passa o país, diante das graves denúncias de corrupção no governo Lula.
Publicação
Publicação no DSF de 20/09/2006 - Página 29291
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. ELEIÇÕES.
Indexação
  • CRITICA, REDUÇÃO, SOBERANIA NACIONAL, DECISÃO, MINISTRO, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, CANCELAMENTO, CONTRATO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), DESCOBERTA, ESCUTA TELEFONICA, GABINETE DO MINISTRO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AMEAÇA, FECHAMENTO, CONGRESSO NACIONAL, PREJUIZO, DEMOCRACIA, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, MEMBROS, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT), PARTICIPAÇÃO, AQUISIÇÃO, DOCUMENTO, DIFAMAÇÃO, CANDIDATO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, GOVERNADOR, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, PARTIDO DA SOCIAL DEMOCRACIA BRASILEIRA (PSDB).
  • CRITICA, FALTA, MOBILIZAÇÃO, INSTITUIÇÃO PUBLICA, POPULAÇÃO, COMPARAÇÃO, ATUAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, HISTORIA, AUTORITARISMO, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, ITALIA.

O SR. ALMEIDA LIMA (PMDB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, povo brasileiro, hoje pela manhã, em Aracaju, acordei às 5 horas. Fui ao aeroporto e embarquei para Brasília às 6 horas e 15 minutos. Chegando a Brasília, às 9 horas, dirigi-me ao Senado, ao Congresso Nacional. Fiquei sem compreender a normalidade do dia, tanto em Aracaju e em Brasília como no Congresso Nacional, e mais especificamente aqui no plenário do Senado.

Tenho certeza absoluta de que, se os fatos que aconteceram no Brasil nesses últimos cinco dias tivessem ocorrido em qualquer outro país que se respeite e cujas instituições estejam no seu perfeito vigor, não estaria o plenário do Senado Federal, neste momento, sem um único Senador da Base de sustentação do Governo. Não haveria no plenário do Senado Federal algo em torno de meia dúzia de Senadores. Já teríamos chegado ao aeroporto da Capital num clima não de tranqüilidade, mas de apreensão.

O Brasil, esta semana, após o pronunciamento do Ministro da área dos hidrocarbonetos da Bolívia - o que saiu e o que entrou -, por suas declarações, teve sua soberania diminuída. Uma instituição como o Tribunal Superior Eleitoral, cujo Presidente também é Ministro do Supremo Tribunal Federal, ser atingida na sua dignidade suprema. A instituição democrática do Estado de direito ser vilipendiada, atacada; e, salvo algumas declarações, nada mais?!

Tudo está normal, tudo está em ordem depois da declaração do Presidente Lula de que, se acordassem o diabo que ele tem no corpo, ele fecharia o Congresso Nacional?! Trata-se de uma declaração contra o Estado democrático de direito, ferindo a Constituição, em uma ameaça explícita, direta, clara!

Depois de toda a bandalheira que este País já viu, surgem mais quase R$2 milhões nas mãos dos corruptos do Palácio do Planalto?!

Refiro-me ao Sr. Gedimar Passos, que foi preso com o dinheiro e que trabalha na campanha do Presidente Lula fazendo análise de informações. Aliás, foi Berzoini quem disse isso, o Presidente Nacional do PT. Como se casam os fatos! Ele foi contratado exatamente para analisar informações, inclusive a do dossiê, por autorização - segundo ele próprio disse à Polícia Federal - do Sr. Freud Godoy. Além dele, cito o Sr. Jorge Lorenzetti, militante do PT, churrasqueiro do Lula, que em 1999 dividia apartamento com quem? Com Delúbio Soares, em São Paulo. O churrasqueiro do Presidente! E, por fim, cito o próprio Freud Godoy, responsável pela segurança da campanha do Presidente Lula.

E Lula sai em defesa deles todos e dá as costas?! Claro! Viaja aos Estados Unidos, diante da normalidade. É tudo normal, tudo normal, tudo natural, tranqüilo. Claro, Senadores! Saí de Aracaju hoje, o sol nasceu no mesmo lugar; cheguei a Brasília, a temperatura estava igual; cheguei ao plenário do Senado, e este se encontra do mesmo jeito em que se encontrava na semana anterior. Tudo normal!

Esse tal de Lorenzetti é exatamente diretor de um banco estatal ou federal de Santa Catarina.

Quando as instituições acordarem, já será tarde. Ou diante de um golpe, ou diante da generalização da desobediência civil. O que esperar? O que esperar? Nós temos na Presidência um senhor absolutista. Faz o que fez, patrocina o que patrocinou - a declaração do diabo que ele diz ter no corpo; o fato na Bolívia; os grampos no TSE; esse dossiê, esse dinheiro -, e está tudo normal?! Esperar mais o quê?

Só que há um problema, Srªs e Srs. Senadores, povo brasileiro: a esse Governo já se permitiu tudo, e as instituições nada fizeram, inclusive o Congresso Nacional, porque tudo é normal. Comprar a maioria do Congresso com mensalão e com a permissão de tantos outros escândalos, a exemplo dos sanguessugas; a corrupção generalizada do Governo; dinheiro ilegal sai por todos os poros, dinheiro da corrupção! O Planalto está enlameado. Não é possível! Sai dos recintos internos do Palácio do Planalto o Sr. Waldomiro Diniz; depois, os que foram cassados, afastados e denunciados pelo Procurador da República, a exemplo de José Dirceu, Gushiken, Delúbio e tantos outros, todos do Palácio do Planalto. Agora, surgem o Gedimar, o Lorenzetti e o Freud!

Sr Presidente, Srªs e Srs. Senadores, revivendo a História, temos conhecimento de o que a omissão gera: a violência, o desastre. E as instituições do nosso País estão sendo omissas. Não deveríamos ter ouvido simples declarações.

Recordo-me de que a 2ª Guerra Mundial - buscando estabelecer um parâmetro e guardadas as devidas proporções - aconteceu com tal profundidade e gravidade porque a Europa e o resto do mundo, sabendo o que Hitler fazia, deixavam-no fazê-lo; sabendo como ele se armava, deixavam-no armar-se; sabendo como ele ameaçava, deixavam-no ameaçar. As instituições brasileiras estão vendo como o Governo do Sr. Lula da Silva se arma, se estrutura, se aparelha. E todos o estão deixando fazê-lo. Quando pode, o Governo usa o dinheiro pela via oficial, o qual é desviado, a exemplo do que constatou, recentemente, o Tribunal de Contas da União - mais de R$10 milhões em cartilhas; a exemplo do dinheiro que é liberado para instituições como o MLST, como o próprio MST, a CUT e a UNE, para aparelhar os seus estamentos, para o que der e vier.

Lembro aqui algumas palavras de Serge Tchakhotine, contidas em sua obra A Mistificação das Massas pela Propaganda Política, originalmente em francês e cuja tradução é do nosso estimado, inesquecível e imortal ex-Governador Miguel Arraes. É dele a tradução desta obra. Na introdução, Serge diz assim:

Para legitimar suas conquistas, os ditadores sustentaram, seguidamente, que elas eram efetuadas, quase sempre, pacificamente, ou, pelo menos, sem emprego de violência física. Isso não é verdade senão na aparência: a ausência da guerra não impede o emprego de uma violência não menos real, é a violência psíquica.

Tudo o que esse Governo faz está sendo permitido. Tudo o que esse Governo realiza está sendo, de forma omissa, permitido e, como se diz no jargão jovem, tomando o fôlego dos adversários políticos e das instituições.

Ele prossegue dizendo:

A ameaça - os discursos de Hitler - associada à visão da arma mortífera - a mobilização do exército alemão - eis a fórmula exata, segundo a qual os ditadores modernos exercem a violência psíquica. Foi precisamente isso o que se passou, por exemplo, na Europa, em setembro de 1938, e que levou as velhas democracias à capitulação, em Munique.

Tudo isto acontece, Srª Presidente, em uma única semana: a diminuição da soberania do País diante de declarações de Ministros bolivianos, os grampos do Tribunal Superior Eleitoral, esse ato de corrupção, a declaração do Presidente de que ele poderia fechar o Congresso Nacional. Isso é golpe, a exemplo da Constituinte que ele queria também, como ele disse, para após sua eleição, porque ele se considera eleito. Isso também é golpe. Tudo isso é natural. Ele dá as costas, sim, porque nada acontece aqui, e viaja para os Estados Unidos.

Prossegue o autor do livro com palavras de Hitler:

“Construímos um armamento tal que o mundo jamais viu - posso agora confessar abertamente”.

“Em cinco anos, eu me armei efetivamente. Gastei milhões e equipei tropas com as armas mais modernas”.

“Temos os melhores aviões, os melhores tanques...”.

São frases do discurso do chanceler Hitler, no Palácio dos Esportes, em Berlim, em 27 de setembro de 1938, discurso dirigido ao mundo inteiro, que ouvia atento.

Atento, porém silente, de forma covarde, sem reação, sem uma postura à altura para refrear aquela malsinada vontade de destruir e dominar o mundo.

“Dei ordem de erigir fortalezas gigantes em frente à linha Maginot francesa”, declarava ele, em meio aos urros aprovadores da massa nazista em Nuremberg.

“As forças alemãs” [era assim que ele falava], “o gládio alemão”, etc, eis o que se ouvia da boca do senhor da Alemanha, nos anos fatídicos que precederam à Segunda Guerra Mundial e isso se repetia em todas as ocasiões.

Na Itália, com Mussolini, não era diferente. E o que faziam os outros países? O que as nossas instituições estão a fazer? Nada.

As declarações que se ouviam dos outros estadistas eram a paz, da paz, pela paz. Era o refrão que se oferecia como desculpa a essas palavras dos ditadores em todas as oportunidades, em todas as situações, no campo adverso, nas democracias européias. Quem não deseja a paz? Quem é tão tolo ou miserável para invocar o pior dos flagelos humanos, que é a guerra?

Ter horror à guerra é bem diferente de cultivar a esperança de evitá-la só com palavras, ladainhas e invocações em face do perigo, o que restabelece, na verdade, certas práticas medievais em que, ao incêndio, à peste e à seca, se opunham as procissões com imagens santas.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inúmeros já fizemos advertências, muitas, sobre o que poderá acontecer diante de tanta omissão. O exemplo que trago, guardadas as devidas proporções, em outro patamar, é exatamente o que estamos a presenciar no Brasil. Tanto é verdade que nada acontece nesta semana pré-eleitoral; em outros tempos, mesmo no Brasil, no mesmo momento pré-eleitoral, este Congresso estava a fervilhar.

O Presidente não sabe de nada. Para ele, não aconteceu nada. As instituições estão no mesmo lugar. Não há uma reação à altura.

Sr. Presidente, a ditadura militar que sofremos neste País também não sabia do que acontecia. Mas tudo acontecia nos porões. Sabemos hoje, com mais detalhe, até pelas palavras contidas na obra magnífica do jornalista Elio Gaspari, como se matava na ditadura militar. Mas o Presidente militar, general de plantão, não sabia. Até que um dia ele exonerou o comandante em São Paulo.

Como se torturava! Como se fazia presos políticos desaparecerem! Cometiam-se atos de terrorismo! Havia forças militares e paramilitares. Está aí a história do Riocentro. Os militares não sabiam de nada. Negavam. Não era do conhecimento deles, porque o Governo era dominado por uma linha dura. Mesmo que, na Presidência da República, como general, não estivesse um assassino, ele era o comandante-geral de todas as tropas e era sua responsabilidade tomar conhecimento de tudo.

Como é que o Presidente da República não sabe o que acontece no seu jardim, no seu quintal, na sua cozinha, com o seu churrasqueiro, com aquele que administra, que trabalha as informações do seu comitê de campanha? Como ele não sabe da atitude dessas pessoas? O dinheiro vem de onde? O dossiê vem de onde?

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o roubo é para o enriquecimento pessoal, individual, mas também é para o aparelhamento dessas organizações, é para a manutenção do seu projeto de poder.

Não podemos, em hipótese alguma... E venho à tribuna exatamente para deixar esta mensagem: tudo isso é normal? Ou tudo isso se transformou em coisa normal neste País?

Disse e repito: quando as instituições acordarem, já será tarde, pois, na Presidência da República, há um Presidente que diz possuir um diabo em seu corpo que o cutuca permanentemente para um golpe de Estado, para fechar o Congresso Nacional. Que espécie de Presidente é esse? E as instituições não tomam uma providência, não há uma interpelação.

Será que o jornalista que fez a publicação de informação que recebeu de um empresário paulista está a mentir? Então, processe-se o jornalista. Ele poderia omitir a fonte, a lei lhe assegura esse direito. Mas, ao contrário, o jornalista Elio Gaspari falou a fonte, disse quem passou a informação para ele em seu artigo deste final de semana.

Que Presidente é esse que temos, que ameaça as instituições todos os dias, e nada acontece? Trata-se de um Presidente que mente sem qualquer pejo, sem qualquer ressentimento.

Sr. Presidente, o Presidente Lula, na última sexta-feira, chegou a Aracaju - para concluir -, em ato de campanha, de comício, e a imprensa publicou. Como sabe que o nosso Estado é contrário ao projeto de transposição das águas do rio São Francisco, Lula falou: “Não existe no Brasil uma outra pessoa que deseje mais do que eu promover a revitalização do rio São Francisco. Não pode haver transposição de águas que não existem”. Palavras do Presidente Lula: “Não pode haver transposição de águas de onde não existe”. Quer dizer, ele admitiu que o rio São Francisco está seco na sua foz. Isso ocorreu em Aracaju, mas, duas horas antes, no mesmo dia - apenas duas horas antes -, em Natal, no Rio Grande do Norte, onde se deseja a transposição, em praça pública, em comício, o Presidente disse: “O projeto está pronto, inúmeras audiências públicas foram feitas, mas uma parcela da elite, que se acha dona do rio São Francisco, não quer”.

Quer dizer, no Rio Grande do Norte, é uma parcela da elite que não quer a transposição; em Sergipe, é porque está seco, não tem água. E continua: “É essa mesma elite que abre a geladeira e bebe água francesa que não quer trazer água para o semi-árido do Nordeste”.

Pode uma coisa dessas? Esse é o Presidente que temos, que não tem o mínimo de respeito pela população a quem ele dirige a palavra. Ele diz isso duas horas antes em Natal para, duas horas depois, em Aracaju, dizer o contrário. Ele fala exatamente aquilo que a platéia, naquele instante, está desejando ouvir.

Se estivéssemos, portanto, em outro país, se a nossa sociedade não estivesse acho que traumatizada, anestesiada com tudo o que acontece, o Brasil, no dia de hoje, não estaria com essa calmaria toda que estamos a presenciar. Neste momento, neste plenário, entre os Senadores da Maioria do Governo, estão presentes apenas dois ilustres e nobres Senadores de sua Base de sustentação, e mais ninguém. Por que razão? Porque, na Presidência da República, está o senhor “absoluto”, absolutista, e as instituições estão permitindo que lá ele permaneça.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/09/2006 - Página 29291