Discurso durante a 191ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a gestão e aplicação dos recursos originários do FGTS.

Autor
Roberto Cavalcanti (PRB - REPUBLICANOS/PB)
Nome completo: Roberto Cavalcanti Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA HABITACIONAL.:
  • Considerações sobre a gestão e aplicação dos recursos originários do FGTS.
Aparteantes
Efraim Morais.
Publicação
Publicação no DSF de 23/11/2006 - Página 35117
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA. POLITICA HABITACIONAL.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, CONSULTORIA, SENADO, AUXILIO, PESQUISA, DADOS, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), REGISTRO, ANTERIORIDADE, APRESENTAÇÃO, ORADOR, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), QUESTIONAMENTO, DESTINAÇÃO, RECURSOS, FUNDOS DE GARANTIA.
  • CRITICA, MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE), CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), FALTA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, OPERAÇÃO, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), NECESSIDADE, DESTINAÇÃO, FUNDOS DE GARANTIA, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, FINANCIAMENTO, IMOVEL, AUMENTO, EMPREGO, CONSTRUÇÃO CIVIL, BENEFICIO, TRABALHADOR.
  • ANALISE, DADOS, RENDIMENTO, SALDO, FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO (FGTS), INFERIORIDADE, INFLAÇÃO, REGISTRO, AUMENTO, RECEITA, CAIXA ECONOMICA FEDERAL (CEF), DEPENDENCIA, RECURSOS, FUNDOS DE GARANTIA.

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu gostaria de iniciar esse nosso pronunciamento tentando explicar, fazer um histórico das origens do mesmo.

Antes de ter o privilégio de estar nesta Casa, procurei a Consultoria Legislativa do Senado. Tive uma excelente receptividade e uma grata surpresa em constatar a excelência do nível da Consultoria Legislativa do Senado Federal.

Isso aconteceu no dia 5 de julho, de 2006, e no dia 1º de agosto tomava posse nesta Casa, exatamente cinco dias após o primeiro contato.

Aprofundando-me no tema habitação, de interesse específico nosso, pudemos, em conjunto com a Consultoria Legislativa, conhecer o que acontece verdadeiramente com o FGTS no Brasil.

No dia 10 de outubro passado, apresentei à Mesa do Senado o Pedido de Informações nº 1.035, de 2006, dirigido ao Ministro da Fazenda, no qual solicitei esclarecimentos complementares para que esta Casa possuísse informações atualizadas a respeito da gestão e da aplicação dos recursos originários do FGTS.

Este trabalho que apresento foi feito, na verdade, a quatro mãos. Por mim e pela Consultoria Legislativa, especificamente um trabalho pessoal do consultor Marcos Kohler.

Sr. Presidente, venho a esta tribuna para falar de um assunto que, no meu entendimento, não vem obtendo a ressonância que a sua importância econômica e social deveriam provocar: o modo de gerenciamento dos recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, o FGTS.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, poderá parecer estranho a V. Exªs que, neste pronunciamento, eu venha a me utilizar de dados gerenciais produzidos pela Caixa Econômica Federal e pelo Conselho Curador do FGTS referentes ao longínquo ano de 2004. Mas trata-se dos últimos dados disponíveis no site do Ministério do Trabalho e Emprego. Percebam, por essa circunstância, como é baixo o nível de transparência com que são tratados os trabalhadores cotistas do FGTS.

Em que pese o fato de já estarmos no fim do mês de novembro de 2006, nem mesmo o relatório de gestão do FGTS do exercício de 2005 foi divulgado nas páginas eletrônicas do Ministério do Trabalho e Emprego, o que denota o baixo nível de transparência desse órgão e da Caixa, o agente operador do FGTS.

Até agora, o que se fez foi publicar um relatório resumido em jornais de grande circulação - tivemos acesso a ele pelo Correio Braziliense de 4 de outubro de 2006.

Não foi por outra razão que submeti à Mesa do Senado um pedido de informações ao Ministério da Fazenda para que a Caixa Econômica Federal forneça informações sobre os programas administrados com recursos do FGTS. Afinal, como o relatório de gestão disponível pouco informa, é preciso obter dados com os quais se possam estimar dois aspectos que julgo essenciais: primeiro, se os recursos do FGTS estão sendo canalizados para os setores de baixa renda da população brasileira; segundo, se esses recursos estão sendo prioritariamente utilizados no financiamento de imóveis novos, uma vez que não basta prover recursos ao mutuário potencial, mas também gerar emprego e renda no setor da construção civil, reconhecidamente aquele mais capaz de absorver mão-de-obra urbana pouco qualificada, exatamente a que mais padece o flagelo do desemprego.

Srªs e Srs. Senadores, como frisei, é essencial que grande parte dos recursos do FGTS seja aplicada em novas construções, de modo a alavancar o emprego e gerar renda para a população mais sofrida, ao dinamizar um setor vital da economia, que é o da construção civil. Mas esse não será o centro deste pronunciamento.

O que mais nos preocupa atualmente é o fato de o FGTS atender a um sem-número de interesses e de interessados, exceto o trabalhador que lá tem seu dinheiro guardado compulsoriamente.

Essa afirmação pode ser contundente. Talvez pareça injusta. Mas, após a apresentação dos dados que trago, V. Exªs hão de concluir que é uma afirmação contundente, sim, mas longe está de ser injusta.

O atual modelo de remuneração dos trabalhadores que têm contas no FGTS tem trazido graves prejuízos a eles. Vamos considerar, por exemplo, um saldo de R$1.000, utopicamente - a quantia de mil reais como exemplo -, existente em 1º de janeiro de 2000. Esse deveria ser corrigido para R$1.605 em 1º de janeiro de 2006, apenas para repor a inflação medida pelo IPCA no período. No entanto, considerando-se a correção paga pelo FGTS, aquela que foi creditada de fato, esse saldo de R$1.000 do nosso exemplo foi corrigido para apenas R$1.414.

Portanto, o FGTS não cobriu nem a inflação!

Ora, no país que pode ser considerado o campeão mundial dos juros, é verdadeiramente impiedoso obrigar o trabalhador a aceitar juros negativos, ou seja, aceitar uma perda no valor real de sua poupança compulsória. Tivemos, nesses seis anos que tomei como exemplo, uma perda real de 12%. Isso significa que o trabalhador vinculado ao FGTS está pagando juros para guardar o seu dinheiro, Srªs e Srs. Senadores. Vejam que absurdo! E pagando juros de 2,13% ao ano para guardar dinheiro!

Se o trabalhador tivesse colocado esse dinheiro em CDBs de noventa dias, o valor obtido, já descontado o Imposto de Renda, seria de aproximadamente R$2.215. Ora, esse valor, comparado aos R$1.414 que a Caixa lhe creditaria, significa uma diferença, uma perda, em termos absolutos, de R$801, cerca de 80% no valor inicialmente aplicado. Acrescente-se que a aplicação em CDBs lhe garantiria disponibilidade imediata, como um padrasto sovina, o mesmo não se pode dizer com relação ao agente operador, a Caixa Econômica Federal.

A Caixa auferiu, no ano de 2005, o montante de R$1,7 bilhão, aproximadamente, a título de taxas de administração. Isso significa que a Caixa Econômica aumentou em 20% a sua receita com taxas de administração entre 2004 e 2005, enquanto a inflação ao longo do ano de 2005 foi de 5,69% - medida pelo IPCA.

No entanto, o que mais chama atenção é que os trabalhadores detentores das contas vinculadas tiveram uma remuneração real praticamente nula. A remuneração dos depósitos do FGTS foi de 5,96%. Menos de meio ponto percentual acima da inflação, em forte contraste com a evolução das taxas de administração da Caixa, que foi de 20%, como mencionado.

Outro aspecto digno de nota é a remuneração obtida pela Caixa a título de taxa de desempenho. Essa taxa decorre do estabelecido na Resolução do Conselho Curador do FGTS nº 295, de 1998. Segundo essa norma, a Caixa recebe uma comissão sobre o que obtiver acima da rentabilidade da poupança na aplicação das disponibilidades do FGTS. Esse piso de remuneração, a poupança, é muito baixo, considerando-se as taxas de juros que os grandes aplicadores podem facilmente obter no Brasil.

Em 2004, a Caixa ganhou com essa taxa de desempenho R$152 milhões e, em 2005, R$223 milhões, configurando uma evolução de 45%.

De fato, considerando-se que o trabalhador mal conseguiu, no ano de 2005, obter remuneração suficiente para compensar a inflação, não é justo que a Caixa consiga amealhar uma rentabilidade tão expressiva a título de taxa de desempenho.

Mas as receitas da Caixa com as operações do FGTS não se resumem a essas. Fora a rentabilidade derivada das operações com mutuários do FGTS, na condição de agente financeiro, a empresa ainda aufere receita proveniente da rubrica “tarifa bancária”, que, no ano de 2005, foi de R$516,3 milhões.

Desse modo, a receita total da Caixa, excluindo-se aquela obtida na condição de agente financeiro, é a soma das taxas de administração e das tarifas bancárias. No ano de 2005, esse valor atingiu R$2,23 bilhões.

Por fim, segundo as demonstrações financeiras da Caixa para o ano de 2005, constata-se que a empresa teve um resultado operacional de R$3,08 bilhões e uma despesa com pessoal de R$4,16 bilhões. Para se avaliar como as receitas obtidas pela Caixa com a gestão do FGTS são relevantes para o resultado da empresa, as comparações seguintes são bastante ilustrativas. Essas receitas equivaleram a 53,7% da despesa de pessoal da Caixa. Caso essas receitas desaparecessem, o resultado operacional - que é o lucro antes dos impostos e da participação dos empregados - seria reduzido em 72,4%; ou seja, o resultado operacional cairia de R$3 bilhões e 80 milhões para um valor real de R$850 milhões.

Esse é o panorama do FGTS.

O Sr. Efraim Morais (PFL - PB) - Senador Roberto Cavalcanti, V. Exª me permite um aparte?

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Com a concessão da Presidência e a permissão para concluir o meu pronunciamento, será um prazer receber o aparte do meu conterrâneo da Paraíba, Senador Efraim Morais.

O Sr. Efraim Morais (PFL - PB) - Senador Roberto Cavalcanti, inicialmente, cumprimento V. Exª pelo brilhante discurso que faz nesta tarde, também pelo trabalho que desenvolveu junto à assessoria da Casa para levantar todos esses dados, partindo de requerimento apresentado à Mesa para que eles pudessem chegar a V. Exª e a sua assessoria.

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Do qual V. Exª foi Relator, com muita honra.

O Sr. Efraim Morais (PFL - PB) - Com muita honra. Quero dizer, Senador, que esse é um trabalho importante, porque, a partir daí, o Congresso Nacional, principalmente esta Casa, saberá conduzir novos caminhos para o FGTS. E V. Exª faz um comparativo que realmente deixa a todos nós em uma situação de observância em relação ao fato. Eu conversava há pouco com alguns Senadores, e tivemos oportunidade, durante o discurso de V. Exª, de lembrar que, normalmente, no que se refere aos projetos de iniciativa dos Parlamentares, do Congresso Nacional, em relação ao FGTS, sempre se encontra um caminho para eles irem para a gaveta, porque ninguém quer descobrir essa caixa-preta. E V. Exª dá um passo muito importante para que possamos pedir mais informações e complementar esse discurso que, tenho certeza, é o primeiro passo para essa caminhada. Acrescento que apresentei, nesta Casa, projeto de minha autoria que amplia o uso do FGTS na habitação, permitindo o pagamento de prestações vencidas. Isso seria um caminho, porque, segundo informação que nos é dada por V. Exª no seu discurso, o dinheiro que ali fica é um prejuízo para os trabalhadores brasileiros, principalmente os regidos pelo regime celetista. Então, quero parabenizá-lo, na certeza de que V. Exª abre um caminho para que nós, os Parlamentares do Congresso Nacional, possamos dar continuidade a essa pesquisa, buscando, evidentemente, o melhor uso desse recurso, principalmente dando retorno aos próprios trabalhadores brasileiros. Parabéns a V. Exª.

O SR. ROBERTO CAVALCANTI (Bloco/PRB - PB) - Eu agradeço o aparte de V. Exª. Espero que, na continuidade do seu mandato, V. Exª dê continuidade aos dados que tive oportunidade de levantar nesta Casa.

Esse é o panorama do FGTS. O panorama do que é essencial na relação entre o FGTS e o trabalhador brasileiro, especialmente o trabalhador de baixa renda. É preciso resgatar a verdadeira função social e a verdadeira função econômica desse grandioso instrumento.

Infelizmente, o Conselho Curador do FGTS não tem sido um canal efetivo de defesa e atenção dos interesses da sociedade em relação a essa ferramenta essencial que é o FGTS. Para V. Exªs terem uma idéia, há certa leniência, eu diria, no trato da gestão do FGTS naquela instância. Outro dia, em reportagem na Folha de S.Paulo (05/11/2006, Caderno B-6), um dos Conselheiros admitia candidamente que não sabia que os valores imputados pela Caixa como despesas, como honorários advocatícios, eram tão vultosos. Ora, um conselheiro que supervisiona um fundo tão importante e tão grande não pode ser surpreendido! Quem ficou surpreendido com essa declaração, com certeza, fomos nós, foi a sociedade brasileira!

Gostaria, portanto, de convidá-los a refletir sobre a importância de modificar essa situação, na qual o FGTS está privilegiando alguns, mas não está beneficiando, de fato, os milhões a que efetivamente se destina.

Todos os dias, temos visto novas opções e soluções mágicas para a aplicação com recursos oriundos do FGTS.

Quero alertar V. Exªs para que, antes de pensarem na distribuição das aplicações desse fundo, pensem antes na remuneração que ele dá a seus reais proprietários, que são os trabalhadores do Brasil.

Temos o maior carinho para com a Caixa Econômica e o papel que ela desempenha em nosso País. Não é possível, no entanto, que, de forma criminosa, o trabalhador brasileiro seja o responsável por bancar, com o seu dinheiro, um resultado operacional do Banco de 72,4%. Só agora, passada a eleição, estou fazendo este pronunciamento.

Não gostaria que o mesmo fosse politizado! Não é culpa do atual Governo, muito menos dos que o antecederam. O mal vem da origem!

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quando ouvirem falar do FGTS, façam primeiro uma pergunta básica: corrigimos a forma de remuneração do trabalhador brasileiro, para que não sejam enganados? Corrigimos a forma com que a Caixa Econômica Federal se beneficia unilateralmente dos recursos desse Fundo?

Só então V. Exªs terão cumprido o papel que o trabalhador brasileiro espera de nós Parlamentares. Façamos desta Casa uma trincheira em defesa do FGTS, tanto na remuneração dos recursos do trabalhador brasileiro quanto na aplicação correta desses recursos.

O que não podemos é admitir, Sr. Presidente, de forma passiva, sob nenhum pretexto, que os trabalhadores brasileiros, donos do dinheiro do Fundo, sejam enganados ao longo de tantos anos.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado pela consideração e pelo tempo extra.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/11/2006 - Página 35117