Discurso durante a 183ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade de investimento público para estimular o crescimento econômico. Defesa da redução nos gastos correntes, de avanços nas reformas da previdência social e tributária, e da implementação de obras de infra-estrutura. Apoio à desoneração dos investimentos, conforme declaração do Ministro da Fazenda, Guido Mantega.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. POLITICA SOCIO ECONOMICA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Necessidade de investimento público para estimular o crescimento econômico. Defesa da redução nos gastos correntes, de avanços nas reformas da previdência social e tributária, e da implementação de obras de infra-estrutura. Apoio à desoneração dos investimentos, conforme declaração do Ministro da Fazenda, Guido Mantega.
Aparteantes
Marcelo Crivella, Romero Jucá.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/2006 - Página 34322
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. POLITICA SOCIO ECONOMICA. GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • REGISTRO, IMPORTANCIA, ELEIÇÕES, UTILIZAÇÃO, TECNOLOGIA, URNA ELEITORAL, AUSENCIA, CONFLITO, DISPUTA, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, PARTIDO POLITICO, CAMPANHA ELEITORAL, AMPLIAÇÃO, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, REELEIÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, CONTRIBUIÇÃO, REFORÇO, DEMOCRACIA, SOBERANIA POPULAR, BRASIL.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, AUMENTO, DEBATE, BANCADA, OPOSIÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ELABORAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, REFORMULAÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, BIOTECNOLOGIA, LEI DE FALENCIAS, ESTATUTO, DESARMAMENTO.
  • REGISTRO, OBJETIVO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, AUMENTO, INCLUSÃO, POPULAÇÃO CARENTE, PROGRAMA ASSISTENCIAL, MELHORIA, QUALIDADE, EDUCAÇÃO.
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, AMPLIAÇÃO, SUPERAVIT, INCENTIVO FISCAL, SETOR PRIVADO, REDUÇÃO, TRIBUTOS, GASTOS PUBLICOS, EXPANSÃO, EXPORTAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), JAPÃO, UNIÃO EUROPEIA, APERFEIÇOAMENTO, EFICIENCIA, PRODUTIVIDADE, SERVIÇOS PUBLICOS, ESPECIFICAÇÃO, ABERTURA, VAGA, UNIVERSIDADE FEDERAL, PERIODO NOTURNO, UNIÃO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), AVALIAÇÃO, QUALIDADE, POLITICA, SETOR PUBLICO, UNIÃO FEDERAL, ESTADOS, MUNICIPIOS, CRIAÇÃO, FUNDOS, FINANCIAMENTO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), REFORÇO, LOGISTICA, EDUCAÇÃO, ESTABELECIMENTO, SUBCOMISSÃO, CONGRESSO NACIONAL, DEBATE, BOLSA FAMILIA, REFORMA TRIBUTARIA, AUMENTO, EMPRESA PRIVADA, PODER PUBLICO, INVESTIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, OBJETIVO, MELHORIA, CRESCIMENTO ECONOMICO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), BRASIL.
  • ELOGIO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, COMERCIO EXTERIOR, EX MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), PRESIDENTE, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DO DESENVOLVIMENTO DA INDUSTRIA E DO COMERCIO EXTERIOR (MDIC), ITAMARATI (MRE), PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROMOÇÃO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, AUMENTO, EXPORTAÇÃO, PAGAMENTO, DIVIDA EXTERNA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), INFERIORIDADE, INFLAÇÃO, CUSTO, CESTA DE ALIMENTOS BASICOS, SUPERIORIDADE, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO CARENTE, BOLSA FAMILIA, REDUÇÃO, POBREZA, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, REGISTRO, DADOS.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, subo a esta tribuna num momento importante da história do País, quando a democracia brasileira sai vitoriosa pelo pleito que tivemos, que foi uma demonstração, primeiro, de competência pela informatização das urnas, pela agilidade, pela falta de “conflitualidade” na disputa democrática, mas, sobretudo, pela intensa participação dos partidos, pela mais ampla liberdade democrática de expressão.

Saio particularmente realizado com o resultado dessas eleições, que, sobretudo, reafirmaram um caminho que eu acreditava ser o melhor para o Brasil. A vitória do Presidente Lula com quase 61% dos votos no segundo turno foi uma afirmação popular, um reconhecimento da sociedade e um estímulo para que se possa avançar no caminho trilhado ao longo desses quatro anos.

Quero dizer, no entanto, que a eleição acabou e que é importante as forças políticas descerem do palanque, para que possamos restabelecer, no âmbito do Parlamento e particularmente do Senado Federal, um ambiente que esteve presente no início do primeiro Governo do Presidente Lula.

Esta Casa foi fundamental no diálogo entre Oposição e Governo e na elaboração de políticas públicas. O que fizemos de aprimoramento do projeto de reforma tributária foram concepções e inovações construídas a partir do Senado, suprapartidariamente.

Aprimoramos o projeto de reforma da Previdência.

Inovamos o projeto de biossegurança, inclusive num impasse longo que existia em relação a como inovar a ciência e a tecnologia e estimular o investimento em pesquisa com a segurança que é necessária nesse caminho da biotecnologia.

Igualmente, propusemos a inovação na Lei de Falências, um estatuto jurídico de quase meio século sem alteração, construído por esta Casa e que hoje agiliza a solução de conflitos, diminui o custo jurídico das empresas e dá estímulo ao crédito e ao financiamento.

Podemos citar também o Estatuto do Desarmamento, que foi uma iniciativa nascida no âmbito do Senado Federal, no âmbito do Congresso Nacional e que foi fundamental para desarmar e criar uma cultura de paz e de não violência na sociedade.

Há uma lista longa de avanços legislativos que nós tivemos. Creio que esse ambiente de diálogo e de negociação e de disputa, a partir de propostas e de concepções, é fundamental que se restabeleça neste momento. Todo o meu esforço será feito no sentido de propor um debate que avance nessa direção.

É com essa intenção que venho a esta tribuna, porque considero que o maior desafio do novo Governo do Presidente Lula e do Brasil, neste momento da sua história, é constituir um pacto pelo crescimento econômico. O Governo definiu que o seu eixo será desenvolvimento econômico, inclusão social e educação de qualidade, mas não haverá desenvolvimento com inclusão social e educação de qualidade sem a força do crescimento econômico.

O crescimento é o maior desafio, não apenas deste Governo, mas, eu diria, da nossa geração. Isso porque nós somos o País que, de 1880 a 1980, sustentou a maior taxa de crescimento da economia internacional e a segunda taxa de crescimento de PIB per capita, perdendo apenas para o Japão. E, no entanto, nos últimos 26 anos, vimos trilhando taxas de crescimento extremamente modestas, quando não mais medíocres.

Pelo tamanho desta Nação, pelos recursos naturais que possui, pela sua base industrial, científica e tecnológica, pelo seu potencial agrícola, pela capacidade de produzir energia com menor custo ambiental, pela sua força de trabalho, pela criatividade de seu povo, não é possível nos acomodarmos nesse cenário.

Portanto, o grande debate neste início de governo, do meu ponto de vista, é definir qual o melhor caminho para o crescimento.

Vejo neste momento quatro posições que disputam, teoricamente, em concepção de políticas públicas, o caminho do crescimento econômico, e vou nominá-las, mais para facilitar o entendimento do que propriamente para estereotipar a posição.

A primeira posição é a que eu chamaria de concepção neoliberal. Tal concepção é muito bem defendida, por exemplo, recentemente, pelo economista - bastante competente e convicto desses valores - Gustavo Franco, que diz, bem como dizem todos os economistas reconhecidos neste País, que não haverá crescimento econômico acelerado se não aumentar a taxa de investimento da economia. A grande questão do crescimento é aumentarmos o que os economistas chamam de formação bruta de capital fixo ou a taxa de investimento da economia.

Vou dar alguns exemplos. O Brasil cresceu, de 1994 a 2005, a uma média de 2,7% ao ano, com uma taxa de investimento de 19% do PIB. O México cresceu de forma muito parecida com o Brasil: 2,9% do PIB, com uma taxa de crescimento de 20,1% do PIB. Portanto, investiu muito próximo e cresceu também muito próximo. O Chile foi um pouco além: teve uma taxa de crescimento de 5,1% do PIB e uma taxa de investimento de 23,1% do PIB.

A Índia cresceu mais: 6,5% do PIB e investiu 23,7% do PIB. A China cresceu 9,6% e investiu 36,1%. Portanto, não haverá crescimento acelerado se não aumentarmos a taxa de investimento.

Aqueles que advogam os valores e a concepção neoliberal entendem que o único caminho para alcançarmos uma taxa de investimento próxima a 25% do PIB, pelo menos, para que possamos almejar crescer 5% ao ano, ou um intervalo entre 25% e 30% do PIB, para que possamos crescer, talvez, 7% ao ano, é o do setor privado. Ou seja, para se chegar ao Estado mínimo, deveríamos fazer um grande ajuste fiscal, aumentar o superávit primário, para reduzir carga tributária e abrir espaço para o setor privado cumprir esse papel.

Entendo que não há como o setor privado sozinho percorrer esse caminho, ainda que seja sim o setor privado a principal força motriz do investimento e do crescimento econômico. Dos cerca de 20% do PIB que temos hoje como taxa de investimento, 17,8% vêm do setor privado e apenas 2,2% vêm do setor público, incluindo aí o Orçamento Geral da União e as Estatais. Por isso, é o setor privado a grande força motriz. No entanto, para o setor privado poder alavancar o investimento, o Estado brasileiro terá que investir mais e, evidentemente, terá que desonerar para estimular o investimento privado.

Não compartilho dessa visão e não creio que poderemos avançar seguindo a idéia do Estado mínimo e a idéia de que só o setor privado será capaz de resolver a questão do crescimento.

De outro lado, há uma posição que basicamente defende o continuísmo da política econômica. Considero que a política econômica do primeiro Governo foi vitoriosa e quero aqui render minhas homenagens ao ex-Ministro Palocci e ao Presidente do Banco Central Henrique Meirelles, que capitanearam esse período da história econômica. A política econômica foi vitoriosa. Foi vitoriosa porque, desde o Governo Médici, este é o primeiro Governo que assume o mandato sem ter crise cambial, sem ter ameaças no balanço de pagamento e sem ter o monitoramento do Fundo Monetário Internacional, que restringe a liberdade de ação e que foca toda a política econômica basicamente no pagamento da dívida.

Portanto, foi um grande êxito, por exemplo, a nossa política de comércio exterior. Quero aqui render as minhas homenagens ao Ministro Furlan e ao Ministro Celso Amorim - que conduziram a política externa sempre sob a orientação do Presidente Lula - porque nós conseguimos mais que dobrar as exportações. Hoje, temos reservas cambiais superiores a US$75 bilhões, “pré-pagamos” a dívida com o FMI, reduzimos o estoque da dívida externa, especialmente da dívida externa pública, e o País tem uma condição que não teve ao longo de mais de 30 anos, que é um balanço de pagamento e contas externas resolvidas para pavimentar um caminho de crescimento sustentável.

E mais: conseguimos não apenas liberar a política econômica - exatamente por superarmos a vulnerabilidade das contas externas e por não termos mais as restrições do Fundo Monetário Internacional - como avançamos na estabilidade econômica. Hoje temos uma inflação inferior a 4% e a cesta básica com um dos menores custos da sua história recente. Isto significou poder de compra para o trabalhador, comida na mesa do trabalhador. O salário mínimo tem o melhor valor dos últimos 20 anos. Mais de 82% dos trabalhadores tiveram um reajuste acima da inflação com um ganho real de salário. Conseguimos ampliar o crédito consignado e o financiamento ao consumo. Conseguimos um programa, o Bolsa-Família, que atinge 11,1 milhões famílias. Tudo isso reduziu a pobreza em 19% e melhorou a distribuição de renda, tarefa que, durante quatro décadas, não foi alterada, em todo aquele período de crescimento sem distribuição de renda ou de crise, onde as coisas se agravavam para a população mais pobre. Nós alteramos a distribuição de renda.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sou contra o continuísmo da política econômica. A política econômica que tivemos nesse período foi uma política de transição, uma política que cumpriu o seu papel; foi uma política que estabilizou a economia. Isso ocorreu, basicamente, porque nós fizemos um superávit primário crescente, para reduzir o crescimento da dívida pública, e conseguimos estabilizar a dívida pública na relação com o Produto Interno Produto. Além disso, atacamos com a política externa numa nova orientação, explorando novos mercados como a América Latina os países da África e da Ásia. E vejo que, no segundo Governo, temos que explorar mais a União Européia, os Estados Unidos e o Japão porque, se é verdade que o nosso volume de exportação, a taxa de crescimento de exportação para Estados Unidos, Japão, União Européia e Canadá é a mesma do crescimento mundial nesses quatro anos e nós crescemos, basicamente, para as outras áreas do mundo, temos que olhar mais e continuar explorando os mercados e a relação sul-sul, como fizemos.

Essa política econômica não vai permitir o crescimento de 5% ao ano, que é a meta do segundo Governo. Não vai permitir. Não adianta continuarmos apenas aumentando o superávit primário, fazendo ajuste fiscal e buscando combinar essa política monetária com a política fiscal que aí está, porque não chegaremos ao crescimento de 5%.

Vejo, no entanto, duas alternativas desenvolvimentistas que debatem um novo caminho para a política econômica no Governo. Uma primeira posição, que eu chamaria de velho desenvolvimentismo, tem, basicamente, a seguinte expectativa: vamos explorar os espaços da política monetária, porque eles existem.

Quero aqui fazer um parêntese. Eu defendi a política econômica durante quatro anos, como Líder do Governo. Escrevi um livro para dizer que os resultados do Governo tinham um imenso alcance social, quando a maioria dos analistas da imprensa, uma parte importante dos veículos de comunicação e das lideranças deste País não enxergava a qualidade do Governo, não via as repercussões sociais e não imaginava que poderíamos vencer as eleições como vencemos.

Durante o Governo anterior, eu, por exemplo, critiquei quando o Conselho Monetário Nacional, Fazenda e Banco Central estabeleceram metas de inflação extremamente baixas, que exigiam uma carga de juros muito elevada, que levavam o Banco Central a uma posição conservadora de que não quer correr nenhum risco com a inflação, mas transfere o risco para o Tesouro Nacional e para o PIB, como aconteceu em alguns momentos do período anterior.

Tanto é verdade que eu tinha razão no debate sobre meta de inflação que eles tiveram de rever a meta ao longo de 2005, para uma meta mais realista, e hoje estamos com a inflação abaixo da meta.

Mas o que é o velho desenvolvimentismo? É imaginar que apenas baixando os juros vamos poder gastar mais, investir mais, vamos impulsionar o crescimento econômico, aumentar a oferta de bens. Portanto, a relação dívida pública/PIB vai melhorar pelo aumento do denominador, pelo crescimento do PIB, a inflação não voltará e, com o crescimento, vamos acomodar as pressões inflacionárias.

Acho, Senador Tião Viana, a quem em breve concederei a palavra, que o caminho do velho desenvolvimentismo pode, sim, levar ao crescimento, mas podemos ter uma bolha de crescimento. Podemos ter uma primeira expansão do PIB, estimulado pelo gasto, pelo investimento público, pela redução dos juros, mas assistiremos a uma pressão inflacionária, assistiremos, seguramente, a uma deterioração das finanças públicas, o que ainda é o maior obstáculo econômico ao crescimento acelerado sustentável, e o Governo poderá se ver, no momento seguinte, obrigado a fazer um ajuste fiscal ainda mais severo, comprometendo e abortando não só o crescimento, mas num momento político muito mais difícil, porque o melhor momento de todo governo é o seu início. Não acredito que esse seja o caminho mais promissor e vejo, às vezes, uma expectativa quase que de um certo romantismo econômico, como se fosse possível simplesmente baixar os juros, aumentar o investimento, continuar aumentando o gasto corrente e imaginar que não teremos pressão inflacionária e teremos um crescimento acelerado.

Eu advogo outro caminho. O caminho que proponho, seguramente, não é o caminho mais fácil, nem para o Governo, nem para o Senado Federal, mas acho que é o mais sólido, o mais consistente, o mais sustentável, o mais promissor. O caminho que eu defendo para esse pacto do crescimento exigirá, sim, sacrifícios, especialmente do Estado brasileiro, mas trará resultados que serão extremamente compensatórios para as exigências e os sacrifícios que deveríamos fazer neste início de Governo.

O que defendo, Senador Tião? Defendo o que eu chamaria de um novo desenvolvimentismo, porque é verdade que o Plano de Metas de Juscelino Kubitschek foi um grande momento da história econômica. Brasília, o parque automotivo, a estrutura de transportes rodoviário e ferroviário, a indústria naval, aquele grande salto na industrialização, a indústria automotiva, a eletroeletrônica, de bens de capital, os 50 anos 5, a herança que ficou foram essas realizações. Porém, por outro lado, houve uma grave crise financeira do setor público, um período de instabilidade inflacionária, o Governo João Goulart não conseguiu reverter o quadro de instabilidade, o Plano Trienal foi a última tentativa organizada - San Tiago Dantas e Celso Furtado - para estabilizar a economia, e o que tivemos depois foi o Paeg, a ditadura militar, a intervenção dos sindicatos, o arrocho salarial, a censura e uma política de estabilização com repressão, que veio a partir de 64.

Eu diria que um novo desenvolvimentismo exige, neste momento da história, o mesmo compromisso histórico com o investimento que tivemos nos grandes momentos da histórica econômica deste País. O foco da política econômica, da política orçamentária é o investimento, tem que ser o investimento, porque só o investimento, com as inovações científicas e tecnológicas, será capaz de impulsionar o crescimento sustentável do País.

Agora, como aumentar a taxa de investimento? Primeiro, cortando gastos de custeio, reduzindo os gastos correntes, contendo essa expansão dos gastos correntes, porque o investimento virou a variável de ajuste do Orçamento, uma variável de ajuste que hoje representa apenas 0,6% da taxa de investimento do País. Não há espaço para investimento no Orçamento. Temos que lutar por esse espaço no Orçamento. Por isso, não acho um bom caminho da Comissão de Orçamento tirar o redutor dos gastos correntes. É muito cômodo caminhar nessa direção, mas na hora em que tiramos o redutor, seguramente, vamos assistir a um Orçamento que vai comprometer ainda mais a capacidade de investimento. Não haverá crescimento acelerado sem investimento público. Portanto, temos que reduzir o gasto corrente. Como? Minha sugestão é que se crie um grupo de trabalho em cada um dos ministérios, não apenas para conter a expansão do gasto corrente, cortar onde for possível as atividades-meio, enxugar o que for possível enxugar, mas também, e principalmente, aumentar a produtividade do gasto público, aumentar a qualidade do gasto público, para poder manter as políticas sociais e atendermos parte dessas demandas.

Dou um exemplo, Senador Tião Viana. No primeiro Governo Lula, foram criadas 43 expansões de ensino superior, novos campus, cinco universidades federais, seis mil professores universitários contratados, mais de 200 mil bolsas de estudo do ProUni. Acho que nós temos que expandir o ProUni, porque é muito barato: é, basicamente, compensação fiscal com vaga, e o custo marginal é muito pequeno.

Mas não dá para manter o ritmo de expansão do ensino superior que tivemos no primeiro Governo Lula. Qual é a solução para manter a expansão do ensino superior? Temos um professor para 16 alunos, em média, na universidade federal brasileira. Na UFRJ, um professor para 12 alunos. Na França, é um professor para 32 alunos. Se estabelecermos que a meta é, em quatro anos, atingir o parâmetro francês, vamos dobrar o número de alunos em sala de aula, vamos abrir curso universitário noturno nas universidades federais que não têm. E, aumentando a eficiência da universidade brasileira, não teremos o aumento do gasto corrente e poderemos, sim, atingir a meta de um professor para 32 alunos, dobrando o volume de alunos atendidos sem aumentar o gasto corrente. Estou dando esse exemplo porque ele serve para a saúde, para a educação, para todas as áreas do Governo. Aumentar a eficiência e a produtividade, mas não aumentar o gasto corrente.

Segundo, precisamos avançar na reforma da Previdência Social. Esse é um tema muito difícil socialmente e muito delicado politicamente, porque, em um país tão desigual como o nosso, a Previdência Social, especialmente o Regime Geral do INSS, é um instrumento de distribuição de renda, é um instrumento de combate à pobreza. Gastamos com o INSS, quer dizer, o orçamento da Previdência Social foi 7,5% do PIB em 2005, R$146 bilhões, e, com o regime próprio, União, Estados e Municípios, 4,4% do PIB, R$85,3 bilhões. No total, no sistema previdenciário - não podemos somar porque são coisas distintas, mas apenas para ter uma idéia integral -, gastamos 11,9% do PIB e, dependendo da Loas, vai a 12,5% do PIB este ano, R$231,3 bilhões no ano passado, e só temos 8,8% da população com mais de 60 anos. Países que têm 25% da população com mais de 60% anos têm gastos próximos ou até inferiores ao Brasil. Se não enfrentarmos a questão da previdência social, inclusive a sustentabilidade, porque estamos na idade de ouro demográfica - no melhor momento do sistema previdenciário - e não podemos ter um padrão de gasto como esse...

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Peço só um tempo para concluir, Srª Presidente.

Se não enfrentarmos esse tema, não teremos capacidade de alavancar o investimento. Não podemos continuar com uma média de aposentadoria no País de 53 anos. A longevidade está aumentando a cada ano. A população cada vez vive mais. Infelizmente, não podemos seguir nesse caminho.

É evidente que temos de preservar os mais pobres, as políticas sociais, a Lei Orgânica, o Estatuto da Terceira Idade, programas essenciais ao combate à pobreza. Mas esse é um tema que deveria entrar na agenda. Eu não diria, aqui e agora, qual proposta. Mas temos de debater o equívoco, por exemplo, do reajuste de 16% das aposentadorias e pensões em um quadro que sabemos que não é sustentável.

Por isso, apelo para aprofundarmos o debate, Oposição e Governo, em torno de uma agenda, como aumentar a eficiência, como reduzir o gasto corrente, para se aumentar o investimento.

Na mesma linha, proponho que o Ipea - e sei que minha proposta foi muito bem recebida no Ipea -, junto com o Tribunal de Contas da União, seja uma agência de avaliação da qualidade da política pública, estabeleça indicadores de produtividade não só para a União, mas para os Estados e Municípios, para os critérios de repasse de recursos. Já existe isso em outros países. Agências avaliam a qualidade das políticas públicas, parâmetros de produtividade, de eficiência, de qualidade do gasto, para que possamos aprimorar a qualidade do gasto público.

Junto com a redução do gasto corrente, eu defendo que nós avancemos na reforma tributária. O ICMS, hoje, além da irracionalidade de 28 Códigos Tributários, estimula a importação e penaliza a exportação. Como está a Lei do ICMS. Ele estimula uma guerra fiscal que custa pelo menos R$25 milhões ao ano. E nós temos, agora, a nota fiscal eletrônica a ser implantada, que vai permitir calibrar as alíquotas para o destino. Em dois ou três anos, nós temos a verdadeira dinâmica tributária do País, e podemos dar um salto de qualidade na reforma tributária. Vamos enfrentar o tema da reforma tributária e concluir esse capítulo para o qual o Senado tão bem contribuiu.

Da mesma forma, defendo novos mecanismos de financiamento da economia. A Eletrobrás já é uma holding, e devia ser uma holding ainda mais robusta, com todos os ativos energéticos do Estado brasileiro unificados, com uma gestão profissionalizada, para se tornar uma Petrobras de energia, para alavancar capacidade de financiamento de energia, para poder suprir um dos gargalos de investimento, que é o constrangimento energético que se projeta para o futuro. Penso que devíamos discutir um fundo de financiamento que alocasse recursos do FGTS, que tem um patrimônio líquido de R$22 bilhões, recursos do BNDES, Banco Mundial e do BID, a fim de alavancarmos o financiamento público e criar, com isso, mais capacidade de fortalecer a logística e a e capacidade de investimento do Estado brasileiro.

Srª Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, aproveitando a experiência do Plano de Metas, o Governo deveria construir um grupo de trabalho interministerial, ligado à Casa Civil, de alto nível, para acompanhar os projetos estruturantes.

Com relação à siderurgia do Ceará, o que falta para viabilizar? Vamos criar um grupo que trate prioritariamente dessa questão. A refinaria em Pernambuco, o pólo petroquímico do Rio de Janeiro, os investimentos da Norte-Sul ou da Transnordestina, na área ferroviária, ou o Ferroanel, na Grande São Paulo, os projetos na área de papel e celulose, bastante promissores, ou na siderurgia. E acompanhar, como nós fizemos no passado, com agilidade, de forma interministerial, a alavancagem do investimento privado. E aí têm razão aqueles que pedem que voltemos a discutir o marco regulatório, que voltemos a discutir o papel das agências reguladoras em termos da sua profissionalização, para criar um ambiente que estimule o investimento privado no Brasil.

Sr. Presidente, fiquei muito satisfeito hoje ao ver o nosso Ministro da Fazenda, Guido Mantega, falar em um plano fiscal e em desoneração dos investimentos. Nós desoneramos a cesta básica de forma, eu diria, até corajosa, no setor da construção civil, de material de construção, mas a prioridade da desoneração tem que ser o investimento. O investimento tem que ser o foco de esforço do Congresso e da sociedade.

           O que eu proponho, portanto - para dar a palavra a todos -, não é seguramente o caminho mais cômodo ou mais fácil. Eu proponho uma agenda pesada de discussão, uma agenda de esforço, de criatividade, para reduzir gastos correntes, para aumentar o investimento público, para aumentar a produtividade e eficiência do gasto, para aprimorarmos a gestão das políticas públicas, o IPEA como um grande instrumento, com grupos de trabalho em todos os ministérios, da mesma forma que novas formas de financiamento do setor público. Vejo que este País tem todas as condições de voltar a crescer aceleradamente.

Se tivermos coragem política, não nos acomodarmos com as restrições e as dificuldades políticas que se apresentam numa agenda como essa, seguramente colheremos frutos promissores, tanto na política monetária, reduzindo de forma sustentável os juros, que hoje consomem de mais de 8% do PIB, para alavancar o investimento público, cresceremos com estabilidade, contendo a inflação e de forma sustentável. O Brasil voltará a ser o que foi durante tanto tempo na história, um dos grandes motores do crescimento da economia mundial.

Ouço o Senador Romero Jucá.

O Sr. Romero Jucá (PMDB - RR) - Senador Aloizio Mercadante, V. Exª traz para o debate um tema que foi centro de discussão da própria eleição: crescimento econômico e o rumo da economia que o País precisa ter, e tema também da discussão não apenas dos partidos aliados do Presidente Lula no novo Governo que se começa a montar, mas também dos partidos de Oposição. Ouvimos discursos de diversos segmentos dos partidos de Oposição na mesma linha, que é a linha da busca do crescimento, da responsabilidade fiscal, enfim, de todas as questões que V. Exª levantou. E V. Exª levantou caminhos importantes. São importantes, nesses quatro anos, os ensinamentos, as medidas tomadas, os avanços feitos. Mas é claro que, nos próximos quatro anos, vamos ter que ousar mais, buscando o crescimento, a taxa de investimento, enfim, todos esses parâmetros que V. Exª tão bem compara, inclusive com dados internacionais, a fim de mostrar que não adianta querer descobrir a pólvora de forma diferente do que é feito mundialmente. Não será possível, em meu aparte, permear todos os temas colocados aqui, mas, sem dúvida alguma, as reformas precisam ser construídas, e construídas com o apoio da Oposição. V. Exª dá um exemplo. Eu conversava com o Senador Arthur Virgílio esta semana a respeito da busca de um novo caminho de construção dessas transformações, como, por exemplo, a votação que está ocorrendo na Câmara dos Deputados hoje, do reajuste de 16% para os aposentados, trazendo o mesmo reajuste do salário mínimo para a Previdência toda, o que inviabiliza a Previdência. Sei da situação da Previdência hoje, inclusive por ter passado pelo Ministério. Sabemos do desafio que se coloca para o futuro do País. E não é um desafio apenas para o Brasil; o modelo da Previdência é um desafio para o mundo todo. A reforma trabalhista também, e a reforma tributária, que aprovamos há três anos. Fui Relator, e V. Exª, como líder do Governo, conduziu as negociações. Avançamos. Avançamos no IVA, no fim da guerra fiscal, na uniformização do ICMS; enfim, em vários mecanismos de simplificação tributária, preparando o País para uma carga tributária menor e mais justa, que evite o planejamento tributário feito hoje. O País possui 27 legislações diferentes de ICMS. É claro que as grandes empresas, com bons advogados, economistas e planejamento tributário, não pagam impostos; quem paga são as pequenas e médias empresas. Esta semana, demos um passo importante nessa simplificação, aprovando a Lei Geral das Microempresas. Naquele debate, fiz um apelo para que a Câmara dos Deputados vote a reforma tributária, que se encontra naquela Casa há três anos, para avançarmos, pois a reforma tributária é o embrião, contém os pressupostos das outras mudanças que vamos ter de realizar. O corte de gastos é algo que terá de ser feito, V. Exª tem razão.

Quanto à questão da energia, concordo com a visão de que se tem de juntar competências e recursos de investimento, para se ter realmente uma proposta em que a energia não se torne um gargalo. Vou falar nisso, daqui a pouco, no que diz respeito à Amazônia, porque estou inscrito, como Líder. Mas quero parabenizá-lo e dizer-lhe que, sem dúvida nenhuma, esse é o debate, entre os setores do Governo e Oposição, que tem que ser feito no início do próximo Governo. É fundamental que todos nós deixemos o processo eleitoral, já findo - e o Presidente Lula foi eleito com uma margem consagradora de votos -, para que possamos construir este País e ele avance. Daqui a quatro anos haverá outra eleição, e assim sucessivamente. Então, o processo agora não é mais eleitoral, mas de viabilização deste País no que diz respeito ao crescimento, à geração de empregos e enfrentamento de desafios. E V. Exª expõe muito bem tudo isso, direcionando, inclusive, caminhos técnicos e temas a serem debatidos com consistência, como deve ser. Então, eu parabenizo V. Exª pelas considerações que faz.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Romero Jucá, penso que no período daqui até a posse, inclusive da renovação da legislatura, o Governo não pode discutir apenas a formação do seu ministério. O Governo precisa exatamente construir essa agenda mínima, essa agenda de convergência do País, sobretudo para o Poder Legislativo.

Hoje, vi, com muita satisfação, uma afirmação do Senador Arthur Virgílio, propondo um debate mais profundo sobre a questão, por exemplo, do Bolsa-Família, e compartilho dessa idéia. Penso que deveríamos discutir o aperfeiçoamento das condicionalidades na área da educação; deveríamos discutir a porta de saída da inclusão produtiva do Bolsa-Família antes de tomarmos uma medida apressada, qualquer que seja ela. Deveríamos criar uma subcomissão para discutir o Bolsa-Família; criar uma comissão para retomar a discussão da reforma tributária.

Ontem, ouvi o Governador Aécio Neves dizer da disposição de Minas de caminhar na unificação do ICMs, que é basicamente um problema entre o pacto federativo, mas não tivemos essa disposição dos Governadores durante esse período. Portanto, vamos retomar a unificação do ICMs como o grande instrumento da reforma tributária.

Sr. Presidente, para concluir, nessa questão da reforma previdenciária, penso que devemos fazer um diagnóstico mais aprofundado, fazendo uma comparação do nosso modelo com o de outros países.

Como se manter essa responsabilidade social do sistema previdenciário com racionalidade econômica, de forma a permitir a geração de emprego no País? Os grandes penalizados por essas distorções do gasto público são os nossos jovens, que não têm expectativa de emprego: 85% dos jovens presos são semi-analfabetos, não têm seis anos de escolaridade. Pobres! Essa é a violência que está posta.

Quer dizer, a oportunidade de emprego depende de investimento, de crescimento. Essa é a grande questão do Brasil, neste momento. Se crescermos, vamos ter mais recursos para todas as políticas sociais. Mas, neste momento, há que se cortar custeio e aumentar investimento, repensar as formas de financiamento, aumentar a produtividade e eficiência e não expandir o gasto corrente. Não cresceremos se não priorizarmos o aumento da taxa de investimento do País.

Senador Marcelo Crivella.

O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - V. Exª tem toda a razão quando diz que precisamos crescer, mas há de convir que, nestes últimos quatro anos, tem sido feito um esforço enorme para se encontrar desperdícios na administração pública. Penso que, mesmo se tivermos, hoje, nos ministérios do Governo, equipes, tribunais de contas e outros organismos que foram criados, fiscalizando os gastos públicos, vamos encontrar muito pouco para cortar. V. Exª há de convir que nossos hospitais, nossas escolas, nossas estradas, enfim, o serviço público que estamos prestando neste País é deficitário, é ruim, é mal. V. Exª não contempla a hipótese de, diminuindo os juros, termos a necessidade de diminuir também o superávit primário, este, sim, o recurso que nós tiramos da sociedade. Senador Mercadante, eu não me preocupo muito quando a conta de juros é alta, porque ela é contábil. Qualquer pessoa hoje que vai comprar uma empresa tira do banco, por exemplo, R$100 milhões, que estavam aplicados a juros. O sujeito que recebe esse dinheiro vai voltar com ele para o mercado financeiro. Então ele tem outra coisa a fazer: vai aplicar a juros de 13%, 14%, 15%, 16%. No fundo, o recurso é contábil, mas o superávit primário não. Esses são recursos que nós tiramos do pagamento de impostos, sobretudo de pobres, de impostos indiretos, e não devolvemos a eles em forma de serviços. Quando V. Exª indica o caminho do corte de custeio, penso que vamos piorar os serviços públicos neste País. E quem precisa de serviços públicos são os pobres, pois as pessoas ricas têm escolas privadas, têm planos de saúde e acabam se virando. O Presidente Lula deu, esta semana, uma entrevista em que dizia que, ao invés de procurarmos onde cortar, nós deveríamos procurar como crescer. Os governos estaduais também estão hoje numa situação aflitiva, porque, se não renegociarem a dívida pública, todos eles assumem com déficits tremendos. Mal vão poder pagar a folha de pagamento. Acho que V. Exª tem toda a razão quando propõe um debate profundo. Mas é preciso encontrar novas fórmulas. Mais sacrifícios de parte daqueles que dependem do serviço público poderá levar nosso País não ao crescimento, mas a um índice de violência maior ainda. V. Exª é de um Estado que viveu, nesses últimos tempos, momentos dramáticos. Eu já tenho vivido isso cotidianamente desde que assumi o mandato de Senador. Agora mesmo, em Nova Iguaçu, estamos com um ônibus seqüestrado, cercado pela polícia, e dentro do ônibus mais uns tantos desempregados. Por isso, eu peço a V. Exª que reflita também sobre esse aspecto. Concordo com V. Exª em que, sem crescimento, não há solução para este País. Baixamos a taxa de juros em 10%, pois, quando assumimos o Governo era 26% e, hoje, estamos com ela em torno de 13%, 14%. Não fizemos crescer o País baixando a taxa de juros. V. Exª tem razão quando diz que precisamos fazer investimento público. Nos Estados Unidos, de onde voltei há quinze dias, eu vi na televisão a campanha de Arnold Schwarzenegger, na Califórnia, cuja propaganda era: “Gastei US$10 bilhões reformando escola pública”. Ganhou. Acabou de ser eleito novamente. Os Estados Unidos têm um gasto público deficitário imenso, que já vem desde a época do New Deal, e uma política de pleno emprego que surpreende o mundo. Agora estão fazendo o muro, porque o mercado atrai milhares e milhares de pessoas do mundo inteiro, brasileiros, mexicanos etc, porque há emprego. O muro está sendo construído porque o mercado chama pessoas, e eles querem escolher. Normalmente, todos os anos, mesmo na época do 11 de setembro, eles importam um milhão de trabalhadores por ano, legalmente, e entram tantos outros ilegalmente, mas eles agora querem... Eu sei que V. Exª foi Líder, e brilhante Líder do Governo - eu tive a honra de ser seu Vice-Líder - e conhece a economia do nosso País profundamente. Mas, se nós partirmos para mais sacrifício, sobretudo daqueles que dependem do serviço público - e acho que se V. Exª for procurar o que cortar vai encontrar muito pouco, em questões macroeconômicas, será muito pouco para gerarmos emprego e o crescimento que precisamos gerar -, V. Exª talvez encontre esses recursos nesse tal superávit primário, que este ano são R$90 bilhões, e que seguramente poderá ser menor com a taxa de juros a 4%, 5%. Muito obrigado pelo aparte.

O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador Crivella, o seu aparte. V. Exª, mais uma vez, expressa o profundo compromisso social que tem com o nosso povo. Compartilho da idéia de que uma das grandes marcas deste Governo não pode ser perdida - e seguramente não será, pois o Presidente Lula jamais permitiria - que é a defesa dos desprotegidos, o compromisso com os mais pobres, ou seja, a inversão do gasto público para políticas de inclusão social. E isso não vai ser mudado.

Mas há espaço para o aumento da eficiência do gasto público. E eu dei um exemplo de que não são os mais pobres que vão pagar. Na verdade, precisamos aumentar a qualidade dos serviços.

Temos um professor universitário para dezesseis alunos em sala de aula, em média. Na França, há um professor universitário para trinta e dois alunos, em média. Por que a universidade brasileira não pode ter o padrão francês como referência a ser construída em quatro anos?

Se avançarmos nessa perspectiva - ou próximo dessa perspectiva -, vamos dobrar o número de alunos nas universidades públicas federais, sem aumentar o custeio, porque a infra-estrutura está lá, a sala de aula está lá, os professores estão lá. O custo de ampliação das vagas é muito pequeno. Há uma capacidade ociosa. Por exemplo, nas universidades praticamente não há curso noturno, que é o horário em que os pobres podem estudar, para poderem trabalhar. Por que não abrir essa discussão com a universidade?

Assim como estou falando da universidade, pode ter certeza de que, se pararmos para montar um grupo para aumentar a eficiência do Senado Federal e diminuir desperdício de gasto público aqui dentro, vai sobrar dinheiro para investimento. Eu lhe garanto e me proponho, inclusive, a participar desse grupo.

Há muito desperdício e os recursos poderiam exatamente ajudar o investimento, especialmente em infra-estrutura. Então, esse é o desafio.

Vamos modificar o Ipea para uma agência de análise da qualidade do gasto público, a fim de tirarmos indicadores, parâmetros e, assim, exigir esse salto de qualidade. E mesmo do ponto de vista do funcionalismo, temos que construir uma gestão mais moderna, a meritocracia no Estado brasileiro, em que as pessoas recebam também pelo desempenho e pelas metas alcançadas, como já é em outros Estados que estão rediscutindo essa questão do estímulo e do apoio ao trabalho.

Agora, por que não podemos reduzir o superávit primário neste momento? Porque, apesar do superávit de 4,25%, temos um déficit nominal de 3% do PIB. Isso significa que 3% do PIB ao ano é a pressão de crescimento da dívida pública. Se continuarmos a reduzir a taxa de juros sem trazer a inflação de volta, e para isso precisamos do superávit primário, poderemos no futuro reduzir não apenas o superávit, mas a carga tributária e darmos um grande estímulo ao crescimento de maneira mais forte. Mas, neste momento, o superávit primário é indispensável porque o País tem déficit nominal. Se se reduz o superávit primário e não se reduz o gasto, aumenta-se o investimento, aumenta-se o déficit. Se se aumenta o déficit, tem que se tomar mais dinheiro no mercado e aumentar a taxa de juros. Esse é o problema principal. Por isso que o superávit foi fundamental, para permitir que a taxa de juros, que era de 27,5%, viesse para 13,75% e continue numa trajetória de queda. É a menor taxa de juros nominal dos últimos 30 anos; mas ainda é uma taxa muito alta. Então, tem espaço? Tem. Mas o superávit primário é que sustenta essa trajetória de queda. Temos que ter na relação dívida pública/PIB uma trajetória de queda. Aumentando o PIB, vamos melhorar essa relação. E para aumentar o PIB é preciso investimento. Precisamos de investimento privado, sobretudo, mas também de investimento público. E a pauta que precisaríamos discutir é como aumentar a eficiência do gasto público, como preservar as políticas sociais de qualidade, e, ao mesmo tempo, alavancar o investimento público deste País.

É preciso determinação, é preciso despojamento, é preciso ousadia, é preciso criatividade. Neste Senado, nós somos capazes de avançar nessa direção e eu espero que restabeleçamos aquele clima de formulação, de embate, de idéias, de discussão, de propostas que tivemos no início desta Legislatura e que foi tão fundamental ao País e seguramente o será porque, tenho certeza, vai prevalecer.

Muito obrigado a todos e obrigado pela tolerância, Srª Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/2006 - Página 34322