Discurso durante a 173ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de telefonema recebido do Senador Geraldo Mesquita Júnior em discordância a posicionamentos assumidos pelo Líder do PMDB no Senado, Senador Valdir Raupp. Considerações sobre fidelidade partidária e o julgamento realizado nesta semana, pelo Supremo Tribunal Federal, sobre o tema. Sugestão de que um partido dos partidos no Senado conceda vaga aos Senadores Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon, para comporem a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Comentário sobre o artigo de Milú Villela, publicado na Folha de S.Paulo, em defesa da educação brasileira. Homenagem pelo Dia Mundial do Professor.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. POLITICA NACIONAL. EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.:
  • Registro de telefonema recebido do Senador Geraldo Mesquita Júnior em discordância a posicionamentos assumidos pelo Líder do PMDB no Senado, Senador Valdir Raupp. Considerações sobre fidelidade partidária e o julgamento realizado nesta semana, pelo Supremo Tribunal Federal, sobre o tema. Sugestão de que um partido dos partidos no Senado conceda vaga aos Senadores Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon, para comporem a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Comentário sobre o artigo de Milú Villela, publicado na Folha de S.Paulo, em defesa da educação brasileira. Homenagem pelo Dia Mundial do Professor.
Aparteantes
Heráclito Fortes.
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/2007 - Página 34230
Assunto
Outros > SENADO. POLITICA NACIONAL. EDUCAÇÃO. HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, RECEBIMENTO, LIGAÇÃO, GERALDO MESQUITA, SENADOR, CRITICA, SITUAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), SENADO, PROTESTO, FALTA, DIGNIDADE, ATUAÇÃO, VALDIR RAUPP, LIDER.
  • COMENTARIO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), APOIO, FIDELIDADE PARTIDARIA, CRITICA, SITUAÇÃO POLITICA, BRASIL, ALTERAÇÃO, IDEOLOGIA, PARTIDO POLITICO, COMPARAÇÃO, PERIODO, HISTORIA, IMPORTANCIA, REFORÇO, REPRESENTAÇÃO PARTIDARIA, FIDELIDADE, ETICA, ATIVIDADE POLITICA.
  • QUESTIONAMENTO, AFASTAMENTO, JARBAS VASCONCELOS, PEDRO SIMON, SENADOR, MEMBROS, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, PREJUIZO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), CONGRESSO NACIONAL, DEFESA, NECESSIDADE, REVERSÃO, SITUAÇÃO.
  • LEITURA, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, GRAVIDADE, TENTATIVA, PRORROGAÇÃO, DESVINCULAÇÃO, RECEITA, UNIÃO FEDERAL, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF), DESVIO, DESTINAÇÃO, PERCENTAGEM, VERBA, PREJUIZO, EDUCAÇÃO, DEFESA, PRIORIDADE, CUMPRIMENTO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, GARANTIA, RECURSOS, INVESTIMENTO, MELHORIA, SISTEMA DE EDUCAÇÃO, PAIS.
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, PROFESSOR.
  • REGISTRO, APOIO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DEMOCRATICO TRABALHISTA (PDT), APROVAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO PROVISORIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA (CPMF).

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Heráclito Fortes, Srªs Senadoras e Srs. Senadores, creio que estamos vivendo um momento de loucura política; e essa loucura prova o atraso da política brasileira.

É inacreditável que, em pleno século XXI, vinte anos depois de estarmos com a democracia em funcionamento, seja preciso que o Supremo Tribunal se reúna para discutir sobre fidelidade partidária. Isso deveria ser algo tão entranhado dentro de cada político que não deveria ser necessário que o Supremo Tribunal se intrometesse nesse assunto.

Lamentavelmente, fidelidade não é um valor entranhado na ação nossa de políticos, mas não é esse o único atraso. O atraso, a meu ver, igualmente ou até mais grave, é que se discute fidelidade à sigla; não se discute fidelidade a compromissos, à coerência, a princípios. Discute-se se uma pessoa é fiel ao partido sem se discutir se o partido é fiel à causa que defendeu na eleição. Creio que é absurdo que, no século XXI, a gente ainda esteja atrás de obrigar a fidelidade, em vez de a fidelidade ser algo natural.

Por que eu disse que está havendo uma loucura? Porque a maneira como o Supremo agiu ontem foi como colocar camisa-de-força no corpo do funcionamento dos partidos e dos políticos; e camisa-de-força é algo necessário para loucos e ensandecidos. Só que camisa-de-força não cura loucura; camisa-de-força controla o doente contra as coisas erradas que ele pode fazer na sua insanidade, mas não cura a loucura. O que cura a loucura é um tratamento psiquiátrico longo e uma psicanálise demorada - às vezes!

O corpo político brasileiro, na loucura que enfrenta, é até capaz de precisar de uma camisa-de-força, mas não nos iludamos: essa camisa-de-força nem de longe vai curar, nem de longe vai resolver o problema, porque o enfoque está equivocado. Afinal de contas - e o discurso do Senador Heráclito Fortes, mais cedo, permitiu pensarmos nisto -, quem é mais infiel? Quem saiu, por exemplo, do PT, como eu, por discordar do encaminhamento das coisas, ou quem ficou e aceitou a mudança de princípios?

A minha convicção - e lamento que não tenham incluído o Senado no processo de ontem, porque eu gostaria de ouvir o julgamento também em relação a nós, Senadores -, a minha sensação, com a minha consciência, é a de que mudei de partido para ser fiel aos eleitores. Mudei de partido, Senador Lobão, para continuar fiel aos princípios; mudei de partido para ser coerente. E a palavra “coerência” não entra em discussão; entra apenas a palavra “fidelidade”. Mas fidelidade a quê? À sigla, não ao partido. Porque, com toda franqueza, qual dos partidos, hoje, a gente pode dizer que tem coerência interna em torno de princípios, de valores, de ideologia?

Imagine, Senador Lobão - eu não gostaria de “fulanizar” -, um eleitor que vota no Partido Comunista do Brasil por convicção comunista. O PCdoB, hoje, é fiel aos valores, aos princípios comunistas? Claro que não, e eles devem estar contentes que eu diga que não. Mas, e quem votou nele porque era comunista?

O que defendeu o Partido dos Trabalhadores em 2002 e o que defendem hoje os filiados do Partido dos Trabalhadores, pelo menos os que estão nesta Casa? Desafio, Senador Heráclito, alguém a me dizer quem é mais fiel a 2002: alguns que ficaram ou alguns que saíram do Partido dos Trabalhadores? A fidelidade aos princípios, aos valores, aos discursos durante a campanha. Desafio que comparem o que digo hoje com o que eu dizia em 2002; e desafio que comparem o que muitos filiados que continuam lá diziam em 2002 e dizem hoje.

Fidelidade a quê? Fidelidade burocrática é o que foi votado ontem. E não estou contra; é até preciso colocar uma camisa-de-força quando o doente está ensandecido. Mas não nos iludamos: ontem, não se deu nenhum passo radical para se curar a esquizofrenia da política brasileira, porque ela tem uma causa mais profunda. Nós, os políticos, não estamos acenando corretamente para um rumo, digamos assim, de um Brasil mais civilizado. Até podemos estar dando pequenas colaborações para que volte o crescimento, para que se ponha um pouco mais de dinheiro na Educação, para que se tente fazer com que a Justiça funcione um pouquinho melhor. Aqui e ali, votamos algo que dá um pequeno, ligeiro veio de arrumação, mas retomar a marcha, não. Retomar a marcha como se fez em 1822, quando se trouxe a Independência; em 1889, quando se fez a República; em 1888, do século XIX, quando se aboliu a escravidão; em 1955, quando Juscelino trouxe o rumo do desenvolvimento, agarrando o que Getúlio havia começado em 1930. Novo rumo desse tipo, não estamos dando. Se estivéssemos fazendo isso, esta Casa estaria dividida entre os que pensam de um jeito e os que pensam de outro, e aí a fidelidade seria automática.

Ninguém muda de um partido de cujos princípios está convicto. A pessoa muda quando as convicções ficaram incompatíveis dentro daquele Partido, ou por oportunismo, fisiologismo, quando os partidos não significam nada.

A verdade é que os partidos deixaram de significar o conjunto firme de princípios, de propostas para o Brasil. Então, é a fidelidade de filiação, não é a coerência de militância. A gente precisa é ter coerência de militância, mais do que fidelidade de sigla. Para isso, as siglas precisam ser partidos, e, hoje, as siglas não são partidos.

Ontem, colocou-se uma camisa-de-força, e, como eu digo, as camisas-de-força são necessárias em alguns momentos. Por isso, eu não julgo se foi errado ou certo. Não quero entrar nisso. Eu até tenderia a dizer que há muito de certo em se colocar essa camisa-de-força, mas a gente precisa curar o doente, e o doente não vai ser curado com a camisa-de-força.

Antes de conceder o aparte ao Senador Heráclito, eu queria pegar mais um exemplo disso. Ontem, e já falamos aqui demais - o próprio Senador Heráclito -, o PMDB cassou dois dos seus Senadores da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, porque eles pensavam diferentemente em relação à cobrança num processo de ética que está em julgamento. Eu pergunto: quem é que tem mais fidelidade ao PMDB do que Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon? Deve haver alguns que tenham a mesma fidelidade, mas mais fiéis aos princípios da própria sigla? E esses dois não mudaram de sigla, eles estão lá dentro. Quem tem mais fidelidade, nesse PMDB, aos princípios de Ulysses Guimarães, à luta pela democracia, do que Pedro Simon e Jarbas Vasconcelos? E eles foram retirados.

Que fidelidade é essa de um Partido que muda essas duas figuras do espaço onde se julgava uma questão de ética contra outro filiado? Recente, inclusive, recente no PMDB. Não é histórico no PMDB.

Então, está-se tentando colocar essa camisa-de-força no doente, que somos nós, toda a política brasileira, todos os Partidos brasileiros. Não me excluo, não excluo o meu Partido disso. Não estou querendo dizer que sou um pouquinho melhor, nem que o meu Partido é melhor. Nós estamos no processo de uma doença muito grave, que precisa, talvez, dessa camisa-de-força que o Supremo colocou, mas a camisa-de-força não cura loucura. O que cura loucura é o doente se encontrar com ele próprio, e isso não estamos fazendo, pelo menos ainda.

Concedo um aparte ao Senador Heráclito Fortes.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Cristovam Buarque, ontem, ao sair daqui, assustado com o que vi - esse ato de brutalidade envolvendo dois companheiros da estirpe de Jarbas e de Pedro Simon -, detive-me a assistir ao julgamento do Supremo Tribunal Federal e vi a cautela com que os Ministros, pelo menos aqueles cujos votos acompanhei, diferenciavam saídas e saídas de Partidos. Todos eles tinham o cuidado de mostrar que sair porque o Partido mudou de programa, porque o Partido mudou de rumo, é uma questão totalmente diferente de sair pelo troca-troca. Senador Lobão, isso é muito fácil de se ver, de se avaliar. As saídas que estarreceram a todos foram aquelas processadas de maneira desmotivada. Em alguns casos, o eleito, antes de empossado, já havia mudado de Partido; outros o fizeram na primeira semana. Foi uma verdadeira avalanche. Às vezes, é preciso matar o boi para salvar o carrapato. Essa foi a única medida para conter essa sangria. Aliás, uma das coisas que me chamou muito a atenção foi a preocupação dos Ministros em não permitir o sufoco da Oposição por mecanismos pouco recomendáveis. Vários lembraram que nem no período revolucionário esses fatos aconteciam. A História sabe separar muito bem o caso de cada um. Quem não sabe - o Brasil teve conhecimento, Senador Cristovam Buarque -, por exemplo, por que a Senadora Heloísa Helena abandonou o PT? Por que V. Exª deixou o PT? São casos clássicos que mostram que mudar de sigla não é pecado mortal. Nem é pecado e, às vezes, é até uma absolvição antecipada. Há fatos concretos que mostram isso. A Senadora Heloísa Helena foi, talvez, o primeiro sinal de alerta, o aviso pedagógico que o Partido não quis seguir. O resto, a História sabe. Louvo a atitude do Supremo Tribunal Federal e acredito que esse movimento localizado para tentar “peitar”, como se diz na linguagem popular, uma decisão daquele Tribunal não vai levar a lugar algum. Lamento, mas não se faz omelete sem quebrar ovos. Lamento que, nesse bojo, possa haver algumas injustiças, mas, mesmo assim, Senador Lobão, o Tribunal ainda deixa brechas para que a pessoa formalize uma defesa. E é evidente que a Justiça vai saber julgar e separar os casos em que houve uma perseguição, houve um incômodo na convivência partidária, daqueles em que mudaram apenas por interesses inconfessáveis. Parabéns a V. Exª

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu quero dizer que estou totalmente de acordo, Senador Heráclito.

A decisão do Supremo, mesmo que não tivesse dado essa brecha, podia ser a camisa-de-força de que a gente precisa nesse momento de loucura. Ela deixou claro que existem saídas que podem ser caracterizadas como infidelidade e outras, ao contrário, que são feitas para ser fiel aos seus princípios. Por isso, a possível perda do mandato vai ser caso a caso e cada um que se justifique, cada um que se explique.

Sr. Presidente, eu quero, também, trazer outro tema para cá. Ainda quero insistir nesse caso que aconteceu, ontem, com o Senador Jarbas Vasconcelos e com o Senador Pedro Simon.

Quando eu saí do PT, Senador Heráclito, eu tive que sair da Comissão de Educação. Ali, o PT não estava me cassando, não. Se eu saí do Partido e o cargo na Comissão pertence ao Partido, corretíssimo que eu deixasse de ser membro da Comissão de Educação, mas o Partido Democratas pegou uma vaga que tinha e me cedeu. Eu continuei na Comissão, já que o PDT não tinha direito.

Eu gostaria de sugerir que algum Partido indicasse os Senadores Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon para a CCJ. Vou levar ao PDT a idéia de que a suplência do PDT, que está vaga, pelo menos essa, seja dada a um dos dois.

Esse é um primeiro passo que acho que a gente poderia fazer. Eu serei para sempre agradecido ao que os Democratas fizeram comigo. Naquele momento, eu ia ficar fora da Comissão e foi o Senador José Jorge que propôs, levou ao Democratas, ainda PFL, e me colocaram na Comissão. Creio que a gente deve trazer de volta esses dois Senadores para a CCJ.

Senador Heráclito.

O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Eu vou fazer uma proposta e convidar o Senador Valdir Raupp para uma reflexão. Temos a sexta, o sábado, o domingo e parte da segunda-feira. O Senador Valdir Raupp nunca foi conhecido, nesta Casa, como homem truculento. Pelo contrário, é um homem de trato fácil, que conversa, dialoga com todos os companheiros. Talvez um dos grandes impactos tenha acontecido exatamente por se tratar da figura do Senador como Líder. O apelo que faço é para que o Senador, durante esse final de semana, medite sobre essa atitude, talvez tomada por pressões compreensivas para quem exerce um cargo de liderança. Que se reúna com os mesmos companheiros que o induziram a tomar essa atitude e reveja isso. Ninguém tem compromisso com o erro. A repercussão desse fato é muito grande. Atingiram dois ícones, não só do PMDB, mas da política nacional, e de dois Estados importantíssimos, como Pernambuco e Rio Grande do Sul. Atingiram mortalmente a Federação. Não é um ato simples, não é colocar ninguém em uma geladeira, é cassar. Então, faço este apelo: vamos nos juntar nessa luta, e o segundo passo será esse. Eu me junto a V. Exª, porque considero fundamental. Não se justifica essa atitude, porque a alegação à decisão tomada é a posição dos dois com relação à CPMF. Será que vale a pena, Senador Edison Lobão, um partido como o PMDB, no dia em que se homenageava e se reverenciava os 15 anos da morte de Ulysses Guimarães, manchar sua biografia, sua história, com uma atitude como essa? O PMDB que soube, na semana passada, dar uma demonstração de protesto e revolta, no episódio do Mangabeira Unger, e dar um aviso ao Governo, como os jornais publicaram, e hoje retroage em caminho contrário. Não acredito que isso tenha ajudado a questão da CPMF; pelo contrário, vai criar dificuldades na convivência e na discussão da matéria daqui para frente. Muito obrigado.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu que agradeço, Senador Heráclito Fortes, e subscrevo seu apelo ao Senador Valdir Raupp. E digo mais: subscrevo também a referência que o senhor fez a ele.

Eu o considero uma das figuras com o mais fácil diálogo, e eu com ele, desde que foi governador, no mesmo período em que fui. Como o Senador Renan Calheiros também é uma das figuras de melhor trato que há nesta Casa, no dia-a-dia. Mas os dois, e parece que aqueles ao seu redor, perderam a capacidade de dialogar. Esta semana, eu disse ao Senador Renan que ele perdeu a capacidade de criar pontes com o resto do Senado, e nós também perdemos a capacidade de criar pontes com os outros lados. Não existe parlamento sem pontes entre cada parlamentar. Não existe. Mas hoje a gente está sem pontes.

Temo que o apelo do Senador Heráclito, que subscrevo, não seja atendido. Por uma razão, Senador Heráclito: eles perderam a capacidade de entender que a política se faz, quando necessário, com recuos. O atual Governador do Distrito Federal, por uma coisa muito menor, quando foi aqui acusado, não fez só o recuo, cometeu o suicídio político, renunciando, e recuperou-se plenamente. O Senador Antonio Carlos Magalhães fez isso mesmo, mais do que um recuo, um suicídio, a renúncia, e depois voltou.

Eles perderam a capacidade de recuar. O Senador Renan Calheiros, se no primeiro momento de toda essa crise tivesse se licenciado da Presidência, a situação seria completamente diferente.

Mas, Sr. Presidente, ontem vim tratar de uma questão, não o fiz por causa da crise, e minha responsabilidade me obriga a me intrometer nisso, embora não seja do Conselho de Ética, mas vim aqui para ler, e peço licença, é curto, um artigo que li, esta semana, na Folha de S.Paulo, e que merece ficar nos Anais. É um artigo da Srª Milú Villela, que diz:

[...]

Muito tem se falado sobre a prorrogação, até 2011, da CPMF. A tal ponto, porém, que pouca ou quase nenhuma atenção tem se dedicado à prorrogação, também até 2011, de um mecanismo que há mais de dez anos afeta diretamente a educação brasileira.

Esse instrumento legal é denominado DRU (Desvinculação de Receitas da União) e, para entender como funciona, basta pensar que 20% de todos os impostos que, pela Constituição, deveriam ir para a educação podem ser destinados pelo governo federal para outras áreas.

Inclusive o superávit fiscal. Ou seja, por essa tal de DRU, aquele dinheiro que foi conquistado pela Constituição ir para a educação, graças ao nosso grande patriarca João Calmon. Hoje, 25% é abocanhado e levado pelo Governo para outras finalidades.

Assim como a CPMF, a DRU também foi criada com prazo de validade bem definido: sua vigência se encerra em 2007. Por isso, o governo busca agora a aprovação de ambas, que tramitam juntas na mesma proposta de emenda constitucional.

No entanto, a sociedade tem o direito e o dever de acompanhar de perto as discussões sobre a prorrogação da DRU, entender seus efeitos para a educação e reagir. [O que é uma falha que a Câmara de Deputados não levou em conta, a mistura das duas emendas.] Entre 1998 e 2007, R$43,5 bilhões deixaram de ir para o financiamento do ensino público no Brasil por causa da DRU. [São R$43 bilhões que deixaram de ir para a educação. E o senhor, há pouco, fez um discurso mostrando como a educação é importante.] Um montante de recursos que não podemos nos dar ao luxo de tirar da educação, que deve ser a política pública prioritária do país.

O desafio atual é o da qualidade. O Brasil não deve se contentar em ter as suas crianças na escola; é preciso que elas efetivamente aprendam o que devem aprender - e isso, convenhamos, não está acontecendo. Nossas crianças e jovens possuem o direito inalienável a uma educação de qualidade, para que tenham o prazer de ir à escola todos os dias, sabendo que vão adquirir os conhecimentos e as capacidades que utilizarão na vida adulta.

Vou repetir: para que tenham o prazer de ir à escola todos os dias. Não estão tendo. Esses R$43 bilhões poderiam ter dado às crianças brasileiras o prazer de irem à escola, se fossem bem usados.

(Interrupção do som.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - E continua:

Hoje, o Brasil investe US$870 per capita por ano, em média, nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, metade do investimento realizado pelo México e quase cinco vezes menos que o da Coréia do Sul, por exemplo.[E a gente tirando dinheiro da educação.]

O momento, portanto, exige a ampliação de recursos - como estabelece a meta cinco do Compromisso Todos pela Educação -, e não a perpetuação de um mecanismo que tira dinheiro do ensino público. Uma alternativa viável à prorrogação da DRU até 2011 está sendo discutida no âmbito da Comissão de Educação e Cultura da Câmara dos Deputados. A idéia é reduzir progressivamente a incidência, nos próximos quatro anos, da DRU sobre os recursos da educação.

            Vejam como são modestos, como a Srª Milu Villela, os que defendem mais recursos para a educação. Nem estamos propondo acabar já com a DRU, estamos propondo uma leve redução ao longo dos próximos anos. Ou seja, estamos pedindo ao Brasil e às nossas crianças que agüentem mais um tempinho, que esperam mais um tempinho. Esse é o grau de submissão que a gente tem.

De acordo com o projeto, de autoria do Deputado Rogério Marinho (PSB-RN), a incidência da DRU sairia dos atuais 20% para 15% em 2008, 10% em 2007, 5% em 2010 e zero em 2011.

Isso representa R$17 bilhões a mais para a educação básica nos próximos quatro anos. Por outro lado, caso a DRU permaneça no atual formato, outros R$28 bilhões deixarão de ir para o ensino público nesse período.

            Ou seja, na verdade, temos que somar esses R$28 bilhões com os R$17 bilhões, e perderá a educação, no total, R$45 bilhões, porque, além de continuar tirando R$28 bilhões, deixaríamos de colocar R$ 17bilhões.

Esta é a hora de a sociedade discutir o assunto e mobilizar seus deputados para que façam o mesmo, garantindo os recursos aos quais a educação tem direito por determinação constitucional. Se perdermos a oportunidade, o assunto voltará à pauta somente em 2011. Mas, aí, pode ser tarde demais.[Frase da Srª Milú Villela: “Aí pode ser tarde demais.]

Em quatro anos, uma parte importante do caminho que leva ao cumprimento das cinco metas do Todos Pela Educação e do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), do MEC, para 2022 já terá sido percorrida.

O primeiro passo no sentido de mobilizar a sociedade para o debate sobre a DRU será dado hoje, quando a Comissão de Educação e Cultura da Câmara realiza uma audiência pública a respeito do tema.

O Compromisso Todos pela Educação estará presente...[O evento já aconteceu.] ...colocando a serviço da causa da educação os esforços dessa grande aliança entre organizações sociais, gestores públicos de ensino, educadores e iniciativa privada.

Falta de dinheiro não é o único obstáculo à construção de uma escola melhor no Brasil. Mas, sem os recursos adequados, fica mais difícil implantar outras melhorias, como as que dizem respeito à gestão.

Somente com o orçamento apropriado teremos o caminho pavimentado para que se obtenham resultados concretos do grande esforço nacional pela educação básica de qualidade.

O artigo foi feito pela Srª Milú Villela, que é Presidente do Faça Parte - Instituto Brasil Voluntário, Embaixadora da Boa Vontade da Unesco, membro, fundadora e coordenadora do Comitê de Articulação do Compromisso Todos pela Educação e Presidente do Museu de Arte Moderna de São Paulo e do Instituto Itaú Cultural.

Eu fiz questão de ler esse artigo, porque creio que ele reflete algo muito importante: o desprezo total pela educação, que faz com que, em vez de se colocarem mais recursos, retirem-se recursos. E isso, embora eu esteja falando de outra coisa, tem a ver com o começo do meu discurso: a fidelidade.

O Partido dos Trabalhadores, o Partido do Governo, era contra a DRU, quando o Presidente Fernando Henrique Cardoso a estabeleceu. Sou infiel por ter saído do PT, mas continuo defendendo as mesmas causas. O Partido dos Trabalhadores e aqueles que lá estão mudaram de posição, mas pela lei, pela burocracia são considerados fiéis. Mais que isso, o Partido dos Trabalhadores defendia revogar o veto do Presidente Fernando Henrique Cardoso, que reservava 10% do Orçamento para a educação. Isso não foi feito até hoje.

Tem tudo a ver com fidelidade, por outra coisa também, Senador Lobão: é que a única maneira de tirarmos essa camisa-de-força que foi colocada necessariamente é, como o senhor disse mais cedo, com a educação. Só um radical processo de educação, só uma revolução na educação é que vai permitir que no Brasil a gente possa tirar a camisa-de-força necessária que o Supremo colocou ontem na política. Só uma revolução pela educação é o caminho, para que a fidelidade seja aos princípios, aos valores, naturalmente, sem precisar de camisa-de-força.

Concluo nesses 20 segundos, lembrando que hoje é o Dia Mundial do Professor. Embora no Brasil o Dia do Professor seja o dia 15, no mundo é hoje, dia 5 de outubro. E eles não têm merecido respeito como construtores do futuro desta Nação, porque a gente se acostumou a imaginar que os construtores são os engenheiros, os geólogos, os economistas, quando, na verdade, esses aplainam o terreno, mas quem faz a gente caminhar em direção ao futuro é o professor e a professora, lá na ponta, na sua sala de aula.

Eu os homenageio hoje, no Dia Mundial, embora vá voltar aqui, no dia 15 de outubro, para isso, se Deus quiser. Mas não poderia deixar de falar de fidelidade partidária a princípios e a partidos, não à sigla apenas, e desse discurso da Srª Milú Villela, que casa tão bem, no dia de hoje, quando falamos em fidelidade e lembramos que o Governo, quando se candidatou, prometeu acabar com essa aberração de 20% da DRU serem chupados. Ele ficou, inclusive, contra a continuação da CPMF e agora defende tudo isso.

Por falar em fidelidade, o meu Partido fechou questão em relação à CPMF e sou fiel a ele. Votei sempre com o PT, quando estava no PT, mesmo quando era contra, enquanto não fosse questão de princípio e vou votar outra vez a favor daquilo que o PDT decidiu, que é a continuação da CPMF, até porque não preciso desmentir nada que disse antes, porque nunca fui contra. Sempre achei que era um imposto que tem características corretas, de tirar muito mais dos que têm muito mais, de servir como instrumento de controle de lavagem de dinheiro e, inclusive, por ser um imposto impossível de se sonegar. Nunca fui contra. O que sou contra é para onde está indo o dinheiro: em vez da saúde, como era o objetivo, para outras finalidades.

Agora, o PDT não fechou questão no que se refere à suspensão da DRU. Por isso, vou votar “sim” - para que não haja mais essa quantidade de dinheiro sugado da educação por causa da desvinculação, maculando-se uma das grandes conquistas que esta Casa, o Congresso, teve no passado, que foi a Lei Calmon, que reserva obrigatoriamente dinheiro para a educação.

Era isso o que tinha para dizer.

Obrigado, Sr. Presidente, pela generosidade do tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/2007 - Página 34230