Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a entrevista concedida pelo ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Roberto Abdenur, à revista Veja, na qual faz críticas à doutrinação ideológica no Itamaraty.

Autor
Jefferson Peres (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: José Jefferson Carpinteiro Peres
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ITAMARATI (MRE), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.:
  • Considerações sobre a entrevista concedida pelo ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Roberto Abdenur, à revista Veja, na qual faz críticas à doutrinação ideológica no Itamaraty.
Aparteantes
Almeida Lima.
Publicação
Publicação no DSF de 08/02/2007 - Página 1231
Assunto
Outros > ITAMARATI (MRE), REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTREVISTA, EMBAIXADOR, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), DENUNCIA, TENTATIVA, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE), MANIPULAÇÃO, SERVIDOR, RECOMENDAÇÃO, LEITURA, IDEOLOGIA, GOVERNO.
  • REGISTRO, INICIATIVA, CRISTOVAM BUARQUE, SENADOR, ELABORAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, ITAMARATI (MRE), CONVITE, EMBAIXADOR, MINISTRO DE ESTADO, ESCLARECIMENTOS, VERACIDADE, DENUNCIA, ENTREVISTA.
  • QUESTIONAMENTO, AUTENTICIDADE, DENUNCIA, EMBAIXADOR, REPUDIO, TENTATIVA, LIMITAÇÃO, OPINIÃO, DIPLOMATA, FAVORECIMENTO, GOVERNO.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estou ocupando esta tribuna para manifestar minha preocupação, que é de muitos outros neste País, com o teor da entrevista concedida à revista Veja, em suas Páginas Amarelas, pelo Embaixador Roberto Abdenur.

Não se trata de um qualquer, Sr. Presidente. É um veterano diplomata dos mais qualificados do Itamaraty, que ocupou, até pouco tempo, o alto posto de Embaixador em Washington. Nessa entrevista, ele faz críticas contundentes à atual condução do Itamaraty.

Mas o que me preocupou na entrevista do Embaixador Abdenur, Sr. Presidente, não foi exatamente a política externa do País, da qual discordo em muitos pontos e concordo em muitos outros. De resto, política externa é questão de opinião. O Presidente da República atual, como qualquer governo, tem o direito de conduzir os rumos desta política como achar melhor. Não é esse o ponto, Sr. Presidente. Realmente preocupante, na entrevista do Embaixador, é a sua denúncia, que confere com informações que me chegaram de outras fontes, de que estaria havendo, no Itamaraty, uma tentativa de lavagem cerebral pela recomendação - quase determinação - dada aos jovens diplomatas - de leitura de textos selecionados pela direção da Casa - leia-se como direção da Casa o Vice-Chanceler, o Secretário-Executivo que, para alguns, é o Chanceler de fato deste País.

Tenho respeito pelo Ministro Celso Amorim, diplomata digno. Tenho boas relações com ele. Acredito que essa versão do Chanceler de fato não seja verdadeira, mas, de qualquer maneira, o Secretário-Executivo tem grande influência na Casa.

Sr. Presidente, obviamente acredito que ninguém neste Senado concordará que um órgão do Governo, um Ministério, faça doutrinação do seu corpo burocrático, seja qualquer for o viés ideológico - conservador, progressista, de esquerda ou de direita -, não importa. O que não cabe é querer fazer leitura dirigida. Isso não é republicano, não é democrático, não é aceitável.

Se a direção do Itamaraty se julga no direito de recomendar textos aos seus membros, Sr. Presidente, que o faça, mas numa escolha pluralista, com livros e trabalhos de várias tendências. A Casa tem que ser pluralista! Agora, “recomendar” textos da mesma linha ideológica, isto se chama doutrinação. Isto é inaceitável! O Senador Cristovam Buarque apresentou requerimento, na Comissão de Relações Exteriores, convidando o Embaixador Abdenur e, em seguida, ao Embaixador Celso Amorim porque ele deve explicações a esta Casa. Fazer a política externa que bem entender é um direito do Governo; doutrinar diplomatas, isto definitivamente não, Sr. Presidente!

Concedo o aparte a quem me pediu. Não sei quem foi.

O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Senador Jefferson Péres, Senador Almeida Lima lhe pede o aparte.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Senador Almeida Lima, com prazer.

O Sr. Almeida Lima (PMDB - SE) - Nobre Senador Jefferson Péres, tive a oportunidade de ler a entrevista a que V. Exª se reporta, publicada nas “Páginas Amarelas” da revista Veja. O fato em si é lamentável, sobretudo por se tratar de um Ministério, a exemplo do Ministério da Justiça, que não considero como um Ministério de Governo, mas um Ministério de Estado. Esta é a concepção que tenho a esse respeito. No entanto, gostaria de fazer duas ressalvas. A primeira delas é que o Governo Lula da Silva está há mais de quatro anos, mas o Ministro, que foi Embaixador em Washington, aguardou deixar o posto para, só então, fazer essa manifestação. Até certo ponto, acho isto inoportuno, pois desqualifica até o conteúdo daquilo que disse. Pela estatura que tem - e sei que é elevada -, ele poderia ter manifestado essa discordância enquanto no cargo ou até mesmo pedido para se afastar do cargo e fazer diretamente esse protesto. A segunda ressalva, para concluir, é exatamente o aspecto de “lavagem cerebral” a que ele se refere. Sou conhecido aqui como opositor ferrenho ao Governo, mas evidentemente, como V. Exª mesmo acabou de dizer, a política externa pertence ao Governo. Não pode ser uma política estática, estável, permanente, ou seja, entra Governo, sai Governo e permanece a mesma. É claro que o atual Governo responde por ela, e será responsabilizado por ela. Quanto à lavagem cerebral, acho também um despropósito, porque lá se encontram diplomatas, pessoas que freqüentaram o Instituto Rio Branco, onde se ingressa por concurso de provas dificílimas, com maturidade, com experiência; não se trata de alunos de grupo escolar. Portanto, tenho e faço as minhas ressalvas às declarações do Embaixador. Se ele tivesse tomado essa decisão e dado as declarações antes de deixar o posto, eu estaria aqui aplaudindo. Como isso não aconteceu, registro as minhas ressalvas, apesar da estatura que reconheço em S. Exª. Muito obrigado, Senador Jefferson Péres.

O SR. JEFFERSON PÉRES (PDT - AM) - Respeito sua opinião que, obviamente, não é a minha. Em primeiro lugar, Senador Almeida Lima, pouco importam as razões pessoais do Embaixador Abdenur. Não vou fazer juízo de valor sobre as razões elevadas ou subalternas que levaram o Embaixador a dar a entrevista. Isso não me interessa. Quero saber o teor da denúncia, se a denúncia tem procedência.

Em segundo lugar, e fui bem claro - aí eu concordo com V. Exª: a direção da política externa é um direito de qualquer Governo, gostemos ou não. Não se trata disso. Agora, fazer leitura direcionada para jovens diplomatas, isto não! O País é pluralista. A Casa tem que ser pluralista. O Itamaraty tem o direito de escolher textos, mas textos de diversas tendências. É sua obrigação fazer isso. Fazer doutrinação não deve, está errado! Eu vou ouvir o Embaixador Abdenur, depois vou interpelar o Chanceler Celso Amorim. Nossa discordância é total neste particular.

Doutrinação, não! De qualquer teor, de direita ou de esquerda, não importa. O Itamaraty tem uma tradição centenária. É um dos poucos órgãos de excelência deste País. Tem um corpo funcional, uma burocracia profissional altamente qualificada. Eu sei que há Embaixadores, há diplomatas constrangidos com isso. Isso não é certo. V. Exª pode concordar com isso. Eu não concordo. Tenho todo o direito de fazê-lo e vou dizer isso vis-à-vis ao Ministro Celso Amorim.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/02/2007 - Página 1231