Discurso durante a 25ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comemoração dos 25 anos do Programa Antártico Brasileiro - PROANTAR.

Autor
Patrícia Saboya (PSB - Partido Socialista Brasileiro/CE)
Nome completo: Patrícia Lúcia Saboya Ferreira Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Comemoração dos 25 anos do Programa Antártico Brasileiro - PROANTAR.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2007 - Página 4874
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, MARINHA, CIENTISTA, HOMENAGEM, ANIVERSARIO, PROGRAMA ANTARTICO BRASILEIRO (PROANTAR), DETALHAMENTO, VIAGEM, ORADOR, ANTARTIDA, AGRADECIMENTO, OPORTUNIDADE, VALORIZAÇÃO, BRASIL, ELOGIO, PESQUISADOR, REGISTRO, HISTORIA, PESQUISA CIENTIFICA, ADESÃO, TRATADO, IMPORTANCIA, ESTUDO, CLIMA, METEOROLOGIA, BIODIVERSIDADE, PREVENÇÃO, CALAMIDADE PUBLICA, BUSCA, ALTERAÇÃO, ALIMENTAÇÃO, EXPECTATIVA, DESTINAÇÃO, RECURSOS ORÇAMENTARIOS.

            A SRª PATRÍCIA SABOYA GOMES (Bloco/PSB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Senador César Borges, que preside esta sessão, meu caro Comandante da Marinha, Almirante-de-Esquadra Júlio Soares de Moura Neto; meu querido - me permita assim chamá-lo - Almirante José Eduardo Borges de Souza, que nos fez o convite para participar dessa viagem inesquecível à Antártida, comandante do navio Ary Rongel, que não está aqui presente; Comandante Parente, que também nos recebeu com todas as honras em seu navio, quero saudar toda a comunidade científica, na pessoa da Drª Tânia Brito e da Drª Cristina Hengel, que têm feito um trabalho excepcional pelo nosso País, dando orgulho a todos nós, brasileiros.

            Começo meu pronunciamento com um tom talvez um pouco diferente, buscando trazer aqui um pouco da emoção que senti nessa viagem tão inesquecível. Portanto, perdoe-me, Comandante, pelos meus excessos, se aqui falar muito mais com o coração do que qualquer outra coisa.

            Sou brasileira e me orgulho disso. Pode parecer clichê usar esta expressão comum, mas nunca a senti tão verdadeira.

            Quando fiz essa viagem, senti até uma certa tristeza por conviver com tantas mazelas, com tantas dificuldades, com tantos desafios, onde tantos e tantos brasileiros criativos e inteligentes que entregam a sua alma e o seu coração em busca de construir um país mais justo, muitas vezes, acabam se decepcionando e, algumas vezes, até se acomodando com essas mazelas que dificultam a vida de milhões e milhões de brasileiros que ainda se encontram excluídos da sociedade. Foi como se essa viagem renovasse o meu patriotismo. Ela fez com que eu conhecesse um outro lado de brasileiros e de pessoas dedicadas a uma causa que muitos de nós, brasileiros, na verdade, não reconhecemos ou sequer conhecemos, que é o Programa Antártico Brasileiro.

            Nesta Casa, onde o trabalho nos obriga a conhecer tantas tristezas que nos cabe combater, onde vemos desfilar um número de erros e dificuldades a serem superados, venho lhes mostrar algo que vi e vivenciei, algo feito por todos nós, brasileiros, com muito esforço, dedicação, trabalho e coragem. Portanto, posso afirmar: sou brasileira e me orgulho disso.

            Trazer esse relato a esta Casa, querendo que os Srªs. e os Srs. Senadores sejam os arautos dessa boa nova, divulgando-a para toda a Nação brasileira, pode lhes dar a mesma sensação que vivenciei.

            Convidada pela Marinha do Brasil, fiz uma viagem ao lado de três companheiros - os Senadores Sérgio Zambiasi, Augusto Botelho e Leomar Quintanilha - à estação de pesquisas na Antártica, a brasileiríssima Estação Antártica Comandante Ferraz.

            A princípio, seria mais uma viagem como tantas outras que realizamos. De diferente, um pequeno toque de curiosidade, já que se tratava de conhecer parte de um continente, famoso por ser a terra dos superlativos. É o mais seco, o mais ventoso, o mais desértico, o mais inóspito e o mais conservado, talvez porque o homem só tenha chegado lá acerca de 200 anos e por ser também o mais afastado dos continentes.

            Embarcamos em um avião da Força Aérea Brasileira - um Hércules - que nos levaria por 11 horas, em três dias, até ao continente gelado. Não se pode dizer que seria uma viagem confortável, mas, com certeza, uma viagem muito prazerosa. Do Galeão a Pelotas, o que mais me chamou a atenção foi a alegria dos nossos companheiros de viagem: militares, pesquisadores oriundos de várias universidades e trabalhadores do Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro, que estavam indo para um estada de pelo menos um mês na nossa estação.

            Mais do que uma viagem de trabalho, longe da família e da civilização, enfrentando temperaturas baixas e ventos fortes, todos pareciam se dirigir a um período de férias. Depois, dei-me conta de que eles viajavam para defender as cores do nosso País em um lugar estratégico, o que exige muito amor pelo trabalho lá executado. E esse trabalho, executado há 25 anos, tem como base principal nossa estação, que agora, em 2007, completa 23 anos. 

            O Brasil aderiu ao Tratado Antártico em 1975, mas apenas em 1982 começamos a nossa fase de pesquisas, após longo período de preparação. Porém, já em setembro de 1983, graças ao valor das pesquisas realizadas e à firme determinação de nossos homens e mulheres que se atiraram nessa obra, nosso País se tornou membro consultivo do Tratado da Antártica, feito conquistado por termos cumprido a condição básica exigida para tal: realizar pesquisas consistentes e relevantes em favor da humanidade. Ser membro consultivo, condição que hoje apenas 29 países possuem, significa ter direito à voz e voto nas decisões sobre o futuro daquele continente.

            Continuando a viagem a bordo do Hércules, um avião militar que trepida e não possui proteção acústica, fomos nos acomodando, da melhor forma possível, em bancos de lonas laterais, encostados ombro a ombro, confortados pelo calor humano e pela vibração daqueles que se unem num objetivo comum, independentemente de, muitas vezes, o País lhes virar as costas, negando minguadas verbas, principalmente para as atividades científicas.

            Primeira parada em Pelotas. Conhecemos a Esantar e o único Museu Antártico brasileiro, algo que nos dá muito orgulho.

            A segunda parada em Punta Arenas, Chile, é uma parada técnica. Serve bem para mostrar a importância do nosso tripulante mais ilustre: Tia Alice. Senhora jovial, encantadora, que, voluntariamente, serve como comissária de todos os vôos antárticos. Figura inesquecível que, do alto dos seus 120 vôos antárticos, deixa uma bela lição de vida, de persistência, profissionalismo e de dedicação ao Brasil.

            Com os helicópteros brasileiros oriundos do nosso navio antártico, o Ary Rongel, comandado pelo Comandante Parente, voamos, finalmente, em direção à Estação Brasileira Comandante Ferraz. Inaugurada em 6 de fevereiro de 1984, tem seu nome em homenagem a um Oficial da Marinha do Brasil que dedicou sua breve vida a levar nosso País ao continente gelado. A Estação conta hoje com uma construção de 2.400m² e vários módulos isolados que servem como laboratórios e refúgios.

            Toda a construção segue critérios baseados na busca da segurança e mínimo impacto ambiental em que questões como o tratamento do esgoto e lixo, o conforto térmico e acústico, assim como a adequada distribuição dos ambientes buscam dar aos moradores a melhor sensação física e psicológica, bem como as adequadas condições de trabalho.

            Especialmente no quesito relacionado à preservação ambiental, o Brasil tem se destacado no cenário internacional, seja por suas soluções tecnológicas, seja pelos cuidados que os moradores de Ferraz adotam em suas atividades cotidianas. Tal posição, certamente, é fruto de um trabalho continuado buscando as melhores soluções - quase sempre utilizando as potencialidades do mercado nacional - e de um esforço em preparar as pessoas que se destinam àquele lugar de características tão especiais.

            No dia-a-dia, a alegria, a camaradagem e o profissionalismo transpiram em cada um dos que estão na Estação, e os cuidados com a limpeza e a conservação nos indicam que seus ocupantes se sentem, efetivamente, em casa; todos contribuem.

            Nas atividades de pesquisa, a variedade de temas e a formação dos cientistas são significativas. No campo das ciências atmosféricas, pesquisamos os efeitos de transmissão eletromagnética na ionosfera, estudamos o efeito estufa e buscamos entender os problemas que assolam o nosso planeta - como as mudanças climáticas -, cujos efeitos danosos se fazem sentir nos dias de hoje. Não é um problema do futuro, senhoras e senhores, é de agora, é de toda a humanidade que irá sofrer suas conseqüências. Somos donos de um grande acervo de dados sobre a redução da camada de ozônio, que permite a passagem de radiação perigosa para a vida humana, responsável pelo aumento da incidência de câncer de pele, principalmente na América do Sul. O Brasil, tão conhecido por suas belas e tropicais áreas litorâneas, com grande parte da economia movimentada pelo turismo - como a minha terra, o Ceará -, não pode ficar alheio a essa realidade, sem contar as prováveis conseqüências que as mudanças de temperatura poderão ocasionar num país agrícola, como o nosso. Os estudos meteorológicos permitem, ainda, prever ocorrências de enchentes, secas, tornados e furacões, como o Catarina que atingiu o Sul do Brasil em passado recente.

            Estudamos os peixes, as aves e toda a vida marinha e dos animais na Antártica, seres que nos dão conhecimentos sobre poluição e contaminação, além de nos permitir pensar em seu aproveitamento no futuro para a alimentação do ser humano.

            Em glaciologia, estudamos o comportamento da atmosfera do planeta nos últimos 500 mil anos, já que a história fica registrada no gelo acumulado, permitindo que se faça uma leitura dos grandes eventos ocorridos no passado para, quem sabe, não repetir onde erramos.

            Nossos estudos tecnológicos, desenvolvidos para as condições rigorosas da Antártica, refletem soluções aplicáveis também no Brasil, seja em aspectos específicos, como os estudos de corrosão e de tratamento dos resíduos sólidos e líquidos, seja no desenvolvimento de metodologias adequadas para a construção em locais inóspitos, como já aconteceu nas estações construídas nas ilhas oceânicas e nas edificações para as áreas de proteção ambiental, como parques nacionais e reservas biológicas.

            Srªs e Srs. Senadores e convidados, o Programa Antártico Brasileiro, Proantar, esteve a ponto, em certo momento, de ser paralisado. Graças às ações do Ministério da Ciência e Tecnologia, do Ministério do Meio Ambiente, do Ministério de Minas e Energia e da Marinha do Brasil, ele sobrevive. Também são importantes os parceiros do Proantar - a Petrobras, que garante o combustível do Programa, e a Telemar, que instalou um moderno sistema de comunicações, com Internet de alta velocidade, imprescindível para os estudos científicos e tecnológicos. São exemplos de trabalho em conjunto para benefício do País.

            Incrível pensar que tudo isso precisa apenas de R$8 milhões por ano - não para pagar todas as despesas, porque muito sai do orçamento da Marinha e das parcerias. Mas as verbas são necessárias para reduzir o aviltamento dos parcos recursos que essas entidades, dedicadas a levar adiante um programa de Estado tão importante, possuem para suas atividades-fim. Temos de trabalhar juntos: participar, incentivar e garantir os recursos financeiros para que esse projeto tenha continuidade.

            Termino aqui as minhas palavras, Sr. Presidente, repetindo, de todo o coração, aquilo que tive oportunidade de dizer lá à comunidade científica e a esse almirante que tive o prazer de conhecer, admirável pela sua dedicação, pelo seu compromisso, pela sua seriedade, mas, mais do que isso, por ter trazido a todos nós a alegria e a certeza de que estamos no caminho certo, no caminho adequado. Refiro-me ao Comandante José Eduardo, esse homem que aqui está e que merece, sim, todas nossas homenagens por tudo, pelo seu esforço, pela forma entusiasmada como fala desse programa, pela certeza que tem de que ele será muito importante para o futuro do nosso País, futuro que tem de começar a ser construído agora.

            Portanto, permita-me o Comandante da Marinha, neste momento, prestar nossas homenagens à Marinha, a esse programa, em nome também do Almirante José Eduardo, que - sei -, em breve, provavelmente, estará em outra missão, mas que deixou a sua marca, a marca do entusiasmo e da dedicação de alguém que acredita neste País.

            Nós, que somos brasileiros, nós, Senadores e Senadoras, estamos aqui representando os nossos Estados com tantas dificuldades, com tantos desafios, num País que, como disse no começo, precisa da nossa união, da nossa força para ser uma Nação decente e que homens e mulheres possam ser felizes, crianças possam ter a alegria de serem felizes, possam ter acesso à saúde, à educação, à moradia, ao emprego.

            É isso que sonhamos, é isso que queremos. É essa a lição que, de um lugar tão longínquo, tão distante, eu pude trazer para mim. Foi uma viagem inesquecível, pelos feitos daqueles que são aventureiros, daqueles que, muitas vezes, se despem de qualquer vaidade num lugar que seria, talvez, o ideal de qualquer sociedade, onde não existe trapaça, onde não existe competição, onde todos, numa só voz, falam com orgulho do nosso País.

            Parabéns à Marinha, parabéns a todos os senhores e senhoras.

            Obrigada. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2007 - Página 4874