Discurso durante a 70ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a entrevista coletiva concedida pelo Presidente Lula à imprensa brasileira.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. TELECOMUNICAÇÃO. POLITICA EXTERNA. DIVIDA PUBLICA.:
  • Considerações sobre a entrevista coletiva concedida pelo Presidente Lula à imprensa brasileira.
Publicação
Publicação no DSF de 16/05/2007 - Página 14414
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO. TELECOMUNICAÇÃO. POLITICA EXTERNA. DIVIDA PUBLICA.
Indexação
  • ANALISE, ENTREVISTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REITERAÇÃO, COMPROMISSO, ESTABILIZAÇÃO, ECONOMIA, AUTONOMIA, BANCO CENTRAL DO BRASIL (BACEN), PROIBIÇÃO, REELEIÇÃO, AUMENTO, TEMPO, MANDATO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, PRESIDENTE DA REPUBLICA, RENUNCIA, CRIAÇÃO, EMISSORA, TELEVISÃO, EXECUTIVO, PRIORIDADE, REFORMULAÇÃO, ORGANIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, PAIS.
  • CRITICA, POLITICA EXTERNA, BRASIL, ACEITAÇÃO, DECISÃO, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, DESAPROPRIAÇÃO, ATIVO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS).
  • CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESCUMPRIMENTO, ACORDO, GOVERNO, REFERENCIA, DIVIDA, AMBITO ESTADUAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, ESTADOS, MUNICIPIOS, REDUÇÃO, DIVIDA INTERNA, RELAÇÃO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB).

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, considero um fato positivo o Presidente da República demonstrar-se disposto a se submeter, daqui para frente, espero que de maneira sistemática, a entrevistas coletivas à imprensa brasileira. Se eu pudesse até fazer alguma sugestão, Presidente Marco Maciel, eu faria a de que, na próxima entrevista, não se esquecesse de arrolar entre os perguntadores o jornalista Boris Casoy, que há muito tempo estava - e agora já não está mais - ausente dessa fantástica fábrica de opinião que é o Brasil democrático de hoje.

            Mas ressalto que vi pontos altos e baixos na entrevista. O mais alto foi a própria entrevista. O Presidente se saiu com desenvoltura. No plano econômico, reafirmou seu compromisso com a estabilidade da economia, com a autonomia consentida, é verdade, do Banco Central, com o regime de flutuação do câmbio que tem dado tão certo não só no Brasil como em outros países no mundo globalizado, que sujeita certas economias a crises cíclicas de efeitos danosos muitas vezes.

            O Presidente tem um projeto, que era do Senador Rodolpho Tourinho e que eu perfilhei, que prevê, Sr. Presidente, a autonomia do Banco Central. E, aliás, ele está absolutamente às ordens do Presidente, porque, tenho certeza absoluta, se aprovado esse projeto, poderá rebaixar de dois a três pontos a taxa Selic. Basta querer, pois as condições objetivas estarão postas. No entanto, precisa aprovar o projeto que dá autonomia ao Banco Central.

            O Presidente teve ainda como ponto alto, e aí já no plano político, ter-se demonstrado claramente contrário a qualquer aventura do tipo terceiro mandato. Foi taxativo, ao contrário do que alguns observaram nos blogs. Eu entendo que ele foi taxativo. Sob pena de uma absoluta desmoralização, ele se declarou claramente contrário à aventura do chamado terceiro mandato; chegando a falar no fim da reeleição e em mandato de cinco anos - idéias respeitáveis que devem ser discutidas com acatamento.

            O Presidente precisa, agora, para que eu o afirme um democrata de verdade e completo, renunciar à idéia da TV estatal. Essa idéia não tem cabimento e será por nós enfrentada de cabo a rabo, de A a Z. Não podemos compactuar com a idéia da manipulação da informação via TV estatal.

            O Presidente teve, como ponto fraco, não ter falado em reformas estruturais. Quando ele diz, e aí foi um ato falho, que o seu Governo visualiza o Brasil cinco, seis anos após o seu mandato, o mandato presidencial, o mandato dele, demonstra que lhe está faltando o traço do estadista, porque, Senador Cícero Lucena, o estadista vê 30, 50, 100 anos além; ele vê as próximas gerações. É muito pouco, é muito pequeno dizer que se está visualizando quatro, cinco ou seis anos adiante. O Presidente precisaria mesmo compreender que terá um lugar menor na História se não fizer as reformas estruturais que garantirão, elas sim, o crescimento econômico brasileiro de maneira vigorosa ao longo dos tempos. Sem as reformas, o Brasil crescerá sempre menos do que os emergentes, na média, muitas vezes menos do que o mundo, algumas vezes menos do que os ricos tomados de per se.

            Mas, enfim, o Presidente, para mim, falha - e falha redondamente - quando aborda a questão da política externa. Disse que o Estado boliviano é soberano; e ninguém neste Congresso, Senador Mão Santa, pensa o contrário: é soberano. Disse que as riquezas da Bolívia, inclusive as do subsolo, pertencem ao povo boliviano. Longe de mim, Senador Valter Pereira, imaginar que não poderia pertencer ao povo boliviano. Eu entendo que pertence ao povo boliviano. O que não é normal é o Presidente aceitar passivamente que a Petrobras perca US$80 milhões em uma desastrosa operação a respeito dos ativos daquela empresa desapropriados, no início manu militari, pelo governo boliviano.

            Desastroso foi termos, agora, aberto esse precedente, e lá vem o Paraguai atrás de compensações em relação à questão cambial envolvendo a energia produzida e fornecida pela Itaipu binacional. Desastroso e perigoso é sabermos que existem muitas empresas brasileiras - e o Brasil já é um player global de razoável coturno - que poderão sofrer, amanhã, o mesmo gesto violento de algum governante que, pelo mundo afora, raciocine parecido com o Sr. Evo Morales. O Presidente demonstra até hoje mais preocupação com a Bolívia e com os bolivianos do que propriamente com os ativos brasileiros e com os direitos dos acionistas da Petrobras.

            Mas eu diria, Sr. Presidente, que não devo fazer panfleto com a idéia da entrevista coletiva. O Presidente passou quatro anos evitando as entrevistas coletivas. Uma coisa é falar para a imprensa descendo de um avião apressadamente; outra é se submeter ao que perguntam a ele os jornalistas. Devem ser mais longas, ao meu ver, devem ser mais detalhadas as entrevistas. E volto a sugerir: engrandeceria muito a entrevista do Presidente se um dia, entre os perguntadores, ele aceitasse o jornalista Boris Casoy, que hoje voltou a fazer telejornal na TV JB, apesar de, durante muito tempo e de maneira muito mal explicada, ter sido silenciado neste País. Durante muito tempo e à revelia de sua vontade, Boris Casoy ficou sem opinar, sem dizer o que ele achava o que era uma vergonha ou o que ele achava que não era uma vergonha.

            Portanto, Sr. Presidente, saúdo a idéia da entrevista. Ressalto, de maneira bem breve, os pontos que julguei mais positivos e os pontos que julguei mais negativos. Mas insisto que algumas respostas deixaram de ser dadas com muita clareza. O Presidente não fala, de maneira efetiva, em cortar os gastos. Não falou, portanto, nas reformas essenciais que haveriam de dar ao Estado brasileiro um caráter superavitário.

            Quanto o Presidente fala em flexibilizar para os governadores em relação à questão da dívida - e não quero nada fora dos limites da Lei de Responsabilidade Fiscal -, talvez não perceba o que os governadores já perceberam: que ele concorda com tudo o que os governadores dizem na conversa, mas, na prática, tem discordado de tudo o que os mesmos governadores solicitam. Esse é outro fato, e vamos chamar a atenção para algo relevante: o Presidente, por meio do seu Partido, votou contra a Lei de Responsabilidade Fiscal. Foi à Justiça contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, que é um marco civilizatório de enorme alcance neste País. E, hoje, se formos levar o desconto dado em função dos Planos Plurianuais de Investimento (PPIs), vamos ver que quem menos contribui para o superávit primário, que tem sido tão benéfico na luta para se reduzir a relação dívida pública interna/PIB, é precisamente a União, que tem relaxado na sua política fiscal. Hoje, a parte saudável da economia brasileira tem sido Estados e Municípios. Eles têm entrado com a parte do Leão, fazendo um sacrifício que tem mostrado a sua vontade, o seu desejo, o desejo dos Estados em geral, de contribuir para que o Brasil tenha uma relação dívida pública/PIB cada vez menor, cada vez mais aceitável. E eles são, portanto, mais responsáveis até do que a União pela queda do Risco País. Quem menos colabora com isso, hoje, é a União, que entra com apenas 1,75% para o esforço do superávit fiscal que, hoje, na prática, é de 3,75%.

            Portanto, Sr. Presidente, procurei, de maneira bastante serena, traçar o que julgo ser o essencial na entrevista do Presidente Lula, que deve ser saudada pelo fato democrático em si. E entrevista coletiva é isto: é o Presidente se expor depois aos comentários a favor, de seus partidários, que podem, inclusive às vezes, discordar dele, e dos comentários que podem ser em parte favoráveis, como é o meu caso, e em parte contrários, como também é o meu caso. Ou seja, o Presidente fala e, em seguida, vem a crítica.

            Nos Estados Unidos, quando o Presidente vai ao Congresso para aquele célebre início de legislatura, depois falam os quatro líderes: fala o líder democrata no Senado e fala o líder republicano no Senado, fala o líder democrata na Câmara e fala o líder republicano na Câmara. Os quatro comentam a fala presidencial. Em seguida, outros comentários poderão vir, mas esses quatro são de praxe, são obrigatórios. Então, quando o Presidente fala, ele se expõe ao que começa com a crítica favorável ou não, favorável no todo ou em parte dos congressistas. E, em seguida, evidentemente, hoje em dia, as notícias on-line, concomitantemente com os blogs, opinando, cobrando fatos passados, uns com mais dureza, outros com menos dureza.

            Contudo, vamos então imaginar que o Presidente, daqui para frente, se afirmará como um democrata de verdade, não só porque rejeita o terceiro mandato, não só porque concede entrevistas coletivas, mas também porque haverá de refletir e abrir mão de uma idéia que não é boa para a democracia brasileira, que é a chamada TV estatal.

            Sr. Presidente, muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/05/2007 - Página 14414