Discurso durante a 71ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre todos os "apagões" que vêm ocorrendo no país, especialmente o apagão educacional.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Reflexão sobre todos os "apagões" que vêm ocorrendo no país, especialmente o apagão educacional.
Aparteantes
Heráclito Fortes, Jefferson Peres, Wilson Matos.
Publicação
Publicação no DSF de 17/05/2007 - Página 14797
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • CRITICA, ESTADO, AMPLIAÇÃO, DEBATE, PROBLEMA, CLASSE MEDIA, FALTA, ATENÇÃO, CRISE, EDUCAÇÃO, SAUDE, TRANSPORTE, PREJUIZO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA.
  • NECESSIDADE, GOVERNO, REALIZAÇÃO, DIVERSIDADE, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, SOCIEDADE.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, todos os dias, Presidente Efraim, de manhã cedo e no começo da noite, pelo menos 20 milhões de brasileiros esperam os ônibus, sem saber a hora em que passam por suas paradas. Paradas de ônibus descobertas, sem nenhum apoio, sem nenhum conforto, e ninguém se lembra de fazer uma CPI das paradas de ônibus neste País, nem controlador de vôo há para informar o que se está passando.

            As paradas não têm o conforto dos aeroportos, não têm restaurantes, ar condicionado, sinal elétrico e eletrônico informando os horários dos vôos. E ninguém se lembra do apagão das paradas rodoviárias. Enquanto isso, temos duas CPIs analisando o apagão aéreo. Sou favorável a essas CPIs, Senador Efraim, cuja convocação assinei aqui no Senado. Apenas penso que deveríamos analisar a CPI dos outros apagões que hoje começam a fazer do Brasil um País em declínio civilizatório.

            Não lembramos que centenas de milhares de brasileiros, a cada mês, esperam não o avião, mas a cirurgia que vai salvar suas vidas. Não lembramos que milhões de brasileiros pequenininhos vão para a escola e não têm aula naquele dia.

            Toda vez que um avião não chega, sai no jornal da noite das emissoras de televisão, Senador Jefferson Péres. Mas, quando o professor não vai dar aula, não sai em nenhum noticiário, Professor Valdir Raupp.

            Sou favorável, sim, à CPI do Apagão Aéreo, mas, acho que estamos fechando os olhos para os outros apagões que dominam a vida da sociedade brasileira, porque escolhemos um apagão e não trabalhamos o outro apagão. Isso porque em nosso País só importa o apagão que ofende cada um de nós das classes médias e altas. Os apagões que atingem o povo não despertam CPIs. O único apagão real que hoje incomoda a vida de cada um de nós - e de que tenho sido vítima, Senador -, desperta-nos imediatamente para a necessidade de contratar mais controladores, melhorar as pistas dos aeroportos e exigir das companhias aéreas e do Governo que cada um cumpra o seu papel.

            Sou favorável, não vou negar e insisto para que haja CPI de qualquer coisa, inclusive do apagão aéreo. Mas faço questão de trazer aqui a minha preocupação de ver nós todos do Senado Federal alheios aos outros apagões que tomam conta da sociedade brasileira.

            Na verdade, quando convocamos a CPI do Apagão Aéreo e não levamos em conta o apagão das paradas de ônibus, estamos sendo Senadores apenas dos usuários de avião.

            Tenho sofrido, Senador Eurípides, nos aeroportos, que têm restaurantes, às vezes pagos pela companhia - quase nunca -, com livrarias, para ficar ali olhando os livros. Num desses dias, os vôos foram cancelados, mas tomei um táxi e voltei para casa. E quem fica numa parada de ônibus e o ônibus não chega? Toma táxi para voltar para casa? Não, vai andando.

            Nós nos preocupamos porque faltamos às nossas reuniões. E as mães de família que saem do trabalho e não chegam em casa a tempo de fazer a comida do filho ou de conversar com o filho? Os pais de família que ficam horas esperando, na parada, que o ônibus passe, e chegam em casa sem tempo de conversar com os filhos? Eles não merecem também que nos preocupemos? Nós reclamamos porque a falta do avião nos leva a perder negócios. E aqueles que, por falta do ônibus, perdem o emprego - todos os dias - ou que têm as horas descontadas pelo patrão por chegar atrasado?

            Nós não estamos nos lembrando dos outros apagões. Isso não é para ficar contra a CPI, mas para dizer que precisamos despertar para os outros apagões que tomam conta deste País.

            Pouco a pouco, Presidente Renan, de apagão em apagão, este País está apagando ele próprio, o Brasil. Comparado a outros países, em relação à evolução do século XXI, é um País que está diminuindo de grandeza do ponto de vista da luminosidade das estrelas. Nós somos uma estrela que está reduzindo a sua luminosidade por causa dos diversos apagões que tomam conta de nossa cidade. Quando há greve de banco, em dois dias se dá uma solução; quando temos, Deputado que nos visita, uma greve em escolas primárias, a greve dura dois, três meses, e ninguém toma uma decisão, nenhuma medida. Ninguém olha o apagão que chega na casa do povo; olhamos o apagão que chega no aeroporto da parcela de classe média e alta do Brasil.

            O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Cristovam.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu passo a palavra ao Senador Jefferson Péres.

            O Sr. Jefferson Péres (PDT - AM) - Senador Cristovam, eu lhe conto uma passagem que é verídica e que é emblemática para ilustrar o seu discurso. Contam que, certa vez, o Ministro da Educação procurou o então todo poderoso Ministro da Fazenda de um governo - não vou identificar os personagens. Disse o Ministro da Educação para o da Fazenda: “Fulano, amanhã, todas as universidades federais do País vão entrar em greve!” E o Ministro da Fazenda, com um riso sardônico, disse: “Eu me preocuparia muito, colega, se fosse uma greve, por exemplo, no serviço de transporte coletivo de São Paulo, porque, aí, incomodaria toda cidade e seria manchete. Uma greve na universidade só vai incomodar os alunos e os pais deles”.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Esquece-se que uma greve dos universitários vai incomodar o futuro do País; vai trazer, de retorno, a falta de professores no ensino da educação básica; vai trazer a falta de profissionais para dinamizar a economia.

            Sr. Presidente, eu quis apenas aproveitar o tempo que temos, antes de começar as votações de hoje - e eu o parabenizo por ter conseguido que houvesse votação - e chamar a uma reflexão sobre todos os apagões que hoje começam - ou já vêm há tempo apagando - no Brasil.

            Quero dizer que vamos analisar toda a situação dos apagões. Preciso dizer também que, com base na proposta de V. Exª durante sua campanha a Presidente, na Comissão de Educação, estamos apurando o apagão educacional.

            Cheguei a conseguir, Senador Renan Calheiros, mais de quarenta assinaturas para uma CPI do Apagão Intelectual, mas não vou apresentá-las. Não vou apresentá-las porque creio que a Comissão de Educação está tendo condições de, sem o instrumento da CPI, levantar por que o Brasil está se apagando intelectualmente, após ter abandonado a educação ao longo de décadas - não é uma questão do Governo atual; e como fazer para reacender a chama intelectual neste País a partir da educação de base, do ensino superior e de todas as demais atividades produtoras do saber e do conhecimento, o verdadeiro capital do Século XXI.

            O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Permite V. Exª um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Com o maior prazer, Senador.

            O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Cristovam Buarque, parabenizo V. Exª pela oportunidade de trazer a esta Casa os vários apagões. V. Exª está coberto de razão. Temos de voltar nossos olhos para questões críticas como o apagão da segurança, do transporte público e outros. V. Exª transformou o apagão da educação em bandeira. Tenho certeza de que teremos frutos, o mais brevemente possível, como produtos dessa luta de V. Exª. O apagão aéreo, que é motivo inclusive de CPI a ser instalada nesta Casa, chegou ao ápice, chegou à aeronave papal. Aliás, quando a Comissão de Infra-Estrutura convocou os envolvidos no setor aéreo brasileiro, no ano passado, levantou-se a questão da falta de controle em determinada área do espaço aéreo do Nordeste, envolvendo o Cindacta de Recife, desmentiram peremptoriamente. Agora, foi constatado o que todo piloto de avião sabe: existe uma dificuldade de comunicação das aeronaves na região do Cindacta correspondente a Recife, salvo engano o Cindacta II - não quero ser perfeito aqui -, que atingiu o avião que transportava Sua Santidade, o Papa. Foi preciso uma ponte de um avião ...

(Interrupção do som)

            O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Sr. Presidente, houve um apagão na minha voz. Graças a Deus V. Exª a restabeleceu. Então, Sr. Presidente, ocorre que estamos aí com um fato concreto, gravações feitas. É preciso que, humildemente, o Governo brasileiro tome providências com relação a isso, decrete emergência, decrete calamidade pública para aquisição desses equipamentos. Estamos brincando com vidas e as providências não são tomadas. Aproveito a fala de V. Exª para fazer esse lembrete exatamente embasado na falha ocorrida no Cindacta II e que atingiu à aeronave papal, mas que foi detectada graças à diligência do Deputado Efraim Morais Filho, que deve estar orgulhando o seu pai que compõe a Mesa do Senado. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador Heráclito Fortes, estou de acordo e insisto na importância da CPI do Apagão Aéreo. Assinei essa CPI. O que quero é chamar a atenção de que há outras CPIs. Digo até que somos tão criativos que temos apagões luminosos, Senador. Vejo aqui trabalhadoras do Ibama e lembro: estamos tendo um apagão com base na queima das florestas. Ilumina o mundo. Do satélite lá em cima se vê a queima que está apagando nossas reservas florestais.

            O Sr. Wilson Matos (PSDB - PR) - Senador Cristovam Buarque, V. Exª me permite um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Concedo se o Presidente autorizar, porque tenho preocupação com as votações.

            O Sr. Wilson Matos (PSDB - PR) - Serei breve. A educação brasileira, em todo o sistema municipal, estadual e municipal, custa em torno de R$300 milhões por dia. É muito fácil ter um recesso. Basta ter um feriado na terça-feira que não tem aula na segunda. Aí vem a semana do saco cheio e tal. Damos, no máximo, 200 dias letivos enquanto o ano tem 365 dias. E cada dia custa R$300 milhões para a Nação brasileira. V. Exª tem toda a razão quando fala da falta de comprometimento com o sistema educacional da sociedade brasileira. Temos que aplaudir o trabalho de V. Exª pelo seu grande esforço no sentido de termos uma educação melhor. Parabéns, Senador.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senador. Esta é uma das formas dos pequenos apagões: a tolerância como encaramos o funcionamento precário da sala de aula no Brasil.

            Senador Renan, vim aqui apenas para chamar a atenção para o fato de que, além do apagão aéreo, o País está apagando, pouco a pouco, por diversos pequenos apagões, tão graves quanto os aéreos embora não atinjam as classes abastadas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/05/2007 - Página 14797