Discurso durante a 92ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Chama a atenção da Casa para a grave situação política do entorno brasileiro. Discurso em defesa do reaparelhamento e da modernização das Forças Armadas.

Autor
Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.:
  • Chama a atenção da Casa para a grave situação política do entorno brasileiro. Discurso em defesa do reaparelhamento e da modernização das Forças Armadas.
Aparteantes
Gerson Camata, Heráclito Fortes, Mozarildo Cavalcanti, Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 20/06/2007 - Página 20090
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, ANEXAÇÃO, DISCURSO, ORADOR, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, DEBATE, SITUAÇÃO, ACORDO MILITAR, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, VENEZUELA, PROBLEMA, SEPARAÇÃO.
  • ANALISE, DIFERENÇA, CULTURA, IDIOMA OFICIAL, ECONOMIA, BRASIL, AMERICA LATINA, DEFESA, BUSCA, INTEGRAÇÃO, DIVERSIDADE, REGISTRO, PROCESSO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), ESPECIFICAÇÃO, PAZ.
  • APREENSÃO, SITUAÇÃO POLITICA, CRISE, AMERICA DO SUL, NECESSIDADE, ATENÇÃO, POLITICA EXTERNA, BRASIL, DEFESA, INTERESSE NACIONAL, ANTECIPAÇÃO, SOLUÇÃO, DEFESA NACIONAL, RELAÇÕES DIPLOMATICAS, PAIS ESTRANGEIRO, URUGUAI, PARAGUAI, BOLIVIA, COLOMBIA, CONCLAMAÇÃO, SENADOR, ESTUDO, PROBLEMA.
  • DEFESA, REFORÇO, FORÇAS ARMADAS, MODERNIZAÇÃO, EQUIPAMENTOS, DIRETRIZ, PAZ, DEFESA NACIONAL, PRESERVAÇÃO, TRADIÇÃO, ITAMARATI (MRE), FORMAÇÃO, DIPLOMATA.
  • CRITICA, APROVAÇÃO, CANDIDATO, INSTITUTO RIO BRANCO, DESCONHECIMENTO, LINGUA INGLESA, PRE REQUISITO, RELAÇÕES INTERNACIONAIS, SOLICITAÇÃO, PROVIDENCIA, MINISTRO DE ESTADO, ITAMARATI (MRE).
  • CRITICA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, BUSCA, INFLUENCIA, AMERICA DO SUL, APARELHAMENTO, FORÇAS ARMADAS, DESRESPEITO, INSTITUIÇÃO DEMOCRATICA, PROTESTO, CONCESSÃO, GOVERNO BRASILEIRO, DEFESA, CORREÇÃO, POLITICA EXTERNA.

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na última reunião da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, que é presidida pelo Senador Heráclito Fortes, fiz pronunciamento sobre a situação da Bolívia, seu acordo militar com a Venezuela, e o problema de separatismo.

Sr. Presidente, solicito que o respectivo documento, que passarei à Mesa, conste para publicação como anexo deste discurso.

Por razões históricas da nossa própria formação, o Brasil está imerso em realidade distinta de nossos vizinhos da América do Sul e da própria América Latina. Temos uma língua diferente, manifestações culturais com características próprias, dimensão e economia que se distinguem do nosso entorno.

Em princípio, essas características nos dão uma enorme desvantagem, em termos de convivência e integração com os países vizinhos. No entanto, fatores que, em visão simplista, prejudicariam a busca da boa convivência e da integração podem e devem ser utilizados como estímulo para a superação de obstáculos. Assim, é na diversidade que devemos buscar forças para tomarmos sempre a iniciativa para a convivência harmoniosa com os nossos vizinhos. É na diferença de aspectos econômicos que, tendo como base a complementariedade, devemos continuar na vanguarda do processo de integração. Cabe ao Brasil não deixar ruir esse processo por razões meramente conjunturais ou por tibieza.

Devo destacar que a integração simbolizada pelo Mercosul começou, por ação precursora do Brasil, pela região sul do hemisfério, pela aproximação e busca do entendimento fraterno com países com os quais tínhamos, e logramos superar, problemas históricos: Argentina, Paraguai e Uruguai.

Aos entendimentos entre os Presidentes Sarney e Alfonsín (Declaração de Iguaçu em 1985) fizemos seguir medidas de confidence building, mediante o acordo de criação da ABCC (Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade Nuclear) e do acordo com a Agência Internacional de Energia Atômica que firmei em Viena, em 1991. A própria edificação de Itaipu, nos anos 70 e 80, foi, no fundo, também uma medida de construção de confiança, por meio do compartilhamento de recursos naturais para a produção energética. A integração demandou esforços comuns e superação de divergências. É processo longo e penoso, que se projeta no futuro, que não pode ser levianamente destruído.

Nunca pensei no Mercosul, na integração, como mera junção de capacidades econômicas, mas sempre considerei que o sucesso dessa obra teria como base a superação das dificuldades culturais históricas e, como argamassa, uma visão conjunta e solidária de futuro, uma união para superar as vicissitudes em período de profundas transformações no cenário internacional, simbolizadas pela queda do muro de Berlim.

A integração que sempre almejei tem a paz como pressuposto.

Hoje, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero chamar a atenção da Casa para a grave situação política do entorno brasileiro, que inspira fundada preocupação. Não se pode minimizá-la. Ver normalidade onde há sinais evidentes de crises potencialmente danosas aos interesses brasileiros. Nossa política externa não pode assistir sem reagir, como exigem as circunstâncias, à manipulada disseminação de sentimentos antibrasileiros.

O Governo venezuelano, que vem aumentando sua influência na Bolívia, Equador e Argentina, elevou o patamar de sua ação ao propugnar uma aliança militar no âmbito da Alba - Alternativa Bolivariana para as Américas - e dedica-se, freneticamente, à aquisição de armas. Por outro lado, no Uruguai, temos crescente insatisfação com o Mercosul e, no Paraguai, a insatisfação com o Acordo de Itaipu. Em três desses países, Bolívia, Uruguai e Paraguai, temos o agravante de numerosa população brasileira já estabelecida na região fronteiriça. Na fronteira com a Colômbia, as incursões das Farc já se tornaram rotina, são bem conhecidas as dificuldades do governo vizinho em controlar a guerrilha.

Pode-se ver, claramente, que um arco de instabilidade cerca o país. Não podemos deixar de estar preparados, tanto no âmbito diplomático quanto de defesa, para enfrentar esses problemas, cumulativos e simultâneos, que surgem de nosso entorno. Há que assumir, realisticamente, a existência de problemas e antecipar soluções por meio de políticas de Estado, e não de reações tópicas e desconexas.

Ações de política externa têm efeitos de longo prazo, por isso devem ser pensadas com racionalidade e planejadas com cuidado e muita isenção. Como recomenda Karl Deutsch em seu livro Análise das Relações Internacionais, não se pode deixar que “ruídos de fundo”, ou distorções ideológicas, nos perturbem a clareza de percepção das situações a serem enfrentadas, para que tomemos decisões consistentes.

O atual estado das relações internacionais de nosso País, Sr. Presidente, merece maior atenção do Senado da República. Esta Casa, em seu todo e por meio de sua Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, deve avocar participação mais ativa na diplomacia e na defesa. Não pode aceitar função meramente homologatória, ex post facto.

Além de dever institucional, a participação mais ativa do Parlamento constitui importante fator de legitimação da política externa. O Congresso Nacional, canal de comunicação entre povo e Governo, ao sintetizar as várias correntes de opinião pública, ao cristalizar a própria nacionalidade, não pode ter visão meramente passiva das ações de política externa. Deve cumprir ativamente sua missão constitucional, para a qual conta com meio específico e apropriado - a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.

O nome dessa Comissão leva-me a lembrar Raymond Aron, que logo no começo de sua Paz e Guerra entre as Nações ensina que o diplomata e o militar simbolizam o Estado no plano internacional. O Brasil tem a felicidade de poder contar com esses dois fatores formados por estruturas do mais alto nível humano, da melhor qualidade. O Itamaraty e as Forças Armadas - reconhece, sem dúvida, a Nação brasileira - são instituições que tradicionalmente tem preparado seus quadros com racionalidade. Têm dotado-os de sentido de cumprimento de dever, de respeito à hierarquia e imbuído-os da consciência de serem órgãos do Estado, no mais puro sentido weberiano.

Penso que, no grave momento em que vivemos, essas características - vitais para a soberania nacional - devem ser preservadas, e devemos evitar que as Forças Armadas vejam relegadas a segundo plano suas necessidades de modernização de equipamento e continuem com os seus meios desgastados. Agora, as Forças Armadas sofrem com a falta de motivação e de respeito aos seus valores básicos.

Não quero adotar nenhuma posição belicista - longe de mim -, mas apenas provocar a reflexão desta Casa sobre a situação das nossas Forças Armadas. Preocupa-me a ineficácia de nossa defesa antiaérea, a precariedade da defesa naval e a crítica situação em termos de munições. Quero que reflitamos sobre a fraca capacidade dissuasória de nossas Forças Armadas, de nossos heróicos e relegados pelotões e batalhões de fronteira, e destacar a minha preocupação com o sucateamento da indústria bélica brasileira.

Devemos preservar as tradições do Itamaraty. Não podemos aceitar a sua corrosão interna. Devemos manter a excelência da formação dos novos diplomatas e não aceitar concessões populistas, com graves conseqüências futuras.

Refiro-me aqui, Sr. Presidente, a facilidades, como aumentar de forma brutal as vagas para o Instituto Rio Branco, a fazer com que as línguas estrangeiras sejam apenas classificatórias.

Foram aprovados recentemente candidatos praticamente ignorantes, por exemplo, no idioma inglês - ferramenta de trabalho essencial para o diplomata.

Devemos manter respeito ao sentido hierárquico e ao mérito que sempre nortearam o Itamaraty e evitar deixá-lo ao sabor de pequenos interesses políticos e pessoais.

Faço aqui um apelo ao eminente chanceler, ao brilhante Embaixador Celso Amorim, para que faça o Itamaraty voltar ao seu leito natural, à correta atuação diplomática por ele tão bem simbolizada.

No caso do nosso entorno sul-americano, vejo com preocupação que passamos a ter política meramente reativa. Tive a honra de firmar o Tratado de Assunção, que criou o Mercosul, em 1991, e agora o vejo esgarçado por dentro. Sou favorável à iniciativa da interconexão da infra-estrutura física regional e à correção das assimetrias existentes com economias menores. Porém, dentro da estratégia que atenda aos interesses brasileiros, e não a simpatias doutrinárias ou pressões conjunturais.

As nossas Forças Armadas, além de sua função de defesa, de manter a integridade no Território Nacional, freqüentemente foram instadas a participar do processo político. Foi assim em vários períodos, sobretudo quando estávamos divididos em blocos antagônicos, que se digladiavam ideologicamente. Naquele cenário, as necessidades de lealdade e alinhamento intrablocos eram rígidas, e as Forças Armadas buscavam defender valores que esposavam com convicção.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Pois não, Senador Gerson Camata.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Senador Fernando Collor, eu ia aparteá-lo, mas vou só cumprimentá-lo. V. Exª está fazendo muito mais do que um discurso. Está fazendo uma advertência. V. Exª está falando como um ex-Presidente da República, com as informações que naturalmente tem mais que todos nós Senadores. Há poucos dias, outro ex-Presidente, o Presidente Sarney, desta tribuna, veio em cima desse mesmo ponto que V. Exª coloca. Temos que meditar muito nas palavras que V. Exª emitiu na Comissão de Relações Exteriores e agora repete no plenário. Precisamos pensar que, agora que chega ao Senado o processo de integração da Venezuela no Mercosul, é o momento próprio, propício para que a advertência que V. Exª está fazendo, não somente ao País, mas também a toda a América Latina, passe a ser preocupação deste Senado. Cumprimentos pela oportunidade da fala de estadista de V. Exª, nesta tarde, no plenário do Senado.

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Muito obrigado, Sr. Senador Gerson Camata, pela grande contribuição que presta ao meu pronunciamento e meus agradecimentos pela generosidade de suas palavras.

Ouço o Senador Heráclito Fortes e, depois, o Senador Mão Santa.

O Sr. Heráclito Fortes (PFL - PI) - Senador Collor, V. Exª vem se especializando nesta Casa em assuntos de política externa e tem feito discursos precisos e da maior importância. Quando escolhemos V. Exª para presidir a Subcomissão do Aquecimento Global foi exatamente por encontrar na experiência de um ex-Presidente da República a pessoa certa para, num momento como este, tratar de um assunto que começou a ser discutido precisamente quando V. Exª era Presidente da República na Rio-92. V. Exª agora traz outro assunto, que é o sucateamento das nossas Forças Armadas. E é preciso que a nossa Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional abra os olhos desta Casa e do País para isso. Já teríamos resolvido o problema se estivéssemos convivendo com o Orçamento Impositivo. Infelizmente, teremos, todo ano, de participar da mesma lengalenga de sensibilizar os companheiros da Comissão e o Governo, não só para não cortar recursos, mas também para não contingenciá-los. Solidarizo-me e, mais, associo-me a V. Exª nessa cruzada. Parabéns!

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Muito obrigado, Senador Heráclito Fortes. V. Exª, como Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, sem dúvida, terá um papel preponderante nesta nossa cruzada.

Senador Mão Santa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador, Presidente Collor - quem foi rei nunca perde a majestade -, atentai bem, V. Exª está fazendo um chamamento a este País para o papel das Forças Armadas. Eu queria dizer que elas vivem um momento de humilhação. Vou lhe dar a realidade. Quando iniciei o meu Governo, e V. Exª combateu aqueles marajás, eu fui - era recesso, era julho - pedir... Vamos dizer, naquele tempo havia funcionários no Piauí privilegiados que ganhavam 27 mil dólares - e V. Exª tentou. Mas era Sepúlveda Pertence. Estava no período de férias e não tinha Parlamento. E a imprensa soube. Senti-me quase um Mitterrand de tanta entrevista. E uma das lamentações era essa. E eu fiz uma pergunta ao Ministro Sepúlveda Pertence, uma das maiores glórias da Justiça deste País. Numa audiência, só nós dois naquele mundo, seis horas da tarde, ele autoridade, eu perguntei: Excelência, eu posso fazer uma pergunta? Aí ele parou. Demorou muito, Presidente Collor! Parou um minuto e eu fiquei na minha, até que ele viu que eu não ia falar e disse: “Fale, Governador!” Eu disse: “Quanto V. Exª ganha?” Presidente Collor, aí ele puxou seis mil. Papaléo, para chegar em oito mil, com qüinqüênio, demorou. E eu disse: “V. Exª não quer ir para o Piauí, não? Eu lhe dou lá um procurador, porque tenho muito e todos estão ganhando mais. Tem gente ganhando vinte e sete mil dólares”. E, na hora, eu puxei o desequilíbrio entre os oficiais da Polícia Militar e os do Exército. Porque o meu Secretário de Obras era o General Oliveira, que tinha sido do Nordeste e me mostrou. Eu não acreditei, Papaléo, mas eu tirei um fotocópia: era três mil e tanto. Eu digo: “Eu não sei como não há outra revolução, porque eu sou médico e não ia aceitar um enfermeiro... A polícia é força acessória. Eles estão humilhados com as situações salariais. V. Exª viu o garbo. Isso é tão importante que o momento mais difícil que esta Pátria passa é hoje: de Chávez, de Fidel, da Nicarágua, da Bolívia do Morales, do Equador, que já acabou tudo em menos de seis meses de governo: a democracia. E existe a mensagem símbolo da democracia de Eduardo Gomes. Foi ele que disse: “O preço da liberdade e da democracia é a eterna vigilância!”. Então, este Senado tem que dar essa vigilância. E V. Exª chamou a atenção para aqueles que garantiram ali aquela bandeira e a ordem e progresso que devemos viver e com o que devemos sonhar.

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Muito obrigado, Senador Mão Santa, pela justa homenagem que faz as nossas Forças Armadas.

Concluindo, Sr. Presidente...

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Presidente Collor, V. Exª me permite um aparte?

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Pois não, Senador Mozarildo Cavalcanti.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (Bloco/PTB - RR) - Antes de V. Exª encerrar, eu gostaria só de aduzir, se V. Exª me permite, o absurdo que é todo ano, quando chega o Orçamento do Poder Executivo para examinarmos - porque deveria chegar com o que é necessário, por exemplo, para as Forças Armadas, ou seja, com o previsto no Orçamento que vem do Executivo -, nós vermos aqui os assessores parlamentares das três Armas e do próprio Ministério da Defesa indo atrás dos Senadores - e a mesma coisa deve ser na Câmara - para, através de emendas das Comissões ou até de emendas regionais, botar os recursos para as Forças Armadas. Isso realmente é um descaso com as nossas Forças Armadas e com o País, porque um país que não se preocupa em estar preparado para uma defesa eventual não merece realmente ter as Forças Armadas que temos.

O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Muito obrigado, Senador Mozarildo, concordo plenamente com as suas afirmações.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, essa configuração, da guerra fria, deu lugar a uma nova realidade, cujo início foi simbolizado pela queda do muro de Berlim lá atrás, em 1989. Já não havia lugar para a disputa ideológica, perdeu sentido a rigidez dos blocos e adquiriu ímpeto o complexo processo de globalização. As fronteiras entre os Estados passaram a ter maior fluidez e a serem vistas, em várias situações, como áreas de cooperação e não de separação.

Nesse novo cenário internacional, inseria-se o processo de abertura no Brasil, afastando-se os militares da participação política.

Refiro-me a esses desenvolvimentos históricos, tendo como referência o fato inegável de que a Nação brasileira, com o recolhimento das Forças Armadas, parece ter-se esquecido da importância de suas funções constitucionais. E os governos têm relegado a segundo plano, por longo lapso de tempo, a preocupação com nossa defesa.

É inegável, Sr. Presidente, que o arco de instabilidade a que me referi pode anular nossos esforços de integração. Não podemos assistir passivamente à utilização intencional de ressentimentos que estávamos procurando mitigar através da aproximação e da cooperação. Não podemos aceitar que se venha utilizar o Brasil como alvo externo, para fins de legitimação interna. Há que colocar limites às provocações para que possamos retomar, e recuperar, o processo de integração.

Creio que está na hora de a sociedade brasileira voltar a refletir sobre a função constitucional das nossas forças de defesa, sobre sua capacidade dissuasória. Recordo o ditado romano si vis pacem para bellum, que não perdeu o sentido ao longo dos anos. São as Forças Armadas as fiadoras da nossa paz e integridade, na sua missão constitucional de defesa da Pátria - mas, para isso, devem estar preparadas.

O atual Governo da Venezuela dedica-se a uma escalada em busca de influência em nosso entorno. Não parece ter limites ao reaparelhar suas forças armadas, ao patrocinar ajuda financeira e militar, ao desrespeitar instituições de países da região, como o nosso Congresso.

Devemos recordar, Sr. Presidente, que diplomacia é negociação em busca do interesse nacional e não concessões seguidas que possam comprometer nosso futuro.

Em 1938, a política de apaziguamento em relação aos avanços alemães, o appeasement anglo-francês teve conseqüências trágicas que todos conhecemos. Há que colocar limites às provocações.

O Presidente da República adquiriu dimensão histórica ao conciliar a necessária estabilidade econômico-financeira com sensibilidade social, ao perceber com clareza os problemas do meio ambiente, ao adotar, de modo firme, a idéia por mim lançada, juntamente com vários Srs. Senadores, da Conferência Rio+20, que apresentou, recentemente, na reunião do G-8 e ao Secretário-Geral das Nações Unidas. Mostra clarividência ao perceber a importância do problema energético e já luta por soluções alternativas ao combustível fóssil.

Devemos alertá-lo, no entanto, que a política externa e a política de defesa necessitam aperfeiçoamento, correção de rumo, para adequá-las aos acertos da política interna, vários deles reconhecidos pela própria Oposição. Uma política externa menos ideológica, mais voltada para os interesses brasileiros, estaria também voltada para a aceleração do crescimento. Teria efeitos multiplicadores e duradouros que aperfeiçoariam os resultados dos programas sociais que tanto carinho merecem do Presidente da República.

Uma política externa baseada no realismo estratégico, na pura defesa dos interesses nacionais, contribuirá diretamente para a aceleração do desenvolvimento a que se voltam os esforços atuais do Governo.

A modernização e o reaparelhamento das Forças Armadas terão profundos efeitos no desenvolvimento industrial, tecnológico e na sustentação da política externa.

Está na hora, Presidente Lula, de dar mais unidade de comando e maior estatura à política externa, fazê-la crescer para alcançar novamente sua dimensão histórica. Essa é uma missão para a qual, tenho certeza, não deverá faltar apoio dos nobres Pares e do Presidente da Comissão de Relações Exteriores deste Senado Federal e, mais importante, da sociedade brasileira.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

*********************************************************************************

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR FERNANDO COLLOR EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

*********************************************************************************

Matéria referida:

“Pronunciamento do Senador Fernando Collor proferido na Comissão de Relações Exteriores. Reunião de 31/05/07”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/06/2007 - Página 20090